Hoje, na Sala Redenção, às 19h, haverá a apresentação da obra-prima de Robert Altman McCabe & Mrs. Miller (Onde os Homens são Homens ou Quando os Homens são Homens no Brasil). O filme é de 1971 e é espantosamente belo. Ele recebe nota 7,7 no IMDB, 8,7 no Rotten Tomatoes e 5 estrelas no NY Times e na Rolling Stone.
Altman era um iconoclasta que virou uma série de gêneros de cabeça para baixo. M*A*S*H era uma comédia anti-bélica. O Longo Adeus foi uma revisão do noir. E o que dizer de seu Popeye? E, é claro, há McCabe & Mrs. Miller, um “western revisionista” que substitui o tiroteio habitual por sequências em que o herói se esconde e se esconde, tentando ficar de fora. O filme ficou restrito ao sucesso cinéfilo. A maioria do público torceu o nariz. Porém, sua reputação foi inflando ano após ano e agora é considerado um dos melhores Altman. Aqui estão alguns fatos dos bastidores da filmagem.
1. O título inicial era A Aposta de Igreja Presbiteriana.
Embora o filme tenha sido baseado em um romance de 1959 de Edmund Naughton chamado McCabe, o título do trabalho era A Aposta de Igreja Presbiteriana (…), referindo-se a uma aposta de alguns moradores da cidade sobre se McCabe seria morto depois de se recusar a vender seus negócios. É que a cidade se chama Igreja Presbiteriana, em homenagem a sua estrutura mais proeminente. Robert Altman disse que, durante a produção, a Warner Bros. foi contatada por líderes da religião, pedindo que não usassem o nome da instituição em uma história sobre bordéis e jogos de azar. O título foi alterado para John McCabe e, depois, para McCabe & Mrs. Miller.
2. Os atores principais eram um casal da vida real que nunca havia trabalhado junto antes.
Warren Beatty e a grande atriz britânica Julie Christie mantiveram um relacionamento amoroso intermitente por vários anos. Em McCabe & Mrs. Miller, eles aparecem juntos nas telas pela primeira vez. Uma biografia de Christie diz que ela foi contratada antes de Beatty. Outra de Altman diz a mesma coisa, acrescentando que a participação de Beatty foi necessária para garantir o financiamento. Mas uma biografia de Beatty conta que ele concordou em fazer o filme depois de se encontrar com Altman e, posteriormente, “convenceu Christie também”. Então, quem sabe?
3. Os prédios da cidade foram construídos por pessoas que fugiam da Guerra do Vietname.
O filme foi filmado perto de Vancouver em 1970, quando muitos jovens americanos estavam fugindo para o Canadá para escapar da Guerra do Vietnã. Alguns desses homens foram contratados para ajudar a construir a cidade Igreja Presbiteriana e até moraram nela.
4. Alguns dos cenários ainda estavam sendo construídos enquanto o filme estava sendo filmado.
Como o filme foi filmado em ordem cronológica, e como a cidade da virada do século deveria ir se expandindo ao longo da história, fazia sentido economizar tempo realizando o filme durante a construção da cidade. Carpinteiros, vestidos com roupas de época, podem ser vistos em segundo plano em algumas cenas, fazendo trabalhos de construção.
5. O filme foi fotografado de maneira incomum e arriscada.
Altman e seu diretor de fotografia, Vilmos Zsigmond, queriam um visual áspero e antiquado. Eles chegaram a um método que os chefes do estúdio nunca teriam aprovado, se soubessem. A técnica mandava expor levemente o negativo do filme antes de fotografar. Isso dificulta a definição da exposição e aumenta as chances de todo o lote ser danificado. O estúdio não gostou do resultado, mas não havia nada que pudesse ser feito depois de pronto — esta é outra razão pela qual Altman fez assim.
6. A fotografia era inelegível para o Oscar.
A elogiadíssima fotografia ganhou menções em muitas críticas, mas foi ignorada quando as indicações ao Oscar apareceram. Acontece que Zsigmond não era sindicalizado. Ele ingressou na Sociedade Americana de Cinegrafistas em 1973 e foi posteriormente nomeado para quatro Oscars, vencendo em 1978 por Encontros Imediatos de Terceiro Grau, de Steven Spielberg.
7. Entre os custos de produção há o replantio do gramado de um morador.
O local das filmagens, uma área rural perto de Vancouver, era escassamente povoada, mas tinha vizinhos. Um desses vizinhos teve que ser reembolsado pelo custo de ter que replantar seu gramado depois que um burro da produção ter se soltado. Ele comeu a grama do cara. Os funcionários da Warner ficaram surpresos ao ver as despesas listadas, embora certamente não tenha sido a primeira vez que um filme de Hollywood incorreu em despesas por causa de algum animal.
8. As cenas de negociação reproduzem as experiências de Altman com produtores.
Altman disse no comentário do DVD que as cenas de McCabe discutindo valores e preços de venda de seus negócios foram inspiradas por suas próprias negociações com produtores e atores.
9. Os atores escolhiam seus próprios trajes, que não poderiam ser trocados.
O pessoal de figurino de Altman montou uma vasta coleção de roupas de época de todos os tipos, penduradas em prateleiras em um dos edifícios da “cidade”. Os atores, desde os protagonistas até os extras, tiveram liberdade para escolher seus próprios trajes, dentro de certas diretrizes: um par de calças, talvez duas camisas, um casaco, etc. Então eles tiveram que usar essas roupas durante toda a filmagem, e cuidar delas como pessoas do velho oeste, sem a assistência de um departamento de guarda-roupas.
10. Tudo bem se você não conseguir ouvir parte do diálogo.
Como a maioria dos filmes de Altman, McCabe & Mrs. Miller têm diálogos naturalistas e sobrepostos. Em vez de uma pessoa dizer uma linha e depois outra pessoa dizer outra, os personagens falam como pessoas reais, interrompendo-se, gaguejando, falando ao mesmo tempo e parando. Zsigmond perguntou a Altman sobre isso. “Não entendo o que as pessoas de segundo plano estão dizendo”, lembrou o diretor de fotografia húngaro. “‘Bem, Vilmos, você já esteve em bares barulhentos. Você ouve o que essas pessoas estão falando ao fundo? Quero uma trilha sonora real. Às vezes você não entende o que elas estão dizendo.”
11. Altman pode ter sido influenciado por Leonard Cohen.
Altman comprou o álbum Songs of Leonard Cohen em 1967, ouviu-o muito, apaixonou-se por ele e depois largou de mão… Dois anos depois, ele estava em Paris pensando em McCabe, e já sabia que não queria uma trilha de música orquestral. Um amigo tocou o tal álbum de Leonard Cohen e Altman disse: “Essa é a música!” Ele imediatamente procurou Cohen a fim de obter permissão para usar algumas das músicas, que os fãs do filme sabem que são assustadoramente apropriadas. “Foi estranho como as letras dessas músicas se encaixavam no filme”, disse Altman. “Eu acho que inconscientemente, elas devem ter estado na minha cabeça.”
É o filme mais lindo e incomum do Altman – um cara que já é por si só diferente de tudo. Não tem nada parecido com ‘McCabe and Mrs. Miller’. Um faroeste triste, melancólico, cujo ‘herói’ é um rematado perdedor. Daqueles filmes que quanto mais se revê, mais cresce.