Enéas de Souza nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Enéas de Souza nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Enéas de Souza é crítico de cinema, economista, filósofo, psicanalista e , como se não bastasse, cliente da Bamboletras.

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Sérgio Sant’Anna (1941-2020)

Sérgio Sant’Anna (1941-2020)

Eu era leitor de Sérgio Andrade Sant’Anna, depois tomei-me amigo dele no Facebook — dialogamos alegre e gentilmente algumas vezes, falamos de seus livros e de como ele era fisicamente muito parecido com outro grande amigo meu — e sua morte me afeta muito. Foi-se um grande escritor, vítima do coronavírus. João Gilberto, Srta. Simpson, Simulacros, Manfredo Rangel e A Tragédia Brasileira são livros que guardo no ventrículo esquerdo, que é onde o coração bate mais forte. Dias atrás, ele escreveu sobre a grande escuridão. Ele tinha receio que ela estivesse chegando. Puxa vida, Sérgio, não precisava ter acertado, né? Homem íntegro, combateu a ditadura militar e tinha todas as ironias do mundo para nossa atual tragédia.

Foi -se e é mais uma tristeza a marcar esses dias.

Beethoven e a direção da transformação

Beethoven e a direção da transformação

Texto publicado no Caderno de Sábado do Correio do Povo de hoje

Ouvir uma obra da juventude de Beethoven e logo depois outra da maturidade é um choque. Poucos compositores evoluíram tão espetacularmente. Mozart vinha fazendo o mesmo, mas viveu 21 a menos e não alcançou o romantismo. Beethoven alterou sua linguagem de tal forma que acabou por tornar-se a própria transição da música do período clássico para o romântico. Isto deu-se certamente por uma necessidade interna, mas fatores externos também o influenciaram.

A vida de Ludwig van Beethoven (1770-1827) mostrou-se tão adequada a romances e filmes que as lendas em torno de sua figura foram se criando de forma indiscriminada, às vezes criando paradoxos. Sua surdez, por exemplo, contribuiu muito para popularizá-lo e para que fosse lamentado. Victor Hugo dizia que sua música era a de “um deus cego que criava o Sol”, mas quem o conhecesse talvez reduzisse o tom de piedade. Beethoven era uma pessoa absolutamente segura de seu talento – não mentiríamos se o chamássemos de arrogante – e tinha perfeita noção de quem era e do que representaria.

Também não foi uma pessoa fácil. Em seus anos de aluno, Beethoven utilizava harmonias que eram consideradas inadmissíveis. Quando lhe diziam que eram estranhas, perguntava: “Quem as proibiu?”. Há um fato muito curioso em sua formação. Desde cedo o compositor teve uma noção muito clara daquilo que lhe faltava: conhecer literatura. Ele sabia que seu talento poderia naufragar sem um arcabouço cultural. Com entusiasmo, ele atirou-se à leitura de Homero, Shakespeare, Goethe e Schiller. Pensava que só assim – e tendo bons professores de composição – poderia ser o que tinha planejado para si: tornar-se o Tondichter da Alemanha, o poeta dos sons de seu país.

As obras escritas antes de seus 30 anos obedeciam e traíam seus mestres. Apesar de respeitar as estruturas aprendidas, já são claros os procedimentos expressivos que utilizaria nas fases seguintes – os temas curtos e afirmativos, os súbitos silêncios, o uso simultâneo de graves e agudos do teclado, a primazia do ritmo. O seu “classicismo vienense” era muito pessoal. É tradicionalmente aceito dividir a vida artística de Beethoven em três fases, mas prefiro dividi-la em quatro. A primeira começa com a mudança para Viena, em 1792. Uma fase leve e ousada como Mozart.

Nove anos depois, em 1801, Beethoven afirmou não estar satisfeito com o que compusera até então, decidindo tomar um “novo caminho”. Tudo parecia levá-lo ao épico e, em 1803, surge o primeiro grande fruto: a Sinfonia Nº 3, Eroica. A obra seria dedicada a Napoleão Bonaparte — Beethoven tinha admiração por ele e pelos ideais da Revolução Francesa. Porém, quando o corso autoproclamou-se imperador da França em maio de 1804, Beethoven foi até a mesa onde estava a sinfonia já pronta, pegou a primeira página e riscou o nome de Napoleão com tanta força que ficou um buraco no papel. Perdeu Napoleão.

O ciclo épico iniciado pela Eroica seguiu com obras verdadeiramente espantosas e originais, que cantavam a força da humanidade, a paixão pela liberdade e a vitória do espírito humano. Vieram a Sinfonia Nº 5, a Nº 6, Pastoral, as sonatas Waldstein e Appassionata, assim como o Concerto para Piano Nº 5, chamado Imperador. Eram músicas intensas, triunfantes e românticas.

Ao final da primeira década do século XIX, começa a terceira fase. Ele já era reconhecido como o maior compositor de sua época, e cometeu algumas, digamos, obras polêmicas. Entre 1813 e 17, passou por uma crise criativa, levado talvez pela progressiva surdez — ele começara a se comunicar com as pessoas por gestos ou por escrito — ou pela perda das esperanças matrimoniais. Mas seguiu compondo: escreveu a pior das músicas em A Vitória de Wellington. “É uma estupidez”, admitiu, mas o público saudou o triunfalismo da obra. Era o músico nacional e tudo o que fizesse era adorado.

Sua sorte foi ter conhecido a Condessa Maria Erdödy, grande e inspiradora amiga que conseguiu retirá-lo da letargia. Ele recomeçou, em 1818, a compor lentamente as que seriam, talvez, suas maiores obras. À Condessa foram dedicadas as duas esplêndidas Sonatas para Violoncelo e Piano Op. 102.

E começou a quarta fase, a mais vanguardista. Há obras muito populares neste período — dentre elas a Sinfonia Nº 9 —, mas há também aquelas que, de tão perfeitas, serviram de base para muitos compositores que vieram depois. A irrepetível sequência perfeita e revolucionária começou com a Sonata para Piano, Op. 106, Hammerklavier. Beethoven teve que prestar explicações a seus contemporâneos, que não a entenderam, o que gerou mais algumas de suas deliciosas respostas mal humoradas. “Não pensei no pianista quando a escrevi”. “Não gostam agora? Gostarão mais tarde. Não escrevo para vocês, escrevo para o futuro.”

As sonatas seguintes, de Op. 109, 110 e 111, são inacreditáveis, considerando-se a época em que foram compostas. A Sonata Op. 111 gerou um dos mais belos momentos da literatura de todos os tempos: a aula do Prof. Kretzschmar em Doutor Fausto, de Thomas Mann. O imaginário professor Kretzschmar dá uma aula sobre o tema “Por que Beethoven não escreveu o terceiro movimento da Sonata Op. 111”. A ideia de Mann nasceu quando um descuidado pianista contemporâneo de Beethoven perguntou sobre o motivo da inexistência do mesmo. A resposta do compositor foi típica: “Não tive tempo de escrever um!”.

O futuro lhe abriria as portas como fez para poucos. No início do século XX, o escritor Romain Rolland acreditava ser o último beethoveniano. Não poderia estar mais enganado. Bartók, Xenakis, Varèse, Shostakovich e Schnittke foram decisivamente influenciados. Além disso, Beethoven tornou-se o mais popular dos compositores, o elo perfeito para aqueles que raramente ouvem a música erudita pudessem adentrar em um novo mundo.

Em 1824, surge a Sinfonia nº 9, Op.125, para muitos sua obra-prima. Pela primeira vez na história da música é inserida a voz humana em uma sinfonia. Os anos finais de Beethoven foram dedicados quase que exclusivamente à composição de quartetos de cordas. Os últimos quartetos são talvez suas obras mais profundas e visionárias. Elas foram encomendados pelo príncipe Galitzin, que pagou 50 ducados por cada. Pagou mesmo? Beethoven recebeu o pagamento apenas do primeiro. Embora o príncipe russo não negasse a dívida, os quartetos restantes só foram pagos aos herdeiros de Beethoven em 1852, 25 anos após sua morte.

Na opinião de Beethoven, o quarteto — que fora inventado por Haydn — era a manifestação mais alta da arte musical e ele utilizou-o como veículo de expressão daquilo que parecia ser um projeto de renovação de sua música.

O Quarteto Op. 132 é absolutamente pessoal, como se vê nas anotações na partitura. Beethoven passara um inverno sem complicações de saúde, mas a primavera trouxera-lhe moléstias pulmonares, digestivas e intestinais que o debilitaram muito, a ponto de deixá-lo de cama por vários dias. Sua situação foi comentada musicalmente na obra. Na partitura, há anotações como “ação de graças de um convalescente”, “sentindo novas forças” ou “Tu (referindo-se a Deus) me devolveste a vontade de viver”. Trata-se de um caso único: um compositor comentar problemas tão terrenos em música. Normalmente, quando se fala na dor que uma música representa, em geral são dores da alma, dificilmente sofrimentos físicos.

Assim, a vida de Beethoven foi finalizada por obras de um tipo nunca ouvido antes. Seus contemporâneos tinham dificuldades de entender aqueles enormes quartetos, às vezes com sete movimentos.

Beethoven foi o primeiro romântico que fez questão de ter liberdade de expressão. Se foi condicionado por algo, foi pelo equilíbrio, pelo amor à natureza e pelos grandes ideais humanistas. Inaugurou a tradição do compositor que escreve música para si, não seguindo os desejos de um mecenas ou a moda. Em uma época em que tanta gente é chamada de gênio, convém conhecer um que verdadeiramente merece ser chamado assim. Beethoven é do tamanho de Shakespeare, Cervantes, Bach, Homero, Dante e de outros poucos, bem poucos.

Foto: Deutsche Welle

Deus e o Diabo em Terra Brasilis

Deus e o Diabo em Terra Brasilis

Eu chego em casa e tomamos café. Aqueles pães da Elena tornam a gente falante. O café incentiva ainda mais e, se não fazemos revolução na mesa do bar — até porque o bar é impossível –, começamos a pensar alto, inspirados por Dostô e sem álcool.

Dmitri Karamázov, personagem de ‘Os Irmãos Karamázov’, de Dostoiévski, diz: “Aí lutam Deus e o Diabo. E o campo de batalha é o coração dos homens”. Assim, Dostoiévski colocava em xeque os valores do humanismo em suas várias vertentes — cristã, idealista, materialista. No espaço psíquico é onde Deus e o demônio se revelavam. Era uma luta travada em silêncio, em espaço obscuro e inconsciente.

Na nossa crise atual, há outra luta, barulhenta e furiosa. Irritante, na verdade. Podemos chamá-la de uma luta entre a razão e a paixão ou crença. De um lado, há os cientistas nos alertando sobre o que fazer — isolamento, máscaras, cuidados –, de outro há os crentes — em Bolsonaro, na onipotência de que não pegará a doença, no espaço sagrado da igreja que impede a entrada do vírus.

Por mais que a luta dostoievskiana possa resultar numa vingança ou crime individual, o debate externo é pior, pois é tão social que pode arrastar a mortes. Hoje chegamos a 10.000, não?

Foi isso. Leu até aqui? Sua vida não mudou. Nem a nossa. Tô de boa com a ciência. Me cuidando para não ter nem aquela gripezinha de todo inverno, apesar de meu histórico de atleta… Aquela gripezinha… A minha, não a do Diabo.

Cláudia Beylouni Santos nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Cláudia Beylouni Santos nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Cláudia Beylouni Santos tem formação em Ciências Jurídicas e Sociais, é especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional, e é estudante de Filosofia e Letras Clássicas.

Também é mãe da Sophia (nada mais justo, a Sophia foi a porta de entrada para a Bambô) e cliente da Bamboletras. É vorazmente curiosa pelo mundo, pela natureza, pelas gentes, cresceu devorando a vida através dos livros, da música e das artes em geral, até poder ir tocá-la de perto com os próprios olhos em jornadas tomando chá de manteiga de yak com nômades Khampa no Tibet; atravessando o mar de Drake como trainee de tripulação em um veleiro para chegar à península Antarctica; trocando abraços com ‘novos velhos amigos’ em tribos tradicionais etíopes; recebendo bênçãos em cerimônia privada na própria casa de uma Kumari – a deusa viva – durante as celebrações à Durga no vale de Kathmandu e muitas outras delícias mais…

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Como ser legal, de Nick Hornby

Como ser legal, de Nick Hornby

A médica Kate Carr divide seus dias entre o trabalho, os dois filhos pequenos, as contas a pagar e um amante sem graça, enquanto o marido cuida da casa e das crianças. O “trabalho” do marido resume-se a escrever uma coluna no jornal local do bairro de Holloway, Londres. São crônicas sobre como ele detesta tudo, principalmente as pessoas. Também escreve um livro, daqueles que jamais virão à luz. O título de sua coluna? Ora, O homem mais mal-humorado de Holloway. E ela, Katie, resolve se separar. Afinal, a relação com o marido dá-se através de sarcasmos dos quais ela é a maior vítima. OK, o sexo funciona, já o resto… Porém, após o anúncio da separação, David, o marido, decide mudar, transmutando-se num estranho gênero de boa pessoa.

A primeira parte de Como ser legal é realmente muito boa. Katie conta sua história demonstrando discreta raiva, além de boas doses de aversão ao marido e ao amante. Ela também tem perfeito senso do vaudeville onde está metida, mas com uma ponta de desespero real. Uma bela construção de Hornby.

Mas aí aparece BoasNovas, um curandeiro magricela e filósofo dotado de um discurso irritante de terapias alternativas. Ele cura David, o marido, de suas antigas dores nas costas. Mas faz mais: tira do coração de David a herança de anos de cinismo e a substitui por um amor inquestionável e abrangente à humanidade. A metamorfose, manipulada habilmente por Hornby, obriga Katie a questionar o que desejava. O novo David é tudo o que ela acreditava que queria que ele fosse: gentil, aberto, amoroso. Só que, infelizmente, ele também quer escrever livros de auto-ajuda, convence seus filhos a dar seus brinquedos a órfãos e, o pior de tudo, quer que BoasNovas more com eles. O tal BoasNovas é um baita chato que quer salva o mundo alterando as posturas pessoais da gente do bairro. A mudança tem que começar por algum lugar.

Enquanto tudo isso acontece, Katie é forçada a pensar na tolerância e sacrifício que está preparada para fazer a fim de melhorar a vida mundial ou a de seu bairro. Por exemplo, David e BoasNovas bolam um modo de incentivar toda a rua a levar um sem-teto para aqueles quartos que não são habitados de suas casas. Também fazem planos para erradicar a dívida mundial na mesa da cozinha e, em uma inversão, Katie se vê no papel de escarnecedora e cínica.

Quando as coisas começam a não funcionar, o livro cai muito. Assim, a história termina de maneira insatisfatória, oscilando entre a comédia social e os entediantes compromissos de fé e amor de David e BoasNovas. Hornby parece perder o rumo. Ou talvez as perguntas que este livro se faz sejam grandes demais para o autor e para a vida que ele descreve.

Hornby: lidando com uma canção maior do que o cantor?

Éder Silveira nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Éder Silveira nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Éder Silveira é Doutor em História pela UFRGS, Professor da UFCSPA e cliente da Bamboletras. É autor de Oswald – Ponta de Lança e Outros Ensaios e Tupi or not Tupi: Nação e Nacionalidade em José de Alencar e Oswald de Andrade.

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Clara Corleone nos 25 anos Livraria Bamboletras

Clara Corleone nos 25 anos Livraria Bamboletras

minha admiração pela bamboletras vem desde a primeira vez que eu a encontrei, quando era criança. uma tampinha amante dos livros e das livrarias, achava um lugar meio encantado, sabe? pequeno e cheio de surpresas. eu e a bambô seguimos na vida uma da outra desde então: minha prima daciara cantou na bambô quando eu era adolescente. que legal, né? cantar numa livraria! quando trabalhei como garçonete em um bar na cidade baixa, tentava ir mais cedinho pro bairro – sou moradora do bom fim – para dar um pulinho na bamboletras. comprei alguns livros do caio fernando abreu por lá que ainda conservo, com muito carinho, na minha biblioteca. ano passado, ao receber uma grana a mais, encomendei dois livros enormes do meu amor reinaldo moraes com o milton. chegaram rapidinho e foram lidos rapidinho, também. essa semana, juntinho desse aniversário tão especial, também rolou um cascalho inesperado e logo pedi ao milton para me mandar alguns livros do marçal aquino. e não posso deixar de mencionar que, honra suprema, algumas cópias do meu primeiro livro ficaram em 2019 por lá autografadas a pedido do livreiro. muito chique!

vida longa a bamboletras, ao meu querido amigo milton e a todas as livraria de porta de rua do mundo.

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Bamboletras: balança, mas não cai

Bamboletras: balança, mas não cai

Por Marcos Nunes

Eu era cliente da livraria Leonardo da Vinci, no Rio, que fechou nos antigos moldes e reabriu em novos, o que a tornou equivalente a outras do ramo, como a Livraria da Travessa, ainda que não a supermercados sem caráter como a Saraiva, a Cultura e a Fnac.

Quando mais jovem, comprava na Livraria Eldorado, na Tijuca, e andava pelos sebos do Centro (tempos bicudos).

Agora sou cliente de uma única livraria, a Bamboletras, onde nunca fui, e com 99% de probabilidades nunca irei, pois moro a quase 1.900 km dela.

Pelo que vi nas fotos do lugar, é um estabelecimento pequeno, porém bem fornido, tipo aquele boteco pequenino e bem transado que a gente ama, pois tem tudo o que gostamos e conta com donos e atendentes de uma simpatia que é quase amor.

Recebo, é claro, meus livros pelo correio, sendo eles quase todos bons muito bons, exceções de praxe não contando, é claro. Alguns me são indicados; outros, escolho depois de vaguear por sites e recomendações avulsas em redes sociais.

Contudo, jamais, jamais mesmo!, compro livros em sites do gênero Amazon. Fazendo como faço agora, ainda me sinto, nesse meu imaginário de poeta e louco que todos têm um pouco, a impressão de circular pelos apertados vãos entre prateleiras repletas de livros, sentindo os cheiros de papel e tinta, olhando para uma eventual e bela cliente, ou atendente, e até para o sorriso bobão do Milton, que suspeito ser assim, bobão, uma vez que nunca nos vimos e sequer nos falamos pelo telefone.

É, a vida virtual pegou a gente e assim são nossos sonhos no século XXI: impossíveis abraços afetuosos em amigos e amantes unidos tantas vezes por um só interesse. Neste caso específico, os livros.

E, nos dias de quarentena, há pouca coisa melhor para fazer do que ler.

Óbvio, podemos também ficar na rede, beber umas garrafas de vinho, fazer um sexo geriátrico, ver uns filmes pirateados na Internet, ou tecer comentários no Facebook, Twitter e coisa que o valha, sem esquecer dos prazeres da cozinha e do simples vagar dos olhos pela paisagem (quando se tem uma à frente que não seja composta somente de prédios, casas, muros, fiações e automóveis).

Tenho visto, claro, nesses dias de muito ócio (e por isso muito prazer) as postagens de porto-alegrenses (e demais habitantes desse estranho país que é um estado) acerca do aniversário de 25 anos do estabelecimento, há uns tempos sob a gestão do colorado e dublê de jornalista Milton Ribeiro. São sempre palavras de muito carinho, muita força e consideração pela luta que é manter um comércio de livros atuante e alerta entre lojas de lingerie e sanduíches de bosta enlatada.

Escrevo, então, minha cartinha de plena solidariedade a esses compadres que leem, escrevem, fazem contas e pagam impostos, e suprem minha sede por palavras impressas em folhas de papel, enquanto existirem árvores e uns poucos leitores como eu, que de fato leem. Para dar um pouco de alegria aos mencionados compadres de nossa república do compadrio que não chega até nós — aliás, vem se estreitando e o número se compadriados cada dia diminui; acho que estamos criando algo novo no mundo: a república minimalista, que vive somente na Praça dos Três Poderes, e o resto é só o resto.

Sigo apoiando a brincadeira de adultos que é ter uma loja repleta desses estranhos objetos que não fazem parte da vida de quase ninguém, que são como as bruxas nas quais quase ninguém acredita – mas que elas existem, existem.

O bobão do Milton Ribeiro na porta da Bamboletras (Foto: Bárbara Ribeiro)

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Santiago nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Santiago nos 25 anos da Livraria Bamboletras

Quem não conhece e admira Neltair Abreu, o Santiago? Pois é, ele é mais um cliente da Bamboletras. Ele colaborou em diversos veículos, recebeu mil prêmios como ilustrador e chargista e aqui temos seu depoimento nos 25 anos da Bamboletras. Ah, temos quadros dele para vender em nossa loja!

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José Francisco Botelho nos 25 anos da Livraria Bamboletras

José Francisco Botelho nos 25 anos da Livraria Bamboletras

José Francisco Botelho é escritor e jornalista, autor de Cavalos de Cronos e A árvore que falava aramaico, ambos publicados pela Zouk, além de premiado tradutor de Shakespeare, Chaucer, Conan Doyle, etc.

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As gravuras noturnas de Martin Lewis, o mestre esquecido de Edward Hopper

As gravuras noturnas de Martin Lewis, o mestre esquecido de Edward Hopper

Do Cultura Inquieta

Martin Lewis teve algum sucesso no início de sua carreira, mas a Grande Depressão de 1929 o relegou a um segundo plano e ele passou as últimas três décadas de sua vida apenas ensinando a outros as técnicas de gravação.

Entre esses “outros” estava o grande Edward Hopper, que se apaixonou por seus personagens e paisagens  noturnas e solitárias. Apesar disso, Lewis morreu esquecido como artista em 1962, sendo considerado apenas um professor de arte aposentado. Estranhos caprichos do destino quiseram que a história escolhesse Hopper para ser célebre, mas o fato é que Martin foi seu mentor e Hopper provavelmente nunca tivesse sido Hopper sem Lewis.

Consciente disso, o pintor disse em sua própria biografia que foi a partir do ilustrador australiano que aprendeu o básico da gravura.

Lewis começou a mostrar seus trabalhos em 1915, usando uma prensa para fazer impressões. Suas gravuras na época eram admiradas e compradas pela elite da Costa Leste. Hopper foi a seu encontro e perguntou se poderia estudar com ele a fim de aprender as técnicas. Com Lewis, Hopper passou a também usar a noite da cidade que nunca dorme como inspiração.

No entanto, anos depois, enquanto preparava uma exposição individual em Pittsburgh, no auge de sua fama, Hopper paradoxalmente rejeitou a influência do trabalho e do aprendizado com Lewis: “Lewis é um velho amigo meu”, disse, rejeitando o valor profissional em seu trabalho. “Quando eu decidi gravar, ele ficou feliz em me dar alguns conselhos sobre processos puramente mecânicos”.

Eles obviamente não eram mais amigos na época. Tiveram problemas, pois era complicado para Lewis ser testemunha do enorme sucesso de Hopper.

Porém, quase 50 anos após sua morte, uma gravura de Lewis, “Shadow Dance”, foi vendida por preço recorde para o artista. Em 2019, um colecionador pagou US$ 50.400 num leilão em Nova York. Ou seja, agora ele começa a receber o merecido reconhecimento que infelizmente não obteve ver.

De sua parte, Hopper sempre considerou a gravura o meio que lhe permitiu explorar outras áreas como artista e muitas de suas gravuras se tornaram mais tarde algumas das pinturas que o tornaram famoso.

Atrás do balcão da Bamboletras (XXIV)

~ DIA DAS MÃES ~

A cliente entra na Livraria Bamboletras, escolhe, escolhe, escolhe e…

— Eu preciso de um presente para a minha mãe. Acho que vou levar este aqui.

E me mostra o romance Olive Kitteridge. Eu calculei a idade da compradora e concluí que sua mãe deveria ter mais de 70 anos.

— Olha, este livro é sobre uma mulher madura, aposentada, que tenta várias vezes se suicidar… Discute também melancolia, envelhecimento e depressão. Tua mãe pode se interessar pelo tema, mas não sei tu achas adequado dar este livro de presente de Dia das Mães…

— Credo! QUE HORROR! Não quero mais. Poderia me indicar outro?

Nikelen Witter sobre os 25 anos da Livraria Bamboletras

Nikelen Witter sobre os 25 anos da Livraria Bamboletras

Nikelen Witter é escritora, autora de Territórios Invisíveis, Viajantes do Abismo, Dezessete Mortos e A Devoradora de Mundos. É graduada e professora de História na UFSM. Possui Mestrado em História do Brasil pela PUC-RS e é Doutora em História Social pela UFF. E é cliente da Bamboletras.

“Quem trabalha com História da Leitura, como é o meu caso, sabe da importância que tem uma livreira ou livreiro. Não se trata apenas de escolhas de acervo e venda de livros. Trata-se do fomento, da curadoria, da conexão entre quem lê e busca e as palavras escritas e seus formatos e gêneros. Livreiras e livreiros são essa ponte, essa ligação. Mesmo quando a gente olha da história do livro no Brasil, sabe que foi dos livreiros que vieram as editoras, de seu gosto e recomendações que se fizeram escritores. É claro que, quando se é uma leitora voraz – o que é o meu caso igualmente – e uma escritora – grupo no qual também me incluo -, a importância da livreira/livreiro continua sendo crucial. Não pelo comércio dos livros que consumo ou que escrevo. Mas pelo papel fundamental de formação de leitores e de extensão dessa cadeia de amantes da escrita a um nível pessoal que, por vezes, oscila entre a amizade e a terapia. É nesse lugar que a Bamboletras tem estado nos últimos 25 anos. Uma livraria livreira. Um espaço de encontro e compartilhamento. Uma porta para a dimensão maravilhosa dos livros. Longa vida, Bambô!”

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Luís Augusto Farinatti nos 25 anos da Bamboletras

Luís Augusto Farinatti nos 25 anos da Bamboletras

Farinatti é escritor — autor de Verão no Fim do Mundo –, professor do Departamento de História da UFSM e também cliente da Bamboletras. Obrigado por fazer parte dessa história!

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