Se jogar direitinho, chega à final

É óbvio, é claro. É só jogar direitinho hoje às 14h. O Mazembe é perigoso, mas também é daqueles times que correm de forma desordenada, numa agitação quase caótica, chegando atrasado nas bolas e cometendo muitas faltas. São rápidos, chutam muito e bem e o envelhecido Índio pode sofrer com a correria deles. Porém, insisto, precisamos apenas fazer nosso jogo.

O futebol mudou. O gold standard voltou a ser o estilo Rinus Michels-Cruyff-Rijkaard-van Gaal-Guardiola-Barcelona de fazer a bola rodar e rodar pelo campo até que se abra uma brecha. Nem todos têm um Xavi para fazer a abertura das portas, mas a coisa funciona mesmo conosco. O Inter talvez seja o time brasileiro com maior aptidão para fazer a bola ir de lá para cá, com aquele falso desinteresse de quem pega o dinheiro sem contar, mas é preciso ter uma calma e categoria imensas para isso e calma é hoje tudo o que não sinto. Porque hoje é o “Dia de se livrar do fiasco”, muito mais ameaçador do que o sábado — o “Dia de tentar ser bi mundial”. Lembro de um ditador da Indonésia (Sukarno?) que nomeava os anos: “este é o ano-em-que-deixaremos-de-passar-fome”, “este é o ano-de-desenvolver-a-indústria, aquele é o “ano-de-viver-perigosamente”, ou seja, de eliminar fisicamente a oposição… Ah, os gremistas.

Eles estão mais assustados ainda. Se o Inter for campeão, passamos à frente deles em títulos internacionais de peso, engatamos uma quinta, ganhamos a Recopa do Independiente no meio do ano e adeus tia Chica. A decadência deles em relação a nós neste século ficará muito clara, clara demais, ofuscante, como sempre desejamos… Para completar, eles ontem perderam a primeira posição no ranking da CBF com o reconhecimento dos campeonatos nacionais pré-1971. O novo líder é o Santos, seguido do Palmeiras, e só a RBS poderá criar uma forma de salvar o tricolor, talvez com um “Ranking Monumental”.

Nossa chefe aqui no Sul21 não nos liberou do trabalho, mas haverá uma TV na redação. Até lá, tenho muitas coisas para fazer e, confesso, não terei muito tempo para exercitar meu nervosismo. Melhor assim. O ócio é um algoz torturante, nunca gostei muito dele.

Agora, leiam abaixo como foi a terrível semifinal de 2006 (post de 14 de dezembro de 2006):

Com Alguma Sorte

Para quem não sabe, o dono deste blog está assoberbado de trabalho – sim, aquele que garante sua sobrevivência com razoável dignidade – e, secundariamente, mobilizado pelo inédito Campeonato Mundial que seu time, o Internacional, disputa esta semana no Japão. Calma, mesmo assim, teremos o “Porque hoje é sábado”.

Pois meu dia de ontem começou com a visão de uma Porto Alegre parada, assistindo ao quase-fiasco do Inter contra o Al Ahly. Jogamos muito mal. Os egípcios exerceram forte marcação e nosso time sentiu muito. Alexandre Pato e Iarley ficaram isolados na frente, brigando inutilmente contra os três bons zagueiros adversários, sem o auxílio de Fernandão e Alex, que travavam outra batalha inglória mais atrás. Com todos bem marcados, as tarefas de armação acabavam ficando para os dois volantes de contenção Edinho e Wellington Monteiro, eficientes em suas funções defensivas mas péssimos criadores.

Ora, é sabido que, para jogar futebol, é adequado ter a posse da bola. Os egípcios marcavam bem, recuperavam a bola e então aparecia o outro grande problema. Nosso meio de campo, formado por Edinho, Wellington, Fernandão e Alex, apresentava enormes deficiências de marcação. Alex está fora de forma – é óbvio que deveria jogar Vargas em seu lugar – e Fernandão está desacostumado à posição, pois passou o ano jogando como primeiro e segundo atacante. Então, recuperar a bola era um parto. Não sei como ganhamos o jogo. Ou sei? Foi com muita sorte, com um zagueiro do Al Ahly atrasando uma bola no pé do Pato e com outro um gol de Luís Adriano, um sujeito que nunca tinha feito nada de positivo no time titular e que, mesmo depois do gol, seguiu no padrão de suas péssimas atuações.

Já contra o Barcelona, os problemas serão outros. O Barça joga mais, marca menos e é provável que nosso jogo apareça. Mas, é claro, me preocupa a recuperação da bola. À exceção de Ronaldinho, o Barcelona joga quase sem drilbles, tocando a bola de primeira e com rapidez, em ação coletiva. Se nossa marcação no meio de campo estiver tão deficiente quanto esteve no primeiro jogo, nem precisamos entrar em campo: é derrota certa. E precisamos atacar (ou contra-atacar com perigo), pois não podemos só ficar lá atrás com o Barcelona tranqüilo, rondando nossa área.

Sugiro a todos uma olhada na última Trivela. Há um artigo de Ubiratan Leal que mostra como José Mourinho (Chelsea) e Fabio Capello (Real Madrid) anularam Ronaldinho e venceram seus últimos jogos contra o Barça. Os dois conseguiram atacar e anular Ronaldinho. Concordo que ambos têm times superiores ao do Inter, mas há, embutida no artigo, uma importante lição.

Providência 1 (Ronaldinho): um lateral dedicado à marcação com um volante na sobra. Ceará e Edinho? Ceará e WM?

Providência 2 (a ajuda à Ronaldinho): ambos colocaram atacantes pelo lado direito de ataque – o Chesea botou o Shevchenko e o Real, Robinho – para que os laterais esquerdos Silvinho e Gio (Giovanni von Bronckhorst) não pudessem auxiliá-lo com tranqüilidade.

Providência 3 (forçar o Barça a se defender): ter dois armadores ativos no meio de campo. Como o Barça atua com apenas um volante (Edmílson), isto obrigará Iniesta e Deco a ajudarem na marcação, deixando o ataque dos catalães desconectado do resto do time.

Essas providências – e mais umas poucas outras – fizeram o Barça desaparecer. Mas para que o volante adversário tenha diversão, Fernandão e Alex terão que jogar… e muito! Eu retiraria Alex ou Iarley do time para fazer Vargas entrar. É incrível a consistência que o colombiano dá a nosso meio de campo. Sua presença foi fortemente sentida pelo Al Ahly no final do jogo de quarta-feira. Sua experiência de anos no Boca Juniors ensinou-o a não se omitir, a valorizar o passe e a complicar luta pelo meio de campo, seja jogando bola, seja cometendo faltas. É um jogador precioso que não conta com a simpatia do muitas vezes tolo Abel Braga, um técnico que dá boa dinãmica ao time mas que tem o hábito de fazer escolhas baseadas nas suas preferências pessoais.

Outro fator de preocupação é a má forma física de Alexandre Pato. Logo após fazer embaixadas com o ombro (ver aqui), ele sentiu cãibras, o que já havia ocorrido no jogo contra o Palmeiras. Ou seja, seu prazo de validade atual é curto e ele só joga até os 15 minutos do segundo tempo.

Tenho certeza de que podemos fazer uma partida bem melhor do que a que se viu ontem e que podemos ganhar. Porém, é óbvio que o favoritismo é catalão.

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Revendo Laranja Mecânica

Neste final de semana, minha filha pediu para conhecer o filme Laranja Mecânica (A Clockwork Orange, 1971), de Stanley Kubrick. Esta é uma das delícias da paternidade — pode rever coisas acompanhado daquele olhar juvenil que perdemos. Ela adorou o filme. A curiosidade é que neste tempo de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) e de tentar mudar as políticas de enfrentamento ao tráfico e ao crime, o filme está mais atual do que nunca, apesar do seu visual estranho e dos escritores do futuro usarem máquinas de escrever…

Não vou descrever o filme, pois acho que todos os que passam por aqui sabem de tudo: da violência estilizada, da prisão, do tratamento Ludovico e da primeira e segunda curas.

A Claudia fez uma rápida pesquisa sobre as circunstâncias em que foi filmada aquela maravilha e demos boas risadas com sua leitura. As filmagens foram o que esperávamos. Copio abaixo, de forma algo editada, algumas observações deliciosas da Wikipedia:

Stanley Kubrick e o objeto de arte futurista que será fatal para a mulher dos gatos

  • Durante a cena em que Alex (Malcolm McDowell) é submetido ao tratamento Ludovico, o ator arranhou a córnea e ficou temporariamente cego. Revendo as cenas não é de surpreender. O cara recebe garras de metal para manter os olhos abertos.
  • O médico que acompanha Alex durante o tratamento no filme era realmente médico e estava lá por motivos de segurança para o protagonista.
  • Malcolm também teve costelas quebradas durante a filmagem da cena de humilhação após o tratamento.
  • Malcolm quase se afogou de verdade devido a uma falha no equipamento que o ajudaria a respirar, na cena em que os seus ex-“droogies” — naquele momento já no cargo de policiais — o encontram e o submetem a uma tortura em uma banheira.
  • Stanley Kubrick propositalmente cometeu alguns erros de continuidade em Laranja Mecânica. Os pratos em cima das mesa trocam de posição e  o nível de vinho nas garrafas muda em diversas tomadas, com a intenção de causar desorientação ao espectador.
  • O filme foi retirado de cartaz no Reino Unido a mando de Stanley Kubrick. Irritado com as críticas recebidas, de que Laranja Mecânica seria muito violento, Kubrick declarou que o filme apenas seria exibido lá após sua morte, ocorrida em 1999.
  • A linguagem utilizada por Alex, chamada de nadsat, foi inventada pelo autor Anthony Burgess, que misturou palavras em inglês, em russo e gírias.
  • A cobra foi colocada nas filmagens após o diretor Stanley Kubrick descobrir que Malcolm McDowell tinha medo delas.
  • A música de Beethoven que perpassa todo o filme foi executada no revolucionário “sintetizador” de Walter Carlos. Depois, famoso, o moço mudou de sexo, rebatizando-se como Wendy Carlos.
  • No livro, o sobrenome de Alex não é revelado em momento algum. Comenta-se que DeLarge seja uma referência a um momento no livro em que Alex chama a si mesmo de “Alexander the Large”.
  • O orçamento total do filme foi de apenas US$ 2 milhões.
  • Stanley Kubrick certa vez declarou que, se não pudesse contar com Malcolm McDowell, provavelmente não teria feito Laranja Mecânica.
  • A canção Singing in the Rain, cantada por Alex durante a cena em que ele e seus colegas violentam uma mulher na frente de seu marido, só está no filme porque esta era a única música que Malcolm McDowell sabia cantar por inteiro.
  • O filme foi proibido no Brasil na época do lançamento, mas liberado depois de alguns anos com a condição de que a genitália da mulher na cena de estupro fosse encoberta por meio de manchas pretas sobrepostas à cena. Quem assistiu ao filme naquela época pôde perceber que tais “manchas pretas” nem sempre acompanhavam a vagina com os pêlos pubianos. Isso sem contar que a censura era de 18 anos. Tais acontecimentos no Brasil serviram para a que a oposição ao governo militar ridicularizasse a censura.
  • Durante a Copa do Mundo de 1974, disputada na Alemanha Ocidental, graças ao seu futebol envolvente, revolucionário e taticamente perfeito, a Seleção Holandesa de Futebol foi batizada pelos jornalistas europeus de Laranja Mecânica. A “Laranja” faz referência também ao vistoso equipamento utilizado por essa lendária seleção de futebol, comandada por Johan Cruijff e Rinus Michels.
  • Na cena em que Alex está em uma loja de discos, pode-se notar que um dos discos que está na prateleira da loja, na fileira central, é o da trilha sonora do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, além do Magical Mystery Tour dos Beatles e Atom Heart Mother do Pink Floyd.
  • A banda Sepultura lançou, no início de 2009, o álbum A-lex, inspirado inteiramente no livro. Inclusive todos os títulos das músicas têm relação com a obra de Anthony Burgess.

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