Ospa termina o ano com show de Rachel Barton Pine em excelente concerto

Ospa termina o ano com show de Rachel Barton Pine em excelente concerto
Foto: Giovanna Pozzer
Foto: Giovanna Pozzer

Apenas isso: o concerto de ontem à noite era de presença obrigatória. Havia a presença da grande violinista Rachel Barton Pine interpretando obras que talvez não fossem as melhores de seu vasto repertório, mas, pô, lá estava ela, uma violinista maior, e com seu Guarnieri.

Rachel Barton Pine diz que só lê sobre música, que só se interessa por música. E que sempre foi assim. Uma vez, seus pais tentaram desviá-la para outros trabalhos manuais e o resultado foi que só saiam violinos de suas agulhas de crochê. Na infância, às vezes não tinha luz em casa, pois se esta fosse paga, talvez faltasse comida. O transporte também era complicado. Depois, quando ela se tornou uma estrela ascendente, a dúvida era entre comprar partituras, cordas para o instrumento ou vestidos para os concertos. Um dia, o vestido e o transporte pregaram-lhe uma peça. O vestido ficou preso num trem do metrô e ela foi arrastada por 200 metros. Ficaram-lhe sequelas, mas ela não faz drama, apenas diz, toda sorridente: “Foi só mais um obstáculo”.

Ela esteve entre nós. O marido e o filho pequeno acompanharam o concerto e o caso das malas deles todos. As malas foram perdidas em São Paulo no domingo. Parece que lhes devolveram os pertences só segunda-feira à noite. Outro obstáculo. Ela achou graça. Não sei o resto da família.

RBP também disse que não há música quase afinada. Que é como a gravidez. Ou se está afinado ou desafinado. É como um bit qualquer do teu computador, caro leitor — ele está ligado ou desligado. Simples.

O concerto iniciou com o chatinho inglês Vaughan Williams, mais exatamente com The Lark Ascending (O Voo da Cotovia). A música foi inspirada por um enorme poema homônimo de George Meredith. São 122 linhas. A cotovia estreou em uma versão para violino + piano em 1920. A versão para violino + orquestra é do ano seguinte. O arranjo orquestral é mais famoso e tocado. Trata-se de uma das peças mais populares do repertório clássico entre os ouvintes britânicos. Ouvi alguns músicos de Ospa dizerem que tratava-se um obra precursora do new age. Olha, têm razão. É mais ou menos isso: um solo de violino com ornamentações, construindo um música nostálgica e folclórica, estática e extática, com maravilhosa interpretação de Barton Pine.

A Fantasia Carmen, de Pablo Sarasate, é por demais conhecida e popular. São as principais melodias da Carmen de Bizet em versão ultra-virtuosística e escabelada. Como música, pode ser um lixo, mas, como dissemos lá em cima, havia Rachel Barton Pine. Sua interpretação foi extraordinária, extraordinária e estimulante, extraordinária, estimulante e feliz e perfeita e inesquecível. Os alunos de violino, presentes comigo nas primeiras filas da reitoria da Ufrgs, olhavam encantados para a violinista que esmerilhava seu instrumento na frente de todos. Um show. Porém, para você, meu cético leitor que já está pensando numa demonstração vazia de habilidade, digo que ali tinha embutida uma interpretação diferente da habitual — e muito superior. Ou seja, havia música onde não se esperava. Muita música.

Nos bis, Paganini — com um final em estilo trash metal — e um belo arranjo de Barton Pine para diversos temas de Piazzolla.

Tive medo da Morte e Transfiguração, de Richard Strauss. Ou as cordas da Ospa iam se deprimir após RBP ou iam dar uma resposta. E deram. Olha, tocaram muito, demais mesmo. O poema sinfônico de Strauss é um lindíssimo dramalhão fin de siècle em quatro movimentos. Como quase sempre, Strauss é programático aqui. Desta forma, a obra descreve a morte de um artista. Conforme vai agonizando, pensamentos da sua vida passam por sua cabeça: a inocência da infância, os problemas da vida adulta, as conquistas, fracassos e, no fim, a transfiguração — uma passagem belíssima e cheia de anjinhos, baseada num motivo que se repete cada vez com maior intensidade). Música complicada e exigente que a Ospa realizou à perfeição sob a direção do bom uruguaio Nicolás Pasquet.

E, infelizmente, aqui acabam os Concertos Oficiais de 2013. Apesar da Ospa estar às traças e ser jogada de um lugar para outro como um cachorro indesejado, foi um bom ano artístico. Pergunte-me como isto aconteceu e eu vou responder que há grandes profissionais na orquestra. Só pode, não há outro jeito.

Que 2014 seja ainda melhor!

Foto: Giovanna Pozzer
Foto: Giovanna Pozzer

Programa:
Ralph Vaughan Williams – The Lark Ascending (O Voo da Cotovia)
Pablo de Sarasate – Fantasia Carmen
Richard Strauss – Morte e Transfiguração
Regente: Nicolás Pasquet
Solista: Rachel Barton Pine (violino)

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Três vezes Brahms: o Concerto da OSPA ontem à noite foi memorável e teve a presença de Romy Schneider

Aos colegas da OSPA.

Quero convidá-los para se divertirem nessa noite de BRAHMS. Apesar dos pesares somos músicos, é isso que amamos fazer, uns mais, outros menos, mas é o que amamos fazer, Música. E quando essa música está aliada a um bom maestro e uma excelente jovem solista, só nos resta uma coisa, nos divertir em tempos de luta por melhores condições de trabalho.

Israel Oliveira, trompista da OSPA, antes do concerto, no Facebook

Querem ouvir músicos felizes ? É só deixá-los tocar Brahms. Três vezes em um único dia é prenúncio de grande concerto.

Augusto Maurer, clarinetista da OSPA, antes do concerto, no Facebook

O programa de ontem, 6 de setembro, era este:

Johannes Brahms – Abertura Trágica, Op. 81
Johannes Brahms – Concerto para Violino e Orquestra, Op. 77
Johannes Brahms – Sinfonia Nº 3, Op. 90

A solista de violino foi a espantosa (e bela) Anna Matz — sósia mais magra e alta de Romy Schneider — e o regente foi o uruguaio Nicolás Pasquet.

Terminadas as apresentações, tenho que dizer que o concerto foi memorável, inesquecível. As interpretações da solista e da orquestra no Concerto e, depois da orquestra na Sinfonia, foram de cair o queixo. Grande regente, o Sr. Nicolás Pasquet.  Foi uma noite para a gente sair de lá feliz, mesmo que tenha sido no péssimo Auditório Dante Barone, mesmo que saibamos do local inadequado para ensaiar, mesmo com os barulhos estranhos que vinham do vestíbulo, mesmo com uma acústica de merda, a orquestra resiste aos maus tratos estaduais e federais. Afinal, a ministra Ana de Hollanda veio à Porto Alegre fazer o quê? Passear e prometer? Chega, né? Quanto mais batem, mais esta orquestra cresce, mas tudo tem limite.

Agora notem como a extraordinária solista de apenas 20 anos lembra Romy Schneider. Vão dizer que não?

Uma era austríaca, a outra é alemã
Anna e Romy nos dão uma olhada sobre o ombro
Uma lê na piscina, a outra, na sala de concerto
Ah, vai dizer que não são parecidas?
Romy Schneider, durante uma aula de violino para Anna Matz, dá uma pitadinha

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