Notas de Concerto da Ospa (30/11/24)

Notas de Concerto da Ospa (30/11/24)

O programa:

Concerto em homenagem ao Bicentenário da Imigração Alemã

Programa:

Wagner, Richard | Abertura “O Navio Fantasma”

Strauss, Richard | Quatro Últimas Canções, TrV 296

Wagner, Richard | Prelúdio “Lohengrin”

Wagner, Richard | Prelúdio e Morte de Amor, de “Tristão & Isolda”, WWV 90

Regência:  Daniel Geiss (ALE)
Solista: Eiko Senda (Soprano – JAP)
Direção Artística: Manfredo Schmiedt

O pai de Richard Strauss (1864-1949), Franz Joseph, foi um excelente trompista. Richard Wagner (1813-1883) frequentemente pedia-lhe conselhos sobre o instrumento. Mas, apesar disso, e do fato de Franz Strauss ter tocado a primeira trompa na estreia de Parsifal em Bayreuth, no ano de 1882, ele não gostava da música de Wagner. Franz era um adepto da primeira escola de Viena e considerava Mozart o maior compositor que já existiu. Maior que Beethoven, Haydn e até mesmo Bach. Em família, ele dizia detestar Wagner, “o Mefistófeles da música”. E foi com algum cuidado que ele trouxe seu filho Richard para Bayreuth em 1882. Naquela ocasião, o pequeno Richard conheceu o grande Richard, caindo de amores por sua música. Papai Franz deve ter ficado contrariado com a conversão do filho à chamada música do futuro. Ele lhe dera uma educação musical no estrito estilo clássico, longe do modernismo.

Deste modo e dentro da enorme tradição do romantismo alemão, o Concerto em homenagem ao Bicentenário da Imigração Alemã é profundamente coerente. Apesar dos 50 anos que separam o nascimento dos compositores, ambos são expoentes do romantismo tardio.

As peças de Wagner do Concerto são partes de óperas que costumam ser também apresentadas em forma de concerto. Já as Quatro últimas canções de Strauss foram escritas quando o compositor já tinha 84 anos e, logo após sua estreia post mortem, em 1950, tornou-se um dos mais famosos ciclos de canções do repertório lírico. Sem dúvida, este é um programa onde o êxtase e o sublime estarão presentes.

Mas há mais conexões entre Wagner e Strauss além do nome e da admiração do segundo pelo primeiro. Há a grande música de ambos, mas antes devemos falar sobre algo mais espinhoso. Uma das conexões é que ambos estão ligados, na mente de muitos de nós, ao nazismo. Façamos duas perguntas sobre Wagner:

1) Essa mancha em seu legado é justificada?, e

2) Se a pergunta 1 for verdadeira, sua música deve ser evitada?

Wagner morreu em 1883, meio século antes dos nazistas chegarem ao poder, então seria temporalmente impossível para ele ter tido qualquer contato direto com os nazistas. Ele, no entanto, teve um impacto direto no movimento nazista. Wagner era um notório antissemita, e sua alta posição na cultura do século XIX lhe dava uma plataforma proeminente para seus discursos. Para piorar, sua esposa Cosima era ainda mais raivosa em seu antissemitismo do que o marido. Ela garantiu que os filhos e netos de Wagner seguissem a tradição. Cosima viveu até 1930 e manteve pulso firme na direção de Bayreuth e na defesa da (grande) obra do ex-marido. Ela evitava solistas, regente e músicos judeus… E alguns de seus descendentes mantiveram o famoso Festival de Bayreuth (centro-sul da Alemanha), que Wagner havia fundado enquanto vivo, num local de exclusão de artistas judeus.

(Fofoca) Cosima, filha de Franz Liszt, era casada com o célebre maestro Hans Von Bülow quando, durante os ensaios de uma ópera, apaixonou-se por Wagner. A Alemanha toda e mais a torcida do Flamengo sabiam do caso e que Cosima havia pedido o divórcio, que só lhe foi dado quando ela ficou grávida de Richard Wagner. Von Bülow seguiu trabalhando com Wagner durante e depois do caso, não obstante o ocorrido. Ela e Wagner eram um casal curioso. Ela tinha 1,80m; ele, 1,65m. (Fim  da fofoca)

Wagner e Cosima, seguidos por seu marido Hans von Bülow, com a partitura de Tristão e Isolda debaixo do braço.

Na época em que os nazistas chegaram ao poder, em 1933, as credenciais antissemitas dos Wagner estavam tão bem estabelecidas que Hitler abriu várias janelas em sua agenda para se insinuar com a família. E, para garantir que a influência de Wagner continuasse ininterrupta, ele cuidou para que suas óperas fossem executadas continuamente, mesmo quando o Terceiro Reich estava em chamas.

E Richard Strauss? Ele estava vivo e muito bem quando os nazistas tomaram o poder. Embora sua reputação como o compositor tivesse caído um pouco desde os dias de Der Rosenkavalier, ele ainda era uma figura internacional altamente respeitada, alguém que os nazistas queriam ter ao seu lado.

Foi-lhe oferecido o cargo de presidente do Reichsmusikkammer, o departamento governamental que tinha jurisdição sobre todos os assuntos musicais. Strauss, que não era imune à bajulação e cujas algumas visões fechavam muito bem com o regime nazista inicial, aceitou. Mas Strauss nunca realmente se juntou ao Partido Nacional Socialista. Ele se via como um grande artista, acima da briga política. Há aqueles que acusam Strauss de ter sido um oportunista. OK. Mas ele é bem diferente de Wagner. Há ampla evidência de que havia algo que ele não era um antissemita. Ele tinha netos judeus e recusou-se em deixar de trabalhar com seu libretista judeu, Stefan Zweig, mesmo quando as autoridades sugeriram fortemente que ele parasse. (Por esse pecado grave, ele foi removido de sua posição no Reichsmusikkammer.)

Então Wagner não era nazista, era, no entanto, um antissemita que influenciou Hitler e cuja progênie continuou seu legado. Já Strauss não era antissemita, mas aceitou cargos dos nazistas por interesse pessoal. A história não exonera nenhum dos compositores. Mas se eu tivesse que escolher qual desses homens deveria ir para o inferno, diria que Wagner ganha fácil.

Thomas Mann tinha uma opinião que resumia muito bem quem era Wagner. Ele dizia que Wagner era um “gnomo fungador da Saxônia com talento bombástico e caráter desprezível”. Wagner tinha 1,65m.

Já o maestro e pianista judeu Daniel Barenboim — grande admirador de Wagner — escreve: “A pessoa de Wagner é absolutamente horrenda, desprezível e, de certo modo, muito difícil de conciliar com a música que ele escreveu, que com frequência expressa sentimentos totalmente opostos: nobreza, generosidade.”

O regente Arturo Toscanini tinha uma frase curiosa para dizer sobre Richard Strauss: “Para Strauss, o compositor, tiro meu chapéu. Para Strauss, o homem, coloco-o novamente.”

Mas é possível escutar Wagner sem levar em conta o antissemitismo? O ódio ao judeus repercute também em seu trabalho de palco? A maioria dos pesquisadores de Wagner afirma que não. Os que discordam dizem que, apesar de Wagner não ter escrito nenhuma ópera antissemita, sua atitude antijudaica se reflete no caráter de alguns personagens: “Existem em algumas de suas figuras referências subliminares que apontam para estereótipos judeus, principalmente no anão Mime de O Anel dos Nibelungos e no crítico pedante Beckmesser de Os Mestres Cantores de Nuremberg.”

Ambas as figuras incorporam nas peças teatrais os oponentes das personagens heroicas. Os contemporâneos de Wagner teria compreendido o “código antissemita” embutido nesses papéis. Hoje em dia, as óperas de Wagner raramente são vistas como antissemitas. Quando se encena Wagner, atualmente, não se pensa em obras com tal conotação, mas de obras de um grande compositor e teatrólogo. Indiscutível gênio musical e inimigo dos judeus, Richard Wagner continua a ser uma das mais controversas figuras alemãs.

Desde jovem, Wagner estudava música e era um homem fascinado pelo teatro, pelo mundo do espetáculo, dos cenários e figurinos. A este amor pelo teatro veio somar-se o amor à poesia, quando descobriu Shakespeare e Goethe, que, além disso, também eram homens de teatro. Muito moço, falava em poesia teatral. Mas foi a descoberta de Beethoven, sobretudo de suas sinfonias, que levou Wagner a optar por este gênero de carreira e por buscar chegar àquilo que ele chamava de “obra de arte total”. Ou seja, ele escreveria os versos e a música e a ópera levaria tudo ao teatro.

Qual é a sinopse de O Navio Fantasma? O nome da ópera em alemão é Der fliegende Holländer (O Holandês Voador). A ópera tem libreto (texto) e música de Richard Wagner. É ambientada em uma aldeia pesqueira da Noruega e conta a história de um navegador holandês punido por Deus por blasfemar contra seu nome, perdendo-se de sua pátria para sempre, a menos que surja em sua vida uma mulher que lhe seja plenamente fiel. Ao atracar no porto, o holandês ancora sua nau ao lado da de Daland, outro navegador. O holandês oferece a enorme riqueza em ouro e joias que carrega na embarcação para Daland em troca da mão de Senta, sua filha. Senta já conhecera previamente a história do “Holandês Voador”, mas é cortejada pelo caçador Erik, que fica enciumado toda vez que ela faz qualquer referência a ele, seja observando insistentemente seu retrato, seja cantando a Balada do Holandês – esta, uma das árias mais célebres da ópera. Daland apresenta o holandês a Senta, e ela lhe jura eterna fidelidade, mas Erik ainda tenta persuadir Senta a voltar para ele. A certa altura, o holandês encontra Erik abraçando Senta e julga que esta rompeu com seu voto de fidelidade eterna, e parte novamente para o mar. À medida que a nau do holandês se afasta, Senta olha cada vez mais longe e se atira ao mar, na direção onde está a nau do holandês, tentando unir sua alma à dele. Ou seja, a ópera é concebida em torno da oposição entre o tema da “maldição” (que sofre o Holandês) e a “redenção pelo amor” (a libertação do Holandês através do amor de Senta).

Em O Navio Fantasma e em Tannhãuser, Wagner desenvolve suas concepções da “melodia contínua” ou “melodia infinita”, e também do leitmotiv. Em oposição à concepção tradicional da ópera fundada na alternância de árias e recitativos, Wagner introduz a noção de continuidade melódica — espécie de dinamismo que foge às amarras dos habituais recitativos — calcada na continuidade da vida, na duração de nossa consciência. Não há divisão da ópera em “números” (árias, duetos, trios, etc.). Já o leitmotiv é um tema melódico ou harmônico destinado a caracterizar um personagem, uma situação, um estado de espírito e que, na forma original ou por meio de transformações desta, acompanha os seus múltiplos reaparecimentos ao longo de uma obra, especialmente em óperas; motivo condutor.

Para Lohengrin, Wagner recorreu à lenda popular. A história é um mergulho na mitologia alemã: O filho de Parzifal, cavaleiro da ordem do Graal, chega num barco puxado por um cisne para defender Elesa de Brabante de uma acusação injusta, mas não pode completar sua missão porque Elsa obriga-o e revelar sua identidade. Vamos detalhar um pouco mais: Lohengrin é uma ópera de Richard Wagner que conta a história do cavaleiro Lohengrin, que chega ao ducado de Brabante para proteger a princesa Elsa, acusada de matar o irmão — que na realidade está vivo e reaparece no final da obra. De acordo com a interpretação de Wagner, o Santo Graal fornece ao Cavaleiro do Cisne poderes místicos que só podem ser mantidos se sua natureza permanecer em segredo, justificando o perigo da quebra do tabu da pergunta sobre seu nome e sua origem. A história se passa em torno do sentimento de insegurança nos relacionamentos amorosos. Elsa é acusada pelo Conde Friedrich von Telramund de ter assassinado o irmão mais novo, herdeiro do ducado. Para se defender, Elsa invoca um sonho em que um nobre cavaleiro a inocenta. Nesse momento, Lohengrin surge em um pequeno bote puxado por um cisne. Lohengrin é um cavaleiro do Santo Graal, filho de Parsifal. Ele é enviado para resgatar Elsa e fica em Brabante como seu novo soberano e esposo. A condição para o casamento é que Elsa não faça perguntas sobre o nome ou a origem de Lohengrin. A ópera é marcada pelo uso do simbolismo de que o amor deve estar acima da dúvida sobre a origem do herói. A obra é mais conhecida pelo seu coro nupcial, que é frequentemente usado em cerimônias de casamento.

Tristão e Isolda é uma história lendária sobre o trágico amor entre o cavaleiro Tristão, originário da Cornualha, e a princesa irlandesa Isolda. De origem medieval, a lenda foi contada e recontada em muitas diferentes versões ao longo dos séculos. Tristão, excelente cavaleiro a serviço de seu tio, o rei Marcos da Cornualha, viaja à Irlanda para trazer a bela princesa Isolda para casar-se com seu tio. Durante a viagem de volta à Grã-Bretanha, os dois acidentalmente bebem uma poção de amor mágica, originalmente destinada a Isolda e Marcos. Devido a isso, Tristão e Isolda apaixonam-se perdidamente, e de maneira irreversível, um pelo outro. De volta à corte, Isolda casa-se com Marcos, mas ela mantém com Tristão um romance que viola as leis temporais e religiosas e escandaliza todos. Tristão termina banido do reino, casando-se com Isolda das Mãos Brancas, princesa da Bretanha, mas seu amor pela outra Isolda não termina. Depois de muitas aventuras, Tristão é mortalmente ferido por uma lança e manda que busquem Isolda para curá-lo de suas feridas. Enquanto ela vem a caminho, a esposa de Tristão, Isolda das Mãos Brancas, engana-o, fazendo-o acreditar que Isolda não viria para vê-lo. Tristão morre, e Isolda, ao encontrá-lo morto, morre também de tristeza.

É sempre bom notar a longevidade de Richard Strauss. Ele foi, efetivamente, um músico dos séculos XIX e XX, um criador que foi contemporâneo de Wagner, que viu aparecerem as últimas obras de Brahms e Liszt e, bem, também as primeiras de Pierre Boulez e da Segunda Escola de Viena. E ele usa tudo o que estava acontecendo a sua volta e mais o romantismo para criar esta verdadeira obra-prima que são suas Quatro Últimas Canções (em alemão: Vier letzte Lieder). Trata-se de um conjunto de obras para soprano e orquestra onde tudo é serenidade e equilíbrio. Três delas são compostas sobre poemas de Hermann Hesse e outra sobre poema de von Eichendorff. O ciclo tem absoluta coerência, perfeita adequação entre a meditação sobra a morte e sua transformação em música, refinamento instrumental e pureza do canto. Aliás, Eiko Senda é uma gênia neste repertório, confiram! Estas Canções estão entre as últimas peças de Richard Strauss, compostas em 1948, quando o compositor tinha 84 anos. A estreia ocorreu em Londres em 1950, regida pelo grande Wilhelm Furtwängler. Strauss não viveu para ouvir sua obra apresentada. Poucos anos depois sua morte, já havia se tornado um dos mais famosos ciclos de canções (lieder) do repertório lírico.

Strauss havia-se deparado com o poema Im Abendrot (No Crepúsculo) de Joseph von Eichendorff e sentira que o texto tinha um significado especial para si. Daí porque o transformou em música em maio de 1948. Logo depois, o compositor recebeu uma cópia de uma antologia de poemas de Hermann Hesse e usou três deles: Frühling (Primavera), September (Setembro), e Beim Schlafengehen (Indo Dormir). Uma quinta canção restou inacabada com a morte de Strauss.

Não há indicação de que Strauss tenha concebido as quatro canções como uma obra unificada. Em dicionários de música publicados até 1954, as três canções sobre poemas de Hesse eram ainda listadas como um só grupo, separadamente da canção anterior baseada em Eichendorff. O título de Quatro Últimas Canções (Vier Letzte Lieder) foi criado pela editora de música Boosey & Hawkes. Foi ela quem as categorizou com uma obra conjunta com o título Quatro Últimas Canções e as colocou na ordem que se tornaria a mais habitualmente apresentada: FrühlingSeptemberBeim Schlafengehen e, por fim, Im Abendrot.

Como disse o maestro alemão Daniel Geiss, as Quatro Últimas Canções são o belíssimo ponto final do romantismo.

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A professora que perdeu o réu primário, de Astúria Vasconcelos

A professora que perdeu o réu primário, de Astúria Vasconcelos

Este é um livro que merece atenção. É um livro sobre uma professora do ensino médio da rede pública de Porto Alegre. Ela trabalha como uma condenada para poder fazer frente a seus modestos gastos e ser muitas vezes atacada por colegas e alunos. Há também seu passado: ela não suporta que estranhos venham colocar a mão no seu ombro, tal intimidade faz-lhe lembrar do tio asqueroso. Às vezes do ex-marido.

Os alunos são difíceis de controlar, apesar das eventuais manifestações de carinho. Não é uma vida fácil, as tentativas de se distrair com o vinho, com a amiga, com a bicicleta, sempre com ajuda de antidepressivos e de terapia não dão muito certo. Tu tens que ter tua vida… É algo assim que dizem para a professora que trabalha 60 horas semanais.

Este é um livro de ódio muito original. Não fala na nobreza da profissão de educador, não fala na formação da juventude do país, fala é do desespero de uma professora de artes para suportar a vida e fazer seu trabalho como pode. Eu, Milton, trabalho atrás de um balcão ouvindo muitas pessoas, muitas delas professoras, e sei bem que a vida desta professora está longe de ser ficcional. Há um cansaço monumental que antidepressivo nenhum vence. Ganham pouco, trabalham muito, e silenciar adoece.

A história de Astúria tem pontos em comum com o filme de John Waters “Mamãe é de Morte”, mas sem seu registro trash-cômico. A relação da professora com as pessoas de seu trabalho está muito mais para Thomas Bernhard, mas sem a minúcia descritiva do austríaco. Talvez ela nem tenha tempo para odiar tão minuciosamente. Já a repetida sensação de estar num beco sem saída se aproxima de cenas “O Ateneu”, de Raul Pompeia.

E a professora perde o réu primário de uma forma que eu jamais contaria aqui. O livro está catalogado como romance psicológico / suspense. Está correto.

Por fim, recomendo este A professora que perdeu o réu primário que será lançado aqui na Livraria Bamboletras nesta sexta-feira (29), entre 17 e 20h.

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Ruy Carlos Ostermann: um encontro com o Professor, de Carlos Guimarães

Ruy Carlos Ostermann: um encontro com o Professor, de Carlos Guimarães

Resenha escrita para a revista Parêntese.

Há no RS algum apreciador de futebol com mais de 30 anos que não tenha ouvido, visto ou lido Ruy Carlos Ostermann? Não creio. Pedir distância crítica a qualquer um deles é impossível. Eu, por exemplo, comecei a ouvi-lo na Rádio Guaíba no distante ano de 1967 e de lá para cá o contato foi muito frequente. Para deixar ainda maior a proximidade, passei boa parte de minha vida trabalhando em dois empregos e eles me obrigavam a um deslocamento a partir das 16h, bem no horário do Gaúcha Entrevista, onde o Ruy, produzido por longo tempo pelo saudoso Paulo Moreira, entrevistava pessoas ouvindo-as com curiosidade e sem interrompê-las. Pois ele foi um comunicador multitemático, multimídia e aparentemente ubíquo.

Li Ruy Carlos Ostermann: um encontro com o Professor (436 páginas), em 3 dias e não me considero masoquista, ou seja, o livro e a extensiva pesquisa de Carlos Guimarães me prenderam por completo. São 35 capítulos diagramados com inteligência, deixando claros os depoimentos, as crônicas do biografado e o próprio texto de Guimarães, o que torna o livro um longo diálogo em que as comprovações do que está sendo dito aparecem de forma fluida.

O começo não promete muito. As origens familiares não são, digamos, fascinantes, mas isto dura pouco. Logo o texto ganha em velocidade e interesse. Também pudera! Seus pais tomam a atitude incompreensível de colocá-lo num internato a poucos metros de casa. E Ruy não parecia ser um problema. Ali parece nascer uma revolta que faria nascer outra pessoa, uma que, inclusive, teria dificuldades na escola e que aprenderia a dirigir seus interesses apenas para o que lhe interessava — a linguagem, a escritura, o pensamento e o esporte.

Ruy foi dos primeiros intelectuais que quebraram a falsa impossibilidade de alguém ser conhecedor de futebol e, ao mesmo tempo, uma pessoa de amplo conhecimento em áreas como arte, filosofia, literatura, história, ciências e música. De forma muito pessoal, ele foi o jornalista que trouxe a linguagem culta e elegante para o rádio, ao mesmo tempo que destronava o achismo reinante. Foi Ruy quem implantou as planilhas em seus comentários. Ele não dizia apenas que um time jogou melhor que o outro, depois enfiando um blá-blá-blá qualquer — nosso homem “de humanas” tratava de informar o número de chutes e de chances de gol, os escanteios, as defesas difíceis dos goleiros, etc. E tudo isto traduzido numa linguagem ausente de aridez. Imagino a festa que ele faria com as estatísticas de posse de bola e os mapas de calor que temos hoje.

Além disso, Ruy era um interessado observador de esquemas táticos, ou seja, ele podia descer alguns degraus em direção ao campo sem passar vergonha. Podia conversar com um técnico sem que este sugerisse a ignorância do jornalista.

O livro de Guimarães também oferece um belo e atraente painel da história do rádio e dos jornais de Porto Alegre, com destaque para o apogeu e declínio da Caldas Junior e a tomada de liderança pela RBS, através de uma administração mais sensata e da paulatina contratação das mesmas figuras que antes brilhavam na Guaíba. As fofocas, hesitações e desafios estão todos muito bem contados, inclusive a rivalidade entre Ruy e Lauro Quadros. Por muito tempo, Ruy foi chefe do departamento de esportes da Rádio Gaúcha e âncora de programas com a participação de Lauro.

Lauro e Ruy, de 85 e 90 anos de idade, parecem dois embaixadores. Eles negam quaisquer confusões, mas não era o que se dizia na época. De um lado e de outro, Guimarães tenta furar o bloqueio dos dois velhos, sem sucesso. São amigos. E as amizades são um importante ponto na vida de Ruy, Ele as cultivava com uma tão especial dedicação que elas foram o que impediu sua ida para a Globo, que lhe ofereceu “rios de dinheiro” para se transferir e que recebeu sempre a mesma resposta: a vida dele, a família e os amigos estavam aqui.

Recomendo o livro de Guimarães. E não apenas para os amantes do futebol.

Carlos Guimarães e Ruy Carlos Ostermann | Foto: Rogério Fernandes / Matinal

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Amandine Beyer: “Tentamos descobrir onde Bach escondeu as suas surpresas”

Amandine Beyer: “Tentamos descobrir onde Bach escondeu as suas surpresas”

A Sala de Câmara do Auditório Nacional de Música da Madrid acolherá no dia 18 de novembro um concerto extraordinário no âmbito da temporada musical da Fundação Scherzo: trata-se do concerto beneficente Non sei solo in memoriam Javier Rodríguez-Miñón Falero, cuja receita irá para o National Organização de Transplantes e bolsas de estudo para jovens artistas. O programa é composto por cinco concertos de Johann Sebastian Bach para diferentes solistas, em versões da violinista francesa Amandine Beyer e do seu grupo Gli Incogniti, principais intérpretes do repertório barroco.

Entrevista concedida à revista Scherzo
Tradução de Milton Ribeiro, auxiliado pelo Juraci

O que a música de Bach representa para você?

Tenho uma relação muito longa com este compositor. Pela minha parte, tenho imensa admiração, fascínio e renovado espanto pela sua forma de captar em notas a sua visão do universo. Mas também muito respeito, porque compôs as Sonatas e Partitas para violino solo: peças tão complexas com as quais passei tantas horas da minha vida que já não sei o que pensar delas!

Felizmente, Bach também escreveu muitas outras coisas que envolvem o violino, e elas são muito mais acessíveis. Como por exemplo as que incluímos no programa Non sei solo . Este título brinca com o subtítulo que o próprio Bach deu às sonatas e partitas, Sei solo, o que por si só é um mistério (ele queria dizer “seis solos” mas se enganou, porque em italiano seria sei soli, ou ele queria dizer você está sozinho, o que parece um pouco desafiador?).

Como você concebeu o programa Non sei solo?

Este é o segundo volume de uma trilogia de programas onde apresentamos praticamente a totalidade dos concertos compostos por Bach em Köthen. O primeiro teve a presença de flautas e oboés, este segundo limitamos às cordas e o terceiro será repleto de fogos de artifício com os metais e outros sopros. Foi um período extraordinariamente criativo para o compositor, onde pôde contar com uma pequena orquestra de virtuosos a seu serviço, e onde, apesar das vicissitudes da sua vida, “nunca esteve sozinho ” .

O programa bachiano que apresenta em Madrid inclui o Concerto BWV 1064R , que funciona maravilhosamente na reconstrução para três violinos solo. Você pode nos contar sobre ela?

Com muito prazer! É um imenso privilégio poder tocar esta música em Madrid em breve. É uma peça que acabamos de adicionar ao nosso repertório. Apesar de já termos várias reconstruções disponíveis, decidimos fazer a nossa própria “receita” e voltar à partitura de Bach e ver como poderia funcionar para nós. E adoro o processo, porque este concerto, quando tocado na versão para três violinos, ganha uma dimensão completamente diferente. Já tinha feito este trabalho na versão para violino do Concerto em Ré menor para cravo , e tinha sido uma experiência enriquecedora. Obviamente, existem padrões de solo que são pensados ​​para teclado e que devem ser “traduzidos” para o violino, mas também tentando combinar o estilo do compositor e o gosto do intérprete, então, por exemplo, transformei meus solos um pouco a meu gosto e deixei os outros dois solistas, Yoko Kawakubo e Vadym Makarenko, livres para adaptar suas partes aos seus gostos e necessidades. Também fizemos algumas pequenas alterações no acompanhamento orquestral que, na minha opinião, produzem uma textura muito mais italiana. Em tutti, ainda estamos experimentando a oitava adequada e é um trabalho muito divertido. Parece que, afinal, há mais liberdade do que às vezes pensamos…

Em muitos concertos de Bach é evidente a influência italiana, o espírito de Vivaldi, que o compositor combina com uma densidade orquestral mais “alemã”, como no Concerto de Brandemburgo Nº 3 . Na sua abordagem a estas peças, que componente gosta de destacar?

Acho que gostaria de destacar o que acho que Bach gostava na música italiana (ele e todos nós!): a vitalidade, o frescor, a leveza da complexidade e a ludicidade. Existe também esse culto ao violino virtuoso que gera cordas muito enérgicas… sem falar na luz totalmente sulista!

A sua abordagem da música de Vivaldi e da música de Bach é muito diferente?

É difícil dizer como abordo um repertório, um compositor. Há muito carinho, carinho, respeito, humildade, vontade, vontade de fazer bem, em todos os casos. Mas é como amizade. É uma questão de dois! e também depende do momento… Para mim a música do Vivaldi é mais imediatamente acessível, porque ele era violinista. E o de Bach tem que passar por outro filtro, porque sempre sai a veia harmônica do tecladista. Ter sempre um órgão em mente não é o mesmo que pensar nas possibilidades (também infinitas, mas de uma forma diferente) de um violino… Com Vivaldi tudo parece imediato: o lirismo, a genialidade, a surpresa… Em Bach , tudo isso é muito mais elaborado, mas no fundo tudo está lá e deve ser destacado. Às vezes, como a própria música de Bach é excepcionalmente rica, parece que apenas tocar as notas seria suficiente e que uma versão puramente “informatizada” (sem intervenção humana) seria suficiente para mostrar a genialidade por trás dela. Obviamente este não é o nosso caminho. Tentamos descobrir onde Bach escondeu as suas surpresas num complexo tecido contrapontístico, onde está aquela harmonia que nos acaricia cada vez que a alcançamos, e onde a aparente simetria e ordem são interrompidas muito ligeiramente para mostrar uma direção inesperada. E uma vez encontrados, pretendemos transmiti-los ao público para que possam experimentar o mesmo prazer que nos proporcionam.

Você pode nos contar algo sobre os solistas que atuam ao seu lado neste concerto?

No Gli Incogniti tenho a sorte de compartilhar a vida musical e os palcos com pessoas especiais. Tocamos muito juntos em partes iguais, ou acompanhando um ao outro, ocasionalmente em tutti, ocasionalmente solo, e adoro essa flexibilidade. A todo momento surge a amizade, e isso é o mais importante para mim. Além disso, fico hipnotizada cada vez que Anna Fontana deixa as harmonias de seu fantástico continuo para exibir seu solo no imenso Concerto para cravo em Fá menor, quando Marco Ceccato assume a liderança com seu violoncelo para Haydn ou Vivaldi ou o que posso dizer? Tenho também as notáveis Alba Roca e Marta Páramo. Já mencionei Yoko e Vadym, mas há também Ottavia Rausa e Baldomero Barciela, sem esquecer Francesco Galligioni e Dmitri Kindynis, nossos convidados especiais em duplo papel de violoncelo/viola da gamba… Todo um grupo de pessoas deliciosas e talentosas com quem me relacionei. ter a sorte de viajar, rir (às vezes de excitação, às vezes de frustração ou cansaço), comer e ensaiar, porque um grupo não é só concerto. São acima de tudo pessoas que se unem pelo amor de divulgar músicas maravilhosas.

Você planeja gravar este programa? O que mais você planeja trazer para o álbum em breve?

Bom, não é exatamente o mesmo programa, mas em janeiro próximo gravaremos um álbum com quase todas as obras desta noite e algumas de outros compositores (Vivaldi, Marcello) que serviram de modelo para Bach, vamos colocá-los um na frente do outro. Eles permitem que você ouça essa música sob uma luz diferente. E é claro que também temos em mente um novo projeto de Vivaldi que achamos que poderia ser divertidamente “polêmico”.

Em entrevista ao nosso saudoso Eduardo Torrico realizada em fevereiro do ano passado, você afirmou que com Gli Incogniti gostaria de fazer música clássica (CPE Bach, Haydn…) com uma equipe maior. Você está trabalhando nisso ou ainda é um objetivo distante?

Embora não o conhecesse muito bem, as conversas com o Eduardo foram sempre muito enriquecedoras e lamento muito a sua perda. Quanto ao repertório clássico, estamos fazendo aos poucos. Não é tão fácil movimentar uma orquestra grande, mas estou muito animada com isso. Já apresentamos um programa completo de sinfonias de Carl Philipp Emanuel Bach, como fizemos no Festival Torroella de Montgrí neste verão, ou uma mistura de Haydn, e CPE Bach em Brühl (na Alemanha), também no verão passado. Fiquei muito feliz.

Stefano Russomanno

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Mais 4 anos de Trump

Trump venceu. Muda pouco a questão do Oriente Médio, mas a vida do Zelensky deverá mudar muito. Para a Ucrânia, melhor seria negociar logo com os russos e evitar mais mortes.

A questão ambiental? Vai ser uma luta.

O protecionismo de Trump deve atrapalhar a economia do Brasil e, dizem, da China. Não entendo muito disso. Só acho que se ele começar a deportar os estrangeiros ilegais, vai fazer subir a inflação porque são os mexicanos que aceitam salários mais baixos para funções que não necessitam maior qualificação.

Seria otimista demais dizer que o apoio irrestrito a Israel prejudicou Kamala-Biden?

O pior mesmo é que a direita fascista se anima toda com esse cara na Presidência.

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O rabo preto

Hoje, depois de levar a Elena na Ospa, passei quase todo o dia na Livraria Bamboletras. Dei umas saídas curtas. Fui pagar uma conta na lotérica, fui ao Banrisul, fui resolver um problema na Jacinto Gomes. Ah, e almocei fora, sozinho.

Quando a Elena voltou e conversamos, ela perguntou o que era aquele rabo preto na minha bunda. Não entendi nada. Pus a mão atrás e puxei uma meia social preta que estava presa no cinto. Apenas uma meia do par.

Sim, pela manhã, tinha pegado a calça de cima da cadeira de balanço. Debaixo da calça estava um par de meias.

Conclusão: dei várias voltas pela Cidade Baixa e na Livraria com um rabo preto. Depois a gente fica famoso e pensa que o motivo são nossos livros, textos e bom atendimento. Pfff, o véio do rabo preto.

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Violino

Violino

Um dos melhores dias da minha vida ocorreu em 2017, próximo do meu aniversário de 60 anos. Eu e a Elena tínhamos ido para um hotel no interior a final de descansar. Ela levou o violino. Nós já conhecíamos a cidade da Salvador do Sul e ela me dissera que uma igrejinha de lá possuía uma acústica incrível.

Ela pegou seu violino e fomos. Pedimos permissão e entramos na igreja — quase uma capela — vazia. Ela abriu o estojo do violino e pediu que eu fosse ouvi-la do balcão, lá em cima.

E começou a tocar a Chaconne de Bach. É uma obra lindíssina, dificílima e longa, de uns 15 min. Pensei que ela tocaria apenas o início… Afinal, não devia saber de cor. Mas ela não parava e a interpretação era realmente muito boa. Pensava que a Elena não se apresentava em grupos que não a Ospa por não gostar de panelinhas…. De repente, me veio a certeza: aquilo era o meu presente. Era. Pedi-lhe para que ela tocar tudo novamente, para poder ouvir com mais calma.

Quando desci do balcão para lhe agradecer, um padre estava atônito na plateia. Ele disse que tinha vindo fazer suas orações mas que, depois daquilo, achava que já estavam feitas.

Hoje, à convite do Bernardo Frederes Kramer Alcalde, voltei a assistir uma Chaconne ao vivo. Tenho sorte com a peça porque foi novamente maravilhoso. O violinista foi o alemão Oscar Bohórquez, filho de um fagotista peruano e de uma pianista uruguaia. A promotora do recital foi a Bach Society Brasil, entidade porto-alegrense que você deveria apoiar.

Valeu muito a pena e eles farão novo Concerto em 4 de dezembro, agora com orquestra.

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Políbio

Nós recebemos uma doação de livros aqui na Livraria Bamboletras. Bons livros. Um monte de coisas de filosofia e bons romances clássicos. Deixei-os um tempo sobre o balcão de entrada.

Mas…

Dentre eles estava um certo Cabo de Guerra, de Políbio Braga.

As pessoas viam o livro e se afastavam com repugnância. Logo, a coisa tornou-se assunto de conversa — e crítica — e tive que dar um basta naquilo. Fui meio radical.

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Pequena nota sobre a Sinfonia Nº 5 de Mahler

Pequena nota sobre a Sinfonia Nº 5 de Mahler

Gustav Mahler dirigiu a Orquestra Gürzenich em Colônia na estreia de sua Sinfonia Nº 5. Depois de passar por uma doença quase fatal no inverno anterior, ele encontrou conforto na música de Johann Sebastian Bach, e o rico contraponto da sinfonia mostra claramente a influência de Bach. Esta obra marca o início de uma trilogia de sinfonias puramente instrumentais. Ao contrário das três anteriores, que eram orientadas pela narrativa e incluíam elementos vocais, as Sinfonias 5, 6 e 7 não trazem a voz humana.

A estreia não correu nada bem. Em carta à sua esposa, Mahler expressou sua decepção, afirmando: “Ninguém entendeu. Gostaria de poder reger a primeira apresentação desta peça cinquenta anos após minha morte.”

O quarto movimento, o célebre Adagietto tocado pelas cordas e harpa, é originalmente uma canção de amor para sua esposa Alma, em comemoração ao recente casamento, o que sugere que deveria ser executada em um ritmo adequado para o canto. Isso é apoiado por marcações na partitura do maestro Willem Mengelberg, que assistiu à execução da sinfonia por Mahler. Porém, embora as interpretações modernas do Adagietto possam variar de 10 a 14 minutos, o próprio Mahler conduziu-a em apenas 7 minutos e 30 segundos. Mengelberg devia ser muito criativo, pois a versão lenta criou a tradição plenamente aceita hoje, tendo o trecho sido tocado no filme A Morte em Veneza, de Visconti, em modo 100% Mengelberg.

Mas eu fiquei assobiando com a Elena hoje pela manhã um Adagietto em velocidade duplicada. Não gostei…

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Vinícius Jr. e a Bola de Ouro

Negro, militante e latino. É demais para a Bola da Ouro.

Mas não é novidade: em 1996, o alemão Matthias Sammer recebeu o prêmio, superando o não-militante Ronaldo Fenômeno, que vivia uma super temporada no Barcelona.

Agora, comparar jogadores fora do contexto do time é tolice. Quem conhece futebol compara equipes ou jogadores de mesma posição e características — e mesmo assim depende do time onde vão entrar.

Por exemplo, quem é melhor no Inter: Alan Patrick ou Vitão? Wesley ou Fernando? São perguntas ridículas. Agora, imagine fazer isso em âmbito mundial?

Quem é melhor? Borré ou Valencia? Para o time de Roger, Borré. Para o de Coudet, Valencia.

 

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Mais uma anunciada derrota da esquerda em Porto Alegre

Mais uma anunciada derrota da esquerda em Porto Alegre

Antes das eleições municipais, defendi prévias para estabelecer a chapa do PT-PSOL. E volto a defender o mesmo para as próximas majoritárias. Atendo pessoas o dia inteiro na Livraria e sei muito bem do desconforto com a chapa que enfrentou Melo.

Agora serão mais 4 anos de uma cidade bagunçada, com corrupção bolsonarista muito ativa e com as empreiteiras c@gando em cima da população. E Melo não fez nada para preparar a cidade para a próxima enchente. Então, quando acontecer novamente, não haverá tanta peninha e doações. Estaremos sozinhos com Melo, Leite e os espigões. É o que nós queremos.

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Apresentando Middlemarch

Apresentando Middlemarch

Middlemarch é um mistério. Muitos clássicos do século XIX são de conhecimento quase geral entre leitores contumazes, mas o livro de George Eliot — que era uma mulher, nascida Mary Anne Evans — permanece ignorado pela maioria.

Acertando como sempre, Virginia Woolf escreveu que Middlemarch era “um dos poucos romances ingleses escritos para adultos”. Eu diria: “escrito exclusivamente para adultos”. O livro aborda temas muito atuais: o status das mulheres perante à sociedade, a ascensão da classe média e a crítica da moralidade, da religião e do casamento.

Sem exagero, trata-se de um livro estupendamente inteligente, publicado em 1871.

Middlemarch é o nome de uma cidade fictícia do interior da Inglaterra a a ação se passa lá volta de 1830. Como Anna Kariênina, o livro tem enredo múltiplo, centrando-se em dois casais, montando um quadro da vida rural inglesa e uma análise dos relacionamentos humanos em geral, especialmente das relações amorosas e do casamento.

O núcleo são os casais Dorothea e Edward Casaubon, Rosamond e Tertius Lydgate.

Dorothea, mulher excepcionalmente independente, politizada para sua época e de grande sede intelectual, casa-se com Casaubon, homem erudito e quase 30 anos mais velho. Ela o admirava, ele prometia muito, mas se revelou frio e chato. Um desastre.

Por outro lado, Lydgate é um médico entusiasmado, amante da ciência, que casa com a fútil Rosamond, que o faz gastar o que não tem. Outro desastre.

O curioso é o afastamento dos dois casais. algo muito semelhante novamente à Anna Kariênina. Um drama aqui, outro lá.

Mas nada desta apresentação faz sentido se não levarmos em conta as intervenções da narradora, com comentários cheios de ideias, pensamentos revolucionários e a colocação de situações morais muito originais.

Nas suas 800 páginas, há um bom número de personagens e tramas que encontram os temas subliminares, incluindo a situação das mulheres, a natureza do casamento, o idealismo e o interesse pessoal, religião e hipocrisia, reforma política e educação. Esse livro é maravilhoso!

Ah, tem algo que não era uma novidade no romance vitoriano, mas que Eliot professa como ninguém: sua profunda simpatia pelos personagens secundários, pelas pessoas simples, feias e pobres,

Vamos a um pouco mais de Virginia Woolf?

“A luta das heroínas de George Eliot, por conta da suprema coragem do empreendimento a que se dedicavam, termina em tragédia ou num compromisso que é ainda mais melancólico”.

Tudo porque, ainda nas palavras de Woolf, “o fardo e a complexidade da condição feminina não lhes era suficiente. Elas desejavam sair do santuário e colher para si mesmas os estranhos frutos da arte e do conhecimento”.

Temos Middlemarch na Livraria Bamboletras. Sim, a tradução da Martim Claret é boa.

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Compre o livro na Livraria Bamboletras, na Av. Venâncio Aires, 113. Ah, não mora em Porto Alegre? Use o WhatsApp 51 99255 6885. A gente manda!

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Violistas

Violistas

Piadas de fagote, piadas de trompete, piadas de violino, piadas de oboé — todas funcionam como ferramentas de ligação que reforçam a hierarquia social da orquestra. E, nesse sentido, não há coleção mais extensa dessas paródias do que a piada de viola (ou de violista).

As piadas de viola vieram do século XVIII e surgiram com a criação da orquestra moderna. logo ficou enraizada a crença de que o instrumento era pesado e seus músicos lamentavelmente incompetentes. Esta implacável da reputação dos violistas, escrita em 1752 pelo eminente compositor e flautista Johann Joachim Quantz, era típica:

A viola é comumente considerada de pouca importância no meio musical. A razão pode muito bem ser o fato de ser frequentemente tocada por pessoas que ainda são principiantes ou não têm dons específicos para se distinguirem no violino. O instrumento proporciona muito poucas vantagens aos seus executantes, de modo que pessoas capazes não são facilmente persuadidos a aceitá-lo.

Estes estereótipos permanecem firmemente em vigor, apesar da presença atual de violistas virtuosos que amam as qualidades úde seus instrumentos. Só que as piadas são boas demais para serem desperdiçadas.

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A mulher de dois esqueletos, de Julia Dantas

A mulher de dois esqueletos, de Julia Dantas

Este é um exemplar do chamado romance híbrido, isto é, aquele que mistura gêneros. Cada capítulo nos surpreende e não somente por seus saltos temporais. Começa com um (bom) conto escrito pela personagem principal, segue com a vida  da mesma durante a pandemia, há um capítulo-catálogo todo de medos e desejos relacionados à gravidez, etc. Na verdade, o romance parece um livro de contos com a mesma personagem em quase todos eles.

Não pretendo estragar a leitura de ninguém, mas digo que o capítulo-conto de abertura é bastante pânico, seguido por outro que traz uma discussão puxada pelo namorado da escritora a respeito do conto do primeiro capítulo. E aqui o livro segue já de outra forma. O chamado “namorado” não é abusivo, mas digamos que tende a ser. Ele não apenas complica a vida como pode, como vai invadindo o espaço físico da autora dentro do pequeno apartamento que dividem durante a pandemia. Ele é hábil nisso. Julia também é muito hábil e sutil ao descrever o relacionamento. Parece que ela também cede a ele. Se a personagem evita o conflito, Julia evita a crítica direta. Paradoxalmente, a contenção é um catalisador feminista fortíssimo para quem lê. (Posso dizer que estava lendo este capítulo durante a madrugada e que ele me acordou totalmente. Putz, achei o tal namorado um baita chato).

Há um capítulo que lembra o Ítaca, do Ulysses de Joyce, mas sem as perguntas. É um interessante catálogo ou catecismo de medos e desejos da personagem-escritora a respeito de engravidar. Ela está com quase 40 anos e, se não tiver filhos agora, a biologia logo decidirá por ela. Muitos dos medos são irreais e lá vamos nós para mais uma intervenção do resenhista gonzo. (Afinal, um obstetra que leu o livro inteiro numa tarde — prova de sua alta qualidade — voltou aqui na Bamboletras e deu risadas sobre algumas das suposições da personagem. Elas seriam totalmente fantasiosas. Conheço um pouco o problema: minha ex teve dois filhos de mim e, se eu tinha mil receios do que poderia acontecer, imagine uma portadora imaginativa).

Para aumentar a dúvida, nos capítulos seguintes Julia passa a tratar seu parceiro não mais como “namorado” e sim como “companheiro”. Ora, parece que o cara é outro e este é bem legal, mais digno de ser pai, creio eu. (Sim, quem lhes escreve é um homem cuja barriga só cresce por ser glutão, mas achei o sujeito digno de uma paternidade, fazer o quê?).

Importante ressaltar que há muito humor no texto de Julia. Não vou contar o final, vou deixar para vocês saberem como Vitor Ramil, Caio Fernando Abreu e suas runas entram na história, mas afirmo que Julia Dantas leva brilhantemente sua história até a última página com um texto inteligente, interessante, leve… E dubitativo.

Recomendo!

Se eu fosse o “namorado”, jamais desalojaria Julia de sua cadeira de balanço. Tenho uma igual. Foto: Renan Mattos / Agencia RBS

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Coisas soltas que fazem parte do fracasso das esquerdas

Coisas soltas que fazem parte do fracasso das esquerdas
  1. Não adianta ofender quem vota no Abobado da Enchente. Aliás, chamá-lo de Abobado da Enchente é errado. Chamar de chinelo, então, nem se fala, é erradíssimo. Chinelo é ser / estar sem grana, é estar sempre mal arrumado, chinelo sou eu. Tornaram Melo o Rei dos Chinelos, coisa que ele recebeu de braços abertos como o Rei da Maioria.
  2. Enquanto a gente condenar o voto das pessoas por serem absolutamente burros, totalmente desinformados ou causado por mau caráter, não vamos entender o que efetivamente define o voto e não saberemos como disputá-lo, restando apenas esse prêmio de superioridade autoconferida. Parabéns a quem quer agregar ofendendo!
  3. Os argumentos para mudar o voto têm de ser outros. Podem ser as múltiplas suspeitas de corrupção de sua gestão que nunca vão adiante. (Chega a ser cômico como tudo dá em nada quando a direita é acusada. Já quando a esquerda é acusada, dá).
  4. Em nível mais geral, temos que exorcizar a esquerda, temos que dar um jeito de desdemonizá-la.. Afinal, Lula governa e o mercado acha normal. Cadê o demônio? Até o Moody`s — que é uma empresa norte-americana de serviços financeiros que também classifica os países segundo o risco para investir neles — virou comuna porque aprova o Haddad.
  5. E, mein Gott, como fazer os evangélicos recuarem da política quando tantos políticos da própria esquerda pedem bênçãos e votos a eles? Todos os políticos ignoram a laicidade, este é mais um caso para exorcismo.
  6. Convivemos com anos e anos de incultura, de educação de péssima qualidade, e isso segue sendo cultivado. Então é um longo caminho que nem começou. Que, aliás, estamos cada vez mais longe de começar.

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A criação do monograma (selo) de Johann Sebastian Bach

A criação do monograma (selo) de Johann Sebastian Bach

J. S. Bach desenhou este monograma para si mesmo, na esperança de ser nomeado Compositor da Corte do Eleitor da Saxônia (daí a coroa). O selo de Bach é composto por suas iniciais JSB sobrepostas à imagem espelhada e encimadas pela citada coroa. Foi uma tentativa de alcançar mais um cargo. Não conseguiu. Mas ficou lindo, né?

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Os vereadores eleitos em Porto Alegre e aquele

Dentre os vereadores eleitos em Porto Alegre há os excelentes, os aceitáveis, os fascistas e os especiais. Vejam o “nome” do último vereador da lista do PL. Porto Alegre é demais!

Vereadores eleitos

PSOL
Karen Santos – 20.207
Grazi Oliveira – 14.321
Pedro Ruas – 12.070
Roberto Robaina – 10.033
Atena Roveda – 4.260

PT
Jonas Reis – 8.235
Alexandre Bublitz – 7.144
Juliana Souza – 6.261
Aldacir Oliboni – 4.856
Natasha – 4.718

PL
Jessé Sangalli – 22.966
Comandante Nádia – 18.010
Fernanda Barth – 7.063
Coronel Ustra – 2.669

Republicanos
Gilvani o Gringo – 7.759
José Freitas – 6.746
Carlos Carotenuto – 4.644

MDB
Psicologa Tanise Sabino – 6.270
Rafael Fleck – 5.908
Professor Vitorino – 5.315

PP
Mariana Lescano – 6.389
Vera Armando – 5.693
Mauro Pinheiro – 5.661

PSDB
Moisés Barboza Maluco do Bem – 8.603
Marcelo Bernardi -7.759
Gilson Padeiro – 7.070

PCdoB
Erick Denil – 5.376
Giovani Culau e coletivo – 4.902

Novo
Ramiro Rosário – 16.450
Thiago Albrecht – 7.615

Podemos
Giovane Byl – 12.115
Hamilton Sossmeier – 4.053

Cidadania
Marcos Felipe – 6.618

PSD
Claudia Araujo – 6.321

PDT
Márcio Bins Ely – 6.296

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Pablo Marçal, o Faker

Pablo Marçal, o Faker

Pablo Marçal publicou um laudo falso — com nome de clínica com erro, assinado por um médico já morto na data do laudo — que dizia que Boulos fora internado por overdose de cocaína.

Fez isso 48h antes do pleito. Claro, o tal laudo vai colar pra muita gente. Sabe-se que a acusação sempre repercute mais do que o desmentido. Tem gente que diz que onde há fumaça há fogo… Nem sempre as metáforas funcionam.

O que não entendo é o fato da candidatura de Marçal ainda não ter sido cassada. Também não entendo o fato de outras prisões (sim, aquelas) não terem ocorrido ainda. Cadê a tal da Justiça? Ou a partir de agora vale tudo?

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As Willis: Sexo, Morte e Escaravelhos, de Carlos Gerbase

As Willis: Sexo, Morte e Escaravelhos, de Carlos Gerbase

Não há nenhum problema em um livro ser divertido, né?, desde que seja bem escrito e com bons artifícios para a gente ficar preso à leitura. Um escritor não precisa tentar sempre escrever a bíblia. Por exemplo, várias histórias da incensada Mariana Enriquez — e eu sou dos que a adoram — são apenas isso: divertidos. Eu gostei demais deste As Willis, de Carlos Gerbase. Largava e pegava o livro novamente, para ler mais um capítulo. É preciso que haja livros assim, capazes de desviar nossa atenção da loucura diária e, se eles forem intrigantes e inteligentes, melhor. Ainda melhor se tiverem uma pitada de humor negro. E se incluir sexo, magnífico! Aqui tem tudo isso.

Originalmente, as Willis são espíritos de virgens que morreram antes de casarem e que aparecem no balé Giselle ou Les Willis, de Adolphe Adam. Giselle é um dos mais famosos balés românticos e costuma ser dançado na ponta dos pés, como manda a tradição. No argumento original, as Willis saem de suas tumbas à noite para atrair homens com a dança e levá-los à morte. O balé tem música bastante chata, mas, se esquecermos desta e dos bailarinos nas pontas dos pés, vai sobrar uma história perfeitamente gótica.

O gótico literário foi uma vertente do romantismo voltada para o obscuro. Fala de morte, insanidade, sonhos e demônios, coisas assim do tipo Frankenstein (1818), de Mary Shelley. A origem das Willis parece estar em Heine (1797-1856) que escreveu sobre uma lenda alemã em que os espíritos das noivas que morreram antes do casamento atraem seus noivos para a floresta, a fim de fazê-los dançarem até a morte. Acho que o nome deveria ser dito vilís (francês) ou vilis (alemão?) e não como o nome do ex-deputado Jean Wyllys, que não foi ameaçado exatamente por virgens.

As Willis tem quase tudo do gótico — claro, os cemitérios também se fazem presentes, no caso, o da Santa Casa em Porto Alegre. Não se preocupem, ninguém dança até morrer, não foi um spoiler, mas, obviamente, o autor baseou-se na história original e faz referências à tradição, apesar de desobedecê-la. Há uma Giselle na trama, há um Alberto apaixonado por ela — no original ele é Albrecht –, e há a Rainha das Willis, que se chama Myrtha em ambas as histórias. Tem também uma bailarina que se chama Margot (Fonteyn?).

Faço este “intermezzo culto” não para me mostrar nem para dizer que Gerbase copiou uma história existente. A história original é ínfima e há muito de invenção nas Willis de Gerbase, que também são virgens que morreram antes do casamento e que podem, sim, matar. E matam facilmente por serem belas e por se alimentarem de suas conquistas através de mecanismos não antropofágicos que não irei explicar por motivos óbvios. Estaria contando parte fundamental da história.

As Willis é um tremendo livro de entretenimento, passado todo em Porto Alegre. Eu me diverti bastante com a boa trama criada sobre a base que expliquei acima, A coisa funciona maravilhosamente. O livro não é sanguinolento, o bom humor perpassa toda a história. Há uma interessante dupla de policiais, uma dupla de irmãs Willis sensacionais e um pastor evangélico que é exatamente aquilo que se espera dele. E, já disse, a coisa funciona.

O livro é uma espécie de tese acadêmica muito livre, escrita por Irina, uma willi. Sabe-se que Gerbase é ou foi professor na PUCRS e que deve ter sofrido horrores com alunos e com o formato insípido das teses (opinião minha). Além de professor, Gerbase dirigiu e fez o roteiro de vários filmes e isto está claro no livro. Como numa boa série, ele consegue envolver o leitor, deixando para o final o desenlace de várias tramas. Eu engoli o livro rapidinho. E curti.

Recomendo!

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Compre o livro na Livraria Bamboletras, na Av. Venâncio Aires, 113. Ah, não mora em Porto Alegre? Use o WhatsApp 51 99255 6885. A gente manda!

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Bárbara, 30 anos

Bárbara, 30 anos

Num domingo, 25 de setembro, há 30 anos, vi a Bárbara Jardim Ribeiro pela primeira vez. Era no fim da tarde e fomos ao Parque da Redenção com nosso filho Bernardo, de 3 anos. Lá, a bolsa estourou e acabamos no hospital. Poucos minutos depois, ouvi a indignação dela por ter sido retirada do quentinho. Ela berrava de forma verdadeiramente espetacular. Toda satisfeita, a pediatra me trouxe a bebê. Lembro de ter dito Que fera, enquanto observava aquele serzinho de cabelos lisos e pretos e cara de índia. Depois ela ficou loira e crespa, depois castanha clara e crespa, cor de chá, prova de que 30 anos é muito tempo. Hoje, acho que sempre se desprende um ar feliz da Bárbara e as pessoas adoram me dizer, rindo, que conhecem ela. Como se fosse um privilégio. E é. Eu acho ela maravilhosa. É minha filha.



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