Adam e Evelyn, de Ingo Schulze

Adam e Evelyn, de Ingo Schulze

Um bom livro da finada CosacNaify.

Quando Adam e Evelyn inicia, estamos em 1989 em algum lugar da Alemanha Oriental. Adam é um cara de uns 30 anos que ganha a vida como alfaiate. Muito bom em seu ofício, deixa deslumbrantes mulheres comuns. É considerado por elas um artista e isso lhe traz uma satisfação tranquila. Vive satisfeito.

Sua namorada, Evelyn, tem aspirações mais vagas e acaba de demitir-se do local onde era garçonete. Eles talvez estejam apaixonados, mas Evelyn pega Adam literalmente sem calças, aceitando agradecimentos excessivos de uma cliente. Ela faz as malas e some.

A sonhada viagem de férias do casal ao paradisíaco lago Ballaton, na Hungria, cai por terra, mas eles acabam empreendendo a jornada ao país vizinho separadamente. Evelyn pega carona no Passat vermelho de um amigo da Alemanha Ocidental, enquanto Adam os segue em seu velho carro. A empreitada acaba tomando dimensões maiores quando as fronteiras da Hungria se abrem para o Ocidente e o muro de Berlim cai. Ingo Schulze cria aqui uma bonita história de amor encenada nos últimos suspiros da República Democrática Alemã e acompanha a entrada traumática deste casal em crise num mundo totalmente novo.

O que Adam empreende não é bem uma perseguição, porque ele não é nada agressivo nem insistente, apenas fica por ali pois a quer de volta e a negativa dela não é assim tão definitiva.

Na Hungria, eles estão indo para uma reconstrução bastante espetacular.

Durante a colorida viagem, ambos atraem amigos — ou admiradores. Evelyn inicia amizade com um cara chamado Michael (o dono do Passat), um sujeito esperto que Adam odeia. Michael quer Evelyn, que falsamente protesta que nada poderia estar mais longe da verdade. E há uma garota chamada Katja que faz amizade com Adam.

Ambos viajam carregados de coisas como mapas, passaportes de um país em extinção e, curiosamente, uma tartaruga. Eles se esforçam para obter os documentos para entrar na Hungria, mas esses documentos não são necessários. “Eles abriram a fronteira, algumas centenas de pessoas correram para lá e foram embora”, diz Katja. Aliás, Katja já arriscou a vida tentando atravessar o Danúbio a nado, só que aqui estamos quase no terreno da comédia romântica, então não há nada trágico na tentativa. A verdade é que ninguém sabe qual fronteira é melhor atravessar ou para onde ir. Só Adam quer voltar, os outros aspiram a doce vida ocidental.

Enquanto isso, Adam e Evelyn entram em intermináveis ​​sessões de discussão. Quem é mais infiel? Mais sério? Mais divertido? Mais atrativo? Eles ficam em pousadas e com amigos aqui e ali. Lá pelo meio do livro notamos que eles realmente não querem ir para casa, nem têm mais certeza de onde fica sua verdadeira casa.

Adam voltará a ter uma carreira satisfatória? De que serve um alfaiate no Ocidente?

A história é ótima, com muitos diálogos. Porém, por detrás do ritmo alegre se encontram vidas sem rumo. É clara a intenção de Schulze de nos mostrar que Adam e Evelyn são como Adão e Eva de um novo mundo. Ele até encontra uma Bíblia num quarto de hotel e lê para ela a cena da maçã, da serpente, de Deus, etc. Ela fica pasma de como um adulto pode acreditar naquela baboseira, mas Schulze usa e abusa da história como metáfora.

Bom e despretensioso livro.

(Dizem que a obra-prima do autor é Vidas Novas, que também foi publicado pela defunta CosacNaify).

Manhã

Manhã

É muito bom dormir carinhosamente, acordar cedo, lavar o rosto, sentar na cozinha, observar o gato circular e pedir comida, enquanto se toma café sem leite na cozinha, ouvindo Arthur Grumiaux tocar as sonatas para violino solo de Bach e se vê pela janela que, provavelmente, em algum momento, choverá hoje. Depois de mais carinhos, chegamos ao trabalho, acertamos as primeiras colunas e manchetes do dia, repassamos e cumprimos algumas ordem recebidas e concluímos que ainda nada aconteceu de maior que a cólica da estagiária. Mas que há de se recuperar.

Voltando no tempo, lembro que faço questão de lavar a louça do café, assim como não dou a menor importância à arrumação da cama. Uma cama desarrumada me é mais convidativa que uma toda lisa e abotoada. Até me irrita ver uma cama com tudo no lugar, parece que o cheiro de dormir vai embora assim que se estendem os lençóis.

No trabalho, entro no Facebook e curto a página de Mario Benedetti. Então, o robô do Facebook me propõe curtir a de Jean-Claude van Damme. Isto me tira das brumas matinais.

Claro, a Feira do Livro de Porto Alegre será a mesmice de sempre, porém, dentre as presenças internacionais, haverá duas para as quais me curvo sem restrições. São as do português Francisco José Viegas e do alemão Ingo Schulze. A nominata dos outros estrangeiros não me impressionou. Espero que fechem logo a programação nacional para que eu possa me agendar com antecedência.

Sabedoria?

Fiquei até triste já que costumo ler as introduções e até (pasmem!) dou uma olhada, apenas uma passada de olhos, pelos rodapés. Agora, quando o rodapé invade outra página, nunca leio. Questão de princípios. Não aceito a falta de classe do sujeito que não consegue inserir citações com elegância em seu próprio texto. Já os rodapés de traduções podem ser muito interessantes, úteis e divertidos, principalmente se forem de Marcelo Backes e ainda mais se forem as do livro Vidas Novas,de Ingo Schulze.

Roubado daqui.

Entrevista com Ingo Schulze

Edney Silvestre é um cara esperto. Tentou conduzir as primeiras respostas, mas como Ingo Schulze não foi pelo caminho sugerido, tirou o time e acabou fazendo uma boa entrevista. Ninguém vai acreditar, mas para mim foi uma surpresa ver a participação ativa de meu grande amigo Marcelo Backes na coisa. O final da entrevista… Só na Alemanha, Ingo!