Ospa: noite de ventos

O concerto de ontem foi uma boa surpresa. Só obras para sopros e percussão. Sei que não dá para fazer isso sempre, mas abrir as janelas com a finalidade de arejar o repertório é uma coisa comum nas boas orquestras e a Ospa, com os músicos que tem, não deve dobrar-se a auto-indulgência, nem pensar que o público é tão amador que queira sempre mais do mesmo.

O concerto abriu com a simpática Fanfarra para preceder La Péri, de Paul Dukas. Obra para metais, serve como abertura do balé La Péri. Excelente interpretação do pelotão de metais da Ospa, disposto em linha na frente do público com o maestro na plateia. Um belo fuzilamento.

Stravinsky em momento pastoral (clique para ampliar)

Depois veio a música mais chatinha da noite, a Serenata para Sopros, de Richard Strauss, a qual demonstrou um mérito indiscutível: ser curta. A coisa ficou séria na Sinfonias (isso mesmo) para Sopros de Igor Stravinsky. Com uma única mulher no grupo e em toda a noite — a clarinetista Beatriz Gossweiler — o que se viu e ouviu foi música de primeira qualidade com um show particular de Leonardo Winter e Augusto Maurer, dançando nas tortuosas melodias do talentoso nanico russo amante da grana.

(Aqui, mais fotos eróticas de Igor Stravinsky).

Após o intervalo veio a música programática de David Gillingham, Waking Angels. Desconhecia totalmente esta bela composição de 1996 sobre a AIDS. Não é um tema leve e a música — assim como a composição de Stravinsky — não é nada trivial. A audição é realmente impactante, mas bonita de se ver. Enquanto Wilthon Matos botava e tirava gatos da tuba, o pessoal das madeiras alternavam intervenções de seus instrumentos com um coral. Isto é, eles cantaram e cantaram bem e com a seriedade requerida pelo tema. Apesar de tudo, não posso deixar de sorrir ao lembrar de Klaus Volkmann cantando com tanta seriedade, ele que parece ter o sorriso naturalmente estampado no rosto. (Impressão que tenho de longe, pois nunca falei com ele. Vai ver e é o maior dos mal humorados…).

Não me apaixonei pela Suíte cp200, de Edson Beltrami. Ela tem um final interessante, mas talvez rendesse melhor se não estivesse depois de Stravinsky e de Waking Angels. Destaque para a trompas e para o oboísta que não sei o nome (Javier Andres Balbinder?).

Além de bom músico, acho que o regente Dario Sotelo deu boas e necessárias explicações. Sabe falar em público, foi simpático, etc. Está caindo de madura a sugestão de imitar a Osesp. 30 minutos antes de cada concerto, um músico da orquestra dá uma pequena aula a respeito do que se vai ouvir. Quem não se interessar, chega só para o concerto; quem quer aprender e puder chegar mais cedo, aprende alguma coisa. A formação do público não deve ser apenas como ouvinte. Waking Angels cresceu muito após a sensível explicação do maestro. Pensem nisso. A Associação de Amigos da Ospa vai acabar acontecendo e espero que consigamos encaminhar coisinhas como essas. É o mínimo. A orquestra existe para o público e formá-lo é importante.

2 comments / Add your comment below

  1. Olá Milton e todos deste importante Blog Sul 21.

    Realmente, o concerto de ontem foi (espero eu) 1º de muitos, existe uma grande quantidade de obras para esta formação, tanto que seria possível fazer uma temporada de concertos para este grupo. Penso que isso ajudaria e muito as atividades técnicas e artísticas desta parte da orquestra.

    Outra coisa.

    O gato que VC diz que eu colocava e tirava na tuba, e uma surdina.
    Assim como os outros metais que também foi muito usada, tem o objetivo de mudar o som, estes timbres são bastantes variados dependendo do modelo, a forma, o material e a técnica de construção.

    Obrigado pela idéia!
    Vou mandar fazer uma surdina em formato de gato para usar em minha peça de teatro “TEM GATO DA TUBA”

    Abraço….

  2. Não fui ao concerto de ontem (e como sou muito preguiçoso continuarei não indo até as apresentações voltarem para a UFRGS, onde o ônibus me larga na porta), mas esse post me lembrou de uma apresentação que a Ospa fez há um ou dois anos, não me lembro bem. Chamada de “Festival Italiano”, consistiu num domingo inteiro de apresentações. Eu assisti a uma desconhecida porém fascinante obra de Rossini tocada por um octeto de sopros. Não sei mais se era uma composição para octeto mesmo ou se foi adaptada. Nunca mais a escutei ou a encontrei na internet, uma pena. Também ouvi uma esquecível sonata para violino, cujo compositor esqueci, e uma seleção de sonatas nada esquecíveis de Scarlatti.

    É isso, os sopros me lembraram do Rossini. Apoio a ideia de fazer as “aulas” antes dos concertos. Uma experiência desse tipo foi realizada pelo flautista Rodrigo Calveyra em sua apresentação com Manuel de Olaso no último domingo. Pelos poucos comentários que ouvi de pessoas que compareceram, o resultado foi muito bom.

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