Você abre Mônica vai jantar e nota que o livro só tem um parágrafo, como alguns de Thomas Bernhard. Folheia algumas páginas e se dá conta que não há pontuação — nem ponto final –, que é um jorro só como o monólogo de Molly Bloom, do Ulysses de Joyce. Porém, se no capítulo final Penélope (o tal monólogo de Molly) temos 8 frases em 70 páginas de furioso fluxo de consciência, aqui temos mais ou menos a mesma extensão do fluxo de consciência de uma mulher que deve ir a uma dessas festas noturnas chatas de fim de ano que as empresas promovem, mas cujo namorado marido andou, simplesmente, masturbando-se publicamente num ônibus e que apanhou feio na mesma tarde. Sim, o pessoal do ônibus não apreciou muito o gesto de abertura do zíper e o resto.
Há muito a elogiar no livro de Davi Boaventura. Apesar da, ops, aventura do estilo, o livro é perfeitamente compreensível, nada hermético. A leitura é fácil e ritmo do texto tão bem planejado que adquirimos rapidamente a velocidade requerida. Mais: Davi é seguro, tudo funciona muito bem na narrativa.
Mônica é uma pessoa simples, uma subgerente de loja que tem um chefe machista que a assedia. Em seu monólogo interior, ela não consegue analisar em profundidade o ato do namorado marido. Está abalada, em choque após saber do fato e fica toda atrapalhada tendo que se arrumar para o jantar. Ou seja, no dia em que descobre uma atitude repulsiva do namorado, o que a humilha e ofende, tem que ir a um jantar, a uma obrigação profissional, com a presença de um cara desagradável e do qual não sabe se conseguirá ficar sentada longe.
No olho do furacão, Mônica deve se mover. É difícil.
O livro é experimental? Sim, mas é muito acessível e de fácil leitura.
Tem pontos de parada? Absolutamente não. Li-o em três sessões de mais ou menos 30 páginas e foi bom.
Então não me venham com papinho de que é difícil, de que é exercício de estilo, punheta literária, etc.
O livro tem o estilo que cabe ao turbilhão de pensamentos que ocorrem a uma pessoa sob pressão profissional, que tem uma união estável e se sente traída da forma mais inusitada e horrível.
Sem spoilers, recomendo.