Uma longa e bela entrevista que fiz com Paixão Côrtes

Uma longa e bela entrevista que fiz com Paixão Côrtes

Publicada em 20 de setembro de 2010 no Sul21

Dias depois da publicação desta entrevista, recebi uma ligação no celular. Era Paixão Côrtes me agradecendo. Ele disse que, tchê, ficou bem completa. Perguntou se podia utilizá-la em outras publicações, com as fotos também. Respondi que as palavras e a cara eram dele. Deu risada. Só o vi aquela vez. Tive a melhor das impressões do velho gaúcho falecido ontem.  

Fotos: Bruno Alencastro / Sul21
Fotos: Bruno Alencastro / Sul21

João Carlos D`Ávila Paixão Côrtes nasceu em Santana do Livramento no dia 12 de julho de 1927. É agrônomo, mas sua principal atuação dá-se como folclorista e pesquisador. Paixão Côrtes é um personagem decisivo da cultura gaúcha e do movimento tradicionalista no Rio Grande do Sul, do qual foi um dos formuladores, juntamente com Luiz Carlos Barbosa Lessa e Glauco Saraiva. Juntos, partiram para pesquisas de campo. Viajaram pelo interior, a fim de catalogar traços da cultura do Rio Grande. Em 1948, foi um dos fundadores e organizadores do CTG 35 e, em 1953, criou o pioneiro Conjunto Folclórico Tropeiros da Tradição. Ele será o patrono da próxima Feira do Livro de Porto Alegre. Paixão Côrtes falou ao Sul21 em sua residência, em Porto Alegre.

Sul21 – O senhor possui duas grandes linhas de trabalho: uma como etnógrafo – por seu trabalho de pesquisa e documentação – e outra, ligada ao movimento tradicionalista.

Paixão Côrtes – Na semana passada, lancei, num CTG de Flores da Cunha, uma espécie de resenha de todas as minhas publicações, que vão desde os livros até os folhetos, artigos e opúsculos. O trabalho mostra todas as capas das edições e reedições organizadas cronologicamente. Estou com 83 anos, mas tenho a sorte de ter visto organizarem isso para mim. A gente fica trabalhando e não tem ideia do que produziu. (Paixão Côrtes mostra a publicação. O número de obras é efetivamente muito alto. Há livros sobre música e danças e os folhetos sobre gastronomia e tradições de regiões específicas. Ele nos convida a trocar a sala, onde estamos, para o que chama de “sua baia”, porque diz ter “sentido” que a charla seria longa. A “baia” é onde trabalha, um escritório cheio de livros. Ele senta na sua cadeira predileta, coberta por um pelego.)

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Sul21 – A Feira do Livro de Porto Alegre habitualmente tem um ficcionista como patrono. Esta é a primeira vez que ela se curva à cultura popular e a alguém que faz outro gênero de trabalho. Um trabalho ligado a uma antropologia intuitiva, que os antropólogos titulados pouco se dignaram a fazer, ou seja, a pesquisar e documentar o folclore gaúcho no território, lá fora, como os gaúchos dizem.

PC – Inicialmente, quero dizer que me senti muito lisonjeado (por ter sido escolhido patrono), pelo simples fato de eu não ser um escritor na concepção atual e, sim, um escrevinhador: recolho as temáticas da cultura popular, estudo-as e tento dar a elas nova dimensão, através da divulgação em texto escrito, devolvendo ao povo o que é dele. Eu vou às pessoas, vejo-as, ouço-as e trato de sentir a alma popular de nossa coletividade. A expressão pessoal e individual e o desenvolvimento econômico e social não interessam a meus trabalhos; seria outro estudo. Interessam-me os aspectos espontâneos e coletivos da cultura, sua identidade. Interessa-me preservar aquilo que o tempo dirá se terá continuidade em cada etnia. O que me interessa é dar às pessoas um conforto, um ânimo e uma certeza de que pertencem a uma coletividade.

Sul21 – E o instantâneo?

PC – Pois é, tchê, o instantâneo, o modismo, o oportuno e o circunstancial “justificam”, entre aspas, ações que são inteiramente desprovidas de sentido histórico. Dá muita tranquilidade o valor dado às origens como uma forma de identificar e projetar as comunidades dentro de um universo maior. E o maior mérito de um povo civilizado é não apenas compreender-se a si mesmo, mas compreender a si mesmo de forma a compreender os outros. O conhecimento de si é uma forma de projetar conhecimento para fora, entende? E como é que os homens simples, jovens, rurais vão projetar sua originalidade num universo maior sem conhecer a realidade e as vivências do seu passado cultural, social e artístico? É aí, então, que se estabelece a ação e a reação e o respeito de um pela cultura do outro.

Paixão_Cortes_03Sul21 – Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia, escreveu Tolstói.

PC – Mas isso é uma verdade evidente, né? E este conhecimento pode renovar valores e melhorar a própria humanidade. E com mais paz, tchê, que é o que a gente procura. Mas voltando à Feira, foi por tudo isso que, apesar de me sentir honrado e surpreso com o convite, passei a achar natural que me colocassem ao lado de escritores, ensaístas, historiadores, professores e coisa e tal para concorrer a patrono. Pô, depois de 60 anos olhando diariamente nos olhos do povo, acho que eu merecia um reconhecimento, apesar de que vou te dizer uma coisa: só agora, aos 83 anos, é que estou começando a produzir coisas mais maduras. Meu novo livro já está em 700 páginas. Mas como, tchê? É porque hoje eu relaciono melhor as coisas. Estou, de verdade, descobrindo o significado daquilo que eu recolhi há anos. Hoje, vejo com mais exatidão as peculiaridades que me ajudam a reproduzir uma época passada.

Sul21 – O senhor está falando em ciência do folclore, em etnomusicologia, em pesquisa. Como isso funcionava no campo? Que métodos o senhor utilizava para recolher as informações, como fazia para tornar aquilo palpável?

PC – O negócio era o seguinte: nos primeiros anos, lá por 1947, eu entrava em comunidades onde eu jamais estivera, de quem eu só conhecia parte da história. E saía perguntando, falando com os mais velhos. Olha bem, tchê, eu tinha 20-22 anos, chegava lá de bota, bombacha e lenço no pescoço, eu sou um homem do campo e não um gaúcho de palco, microfone e holofote. Eu ia buscar a cultura daquelas pessoas lá na convivência com eles, num diálogo direto, sem tecnologia nem nada. Buscava mais aos idosos para saber de suas vivências e acabava causando muita espécie porque eu, jovem, de 20 anos, não procurava a sociedade das moças e, sim, a dos velhos e das velhas e eles não me conheciam. A estranheza era a seguinte: o que esse guri está fazendo aqui, saído de não sei onde, me perguntando umas coisas sobre a família e sobre o tempo de moços de seus pais? Deve estar procurando alguma herança!

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Sul21 – E o senhor perguntando como ele sapateava…

PC – Claro! E o sujeito pensando, mas por que ele precisa saber como eu sapateio? Por que tenho que dar satisfações a esse desconhecido? Então, foi muito difícil adotar, criar um sistema onde eu fosse anotando todas aquelas coisas e ainda relacionando com o meio social e econômico. Eu levava umas anotações prévias sobre a região e começava tateando. “O senhor conhece a chimarrita, o balaio, etc.?” E, naquela época, não existia gravador. Só o Instituto de Música tinha um gravador que pesava 10 quilos e gravava o som em fita de papel. Hoje, ninguém sabe o que é, mas eu tenho tudo guardado. A coisa era assim: eles me diziam como dançavam cada música e eu tentava imitar porque o bagual tinha vergonha de fazer aquilo sem música.

Sul21 – Então eles cantavam para o senhor.

PC – Mas, claro, isso eles tinham que fazer. Então eu girava prum lado e eles diziam, não, é para o outro lado, e eu anotava a posição dos pés. Direito 1, esquerdo 1, direito 2… Tudo desenhadinho para não esquecer. Anotava também as letras e ah, tem uma coisa importante: eu tenho muito boa memória, mas ela funciona de um jeito gozado. A música entra pelo ouvido e vai para o cérebro, mas eu só decoro a melodia se ela vai para o pé. Então, se eu não dançasse, não conseguia voltar para casa com ela no ouvido. Daí, falava com meus amigos músicos a fim de que eles tirassem a música e transformassem tudo aquilo em partituras. Eu cantava e dançava para eles. Depois, com o gravador do Instituto tudo ficou mais fácil e eu cheguei a refazer algumas visitas para ter certeza das anotações. Tava tudo certo.

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Sul21 – Enquanto o senhor pesquisava num lugar, Barbosa Lessa fazia pesquisas paralelas noutro lugar, certo? E tudo era feito em fins-de-semanas, porque ambos trabalhavam.

PC – Ah, pois é, um trabalhão. Raramente, nós viajávamos juntos. E era só um gravador. Eu comprava duas passagens no ônibus, uma para mim e outra para o gravador, que era enorme. Quando alguém reclamava, eu mostrava a passagem “dele”. E tudo saía do nosso bolso. Aí, eu gravava tudo naquele trambolho e devolvia o gravador ao Instituto. Senão, tinha que trazer no ouvido.

Sul21 – Podemos voltar poucos anos? Quero relembrar de quando o senhor tinha 17 anos, mudou de colégio – foi para o Júlio de Castilhos no turno da noite – e, junto a outros estudantes, quis estender os festejos da Semana da Pátria até o dia 20 de setembro, data da Revolução Farroupilha, fundando o departamento…

PC – Departamento de Tradições Gaúchas do Colégio Júlio de Castilhos. Como eu estava ausente da vivência contínua com a vida no campo que me era familiar, comecei a conversar com as pessoas e fui vendo que um era de Cruz Alta, outro de Bagé, não sei mais onde. E aí combinávamos: “Aparece lá para tomar um mate”. Tomar mate, naquela época, só dentro de casa. Na rua, nem pensar. Nem na porta de casa. Bombacha ninguém ousava vestir em Porto Alegre.

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Sul21 – Vocês logo perceberam que o Colégio Júlio de Castilhos poderia abrigar essa iniciativa?

PC – Ah, não foi tão simples. O negócio é que eu botava bota e bombacha e ia para a aula. E era aquele comentário só. Eu morava na Sarmento Leite, e o antigo prédio do Julinho era na João Pessoa, onde fica hoje a Faculdade de Economia da UFRGS. De noite, eu ia pilchado. Quando fazia frio, ia de poncho. Chovia, botava um chapéu. O pessoal falava: “Olha o guasca de fora”, “Olha o guapo”. E eu não me ofendia, sabia o que eu era, eles não estavam me ofendendo ao dizer aquilo.

Sul21 – E as moças?

PC – As moças não participavam. Elas estavam em outra. “Miss”, “Star”, tudo nome americano. E eu fui indo, vestido assim. Foi aí que eu comecei a pensar: por que a gente não faz um núcleo de resistência a essas loucuras norte-americanas e tudo o mais que está aí? Fui bolando, pensando, sozinho. E aí um dia, no Grêmio Estudantil, expus a coisa: “Acho que a gente deveria preservar as nossas tradições”, etc. Tinha a Chama da Pátria, no 7 de setembro, data magna da pátria. Foi aí que tive a ideia de tirar uma centelha da pira da pátria e levar para o Júlio de Castilhos, fazer uma continuidade da chama da pátria, lá num candeeiro, até o 20 de setembro. E o pessoal dizia: “Mas como?”. Então fui na Liga de Defesa Nacional, um órgão muito importante na época. Eu conhecia o major Vignolli. Apresentei minhas intenções, numa carta que nós tínhamos preparado. Ele me perguntou: “Então, qual é a ideia?”. E eu, numa insolência que só hoje percebo, respondi: “Vou tirar uma centelha da pira da pátria para levar para o Colégio Júlio de Castilhos”. Imagina, eu com 18, 19 anos. Aí ele chamou um sujeito: “Ô Pimentel, vem aqui”. O sujeito chega e diz: “E aí, Paixãozinho, como é que vai?”, todo entusiasmado. Era amigo do meu pai, com quem tinha trabalhado lá em Santa Maria, me conhecia desde pequeno. E perguntou: “O que é que tu estás fazendo aqui?”. A ideia era prolongar do 7 de setembro até o 20, da Revolução Farroupilha. Aí eles me perguntaram como é que eu queria fazer isso, se era a cavalo, como é que era e tal. Eu tinha pensado em três cavalos – um com a bandeira do Rio Grande, outro com a bandeira do Colégio Júlio de Castilhos e outro com a bandeira do Brasil.

Paixão_Cortes_07Sul21 – Mas qual era a importância de pegar a centelha da pira da Pátria?

PC – Era muito importante, porque aquela centelha era uma homenagem aos pracinhas que morreram na segunda Guerra Mundial, em Pistoia. O fogo vinha de lá, atravessava o Atlântico, chegava a Recife e descia até aqui. Nós éramos nacionalistas, brasileiros e gaúchos. Nós queríamos participar desta homenagem, dando continuidade do nosso jeito, do nosso modo, de cavalos, bombachas e música nossa. Houve um baile, até. Bom, nós queríamos aquele mesmo fogo dentro de um candeeiro, que era a luminária dos nossos galpões.

Sul21 – E os gaúchos, de onde saíram?

PC- Eu convencia um, que convencia outro. Mas aí não tinha arreio. E cavalo? Não tinha. Fui falar com o doutor Pimentel: “Olha, consegui um piquete bom. Gente firme. Mas não temos cavalo, nem arreio”. O doutor Pimentel disse que conseguia os cavalos, do Regimento Osório. “E os arreios?”, perguntei. “Isso vai ser difícil”. Falei para ele: “O senhor me arruma uma caminhonete e dois homens que eu dou um jeito”. Cinco horas da manhã saímos em direção a Belém Novo. Foi clareando o dia e iam aparecendo aquelas figuras a cavalo; eu mandava parar a caminhonete e começava a dar um discurso sobre o gaúcho, a pátria, o gauchismo, e os caras ficavam atônitos (risos). Assim arranjei 14 arreios. Só na palavra! Devolvi um por um, eu mesmo. Montamos os arreios e conseguimos oito pessoas. Faltou gente para montar, as pessoas ficavam com vergonha. Tu podes imaginar oito loucos vestidos de gaúcho, de faca?

Paixão_Cortes_08Sul21 – A revolução Farroupilha não era comemorada?

PC – Não, era tudo proibido. Os símbolos estaduais eram proibidos. Não era feriado, não tinha nada e nós comemoramos com um baile no Teresópolis. Um veio pilchado, o outro não. Nós tínhamos uma bandinha alemã que nem sabia tocar a nossa música, foi uma dificuldade ensinar alguma coisa para quem só sabia tocar valsinha. E todo mundo chorando por causa da fumaça do churrasco. Uma bagunça, tudo improvisado.

Sul21 – E a expansão do movimento? E o CTG 35?

PC – O nome nós decidimos numa reunião em 5 de janeiro de 1948, mas a fundação foi em 24 de abril. Foi difícil. Não conseguimos o registro civil. Nós queríamos um CTG, eles falavam em associação; eles falavam em presidente, nós em patrão; eles falavam em vice-presidente, nós em sota capataz; eles em relações públicas, nós em invernada disso ou daquilo. E lá dentro também era confuso. Nós tínhamos poucas descrições, partitura nenhuma, então o Lessa e eu começamos a procurar. Eu viajava muito, pelo serviço, então íamos cada um para um lado. Começou em Palmares. Eu estava falando com um rapaz sobre danças tradicionais e ele me falou da tal “dança do pezinho”. Eu não sabia: “Que dança do pezinho? Vocês dançam isso?” E o cara: “Claro, lá na praia, nas festas”. E aí formou-se um grupo e nós fomos a Palmares para pesquisar. Bem, se a 100 quilômetros de Porto Alegre tem uma dança dessas, como é que não vai ter por esse Estado inteiro?

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Sul21 – E os clubes?

PC – O clubes não nos aceitavam. Ninguém podia entrar num clube de bota e bombacha.

Sul21 – E os escritores que dizem que o senhor e Barbosa Lessa “inventaram” as tradições e toda a mitologia gaúcha?

PC – É gente desinformada, são pessoas com raízes urbanas que não consideram o campo. Eu não penso ou invento nada. Tenho horas e horas de fitas e documentação. É só estudar. E como é que eu vou inventar se eu não sou compositor nem sei escrever partitura, se não sou músico? Como é que eu vou inventar coreografia sendo engenheiro agrônomo? Como é que eu vou inventar cultura trabalhando em outro ofício durante toda a semana. Mas se tem que sapatear ou montar num cavalo, ah, isso eu sei fazer. Ser me pedirem para dançar com uma prenda, vou dançar com o respeito e a nobreza que a mulher merece. O que é isso? Como é que eu e o Lessa faríamos para criar toda essa montanha de coisas que está nesses livros aí? Bom, nesse caso, nós seríamos geniais. Só que não somos, só fizemos registrar o que existia.

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Sul21 – Há preconceito.

PC – Há preconceito, mas não adianta, hoje é conceito. Mas é claro que tudo vai mudando, a cultura é dinâmica, nada é estático. Mas é um dinamismo coerente com a cultura original. Isto parece ser difícil de entender. Por exemplo, passei dez anos estudando os Birivas, alguns diziam mas o que é isso, Paixão? Pois é, está aí, olha este livro, Danças Birivas. Encontrei tudo, por onde eles andavam, suas canções e vestimentas. Isso é depois de 1732 e está tudo documentado. Só havia conhecimento sobre a indumentária masculina, mas me diga se há um baile sem a presença feminina, ainda mais numa época onde talvez o baile fosse a única chance de ver uma mulher com a qual se pudesse casar. Claro que havia os vestidos delas e está tudo aí. Chula, dança dos facões, chico do porrete, fandango… só homem dançando? Como é que uma sociedade se reunia, certamente de raro em raro, sem mulheres. Hein? É inimaginável. Elas ficavam em casa? Claro que não. Levei anos para saber por onde andaram, o que cantavam, dançavam, comiam, vestiam, se recreavam, etc. Sim, desapareceram, mas há que descobrir a origem de tanta coisa que chegou a nós de outro jeito. Agora, se o crítico não lê o livro para retrucar com conhecimento, eu não posso fazer nada, só não dou bola. Eu só reproduzo.

Sul21 – E o Laçador? Como foi a história do monumento?

PC – Em 1954, São Paulo comemorava 400 anos de fundação e fez um grande evento nacional, convidando todos os estados brasileiros, inclusive o Rio Grande do Sul. E eu tinha fundado o conjunto Tropeiros da Tradição, que era um grupo de músicas e danças folclóricas e lá fomos nós representar o RS. Havia um enorme estande, um pavilhão e havia sido previsto um concurso para uma alegoria, um símbolo que falasse do estado. Cada candidato apresentava um projeto e lá estava o Antônio Caringi. Só havia quatro artistas propondo projetos. E me convidaram de surpresa para fazer parte da comissão julgadora. Lá estavam o Dante Laytano, o Moisés Vellinho e outras pessoas de destaque na época. Eu era um bagual e nem sei porque me chamaram, mas me convidaram e eu fui. E cada artista mostrou uma maquete e fez uma exposição de motivos, vendeu seu peixe. E eu fiquei por lá avaliando. Eu gostei mais do projeto do Caringi e ele venceu.

Paixão_Cortes_11Sul21 – O Sr. conhecia ele?

PC – Não. E aí me pediram para escrever um arrazoado justificando a escolha. Eu fiquei louco de medo. O que eu sabia de obras de arte? Aí, o Caringi veio me visitar em minha casa para detalhar a vestimenta do Laçador. Ele queria saber de cada laço, de cada detalhe, como fazia, como usava, etc. E eu ia explicando tudo para ele. Aí ele voltou umas três ou quatro vezes com dúvidas e eu acabei de modelo para o monumento. Ele ia lá em casa e eu ficava lá parado com ele desenhando, rabiscando. Pegava o laço assim, assado, uma chatice. Dava opções para ele, puxava o lenço para cá, para lá. Ele me perguntava se podia colocar isso, ah, isso pode; ou aquilo, aquilo não pode, porque nenhum laçador usa assim. E a estátua saiu.

Sul21 – E o fato do senhor ser um colorado de quatro costados, sendo que a torcida do Grêmio é quem usa o Laçador como um símbolo seu? Há até chaveirinho para vender com o Laçador gremista.

PC – Olha, eu sou até cônsul cultural do Inter. Apesar de o Laçador ser um símbolo de todos os gaúchos, acho que os caras nem imaginam uma coisa dessas… Meu pai foi goleiro e ponta-esquerda do Inter entre os anos 1912-17. O apelido dele era Peru e, quando criança, eu era o Peruzinho. Meu avô, avó, pai, eu, todos os filhos e netos, todos são colorados. Todo mundo é bi da América e futuro bi mundial, tchê. O mundo está dominado, está tudo dominado! (risadas)

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Sul21 – E, para terminar: no que a sua atuação na Feira diferirá dos antecessores?

PC – Ontem, eu falei com o presidente João Carneiro. A programação foi levemente alterada para agregar mais alguns eventos de cultura popular. Haverá então quatro ou cinco “momentos originais”, não tradicionalistas. São pessoas vivas que, com roupas originais, remontarão a formação do Rio Grande do Sul. Vão estar tocando se apresentando e cantando lá na feira. E eles terão momentos de saudação onde explicarão ao público o que estão representando, seja mouros ou cristãos, remontando as lutas ibéricas, as desconhecidas manifestações africanas calhambolas e também o tradicionalismo vigente nos dias atuais. Mas tudo ainda tem de ser ajustado ainda. Foi tudo muito intenso nos últimos dias, houve muito trabalho. A abertura será com matraca e não com sino. A matraca é como chamavam as pessoas no interior do estado. Não sei se somos belos ou maravilhosos, sei que somos autênticos e que ajudamos a formar o que está aí. E o pessoal da Feira está sendo sensível aos pedidos simples de um patrono um pouco diferente. (A esposa de Paixão Côrtes, Marina, diz que ele tem uma entrevista marcada com uma rádio de São José do Norte naquele minuto. Não obstante ela estar com o telefone na mão, os dois não têm pressa. Ela diz que foi contra a candidatura a Patrono da Feira.)

Marina – Dá muito trabalho cuidar dele…

PC – Ela diz isso por causa do meu marcapasso. (Sugiro que ele vá no ritmo do marcapasso. Ele dá uma gargalhada, leva-nos calma e gentilmente até a porta. No caminho, diz que ainda não almoçou. Eram 15h30.)

Obs.: Duas perguntas e respostas da entrevista foram copiadas do material escrito que Paixão Côrtes entregou ao Sul21 durante a entrevista. Uma delas é “E as moças?” e a outra foi “E o gaúchos, de onde saíram?”.

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Manhã

Manhã

É muito bom dormir carinhosamente, acordar cedo, lavar o rosto, sentar na cozinha, observar o gato circular e pedir comida, enquanto se toma café sem leite na cozinha, ouvindo Arthur Grumiaux tocar as sonatas para violino solo de Bach e se vê pela janela que, provavelmente, em algum momento, choverá hoje. Depois de mais carinhos, chegamos ao trabalho, acertamos as primeiras colunas e manchetes do dia, repassamos e cumprimos algumas ordem recebidas e concluímos que ainda nada aconteceu de maior que a cólica da estagiária. Mas que há de se recuperar.

Voltando no tempo, lembro que faço questão de lavar a louça do café, assim como não dou a menor importância à arrumação da cama. Uma cama desarrumada me é mais convidativa que uma toda lisa e abotoada. Até me irrita ver uma cama com tudo no lugar, parece que o cheiro de dormir vai embora assim que se estendem os lençóis.

No trabalho, entro no Facebook e curto a página de Mario Benedetti. Então, o robô do Facebook me propõe curtir a de Jean-Claude van Damme. Isto me tira das brumas matinais.

Claro, a Feira do Livro de Porto Alegre será a mesmice de sempre, porém, dentre as presenças internacionais, haverá duas para as quais me curvo sem restrições. São as do português Francisco José Viegas e do alemão Ingo Schulze. A nominata dos outros estrangeiros não me impressionou. Espero que fechem logo a programação nacional para que eu possa me agendar com antecedência.

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Diferentes formas de sobrevivência

.: 1 :.

O veterano Rubens Barrichello teve um grande 2009. Após quase não arranjar equipe, Rubens acabou o mundial de pilotos em terceiro lugar e em alta. Para completar, saiu da habitual passividade e reagiu ao fato de ser uma piada em todo lugar. Nesta semana, ganhou um processo contra o Google, obrigando a que o gigante retire, principalmente do Orkut, mais de trezentos falsos perfis onde Barrichello era tratado como tartaruga, chofer, etc., além de 90 comunidades ofensivas. O motivo da ação foram as reclamações dos filhos do piloto. O valor da indenização é uma piada para os padrões da Fórmula 1, US$ 500 mil, e a grana vai para instituições de caridade. Barrichello, claro, é multimilionário e só alguns brasileiros o acham incompetente.

.: 2 :.

Enquanto isso, o ex-tenista Andre Agassi escolheu outra forma de sobrevivência: o suícidio póstumo como atleta. Em sua autobiografia Open, o vencedor de oito Grand Slam confessa ter tomado regularmente a droga cristal — também conhecida como MD cristal, crystal meth ou ice. Uma vez ao ser flagrado num antidoping, mentiu, em carta por escrito, que seu auxiliar havia colocado a droga num refrigerante e a ATP acreditou ou não quis levar o caso adiante. O auxiliar que “batizara” o refri foi mandado embora e Agassi seguiu a carreira nas quadras e no cristal. Uma maravilha.

Mas é pior. Depois dessa, a ATP afrouxou o controle sobre o doping. Hoje, os tenistas apenas escrevem onde estiveram e o que tomaram. Uma piada. Rafael Nadal e Marat Safin tiveram reações bastante fortes. Nadal foi sério:

— Não entendo porque disse isso agora, já que está aposentado. É uma forma de prejudicar o esporte sem nenhum sentido. Se nesses momentos a ATP escondeu o assunto (do doping) de Agassi e puniu outros, parece uma falta de respeito com todos os esportistas. Quero acreditar e espero que nada disto esteja acontecendo agora. Acho que temos um esporte limpo e sou o primeiro a desejar isso, mesmo sem estar de acordo com a forma (em que são realizados os exames antidoping). Os trapaceiros devem ser punidos, e se Agassi trapaceou em sua época, deveria ter sido punido — disse.

Agassi disse estar triste e arrependido. Coitado.

O tenista russo Marat Safin, mantendo a habitual irreverência e ironia que me fazem admirá-lo, propôs a solução para o “problema de consciência” de Agassi.

— Ele sente culpa? Então que ele devolva os seus títulos, dinheiro e seus Grand Slams — , afirmou Safin em entrevista ao jornal francês L’Equipe. — Se ele agora é limpo e franco, poderia fazê-lo. Vocês sabe, a ATP tem uma conta bancária e ele pode fazer a restituição, basta querer — completou.

Como Safin é do meu time e não alivia, seguiu mandando bala:

— Eu não vou escrever minha biografia, não preciso de nenhum dinheiro. A questão é: por que ele fez e por que confessou após aposentar-se? — , perguntou. — O que ele quer é vender mais livros, é completamente estúpido — , criticou o russo. Safin encerrou sua carreira esta semana em Paris fazendo uma grande partida contra Juan Martin del Potro. Foi eliminado ao perder por 2 x 1.

Além do russo e do espanhol, poucos se manifestaram. Guga foi cauteloso e político.

— Eu confesso que não sei até que ponto essa notícia pode se tornar algo real — , disse. — O Agassi que conheço é um sujeito competitivo e sincero nas palavras dele. Na realidade, se comprovado, ele deve ter tentado demonstrar no seu livro momentos de sua trajetória em que enfrentou dificuldades.

Mas é ainda pior. Os médicos revelam que, em algumas circunstâncias, o cristal provoca pânico e…

Bem, Agassi afirma em seu livro que perdeu de maneira proposital para Michael Chang na semifinal do Aberto da Austrália em 1996, pois queria fugir de Boris Becker na decisão. Apesar de transparecer sempre sério e objetivo. Agassi agora diz que tinha medo de Jim Courier, Thomas Muster, Yevgeny Kafelnikov, Boris Becker (que chama de “maldito alemão”) e de Pete Sampras. Estranho. Sobre Chang, Agassi tem algumas pérolas bastante interessantes:

— Eu o odiava. Ele dava graças à Deus e atribuía suas vitórias a Deus, isso me irritava muito. Por que Deus se importaria com uma partida de tênis? E por que ele se colocaria contra mim e a favor do Chang? Isso é ridículo. Quando ele venceu Roland Garros em 1989, fiquei com vontade de vomitar. Me perguntei: “Por que logo o Chang? Por quê, entre tantos outros, logo ele foi vencer um Slam antes de mim?”

.: 3 :.

E a Feira do Livro de Porto Alegre? Por que agoniza? Ora, por sua exclusiva culpa. Há anos que este blogueiro de sete leitores diz que a Feira tornou-se uma grande livraria, que não há variedade, que a quantidade de livros iguais — se a gente pede alguma coisa diferente, os livreiros têm de encomendar (?!) — torna a Feira um espetáculo nauseante. Este ano, não comprei nenhum livro lá, até porque sei que dificilmente os livros que procuro estarão lá. Alguém encontrou na Feira o livro o recentíssimo Música Mundana de John Neschling? Alguém viu por lá a trilogia do Gaúcho a Pé de Cyro Martins naquela bela edição comemorativa ao centenário de Cyro Martins lançada no ANO PASSADO? Melhor o site da Cultura ou a Estante Virtual, né? E, de quebra, não se precisa caminhar no meio de corredores cheio de livros de vampiros e autoajuda. De bom, a Feira tem os bares. Lá é onde estão atualmente os leitores.

.: 4 :.

Cada um busca a aposentadoria que pensa merecer. Barrichello aspira a uma dignidade tardia. Agassi faz o exato contrário. Barrichello quer entrar na história de uma forma diferente do que foi sua vida; Agassi quer o desprezo, mas antes venderá livros. A Feira está em fase minguante, mas não sou nada apocalíptico a respeito. Talvez até melhore.

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Trecho de e-mail recebido de Mariângela Grando:

A presidente do Conselho Estadual de Cultura escreveu:

…me parece que, finalmente, a inteligenzia começa a dar-se conta dos estragos que estão sendo cometidos na pasta da Cultura. Hoje aprovamos a Feira do Livro, e até reabilitou-se algumas glosas ao orçamento, que haviam sido feitas pelo SAT (setor de análise técnica) da LIC/SEDAC…

A melhor notícia da semana, quiçá do mês, João Carneiro.

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Uma perspectiva curiosa da Feira do Livro de Porto Alegre

Nossa querida Feira do Livro – que já passou dos 50 anos – é uma grande reunião de livreiros e instituições em uma praça aberta no centro de Porto Alegre. Vende-se livros, ministram-se palestras, há uma área para a literatura infantil (com livrarias especializadas e teatro), há oficinas de literatura, há as empresas de comunicação que transferem seus estúdios para lá e há o coração da cidade, que segue pulsando não apenas de acordo com a pressa e a violência, mas também pela literatura. Nossa Feira é incomum sob vários aspectos: é gratuita, é realizada em praça aberta, é visitada por milhões de pessoas – não é exagero – e é quase impossível caminhar entre as barracas nos finais de tarde e de semana. Os amigos estão todos lá, conheço gente que vai todos os dias da Feira à Praça da Alfândega, no centro da cidade. Ela começa sempre na última sexta-feira de outubro e acaba por volta do dia 15 de novembro. Este ano vai de 31/10 a 16/11.

Há coisas ruins nela: nos últimos anos, as barracas da Feira tornaram-se uma imensa livraria convencional. Não há diversidade, todos oferecem as mesmices mais vendidas, deixando as novidades escondidas. A Feira que vende livros novos é uma megastore meio nauseante. Vou dar um exemplo: no ano passado, procurei o premiado Nove Noites de Bernardo Carvalho, publicado pela Companhia das Letras. Livro novo, né? Perguntei em mais de 20 barracas e nada. Enchi o saco. Ou seja, todos vendem as mesmas coisas e acabei na Internet. Já Paulo Coelho e nossos best-sellers gaúchos estão em todo lugar. É monótono. Talvez as únicas exceções sejam a Livraria Bamboletras e a Ventura Livros. O resto é shopping. Mas há os sebos e há os tradicionais balaios de saldos e encalhes, são eles que salvam nossa vida e garantem nossa presença na área de vendas. Há que procurar, mas vale a pena.

Nos últimos anos, passei a participar dos eventos periféricos. São carradas de seminários gratuitos com escritores. Sentamo-nos confortavelmente nos bons salões do Santander Cultural, do Clube do Comércio e do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo a fim de ouvir os autores. Ao final, podemos fazer perguntas e debater a obra, a vida, a política, o futebol, o amor, outras obras, qualquer coisa. Dependendo do autor, claro, as pessoas saem eufóricas destes encontros. Nos últimos anos, estão sendo apresentados ciclos também gratuitos de filmes baseados em livros em salas próximas (“É tudo free!”, como diria Raul Seixas) e a parte internacional da Feira melhorou muito, com os argentinos e espanhóis entrando com livros e preços bem legais. Mas, quando coloquei lá em cima meu título sobre uma determinada perspectiva, não referia-me às possibilidades culturais e sim a outras, como explico abaixo.

O título diz respeito a um caso pessoal. Alguns meses depois de minha separação, em 2001, eu ainda estava deprimidíssimo e chegou a época da Feira do Livro. Não morava mais com meus filhos e tinha um enorme tempo livre ao qual estava desacostumado — ou acostumado a utilizá-lo apenas para me desesperar ainda mais. Os amigos estavam meio sumidos pois eu sumira. Mas também sumiram porque é normal sumir nestas circunstâncias: sabe-se que o separado contrai uma rara espécie de hanseníase contagiosa. Ele(a) causa medo, algo do gênero se-aconteceu-a-ele(a)-pode-acontecer-a-mim-e-eu-não-quero. Porém, durante a Feira consegui decidi (aleluia!) que ia voltar a aparecer para as pessoas. Afinal, era a Feira! Então ficava na frente do pavilhão de autógrafos por volta das 18h. Sim, ficava ali, como uma prostituta fazendo seu ponto. O extraordinário é que TODOS OS DIAS em que lá fui, surgiram amigos — velhos, novos ou antiqüíssimos — com os quais acabei jantando ou visitando depois. Eles sempre apareceram. Estes amigos traziam com eles outros e, quando me dei conta, estava com uma popularidade tonitruante, se comparada com a imediatamente anterior. Meu telefone voltou a tocar e pude, com mais conforto, fazer de conta que a vida estava voltando ao normal.

Certas experiências acabam por se oferecer gratuitamente aos separados, quando estes não estão inteiramente paralisados pela depressão. Não, não indico a separação como remédio para ninguém, mesmo que se queira fazer um treinamento intensivo de realidade. Ao contrário, admiro muitíssimo mais os casais que se separam por um tempo e depois voltam a seus casamentos em outros termos. É uma atitude de fé no outro e a remodelação deve ser “ecológica para a alma”.

As idas à Feira custou-me menos do que qualquer psiquiatra, menos que qualquer antidepressivo… Foi um período de recuperação e inclusão de novos amigos. Um bom período. A propósito, comprei alguns livros nos balaios, claro…

Ah, e há promessas de cervejas no bar no MARGS.

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Mônica Leal ameaça a Feira do Livro

A repelente Mônica Leal recebeu farta curtura desde o berço. Seu papai, Pedro Américo Leal, costumava berrar no rádio, na televisão e certamente em casa, ofensas àqueles comunistas que fugiam dos militares “escondendo-se debaixo da cama”. Convocando-os publicamente a um debate que nunca poderia sustentar com seu pequeno cérebro, em verdade convidava-os à tortura. Mas Mônica é hoje a primeira amiga da repulsiva governadora e acabou na Secretaria da Cultura… Não demorou a arrumar confusão. Numa secretaria onde parte dos recursos são “captados”, era óbvio que a cloacal secretária logo arranjaria uma sarna. E era óbvio que se sujaria por pouco, fazendo cocô no meio da sala ou, pior, mijando em meio a nossos livros. Havia algum na casa de Pedro Américo?

A Feira do Livro tem um orçamento de 2,4 milhões e já teve sua primeira requisição de recursos via LIC negada em 28 de agosto. Eram R$ 700 mil. Havia — surpresa? — incongruências, erros de datas e os critérios de pagamentos de cachês era obscuro. Virão os R$ 850 mil aprovados pela Lei Rouanet, federal, onde a latrinária secretária não consegue pôr as mãos. Enquanto isso, a Câmara Riograndense do Livro está resolvendo o que sai da programação inicial de Feira, pois o dinheiro da LIC… o dinheiro da LIC… não servirá à Feira de 2008 e nem aos chás das amigas.

Será uma Feira sem precedentes.


Enquanto a escultura cai em desespero, as amigas tentam explicar as obras a uma visitante no MARGS (destaque para a insinuante cruzada de pernas da governadora)

Upgrade: vejam o estado do site da Feira. Notem seus (poucos) detalhes.

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Feira do Livro de Porto Alegre: Charles Kiefer é o patrono

Sem dúvida, a melhor escolha. Os outros quatro da lista final eram Carlos Urbim, Jane Tutikian, José Clemente Pozenato e Juremir Machado da Silva. Num estado que se ufana de ter muitos autores, mesmo que a esmagadora maioria nunca devesse ter escrito uma linha e nem tenha a compreensão interna dos motivos que os levam a nos torturar com seus escritos, Kiefer é uma cara de trinta livros de vários gêneros, que escreve muito bem e que tem uma oficina de literatura onde se empenha-se e incentiva a formação de novos autores.

Enfim, voltamos a ter um escritor de ampla cultura como patrono. (Já tivemos outro assim? Não lembro, mas espero que sim!) Além de sua produção literária, Charles Kiefer é um sujeito que pode sair por aí falando sobre Shostakovich e Tchékhov, Raymond Carver e Guimarães Rosa, sempre com fluência, amor pelas coisas e vontade que as pessoas se juntem a ele. Uma pessoa rara e uma escolha mais ainda, pois ele — um cara de esquerda e dono de humor bastante ácido — não me parece ser dado à compra de simpatias representativas de canais competentes. Uma boa surpresa.

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