Cartas recém reveladas de Sylvia Plath citam abuso doméstico cometido por Ted Hughes

Cartas recém reveladas de Sylvia Plath citam abuso doméstico cometido por Ted Hughes

A correspondência inédita entre a poetisa e sua antiga terapeuta registra acusação de espancamento por parte do marido e o desejo explícito de que ela morresse.

Traduzido livremente do Guardian

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Numa carta dirigida a sua antiga terapeuta, Sylvia Plath (1932-1963) escreveu que seu marido, Ted Hughes (1930-1998), vencera. Isso dois dias antes de ela abortar o segundo filho do casal. Também escreveu que Hughes queria vê-la morta. É o que diz nas cartas de Plath. As duas acusações estão entre as revelações mais explosivas de uma correspondência inédita escrita durante um dos casamentos mais famosos e destrutivos da literatura.

Escritas entre 18 de fevereiro de 1960 e 4 de fevereiro de 1963, uma semana antes de sua morte, as cartas cobrem um período da vida de Plath que permaneceu até hoje desconhecido tanto para leitores como para estudiosos. A escritora norte-americana, que viveu estes anos na Inglaterra, era uma prolífica escritora de cartas e mantinha diários detalhados desde a idade de 11 anos. Porém, após sua morte, Hughes declarou que os diários de Plath daquela época foram perdidos, incluindo o último volume que, estranhamente, ele disse ter destruído para proteger seus filhos, Frieda e Nicholas.

Enviada sempre para a Dra. Ruth Barnhouse — o modelo para a Dra. Nolan na novela autobiográfica de Plath, A Redoma de Vidro, e que tratou o escritora nos EUA após sua primeira tentativa de suicídio em agosto de 1953 — a correspondência é entendida como os últimos textos sem censura escritos por Plath em seus meses finais, junto de algumas de suas poesias mais famosas, incluindo as da coletânea Ariel.

Assia Wevill
Assia Wevill

As nove cartas escritas após Plath descobrir a infidelidade de seu marido com sua amiga Assia Wevill em julho de 1962, formam o núcleo da coleção. Também estão incluídos registros médicos a partir de 1954.

O tratamento de Plath com Barnhouse terminou quando a poeta mudou-se para Inglaterra mas as duas seguiram uma amizade muito íntima que tem sido foco de estudo de scholars.  A correspondência revela uma intimidade tranquila e acolhedora, bem como um grande senso de humor.

Além de expor sua dor pela descoberta do adultério de Hughes, as passagens mais chocantes revelam a acusação de abuso físico (espancamento) sofrido por Plath pouco antes de abortar seu segundo filho em 1961. E na carta datada de 22 de setembro de 1962 — no mesmo mês em que os poetas se separaram — ela diz ter sido espancada por Ted. Vários dos poemas de Plath abordam o aborto, como Parliament Hill Fields.

A extensão do distanciamento do casal durante este período é revelada em outra carta da coleção, datada de 21 de outubro de 1962, em que Plath escreve para Barnhouse contando que Hughes lhe disse diretamente que a desejava ver morta. Embora Plath tivesse uma história de depressão e auto-agressão, e tivesse tentado se matar em 1953, ela apenas revelou tais episódios para Hughes após o casamento.

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As cartas foram escritas numa época em que Plath estava temendo por seu estado mental. Era o período da desintegração de um dos mais famosos casais literários do século XX. Hughes, nascido em Yorkshire, conhecera Plath enquanto ambos estudavam na Universidade de Cambridge em 1956. Hughes já era um poeta estabelecido e ela tinha ido a uma festa no dia 25 de fevereiro daquele ano com o desejo expresso de conhecê-lo. Quatro meses depois, eles se casaram e formaram rapidamente uma formidável e mutuamente benéfica parceria criativa que resultou na obra de Hughes, Hawk in the Rain, e na novela semi-autobiográfica de Plath, A Redoma de Vidro.

O fascínio público com o relacionamento era grande, ainda mais que a produção criativa de ambos se baseava em experiências de vida. Em outubro de 1962, Plath escreveu a maioria dos poemas que seriam incluídos em Ariel — publicado postumamente em 1965 — que inclui muitas referências e iconografias interpretadas como sendo sobre Hughes. Estes incluem as linhas em Daddy: “I made a model of you, / A man in black with a Meinkampf look / And a love of the rack and the screw” (“Eu fiz um modelo de você, / Um homem de preto com um olhar de Meinkampf / E um amor de cremalheira com parafuso”). Plath escreveu para sua mãe durante este período: “Eu estou escrevendo os melhores poemas da minha vida. Eles farão o meu nome”.

Décadas mais tarde, em Birthday Letters, de 1998, Hughes falou sobre seu tempo com Plath, sobre a tempestuosa ligação e as consequências da morte da mulher. O livro foi sua resposta final aos críticos feministas que, nos anos 70, acusaram Hughes a respeito do tratamento que dava a Plath. Durante esse tempo, ele foi várias vezes interrompido com gritos de “assassino” em suas leituras. A feminista norte-americana Robin Morgan publicou o poema The Arraignment, que começa com a frase “Eu acuso Ted Hughes”. Plath foi sepultada e na lápide lia-se Sylvia Plath Hughes, por insistência dele. Ela foi alvo de “vândalos” que removeram o sobrenome do marido, que sempre colocava o Hughes de volta.

Grave1Em sua coleção de 1998 Howls and Whispers, Ted citou uma das respostas de Barnhouse a Plath, em setembro de 1962, no poema de título: “And from your analyst: ‘Keep him out of your bed. Above all, keep him out of your bed’” (E se seu analista: Deixe-o fora da cama, deixe-o fora da cama). Em 2010, a aparente palavra final de Hughes sobre o relacionamento turbulento foi publicada sob a forma de seu poema Last Letter, que descreve o que aconteceu nos três dias antes de sua esposa morrer.

O nome de Hughes foi diversas vezes recolocado por ele na lápide de Plath
O nome de Hughes foi diversas vezes recolocado por ele na lápide de Plath

Bem, os estudiosos de Plath elogiaram a alta qualidade e as informações contidas nas cartas recém encontradas. Elas estão sendo publicadas em livro. O primeiro volume já saiu. O co-editor Peter K Steinberg disse: “É um incrível material que tinha ficado totalmente fora do radar”, Citando as poesias “sensacionais” que Plath escreveu em outubro de 1962: “É possível que Plath fizesse uma catarse ao escrever para a Dra. Barnhouse e que, ao fazê-lo, sentia-se livre para escrever aqueles poemas explosivos e duradouros”.

Andrew Wilson, autor de Mad Girl’s Love Song, sobre a vida de Plath antes de conhecer Hughes, disse que a correspondência com Barnhouse fornecem uma inestimável visão das origens de sua batalha contra a depressão. Elas formariam “o elo perdido” entre sua biografia e história literária. “Essas cartas parecem capazes de preencher certas lacunas de nosso conhecimento e lançam novas luzes sobre o casamento turbulento e controverso entre Plath e Hughes”, disse ele.

Por incrível que pareça, o arquivo chamou a atenção dos estudiosos da Plath após um vendedor de livros raros anunciá-lo on-line para venda.

Com todo o barulho provocado pela descoberta, Carol Hughes, a viúva do poeta, tratou de rebater: “As alegações feitas por Sylvia Plath em cartas inéditas para sua psiquiatra, sugerindo ter sido espancada por Ted Hughes, dias antes de ter abortado o segundo filho, são tão absurdas quanto chocantes para quem conhecia bem Ted”.

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Nosso amor vulgar

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