Ernesto Sábato completa 99 anos / Saramago entrevista María Kodama

Ernesto Sábato não escreveu muitos livros de ficção, talvez tenha escrito três ou quatro, mas os que li foram muito marcantes: O Túnel e Sobre Heróis e Tumbas.

O Túnel é de 1948 e insere-se decidamente no existencialismo. Albert Camus era um entusiasta da obra e recomendou sua tradução para a Gallimard, o que tornou Sábato uma celebridade da noite para o dia. Lembro que gostei demais daquele vertiginoso monólogo escrito na primeira pessoa por um narrador que resolve contar o ato que cometeu. Traz tremendos debates de consciência, demonstrando as  dualidades e desvios que empurram os seres humanos a pensamentos e atos.

Mas, em minha opinião, seu grande romance é Sobre Heróis e Tumbas de 1961. São três narrativas que se completam: a do amor algo doentio de Martín por Alejandra — esta uma das maiores personagens que já conheci — ; a da morte no exílio do general Juan Lavalle, heroi da independência argentina; e o melhor de todos: O Informe sobre Cegos, que chegou a ser publicado separadamente há alguns anos. As duas primeiras, apesar de totalmente diversas, são clássicas histórias de decadência de uma certa aristocracia,  contadas sob a perspectiva da morte. Já O Informe está no limite do fantástico e é a respeito de uma seita maléfica dotada de poderes esotéricos e que une todos os milhões de cegos do mundo.

(Escrevo de memória. Li ambos nos anos 70…).

Tenho a melhor das lembranças de Ernesto Sábato, mais um grande escritor argentino.

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Kodama entre o génio de Borges e as perguntas geniais de Saramago

Obs.: Ontem, no Ciberescritas, li a estranha entrevista que José Saramago fez com (ou submeteu a) María Kodama, viúva de Jorge Luis Borges. Transcrevo-a abaixo.

Por Isabel Coutinho

José Saramago revelou-se um óptimo entrevistador. María Kodama, a última companheira de Jorge Luis Borges, riu-se às gargalhadas e lá foi respondendo às perguntas sérias, íntimas e prosaicas do Nobel português. “Como é que Borges dizia que te queria? Explica-nos, explica-nos!”.

Já José Saramago tinha lido pela primeira vez o poema Elegia (1963), de Jorge Luis Borges, e estava a dizer para a assistência que quase encheu o auditório da Biblioteca Nacional, sexta-feira à tarde em Lisboa, que se tratava de “um belo poema, quase uma autobiografia”, quando a sua mulher, Pilar del Río, irrompeu pelo palco vinda da plateia.

“É um poema belíssimo mas ninguém ouviu nada”, disse-lhe, enquanto ajustava os microfones em cima da mesa.

O prémio Nobel da Literatura ainda balbuciou que alguém tinha ido mexer no seu microfone, mas Pilar del Rio virou-se para os oradores e avisou: “Para todos e para sempre, o microfone tem que estar em frente à boca!” A plateia desatou às gargalhadas.

“Pois”, afirmou Saramago. “É a sua experiência de rádio”, justificou-se perante os seus companheiros de mesa, que eram María Kodama escritora, tradutora, companheira de Jorge Luis Borges por mais de vinte anos e Carlos da Veiga Ferreira, o editor da Teorema, onde estão publicadas em português as Obras Completas do escritor argentino que morreu em 1986.

“E então passemos a ler outra vez o poema porque não perdemos nada com isso”, rematou o autor de Ensaio sobre a Cegueira. “Oh, destino, o de Borges,/ ter navegado pelos diversos mares do mundo/ ou pelo único e solitário mar de nomes diversos (…)/ e não ter visto nada ou quase nada/ senão o rosto de uma rapariga de Buenos Aires (…)”, deu-se assim o mote para a palestra-colóquio E se falássemos de Borges?, uma conversa entre a viúva e o Nobel, organizada pela Fundação José Saramago, a que se seguirão outras dedicadas a escritores. No dia 10 de Julho, no Teatro Nacional de São Carlos, falar-se-á de Jorge de Sena.

“Não achas que os leitores ficam prisioneiros dos contos de Borges?” Saramago tem a intuição de que o acesso à obra do escritor argentino se faz pela leitura dos contos e que às vezes os leitores ficam só por aí. Esquecem que Borges foi um grande poeta.

Kodama concordou. O que deu fama internacional a Borges foi a tradução dos seus contos e da sua prosa. Mas, revelou, “ele sempre se sentiu poeta”. Mesmo a sua prosa é “uma prosa poética, tem um ritmo especial”. Ele preferia ser recordado como poeta e não como contista. Mas como era muito exigente consigo próprio e perfeccionista, sentia uma nostalgia, pensava que nunca ia conseguir chegar a escrever “o poema”. “Eu como leitora acho que muitas vezes o conseguiu, mas ele não o sentia da mesma maneira”, concluiu María.

Vida de todos os dias

Borges começou por ser poeta. Mas a determinada altura teve um acidente. Magoou-se na cabeça numa janela aberta que estava a ser pintada, quando ia para casa de uma amiga, e sofreu uma septicemia. Na época não havia antibióticos, ficou às portas da morte, com febre e pesadelos. Quando melhorou, “milagrosamente”, teve medo de ter perdido a capacidade intelectual, a capacidade para escrever poemas. “Então decide que vai escrever um conto porque se fracassasse não sentiria que estava louco ou que tinha perdido essa capacidade.” Escreve então o seu conto Pierre Menard, autor de ‘Quixote’ (onde está a frase “Não queria compor outro Quixote o que é fácil mas ‘o’ Quixote”).

A partir daí entra num longo período em que se dedica à prosa, aos contos, e escreve ensaios e crítica literária para jornais. “Quando perde a visão e percebe que lhe é difícil continuar a escrever, vai retomar a poesia. Porque era mais fácil decorar o texto por causa da rima, já que não podia passar ao papel imediatamente o que estava a pensar.” Começou pela poesia, por causa do acidente escreve prosa e mais tarde, por causa da cegueira, regressa à poesia. Na última fase, “já seguro de si”, mistura as duas coisas, poesia e prosa.

Como era Borges na vida de todos os dias?, quis saber Saramago.
“É que Borges era um génio e continua a ser apesar de já não estar entre nós como é que se comporta um génio na vida de todos os dias?” A esta “questão prosaica” o escritor quis que Kodama respondesse francamente. Aprendia-se muito, disse ela, era notória a profundidade e diversidade do seu conhecimento. Tinha um enorme sentido de humor e contava muitas histórias da sua avó inglesa, que ele adorava. “Era um ser encantador, divino”.

Por vezes eu tentava que os meus colegas de turma fossem assistir às aulas de línguas anglófonas que ele me dava. Eles diziam-me: ‘Não! Como queres que vamos contigo, ele é velho, os labirintos, os espelhos, por que é que não vens mas é sair connosco?’ Eu respondia-lhes: ‘Sim, ele é os labirintos, os espelhos, o que vocês quiserem, mas paralelamente a isso é uma pessoa divertidíssima com quem podemos passar momentos muito agradáveis e descobrir uma quantidade de coisas, intelectuais e não só, através do que nos conta.” Apesar da sua sabedoria, disse Kodama, as pessoas não se sentiam intelectualmente inferiores a Borges. Sabia guiar as conversas.

“Tinha muita consideração pelos outros. E tinha um sentido ético e de delicadeza no trato. Na sua obra também se reflecte isso: tudo está dito, mas tudo é dito de uma maneira especial.”

Aulas de línguas

Não há palavras para descrever o ar matreiro do escritor português quando anunciou a María Kodama que lhe ia colocar duas questões “muito íntimas”. Durante toda conversa, que durou mais de uma hora, Saramago fez sempre perguntas interessantes, foi dizendo também aquilo que pensava sobre a obra do autor argentino, não fugiu a perguntas difíceis como a sua ligação com a ditadura.

Estava visivelmente bem-disposto a longa doença do ano passado parece estar finalmente a ficar para trás, com 14 quilos a mais e a recuperar pouco a pouco a massa muscular. “Estavas realmente interessada em aprender inglês antigo ou foste aprender inglês antigo para conhecer Borges?”, foi a primeira. Seguiu-se a segunda: “Como é que Borges dizia que te queria?… Explica-nos, explica-nos!” Foi então quando Kodama tinha cinco anos que teve aulas com uma professora de inglês que utilizava um método de lhe ler os textos no original e depois traduzir em espanhol. Leu-lhe um poema em inglês de Borges, do qual Kodama não entendeu nada mas sentiu que havia algo ali que a fazia sentir próximo dele (a solidão).

Aos 12 anos, um amigo do pai, que era fanático de Borges, levou-a a ouvir uma conferência do escritor e ela impressionou-se com a sua timidez. Anos depois, já no colégio, viu Borges do outro lado da rua. Vai ter com ele: “Conheci-o quando era uma miúda.” Ele riu-se: “Claro, agora você é grande. Em que trabalha?” Ela respondeu-lhe: “Estou a terminar o secundário.” Quer estudar o inglês arcaico?, pergunta-lhe ele. “Shakespeare?”, arrisca ela. “Não, muito anterior, século X.” “Então se calhar é complicado”, diz-lhe ela mas ele convence-a, dizendo que vão estudar juntos. Passam a encontrar-se em cafés de Buenos Aires, ele aparecia com os dicionários debaixo do braço. “Divertíamo-nos muitíssimo”. E a vida foi-lhes dando outra história que terminou, realmente, “em amor”.

“E a segunda pergunta?”, insistia José Saramago. Kodama ria-se ao início e depois já estava às gargalhadas. “Que palavras utilizava para dizer que te queria…”, continuava o autor português. “Isso é importantíssimo. Posso não ser um bom escritor, mas a fazer perguntas sou um génio!”, brincou o Nobel, que assim pôs a sala inteira a rir à gargalhada.

María e Jorge usavam vários nomes, a maior parte ligados à literatura. “Um desses nomes era tirado de um conto que ele me tinha dedicado em segredo e que se chama Ulrica (in O Livro da Areia). Quis gravá-lo no túmulo em Genebra e em lugar de María Kodama e de Borges coloquei o epitáfio ‘De Ulrica a Javier Otárola’, porque eram nomes muito especiais para nós. Ulrica vinha também um pouco da Elegia de Marienbad, de Goethe, que ele me recitava em alemão. Ulrike von Levetzow era o nome da jovem amante de Goethe e quando ele fazia amor com ela contava as sílabas nas suas costas, acariciando-as com a mão. Bem, já está dito.” E María Kodama e José Saramago prosseguiram com outro assunto antes que a conversa ficasse mais complicada.

25 comments / Add your comment below

  1. Que maravilha, Milton! Há outro do Sábato, Abbadon, o Exterminador. Mas só li O Túnel, e também o achei muito bom. Até Thomas Mann achou essa novelinha extraordinária. Há tempos procuro “Sobre Heróis e Tumbas ” e não o acho para comprar (ou de tanto não achar já não procuro).

    Com licença que vou ler a entrevista com a María Kodama.

    P.S.: Já que falei sobre livros difíceis de achar, recorro aos leitores desse blog com um pedido: se alguém tiver “O Teatro de Sabbath” , do Philip Roth para me vender, entre em contato.

      1. Finalmente a cia das letras desconfiou! No site da editora há uns vinte pedidos de leitores para a reedição do Teatro de Sabbath.

        Tinha por esgotado também o romanção do Sábato. Bom saber.

        Grato, Cassionei.

  2. Eu tenho aqui um volume de diálogos entre o Sábato e o Borges que é delicioso, editado pela Globo. Numa das conversas, o intermediador os recebe em um bar de Buenos Aires; Borges pede água e Sábato whisky. Sábato fala da mitificação inconsequente dos leitores superficiais, e cita alguém da crítica que disse ser o Dashiel Hammet tão bom quanto Faulkner. Quem diz isso, continua, só pode ser um leitor esporádico, alguém pronto para escrever para periódicos, não um leitor profissional. Mas o melhor é ver Borges tão cordial, de certa forma infantilmente indefeso, o que se vê pouco entre grandes escritores (que se preocupam em passar uma imagem de rigidez literária como se pronunciassem sentenças imortais no simples ato de irem ao banheiro). Perguntado sobre musica_ Borges também era compositor de tangos, reunidos nos quatro volumes da Globo numa seção de milongas_, disse que uma sobrinha ou uma outra menina de sua família, ligou o rádio para que ele escutasse uma canção. Era uma canção tão linda e tocante que ele não resistiu ao choro. Terminada, perguntou quem cantava, ao que a menina respondeu: mas valha-me deus, o senhor nunca ouviu os Beatles?

    Semana passada mesmo sublinhei essa frase, de um dos Prólogos dos Prólogos: “Nada mais distante da beleza que a simetria perfeita.”

  3. Teimo em considerar escritores pessoas comuns, tão interessantes e desinteressantes quanto quaisquer outras, à parte os bons livros que escreveram, de forma que praticamente não me interessam suas vidas, o que fizeram, o que dizem, as opiniões que sustentam, as posições políticas que defendem ou acatam…

    Os livros de Sábato são de fato bons, tanto O Túnel quanto o Sobre Heróis e Tumbas, apesar de mergulhados em um sentimento específico, de quase desesperança, com o humor soterrado por circunstâncias demasiadamente trágicas, construindo uma mitologia dos infernos para o continente latino-americano.

    Como homem era físico, parece que dos bons, e tinha enormes preocupações acerca do uso das tecnologias para a destruição, controlando números sobre armamentos e verbas, comprovando que os orçamentos militares, se dispostos à humanidade, resolveriam todos os problemas de miséria e decorrentes. Nada demais, portanto.

    Sobre a entrevista de Saramago com a “mulher” de Borges, bem, nada vi que justificasse chamar o escritor de entrevistador genial (ah, vai ver que me falta a sutileza…); prefiro, na função, o Edmund Wilson. Mais um pouco ficaria como numa revista de fofocas, assim: “Vem cá, minha filha, Borges não era viado não? Ah, era homem? E, vem cá, como é que ele te comia?” Gostaria de ter lido a resposta de Kodama sobre o apoio de Borges àqueles que depuseram Perón através de um golpe militar (como todo aristocrata, Borges nutria um profundo desprezo pelo povo, principalmente quando ele lotava a Praça de Maio), e seu posterior apoio à ditadura de Videla e todas mais que sobrevieram à Argentina e à América Latina, faltando ainda um questionamento ao oportunismo de Kodama, talvez de olho no patrimônio literário (e financeiro, é claro) do velho, enquanto o envolvia em poemas escritos em inglês arcaico, que recitavam, com certeza, como se sorvessem pitacos de ópio, mas tudo isso não tem lá grande interesse, são picuinhas que nada alteram as circunstâncias históricas gerais, contando ou não com a presença desses “grandes homens”, ou o que quer que sejam ou tenham sido, talvez apenas escritores e por isso eles nos valem, o pouco que isso pode valer, aliás.

    Bem, está na hora da minha oração ao sol.

    1. Acho que a tal “genialidade” foi um exagero da parte de Sonia Coutinho. Ela queria dizer que Saramago deu uma de fã, que fez exatamente o contrário, que começou a fazer perguntas pessoais de destoam do perfil hierático que os leitores têm de Borges, que fez as perguntas cara-de-pau que uma dona de casa faria primeiro, se não tivesse super-ego.

      O Charlles, acima, também trouxe um depoimento que nega a tal pose borgeana.

      E então, o sol te recebeu bem? Aqui no sul ele brilha, apesar dos 11 graus.

    2. “Construindo uma mitologia dos infernos para o continente latino-americano.” Preciso.

      Não sei qual desses ditadores certa vez cumprimentou a Borges com a frase: Li todos os seus romances.

      As entrevistas desse tipo só são interessantes quando levadas o mais descaradamente possível ao âmbito das fofocas. O que interessaria saber sobre a obra de Kodama, ou o que ela pensava da obra do marido? Sobre interesses matrimoniais colaterais, qual mulher ou homem não os tem? Em troca aos olhos verdes e o ar de dançarina espanhola, ofereci à minha esposa uma simples casa e uma carro modelo 97, e saí ganhando. Dez anos mais nova, se o whisky me fizer tão bem quanto faz a Sábato, entenderá sobre como lubrificar da maneira mais eficiente as rodas da cadeira. E como foram felizes os tempos_ se realmente os houve_ em que os interesses de fortuna feminino se dirigiam às possibilidades de ganho de espólios de escritores; hoje as vítimas são jogadores de futebol, pagoderos (se bem que no Brasil os escritores estão imunizados), fazendeiros_ ou estancioneiros.

      Harold Bloom, no cânone ocidental, no capítulo sobre a literatura hispano-americana, salienta o mérito de Borges por escapar dessa sanha improdutiva de ter que relacionar literatura com política. O escritor saudavelmente apolítico, e bem superior a Galeano (se bem que esse, justamente, só é bom por transitar em sentido oposto), ou à trilogia dos subterrâneos da ditadura feita po Jorge Amado (que o genial Sarney, na Folha, revelou ser maior que Saramago), ou a qualquer dos romances “denúncia” do Llosa.

  4. O Túnel e Sobre heróis e tumbas estão na minha lista de favoritos. Os diálogos de Sábato e Borges são muito bons, mesmo.

    Aliás, sou considerada herege por preferir Sábato a Borges.

    E confesso que não imaginava que Sábato ainda vive. Não costumo me interessar pela vida dos escritores, apenas pela obra. Obrigada pela informação, Milton!

  5. Será que Borges respondeu “Eu também li todos os seus romances, general?”

    Prefiro as entrevistas que tratam das questões literárias mesmo; não me interesso sobre questões pessoais quando elas não me são reveladas por alguém de acordo com sua própria vontade.

    Não sou fã do Harold Bloom, e não considero improdutivo relacionamento da literatura com a política, aliás, considero mais improdutivo fugir à questão com se ele não dissesse nada ou não fosse relevante literariamente. São questões intereseccionáveis, por assim dizer.

    Llosa sempre foi um oportunista com capacidade de escrever bons livros, mas esta caapacidade ele perdeu há alguns anos, e hoje vive da caridade de quem o detesta.

  6. Eu era adolescente quando li “O Túnel”. Fiquei vivamente impressionado pela fluidez e firmeza do texto escrito por Sábato, na voz “del pintor que mató a María Iribarne”. Desde então procuro sem subesso “Sobre Heroes y Tumbas”. Tenho em casa “Abadon, o Exterminador” mas, por algum motivo, nunca o li.

    Na mesma época fequentei uma oficina de contos. Lemos o explêndido “O Sul”. Naquele tempo, eu andava lendo os poemas do Borges. Não conseguia largá-los. Pouca literatura me comovia daquele jeito.

    Disse ao oficineiro (um escritor profissional a quem respeito e admiro) e a meus colegas que gostava mais dos poemas do Borges do que de seus contos. Um colega, com ar quase de compaixão, disse-me que me faltava cultura para entender os contos de Borges. Alguns colegas rira.

    Tempos depois, li os contos novamente e os achei magníficos. Mas o amor pelos poemas do fim da vida de Borges nunca me abandonou.

    Lendo a entrevista, senti-me vingado.

    1. Queria que alguém aqui me esclarecesse sobre uma dúvida capital: há um poema famoso, desses de emoldurar em sala de espera de escritórios de advocacia (tal qual o “If”, do Rudyard Kipling), atribuído ao Borges. Esse poema é, realmente, muito comovente, ainda que um tantinho piegas, em que Borges lamenta, do alto de seus vários anos, não ter chupado mais sorvetes em vez de ter comido tanto lentilhas (foi a primeira vez que ouvi essa palavra, aliás, lentilha, e fiquei encantado), não ter andado mais descalço, não ter escalado montanhas, etc. Porque a vida é passageira e~estou velho e não tenho mais tempo. Algo nesse estilo. Contudo, tenho os quatro volumes da dita obra completa (que na verdade não o é) de Borges, lançados pela Globo, e nunca vi esse poema. Seria um poema apócrifo???

        1. Pô, cara. Você acaba de desvendar um antigo enigma. O pessoal da propaganda é tão sacana, que pela minha adolescência havia um comercial de tevê onde se lia tal poema, e no final vinha a atribuição a “Jorge Luis Borges, um dos maiores escritores do século XX”

  7. Milton, já que o assunto é escritores hispanoamericanos, hoje concluí a leitura de 2666. Notei algumas falhas da edição oficial, mas a mais visível está na página 800, último parágrafo, em que se diz que foi a última vez que Archimboldo e a baronesa se viram. Mas na página 819, primeiro parágrafo, afirma-se que os dois se encontraram ainda por muito tempo, até a velhice da baronesa. Na parte dos crimes, descreve-se que o mamilo de um seio de mulher foi cortado, junto com algumas cartilagens. Até onde sei, não existem cartilagens no seio. Essas e outras mancadas poderiam se juntar à coletânea de frases equivocadas de vários autores citadas no final do livro.

  8. “(Escrevo de memória. Li ambos nos anos 70…).”

    Esta tua memória me mata de inveja, Milton.
    Li aproxidamente uns 10 livros de Borges, não lembro de nenhum. Os bichinhos estão lá abandonados e esquecidos na triste biblioteca.
    (Talvez porque os tenha lido durante o doutorado em engenharia. Realmente não sei.).

  9. Se não estou enganado, o primeiro livro que li da literatura argentina foi “Sobre Heróis e Tumbas”, da velha edição da saudosa Francisco Alves. Depois veio “Abadon, o Exterminador”, e só depois de alguns anos, “O Túnel”. Há pouco mais de um mês atrás comprei uma edição espanhola do “Abaddon”, que custou ridículos R$9,90 numa livraria daqui da minha cidade, e a simpática balconista me perguntou se eu gostava de livros de terror, por estar comprando aquele livro… ai, ai… respirei fundo, e expliquei o contexto do livro para a mocinha (devia ter uns 20 anos), e ela ficou me olhando com uma cara de “do que este cara tá falando).

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