Nossa ida ao Cine Gourmet do Hotel Casa da Montanha de Gramado

Nossa ida ao Cine Gourmet do Hotel Casa da Montanha de Gramado

Chegamos ao Hotel Casa da Montanha no final da tarde de sexta-feira para participar de uma sessão do Cine Gourmet. A semana de trabalho fora complicada e era nossa primeira vez — minha e da Elena — neste evento que dura todo o fim de semana. O Casa da Montanha é sensacional e fomos recebidos com extrema gentileza pelos atendentes que fizeram o check-in. E olha, só de pisar no hotel, já deu vontade de ficar por lá. É tudo muito aconchegante e agradável. Quando chegamos ao nosso quarto, havia referências de muito bom gosto ao evento do qual iríamos participar.

Foto: Milton Ribeiro
Foto: Milton Ribeiro

Sobre a mesa estava um vinho de boas-vindas, além de toda a programação relativa ao Cine Gourmet, onde seria apresentado Volver, de Pedro Almodóvar. Todo o material recebido dizia da obra e tinha o colorido do cineasta espanhol. A agenda previa que na noite de sexta-feira seriam servidos queijos e vinhos para receber os participantes do evento. O filme seria passado na noite de sábado e os dias de sábado e domingo eram para aproveitar o hotel e a cidade.

Após chegarmos, passaram-se alguns minutos e bateram em nossa porta para nos oferecer uma comidinha rápida, desejar-nos uma boa estadia e perguntar se estávamos satisfeitos com a acolhida e o quarto. É claro que estávamos, muito. O prato que nos entregaram era  bem interessante para quem recém chegara de viagem.

Foto: Milton Ribeiro
Foto: Milton Ribeiro

Então descemos para uma voltinha rápida pela cidade. Na verdade, precisávamos de muito mais comida, pois não tínhamos almoçado em Porto Alegre. A temperatura estava na casa dos 5ºC, caindo. Apesar da excelente impressão inicial, nossa ignorância sobre o hotel ainda era quase total. E, imaginem, poderíamos ter jantado no La Cacería, localizado no próprio Casa e especializado em receitas de caças — “Cacería” significa “Caçada” em espanhol –,  além de risotos, massas e saladas. Só que a gente não lê manual nem folder e acabamos numa jantinha mais ou menos.

DSC03096No retorno, mais uma surpresa. Sobre a cama havia dois chocolates — excelentes, garanto-lhes — e informações sobre a previsão do tempo do dia seguinte. Seria um dia nublado, como indicava a marcação, e a temperatura estaria entre os 6 e 16°C.  Começamos a nos acostumar com a coisa: vocês conhecem a facilidade com que o ser humano se acostuma ao bom tratamento.

Foto: Milton Ribeiro
Foto: Milton Ribeiro

Depois fomos ao tal queijos e vinhos do hotel, onde conhecemos boa parte do pessoal que estaria na sessão do dia seguinte. Novamente, tudo perfeito. Havia vinhos perigosamente leves e outros encorpados que enfrentavam com galhardia os maravilhosos queijos.

Como disse, o dia de sábado, antes da sessão de cinema, era livre para flanar pela cidade e fizemos uma boa divisão entre o hotel e as ruas.

Foto: Elena Romanov
Foto: Elena Romanov

É óbvio que o conforto do Casa da Montanha se impôs e acabamos permanecendo mais nele do que fazendo turismo. Poderíamos ter ficado na piscina, mas esses animais viciados em leituras têm outros hábitos como os mostrados acima e abaixo. Então, dei o pontapé inicial na leitura de O Adolescente de Dostoiévski.

Há vários espaços no hotel destinados a quem quer ver TV, tomar chá, conversar, ler, exercitar-se, nadar, o diabo. Mas a cadeira acima e abaixo parece ser um point preferencial. Todos convergiam para lá, mas eu fui mais rápido.

Foto: Elena Romanov
Foto: Elena Romanov

E fomos para a sessão de cinema. O coquetel temático começou uma hora antes do início do filme. Homenageando um detalhe cômico do filme, foi servido um canapé de beterraba chamado “russo” que deixou a Elena encantada. Ela agradeceu especialmente à chef Gabriela Carvalho ao final do jantar, pois teve que ir à Gramado para reconhecer um sabor de sua infância.

Foto: Cibele Peccin
Foto: Cibele Peccin

O Cine Gourmet acontece mensalmente e os filmes são selecionados pelo crítico de cinema Robledo Milani. Ele é o curador do evento desde a primeira edição, há 10 anos. Ele revelou que Volver era uma visita ao passado do diretor Almodóvar. O filme se passa em grande parte na cidade onde ele nasceu e baseia-se nas mulheres-personagens que povoaram sua infância. “Volver é a comida que comia na infância. Também é a fome e a família”.

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

Milani explicou que as mulheres da infância de Almodóvar eram curvilíneas e voluptuosas. Deste modo, se a personagem principal, vivida por Penélope Cruz, não precisou aumentar seus seios, teve que usar um aplique para arredondar o traseiro. Não, não apresentarei fotos comprobatórias.

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

A chef Gabriela Carvalho também falou. Fez uma breve referência ao fato de haver muito em comum entre as cozinhas brasileira e espanhola, e garantiu que haveria ousadias no cardápio — sempre secreto — que seria servido. Que ousadias? Ora, já veríamos. Ela disse que não admitiria uma mera reprodução do que aparecia na tela e que tudo fora recriado instintivamente.

Foto: Cibele Peccin
Foto: Cibele Peccin

Após o filme, no caminho para o Restaurante La Cacería, havia atores fazendo releituras de cenas do filme. Na saída da sala, por exemplo, mulheres de preto choravam desesperadas e davam-nos “pêsames” como se tivéssemos saindo de um velório e, bem na entrada do restaurante, estava uma nova Penélope Cruz sobre um freezer com uma faca na mão. Bem, quem viu o filme sabe o motivo. E ela cantava Volver, canção que Penélope recém cantara no filme (na verdade, ela é dublada).

E chegamos ao restaurante.

Foto: Cibele Peccin
Foto: Cibele Peccin

Por sorte, fomos convidados para ficar numa mesa com Robledo e Guilherme Cerveira. Em companhia tão agradável, nem precisaríamos de vinho para ficarmos loquazes. Mas, com eles e o festival de sabores servido sob a batuta de Gabriela Carvalho, a conversa ficou mais do que animada. Na verdade, chegou às raias das inconfidências.

Bem, a partir de agora, sofram.

Foto: Cibele Peccin
Foto: Cibele Peccin

Assim como a palavra cão não morde, a foto acima não vem com gosto. Se viesse, vocês imediatamente morderiam o monitor do computador ou a telinha do celular. Isto foi um bacalhau realmente enlouquecedor para o neto de portugueses que vos escreve. Sou antigo admirador das variações sobre o tema bacalhau. E garanto-lhes, mesmo sendo incondicionalmente ateu, que a coisa estava no mais alto grau de divindade.

Agora babem:

— A entrada foi um mojito de presunto cru, melão, pepino, hortelã e limão siciliano, harmonizado com um PradoRey Classic Verdejo Sauvignon 2014 (Rueda, Espanha).

— O primeiro prato ficou chamado de Raimunda, nome do personagem de Penélope Cruz. Era uma Tortilla de batatas e bacalhau, compota de tomates frescos e alho, harmonizadas com um Artero Rosado La Mancha 2014 (La Mancha, Espanha). Na minha opinião, este prato roubou a cena, mas o resto da mesa ficou abobado foi com…

— O segundo prato. Era um Cozido Madrileño de cerne de cerdo, chorizo, garbanzo e ervas com a harmonização a cargo do i-nes-que-cí-vel Tribu 2010 — El Angosto (Valência, Espanha). Olha, realmente, este Cozido não se intimidou com o citado bacalhau.

— A sobremesa foi Arroz doce espanhol com cardamomo e canela. O vinho que o acompanhava era um Alambre Moscatel de Setúbal 2010 (Setúbal, Portugal).

Foto: Cibele Peccin

Foto: Cibele Peccin

Após o jantar, conversamos longamente com a chef Gabriela, pessoa de extrema modéstia que nem parecia ter-nos acabado de conduzir com tanto brilhantismo por algumas coisas boas da vida.

Eu e Elena agradecemos ao Robledo Milani pelo convite, deixando claro que estamos disponíveis. Imagina se não?

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Milton Ribeiro em 21 de março de 1964

9 dias depois da inauguração do Araújo Vianna, 10 dias antes do Golpe, eu brincava no gramado do auditório, hoje cercado.

Naqueles dias, a gente subia e descia e rolava na grama e ainda sentava para tomar sol no gramado que circunda o Araújo Vianna.

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Revelamos quem cometeu o atentado às instalações do Natal Luz

O blog acaba de receber o seguinte comunicado:

Nós, da FGCK (Frente Gaúcha de Combate ao Kitsch), assumimos o atentado às instalações do Natal Luz. Se a coisa for reerguida, invadiremos novamente a Bavária de Plástico. Muito cuidado, portanto!

A qualquer momento, mais informações.

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Ver na TV é ver pouco

Talvez eu vá ao estádio pela beleza plástica do jogo ou de sua tática (na TV não é tão bonito, nem tão interessante), mas talvez vá pela beleza do gramado, iluminado pelo sol ou pelos holofotes em jogos noturnos, ou quem sabe apenas por amor à disputa e ao Inter, mas acredito que a verdadeira razão é a de que o futebol é um gênero de espetáculo produz maior variação de humores e participação do que qualquer outro que conheça. Por exemplo, se você for a um concerto, provavelmente não poderá ofender o artista ou, num museu, será no mínimo estranho se começar a vaiar o quadro. Vou a muitos concertos; sei que escolho bem e, quase sempre, saio feliz. Às vezes, ele é apenas aceitável. Há possibilidades bem tristes, é claro, porém elas raramente incluem a vaia, chamar o artista de filha-da-puta ou a disposição de odiar o time e odiar a si mesmo a ponto de desejar a própria derrota — em outras palavras, de desejar o próprio fracasso.

Estou enrolando para dizer isso: um concerto ou qualquer outro espetáculo que aconteça dentro de um teatro são representações mais incompletas da vida do que um jogo de futebol. Pronto, disse! Talvez não consiga dormir hoje. Os fantasmas de Shakespeare, Pirandello, Tchekhov, Bergman, Wagner (ai que medo!), Sófocles e de tantos outros me perturbarão a noite. Sei que os aspectos culturais envolvidos fariam o futebol perder de goleada nos primeiros minutos de uma discussão, mas experimente olhar de frente para uma torcida de futebol com o jogo se desenvolvendo às nossas costas. O sofrimento, a alegria, a expectativa, a frustração e quase todos os sentimentos são coisas presentes, visíveis quase a ponto de serem fenômenos físicos. Talvez até o amor romântico tenha representação no futebol… No teatro elisabetano — época de Shakespeare –, os assistentes manifestavam-se, podiam gritar e fazer piadas sobre Otelo, Iago e Desdêmona, mas, hoje, fazer isto seria uma tremenda falta de educação e eu até concordo. Pô, já imaginaram um cara berrando ao nosso lado, fazendo-nos perder as falas?

A possibilidade de amar, de ser indiferente ou de detestar o próprio time, de ridicularizar e sentir medo do adversário, de aplaudir ou desejar a própria derrota é exercida plenamente apenas quando estamos no estádio. Não sinto e, mais, acharia ridículo sentir tanta coisa na frente da TV. A maravilha está no campo de batalha e no leque de opções por ele oferecidas. Na proximidade do fato e no oscilar entre o píncaro da glória e o possível funeral está o fascínio da coisa.

Pensei nisso quando li alguém afirmando que a narração da TV deveria ser substituída pelo simples som ambiente do estádio. Apenas ele, o som, os gritos e cantos da torcida, quiçá o som da casamata com as ordens, palavrões e lamentações dos técnicos. Quem sabe umas mensagens escritas, indicando o tempo de jogo e as substituições. E, quando lembro de Galvão Bueno e alguns “famosos alguéns” de nosso Rio Grande, concordo.

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