Sou uma pessoa que quase só ouve música erudita mas que não vê o resto do mundo com superioridade, coisa tão comum entre meus pares… Ouvi rock somente até a adolescência e ainda tenho, em vinil, um bom acervo de “dinossauros”, o qual muitas vezes provoca ohs e uaus nos amigos de meu filho. Ele, Bernardo, hoje com 18 anos, costumava reclamar de mim por ter abandonado o rock que ainda ama e queria que eu voltasse à minha adolescência pondo só Beatles, Led Zeppelin, Deep Purple, Rolling Stones e mesmo o medonho Pink Floyd pós-Dark Side no CD player — ele é um voraz consumidor de música e ficava carente entre seus muitos amigos por não encontrar, entre eles, outros que fossem tão “cultos” musicalmente.
Eu ficava pasmo de ser tão atualizado. Afinal, Bernardo e seus amigos ouviam embevecidos as novidades do tio Milton: Quadrophenia (1973) do Who, Fragile (1972) do Yes, A Night at the Opera (1976?) do Queen, e mais uns 100 bolachões inéditos para a petizada.
A cena era assim. Em pleno 2000 e alguma coisa, Bernardo se atirava sobre meus velhos vinis e desencavava uns Alice Cooper, uns The Who (legal!), uns Queen (bom), Gentle Giant (que voz horrorosa a daquele cantor) e até Slade. Por outro lado, sou casado com uma mulher que ama as óperas, principalmente as de Mozart e Rossini, e que tem baixa tolerância aos grupos de som mais agressivo e que começa a berrar (sério!) quando pressente a iminência de Pink Floyd, pois foi traumatizada por seu irmão que ouvia The Wall cinco vezes ao dia — era deprimido, claro. (A propósito, comprei The Wall no dia em que foi lançado no Brasil e o vendi com lucro dois dias depois. Era muita adolescência). E, para piorar, ouço insistente a voz de meu pai que sempre me dizia que era importante não perder a contemporaneidade.
O único acordo possível seria o de ficar ouvindo Tom Jobim, Chico Buarque, Elis Regina, bebop e esquecer meu pai. Neste caso, todos ficariam felizes, mas o espectro se limitaria muito e estaríamos definitivamente fora das paixões de uns e outros. Ou seja, não dá.
Sou um cara de gosto musical eclético e até desejo ser tolerante, então só fecho a porta para as músicas absolutamente imbecis — ou seja, quase tudo –, além de boleros, alguns tangos cantados e reggaes, que não suporto. Por exemplo, ontem, fiquei bem feliz ouvindo com a Claudia a ópera L´Italiana in Algeri de Rossini. Porém, para aumentar a confusão sonora da casa, nos últimos dias fiz pesados esforços com roqueiros contemporâneos tais como Beck, Radiohead, Oasis e outros. Estes três são artistas ou grupos de produção muito boa e civilizada, porém… como são convencionais! Será que não há mais para onde ir? Cadê a vanguarda? Será que a indústria a sufocou?
Beck escreve as mesmas letras de gosto duvidoso que quase sempre caracterizaram o rock, mas é um grande inventor de melodias. Já o Radiohead se preocupa demais com a estrutura dos arranjos e perde a fluência. É um bom grupo que tem o problema de repetir-se ad nauseaum. O Oasis é um epígono dos Beatles e do T. Rex, mas quem se importa? Acho que a canção Cigarettes and Alcohol, do CD Definitely Maybe, é o máximo que se pode exigir de um rock — poucas vezes me deparei com uma letra que combinasse tão bem com música e interpretação.
Mas, olha, não adianta, todos eles parecem um pouco aprendizes (podemos incluir Pearl Jam aí também). Não há no horizonte nada parecido com Beatles, Stones, Led, Who, etc. E não apenas uma questão de postura, trata-se de qualidade musical mesmo. Escrevi toda esta coisa confusa porque ontem recebi o seguinte torpedo do Bernardo:
Tchê, descobri um puta álbum dos Stones, Sticky Fingers. Tu deve conhecer.
Imagina se não! Tal fato foi uma espécie de involução… (*) De resto, ele está descobrindo Charlie Mingus (Aleluia!), Ligeti (três Ave-Marias), Shostakovich (dez Pais-Nossos) e, compreensivelmente, não sabe onde botar Wynton Marsalis na história do jazz. Miles Davis sabia bem onde enfiá-lo. Mas, já que o assunto é rock, volto ao tema para finalizar: chego à conclusão de que os dinossauros ainda dominam esta área do mundo. O céu do rock está lotado de pterodáctilos.
(*) Ato falho de origem controlada.
Puxa Milton, que legal. Deve ser muito bom assistir esse processo de “aculturamento” de uma maneira tão natural.
Nem preciso dizer pra vc ter paciência com o Bernardo. Ele chega lá. Ainda mais com todo esse repertório que tem em casa.
Uma curiosidade: como foi sua passagem do rock ao erudito? Qual foi o rito de passagem? Desconfio que tem jazz no meio dessa estória, mas enfim, conta aí pra gente.
É o caso mais comum, Drex, porém não foi o que ocorreu comigo.
Nasci ouvindo música erudita em casa. Meu pai costumava encher a casa de românticos como Chopin e de Beethoven, Beethoven, Beethoven. Na verdade, a exceção era eu…
Gostei do seu pai. Espero que ele gostasse de Reggae e do Pink Floyd assim como eu gosto.
Reggae? Não, não dá.
Jah vibrations anyway
Veja no You Tube o clip da música 2 + 2 = 5, do Radiohead. Parece Pink Floyd, principalmente porque é animação.
“Sou uma pessoa que quase só ouve música erudita mas que não vê o resto do mundo com superioridade, coisa tão comum entre meus pares…”
Mentiroso, e que se entrega:
“Mas, já que o assunto é rock, volto ao tema para finalizar: chego à conclusão de que os dinossauros ainda dominam esta área do mundo. O céu do rock está lotado de pterodáctilos”
Bá, tchê, o rock cumpre com o que promete: expressão imediata de uma revolta idiotizada diante de um mundo mais idiota ainda. A humanidade inteira sucumbirá sem nunca ter passado da adolescência, por isso o rock é perene.
E, novamente: tem dias em que nada é mais saudável do que um ataque de guitarradas ensandecidas roendo nossos miolos.
Hahaha, eu notei, claro. Tentei chamar de ato falho de origem controlada…
Não deu certo.
ahahahahaha. Boa!
q vou dizer. gosto MUITO de pink floyd (principalmente sem os vocais do Roger Waters) e muito do Radiohead (principalmente de Hail to the thief – ouça A Wolf at the Door e o 2+2=5, já mencionado).
Agora, se posso (posso?) te dar A DICA: ouça MOGWAI. Um bom CD para conhecê-los é Rock Action (ouça 2 rights makes 1 wrong, POR FAVOR, e diga AQUI o q achou). Aí deixo tu me iniciar (ui) no mundo erudito (sério, quero dicas de iniciação, mas só se ouvir umas do Mogwai).
Outras deles pra ouvir: Take Me Somewhere Nice , New Paths to Helicon (Pt.2), Yes! I Am a Long Way from Home, Mogwai Fear Satan, New Paths to Helicon (Pt.1)…
aceitarei pedradas. mas ouça.
Arbo,
eu gosto do PF “das antiga”, mas eles poderiam ter pendurado as chiteiras antes da egotrip do Waters.
è chato dar o braço a torcer, mas devo confessar que concordo com o Marcos Nunes, na sua última frase. poderia ( e estou me controlando bem!) comentar longamente sobre esse assunto, mas só direi uma ( duas…) coisas: Radiohead não é convencional e é uma das mais inteligentes e valiosas bandas surgidas nos últimos dez anos. E , por final:
It`s only rock`n roll, but a liked!
Dá os dois braços e concorde também com o parágrafo anterior!
Enquanto vcs estiverem nos braços, tudo bem.
Ôpa! Tà me estranhando! Se eu fosse resolver transitar por estas paradas, procuraria um homem menos brabo que o Nunes. talvez vc, Milton querido!
Meus braços tão atados numa camisa de força; tudo que faço é pular e bater a cabeça na parede, e taí a melhor circunstância posssível para se ouvir um bom rock’n’roll!
Bom, ouvi o último CD (parecia déjà vu).
E o OK, Computer tem bons momentos.
Mas, decididamente, sou um chutador. Não é minha área.
Estou a desconfiar que está rolando uma viadagem por aqui…
Há um ensaio sobre rock, no livro “Cruze esta linha”, do Rushdie, que ele expressa o que todo apreciador desta música_ que não se limitou a apenas ela_ sente em respeito às suas antigas grandes bandas, quando passa dos trinta anos. Ele cita as letras de Cave, as tiradas de Lennon, a perspicácia social de Dylan, e, apesar de fã, reconhece o limite artístico desse gênero. E conclui com uma memória de um show do Franz Zappa, em que um negão invade o palco em plena metade da apresentação da banda, e se recusa a se retirar enquanto não tocar um trumpete estropiado que traz nas mãos. Zappa para (pára) o show, coça o queixo em atitude de como aproveitar aquele novo integrante, e tem uma idéia. Manda seu tecladista subir até o poço do grande órgão medieval desativado do Carnegie hall, e quando este está bem instalado, a banda acompanha o indissoluto e muito feliz negão, num solo que, apesar de escabroso, faz aplatéia ir ao delírio. Rushdie (aliás, grande escritor, mas tão pouco comentado por estas nossas pradarias) diz que, apesar do status de musica descartável, daria tudo para ter um humor, e uma leveza, tão exorcisante quanto esse.
Veja bem, Charlles, eu nunca diminuiria a importância social do Rock ou sua catarse. Falo sobre sua qualidade atual. (E, tá bom, a do Floyd Tardio).
Bah, Milton, eu conheço tudo do The Who, tudo mesmo. A ponto até ficar abalado com aquelas denúncias contra o Pete Townshend quando eu tinha uns dezenove anos.
Mas incrivelmente, os anos passaram, e deixei de ouvir rock também.
Meu pai tinha voltado a ouvir mais rock por minha causa e continua ouvindo.
E eu larguei de mão, huhsdahasdhuasduhs
Mas coisa que gosto é um bom brasileiro com influências roqueiras, como Clube da Esquina, Novos Baianos.
Aliás, morreu hoje de madrugada, subitamente, o Zé Rodrix. Um grande músico. Lamentei demais.
Cara, meu filho TEM QUE IR NUMA IMPEDNUA!!! Nem que seja para falar sobre The Who contigo. Ele tb ficou irritado com as insinuações…
milton, manda mesmo o guri pruma Impednua. joga alguma coisa ou puxou ao pai? (não fará diferença, tem pra todos os gostos hehe) – e diz pra ele te mostrar o PENÚLTIMO do Radiohead, Hail to the thief. Aí sim.
Se puxar ao pai, joga bola. O Milton, antes de abandonar a carreira, era um atacante rápido como o Nilmar, segundo ele próprio.
MAGRO como o Nilmar, MAGRO como o Nilmar, bem entendido…
Radiohead, Beck e Oasis – e tu pede vanguarda? são todas bandas sem nenhum sal… civilizadas, como tu diz. chamá-las de rock faz Led Zep parecer death metal. ou, na verdade — “ROCK” virou McDonalds. para ouvir algo de verdade é preciso ir buscar no underground.
essa gente aí é muito chata e sem testosterona.
[o Bernardo já fez 18??? céus!]
Tiago.
O Bernardo faz jornalismo na PUC que nem que tu.
E me falta cultura roqueira, é óbvio!
Olá Milton!
Acompanho seu blog, diariamente, através de meu google reader.
Pois bem. Vi que trata no final de seu post sobre rock contemporâneo, pensei no dito sobre o Radiohead (repetições nauseantes), concordei até certo ponto e, por fim, me surgiu na cabeça uma dica de uma banda atual que, sem dúvida nenhuma (para mim), é vanguarda:
“The Mars Volta”
Recomendo a audição do primeiro álbum, o “De-loused in the comatorium”.
Fica a dica!
Creedence, Jerry Lee Lewis, The Mamas and The Papas, Nazareth, Led Zepellin, Peter Frampton, Simon & Garfunkel, The Beach Boys, Jefferson Airplane, Janis Joplin. No Brasil, Raul e Rita.
Ah, esqueci: The rock’n roll never die. 🙂
Milton,
deves escrever sobre música com mais frequência. Do pouquíssimo que ouvi de rock até hoje, concordo veementemente com tua tese do empobrecimento progressivo do rock (bem como, de resto, de todo “gênero” musical comercial…)
Certamente utilizarei como referência em minha disciplina EAD de apreciação musical.
Grande abraço,
Augusto
to ouvindo reggae ultimamente. mas Bob Marley e Peter Tosh.
Bob era genial.
ops… to ouvindo sem o ‘Beck’ do lado!!!!!
Very nice site!