48 Variações sobre Bach, de Franz Rueb

O número 48 é um pouco surpreendente. Esperava os 30 das Variações Goldberg, mas Franz Rueb escolheu os 48 Prelúdios e Fugas (Livros I e II somados) de Bach, certamente em razão de ter assunto demais. E é isso o que surpreende — assunto demais, 375 páginas sobre alguém do qual se sabe tão pouco. Explico melhor: este livro é formado por 48 capítulos (flashes) — que têm de 5 a 10 páginas cada um — sobre a obra e principalmente sobre a vida de Bach.

A abordagem do escritor Rueb é basicamente histórica. 48 Variações sobre Bach parte da família de Bach em direção ao ambiente dos principados e das igrejas daquilo que hoje é a Alemanha. Aprofunda-se no estudo do que era a educação da época e procura compreender um artista absolutamente brilhante e original nascido naquele contexto e que ficou órfão aos 10 anos de idade, indo de casa em casa, de instituição em instituição, até aprender seu ofício e alcançar vários cargos em principados. A tarefa não é nada simples, mas se fizer a comparação deste livro com outras biografias que li, a de Rueb parece das mais honestas. A conclusão de que Bach provavelmente não entenderia a divisão que hoje se faz entre sua música sacra e secular é uma tese bastante sólida. A certeza de que Bach era um tipo de homem que não tinha a compreensão do próprio gênio e de que era adogmático na área musical são certezas. A descrição de suas muitas lutas contra as autoridades são bem conhecidas, mas aqui são descritas com riquezas de detalhes que as tornam interessantes. O único defeito que encontro neste livro cheio de qualidades e de tão engenhosa feitura são certos exageros na vontade de dar sempre razão a Bach, o qual, cumpre lembrar, era um ser humano. (OK, quando ouço algumas de suas obras, parece-me sobre-humano, porém o ouvinte normalmente é um e o biógrafo outro menos arrebatado, de preferência).

Nunca li descrições tão completas e convincentes do entorno do compositor, nunca o final de sua vida em Leipzig foi mostrada com tanta crueza e tristeza. Então, o livro, que termina com a afirmação de que os ossos que estão no túmulo de Bach são de outra pessoa, vale a pena. E como.

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  1. Ahn… Repetirei o comentário que fiz em 10/3, que talvez cê não tenha lido: “Para nós soa estranho que um cara tão talentoso perdesse tempo com picuinhas salariais e outras de ainda menor monta, mas penso que o tal, no meio dele, só reconhecesse seus problemas como fatos da vida de qualquer músico na época, e que ele certamente se via como apenas isso: um músico a mais, por maior que fosse o engenho que também ele, mais imodestamente, também reconhecesse em si mesmo. Além disso, era um lúbrico: fez filhos diligentemente a vida inteira, certamente para a maior glória do protestado deus, ou melhor, certamente sob tal álibi…”.

    Religiões estão nos regimes das convenções, como casamento, paternidade, etc. Quase não se é religioso em um universo de crentes; frequenta-se o culto ou a missa, observa-se datas festivas, jejuns, etc., mas no pega pra capar de todo dia a ética religiosa fica pra escanteio e vale a ética do capitalismo, ou seja, farinha pouca meu pirão primeiro.

    Vejo-me como um camponês com uma carroça atolada numa estrada lamacenta, a ver passar aquele sujeito com vestes de funcionário, a assobiar uma melodia complicada, os sapatos sujos, o rosto suado mas a fisionomia e aspecto geral com uma alegria saltando os olhos. Cara louco, sô!

  2. Devias mandar esta resenha para a companhia das letras e ver se a um leitor tão bom como tu eles não mandam outras obras, dá muita vontade de ler o livro depois de te ler.

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