Os Ateus, o Novo Ateísmo e os Ateus Devotos (?)

Publicado em 14 de novembro de 2006

A revista Época desta semana traz como matéria de capa um interessante artigo sobre um movimento ateu liderado por alguns cientistas do hemisfério norte. Eles buscam diminuir a “influência de Deus” no mundo e sua motivação não é somente a de acabar com as guerras religiosas, mas impedir que a religião continue atrapalhando o progresso da ciência. Porém, é importante notar que este Novo Ateísmo não tem como alvo tornar ateus os devotos, mas fazer com que os dubitavos agnósticos declarem-se finalmente ateus e passem a combater a maléfica influência.

Admito que haja agnósticos autênticos, porém a palavra tornou-se um substituto educado para que não se use a palavra feia: ateu. O agnosticismo é uma atitude que considera inúteis as discussões sobre questões metafísicas, já que estas tratam de realidades não conhecidas… Pode ser sincero, mas é também confortável. Uma das coisas mais cômicas que encontro no Orkut é o alto número de pessoas que declaram-se agnósticas. São pessoas que são indiferentes a Deus e a religião, mas que não querem complicações com os crentes. Talvez por ser viciado em tentar dizer a verdade – vício que me traz liberdade mas que nunca me trouxe vantagens, muito pelo contrário -, não consigo utilizar este contorno. O estranho é que, mesmo declarando-me ateu, tenha um crescente número de amigos cristãos, alguns inclusive me ameaçando freqüentemente de conversão e todos – mas todos mesmo, como se tivessem combinado – dizendo que meu santo de devoção seria São Francisco de Assis, sobre o qual pouco sei, mas que deveria estudar, segundo eles. Conversamos jocosa e civilizadamente sobre religião; ou seja, eu não os considero perigosos nem eles a mim, nem quando ponho na mesa meu principal argumento, que é também utilizado pelo Novo Ateísmo: o de que a religião não está apenas errada, como é moralmente perversa e faz mal ao mundo.

Já a posição dos novos ateístas não é tão tranqüila e o fato do movimento ser levado adiante por cientistas não é casual. Segundo eles, a religião – com sua incontrolável mania de se meter em tudo (em vez de só rezar, crer e fazer seus membros seguirem seus preceitos…) – tem claramente atrapalhado o progresso da ciência. Ou seja, o que para mim é secundário, quiçá uma discussão interessante em um jantar, para eles é perda de liberdade.

Há novidades engraçadas – como não haveria? – no Novo Ateísmo. Há o brasileiro que transformou o Natal em Newtal, homenagem à Isaac Newton, nascido em 25 de dezembro. Ele coloca maçãzinhas na árvore em vez de bolinhas coloridas…

A estratégia do grupo é inteligente. Convencer um agnóstico a ser franco é mais viável do que desconverter um convertido. Minha experiência diz ser impossível deslocar em um centímetro um crente de sua fé. O crente possui absoluta, autêntica e tranqüilizadora necessidade de acreditar num ser superior, por mais estranho que isto me pareça. Porém, para mim, o fato do número de ateus ter crescido – fato admitido inclusive para Igreja Católica – aponta para um longínquo futuro em que grande parte das guerras religiosas não ocorram por simples por falta de religião suficiente…

Indo bem mais longe do que a matéria da Época vai, digo que em sentido diverso vão os chamados ateus-devotos. Estes seres um pouco mais confusos que o habitual, normalmente italianos, não crêem em Deus, mas julgam que os “valores da religião” podem ajudar a sociedade ocidental a se defender do perigo islâmico e daquilo que eles consideram as novas invasões bárbaras, vindas do terceiro mundo. Para esses “intelectuais”, a Igreja Católica defendeu durante séculos os valores europeus, por isso eles temem que sua perda de influência termine por debilitar as relações do velho continente com o resto do mundo. Os Atei Devoti pregam algo como uma Bíblia sem Deus, ou crucifixos sem fé. Acho cômico, pois o diabo talvez não tenha receio destes crucifixos de fantasia…

No último dia 19/10, em Verona, o Papa Bento XVI estendeu a mão a estes intelectuais que temem que a Europa torne-se uma “colônia do islã”. Reconheceu que “numerosos e importantes homens do mundo da cultura, inclusive muitos que não compartilham a mesma fé ou não a praticam”, estão preocupados com os riscos que a Europa corre se romper com suas raízes cristãs. Recordou que os cristãos estão abertos aos valores autênticos da cultura moderna, como o conhecimento científico, o desenvolvimento tecnológico, os direitos do homem, a liberdade religiosa e a democracia.

Ou seja, a se acreditar nestas palavras, o Papa daria força aos cientistas do Novo Ateísmo. É tudo muito estranho, nada místico e não sou louco de me aprofundar no que será o novo desenho religioso de um Primeiro Mundo cheio de alienígenas e de cientistas fora dos laboratórios. Talvez Jan Mabuse (abaixo) já estivesse antecipando coisas…

2 comments / Add your comment below

  1. Já que foi republicado vou re-responder…

    A questão é simples, um ateu, mesmo sem provas contundentes, tem certeza que deus não existe, da mesma forma que um crente, também sem provas, acredita que deus existe. Já um agnóstico apenas ignora a questão, pois sabe que é desprovida de qualquer certeza, portanto, inútil.

    Atte.
    Natal.

  2. E até agora não compreendo a razão do Newtal, afinal ele era alquimista, ocultsta e outras coisinhas mais, coisas que os ateus acham que é besteira e charlatanice.

    Fora o uso da Árvore e da Maça, inseridas numa simbologia ocultista.

    Ah, foda-se.

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