Quando David Gilmour passou por Porto Alegre, li coisas muito equivocadas a seu respeito. Ele seria uma espécie de tranquila divindade que habitaria uma nuvem cor-se-rosa, acompanhado por sons de Enya e de baterias sussurrantes ao estilo de Nick Mason, fazendo apenas fi, fi, fi. Sim, claro, forcei a barra, mas o som do Pink Floyd muitas vezes é assim mesmo e deve ser este o motivo de tais descrições embevecidas. Ele moraria dentro de uma redoma de competência, colhendo a nata para devolvê-la perfumada a seus milhões de fãs. É óbvio que há várias formas de prazer, inclusive as mais eruditas, mas dei risada, porque as descrições pareciam caracterizar algo como um bom filtro de cerâmica. Esta comparação é válida em razão de os textos dizerem que tudo o que ele tocava ficava tranquilo e de bom gosto. Não pareciam descrever um roqueiro.
Lembrei destas críticas hoje pela manhã e resolvi demonstrar como Gilmour — um baita músico — pode também tocar uns rocks rápidos, dançáveis e barulhentos dos anos 50 e 60, sem maiores problemas ou grande poesia, apenas como diversão. Em 1999, Paul McCartney lançou Run Devil Run, um álbum de estúdio que contém covers de canções de rock and roll do final da década de 1950 e três novas de McCartney, escritas no mesmo estilo.
A banda tinha Paul McCartney (baixo), David Gilmour (guitarra), Mick Green (guitarra), Ian Paice (do Deep Purple, bateria), Pete Wingfield (teclados). Abaixo, o show de 46 min que fizeram no Cavern Club. David Gilmour também sabe se divertir — e ganhar uma grana –, ora.
A relação de canções:
“Honey Hush” (Joe Turner)
“Blue Jean Bop” (Gene Vincent/Morris Levy)
“Brown Eyed Handsome Man” (Chuck Berry)
“Fabulous” (Harry Land/Jon Sheldon)
“What It Is” (Paul McCartney)
“Lonesome Town” (Baker Knight)
“Twenty Flight Rock” (Ned Fairchild)
“No Other Baby” (Dickie Bishop/Bob Watson)
“Try Not to Cry” (McCartney)
“Shake a Hand” (Joe Morris)
“All Shook Up” (Otis Blackwell/Elvis Presley)
“I Saw Her Standing There” (Lennon–McCartney)
“Party” (Jessie Mae Robinson)