Sobre o Exílio, de Joseph Brodsky

Sobre o Exílio não chega a ser um grande texto ou pelo menos é um texto muito de circunstância. Quando Joseph Brodsky tinha apenas 24 anos, foi acusado de parasitismo social. O julgamento foi antológico e Savelyeva, o juiz, ficou para a História.

— Qual é a sua profissão?

— Poeta.

— E qual é a sua ocupação permanente?

— Julgava que era uma ocupação permanente.

— Quem lhe deu autorização para ser poeta?

— Ninguém. E quem decidiu que eu pertencesse à raça humana?

Condenado a cinco anos de trabalhos forçados na tundra gelada de Norinskaya, uma variante da Sibéria, Brodsky foi para sempre impedido de “exercer uma profissão para a qual não tinha as qualificações necessárias”. A sentença correu mundo e o escândalo abreviou-lhe a pena.

O evento obrigou-o a deixar sua terra natal, Leningrado (ou a atual São Petersburgo), seus amigos e sua família. Ajudado por ninguém menos que W. H. Auden, Brodsky foi viver uma nova vida nos Estados Unidos. Apesar de sua juventude, antes de sua emigração, ele já estava se destacando como um talentoso poeta e artista. Foi reconhecido por ninguém menos que a grande Anna Akhmátova, que se tornou sua mentora antes da repentina expulsão. Nos Estados Unidos, ele alcançou enorme sucesso. Recebeu o Nobel de Literatura em 1987, em recompensa por uma prolífica carreira escrevendo poemas que hoje são considerados clássicos.

Um homem com bom gosto, especialmente literário, é menos suscetível aos encantos e amarras de qualquer versão da demagogia política. O ponto, aqui, não é que a virtude constitua uma garantia para a criação de uma obra de arte, mas sim que o mal, principalmente o mal político, é sempre um péssimo estilista. Quanto mais substancial é a experiência estética de um indivíduo, mais sólido é seu gosto, mais afiado é seu foco moral, portanto, mais livre ele é, mesmo que não seja necessariamente mais feliz.

Seus poemas e escritos falam do tédio do exílio e da tristeza pela ruptura entre sua antiga vida e a nova. Durante anos, ele permaneceu banido na Rússia — nunca retornou –, embora tenha permanecido muito amado por lá, com pessoas compartilhando seus escritos no circuito underground, com poemas sendo distribuídos em samizdat ou em cópias impressas e manuscritas à mão. Isso ainda era motivo de grande tristeza para Brodsky, que foi citado como tendo dito em uma entrevista à Paris Review : “Para um escritor, não ser publicado em sua língua materna é tão ruim quanto um final ruim.” Se, como disse Adorno (1903-1969), não poderia haver poesia após Auschwitz, para o escritor russo é impossível que o exilado consiga novamente sentir-se em casa.

Como não há leis que possam nos proteger de nós mesmos, nenhum código penal é capaz de prevenir um verdadeiro crime contra a literatura; apesar de podermos impedir ameaças materiais a ela — como a perseguição de escritores, atos de censura, a queima de livros –, não temos poder algum em relação à pior das violações: a de não ler livros. Por esse crime paga-se por toda a vida; quando o violador é uma nação, ela paga com sua história.

O livro é dividido em 3 ensaios — “A condição chamada exílio”, “’Uma face incomum’” e “Discurso de aceitação”.  O melhor, disparado, é o segundo, que é o discurso que Brodsky proferiu ao receber o Nobel. É aqui, com tema livre, que ele se esbalda e todas as citações que aqui coloco foram tiradas dele. O terceiro ensaio são quatro páginas bem simpáticas onde ele diz “OK gente, eu aceito o Nobel”

Não tenho dúvida de que, se houvéssemos escolhido nossos líderes tomando por base suas experiência de leitura, e não seus programas políticos, haveria bem menos sofrimento no mundo. Parece-me que o mestre em potencial de nossos destinos deveria ser inquirido, primeiramente, não em relação ao que ele imagina que deveria ser o curso de sua política externa, mas quanto às obras de Stendhal, Dickens, Dostoiévski.

Joseph Brodsky (1940-1996)

Deixe uma resposta