Tempos Fraturados, de Eric Hobsbawm

Tempos Fraturados de Eric HobsbawmExcelente e boêmio livro do grande Hobsbawm, falecido em 2012. Trata-se de 22 ensaios curtos sobre a cultura, a política e a sociedade do século XX. Muitos deles originaram-se de conferências ministradas pelo veterano Hobs – nascido em 1917 – para os mais diversos eventos. Cada um deles poderia ser expandido para formar um volume separado. Há desde análise sobre o papel do caubói na cultura americana e considerações sobre a moda até considerações fundamentais sobre a boliolice (palavra minha) do intelectual público moderno, sobre os guetos onde a grande música e grande literatura foram se esconder e sobre a situação das religiões no mundo. No último caso, as religiões são tratadas como devem ser: como forças políticas.

É difícil escrever uma resenha sobre um livro que trata de 22 temas, mesmo que estes estejam agrupados em 5 seções. Melhor citar o brilhantismo da prosa e das argumentações do mestre. Então, coloco abaixo os títulos de cada um dos ensaios a fim de que cada membro de meu septeto ledor possa avaliar o potencial de interesse que teria Tempos Fraturados (Cia. das Letras, 358 pág, tradução de Berilo Vargas). Depois, como test drive, coloco um trecho de A perspectiva da religião pública.  Pura isca para o debate.

As divisões e ensaios do livro:

1. Manifestos

PARTE I: a difícil situação da “cultura erudita” hoje
2. Para onde vão as artes?
3. Um século de simbolismo cultural?
4. Por que realizar festivais no século XXI?
5. Política e cultura no novo século

PARTE II: a cultura do mundo burguês
6. Iluminismo e conquista: a emancipação do talento judeu depois de 1800
7. Os judeus e a Alemanha
8. Destinos Mitteleuropeus
9. Cultura e gênero na sociedade burguesa europeia
de 1870-1914
10. Art nouveau
11. Os últimos dias da humanidade
12. Herança

PARTE III: incertezas, ciência, religião
14. Ciência: função social e mudança do mundo
15. Mandarim com barrete frígio: Joseph Needham 16. Os intelectuais: papel, função e paradoxo
17. A perspectiva da religião pública
18. Arte e revolução
19. Arte e poder
20. Os fracassos da vanguarda

PARTE IV: de arte a mito
21. O artista se torna pop: nossa cultura em explosão
22. O caubói americano: um mito internacional?

Trecho provocativo:

Pela primeira vez em décadas há hoje um movimento militante que propaga o ateísmo. Seus ativistas mais importantes são cientistas naturais. É verdade que, intelectualmente, a teologia praticamente desistiu de contestar a ciência em seus próprios termos, confinando seus argumentos à invenção de teorias que possam tornar os resultados aceitos da ciência contemporânea mais compatíveis com a divindade. Mesmo os crentes na verdade literal do Gênesis agora cobrem sua nudez com a folha de parreira de uma “ciência criacionista”. O que mobiliza os crentes na razão não é o absurdo dos argumentos dos adversários, mas sua recém-demonstrada força política.

Pois, no passado como de novo e cada vez mais no presente, a secularização das atividades globais tem sido, na quase totalidade, obra de minorias, sobretudo das instruídas — os alfabetizados num mundo de analfabetos, os diplomados de ensino médio e universitário nos séculos XIX e XX, os estudantes de graduação e pós-graduação no século XXI que têm acesso ao verdadeiro know-how da sociedade de informação. Os movimentos tradicionais, populares, radicais e trabalhistas, cujos ativistas eram em grande parte autodidatas, também devem ser vistos como minoria secular em campanha. A única exceção, um genuíno movimento local de modernização, é o impulso pela emancipação física e sexual das mulheres de suas restrições históricas, na medida em que recebeu permissão para se realizar; e até isso deve seu reconhecimento institucional oficial (divórcio, controle de natalidade, etc.) ao trabalho de minorias ativistas laicas.

7 comments / Add your comment below

  1. Para mim, o melhor ensaio ( todos são bons) é POS JUDEUS NA ALEMANHA, isto porque ele confirma algo que eu pensava : isto é, os judeus eram, classe média e alguns muito ricos, dois setores da burguesia que tem tendência a se alienar da politica, tem medo de perder seus privilégios e da ascenção dos setores mais pobres da população. Achavam que Hitker só iria pegar os comunistas e els não eram comunistas. Alguns judeus ricos até ajudaram o nazismo.e quando se sentiram ameaçãdos emigaram.Os judeus pobres, estes sim foram gaseados.

  2. Continuando com “Os judeus na Alemanha ” do livro Tempos Fraturados do saudoso ( sim, porque sua lucidez está nos fazendo falta) ;
    ” Os judeus alemães queriam apaixonadamente ser alemães, embora quiesessem ser assimilados ” não pela nação alemã, mas pela classe média alemã”. ( citando Pulzer). E segue :” Apesar da maciça secularização e do impressionante empenho de serem alemães, os judeus alemães sobreviveram como grupo consciente de seu juidaismo até serem extirpados por Hitler.Nem se devia isso apenas ao antissemitismo que como nos lembra Pulzer, era de qualquer maneira, relativamente moderado pelos padrões de outros países.E Citando Sir Rudolf Peierls ( físico refugiado): ” Na Alemanha pré-Hitler ser judeu era uma desvantagem tolerável”.
    Não foi o antissemitismo alemão, ou o bem mais palpável antissemitismo vienense que converteu Herzl ao sionismo, mas o caso Dreyfus na França”
    Maias adainet:” Em suma, os judeus alemãesseentiam-se à vontade na Alemnha.Por esdta razão sua tragédia foi dupla. Não só fotram destruidos, como não previram seu fim. Pulzer se esgorça para racionalizar o fracasso, na realidade a recusa da judiaria liberal alemã em reconhcer o que Hitler pretendia mesmo depois de1933. ” poucos conseguiram ao menos acreditar quando os primeiros relatos confiáveis sobre o genocídio vazaram para o Ocidente em 1942″.
    Então o que quero dizer (FC) é que a burguesia judáica alemã, alienada e/ou equivocada da políítica ( como toda a burguesia de qualquer país) nem mesmo dez anos após iniciado o genocídio, estava se dando conta da barbárie incomensurável do nazismo e da completa indiferença de seus vizinhos de porta, os bons e ordeiros burgueses alemães.
    O pior cego……

    1. Prezado Franklin Cunha.

      Apenas a fazer uma pequeníssima complementação aos seus excelentes comentários, gostaria de ressaltar que Reich, em 1933, na Psicologia de Massas do Fascismo, abordou a questão judaica, ou seja, o antissemitismo latente na cultura alemã mesmo antes da ascensão legal de Hitler ao poder. Há, na referida obra, uma reflexão assustadora sobre uma matéria de um jornal alemão (não me lembro agora qual…, pois estou a escrever de memória…) que relatava a humilhação pública que uma jovem alemã foi obrigada a se submeter…: colocaram em seu pescoço uma placa com ultrajes à sua moral, simplesmente por estar envolvida amorosamente com um judeu. Finalizando e a lembrar de Bergman: o ovo da serpente estava a ser chocado há muito, na terra de Wagner, antes da efetiva tragédia colossal. Vai saber… Talvez “O grito de Munch” fosse uma profecia…

      Ao escrever isso – silencio…, pois os últimos acontecimentos no Brasil, desde Junho, podem ser os sinais associados ao novo ovo nazifascista em colossal crescimento entre nós.

      Um abraço fraterno, Franklin.

  3. AO NAZIFASCISMOVERMELHOTUPINIQUIM
    .
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    .
    O PIG É PORCO
    by Ramiro Conceição
    .
    .
    A rua, a casa, o casal,
    tudo acorda,
    até o Sol acorda depois
    do entregador de jornal.

    Mas
    o que de motocicleta
    o entregador entrega?
    Notícias?
    Certamente, não
    (tudo já foi mastigado).
    Análises?
    Claramente, não
    (tudo já foi deturpado).
    Educação?
    Obviamente, não!

    Afinal
    o que de motocicleta
    o entregador carrega?
    Não é um hábito, mas um vício!
    Então é preciso voltar ao início
    e, com alívio,
    jogar uma pá de cal.

    A rua, a casa, o casal,
    tudo acorda,
    até o Sol acorda sem
    o entregador de jornal.
    .
    .
    ESQUERDA DE MERDA
    by Ramiro Conceição
    .
    .
    É, já fiz cada quiproquó
    que mereci levar no fiofó.
    Até já casei com fantasma
    e até já fedi…feito miasma.

    Casar com um fantasma,
    não teve problema algum:
    trepei; dormi; viajei; e me
    habituei ao sujo dito-cujo.

    O dilema foi que, por ser uma alma penada,
    o fantasma… não veio desacompanhado,
    mas… junto à fantasmanada acorrentada
    ao fantasmagórico de uma monada de putas,
    de estafetas, de piolhos diplomados na USP,
    um embuste!, um bando de metidos a besta,
    que se diziam “do Bem”, mas eram soleiras:
    era a geração pós-maluco-beleza,
    que enriqueceu o pobre mago da esperteza.

    Nunca cultivaram o belo,
    nunca puderam conhecê-lo:
    eram moçinhas e mocinhos
    a farejar com… focinhos.

    Ai… quanto papo cabeça!
    Quanta merda de esquerda!
    Ainda bem que tudo findou.
    O fantasma me abandonou.

    Por isso, grato, estou aqui,
    a finalizar essa obra-bufa;
    pois soube à boca pequena
    que algumas almas penadas,
    em solitárias, fétidas, cloacas,
    vestiram-se, com as gravatas
    de suas línguas, enforcadas.

  4. Para que fique historicamente registrado, para que não ocorra qualquer acusação de oportunismo: já, lá, em 2011, publicara aqui – e no blog do Carpinejar – meu protesto contra a invasão da reitoria da USP por esses delinquentes mascarados que, infelizmente, tornar-se-iam exemplos à decadência política:

    https://miltonribeiro.ars.blog.br/2011/11/11/porque-hoje-e-sabado-2/

    Tal texto publiquei também, à época, lá, no site do DCE da USP: ficou no ar por aproximadamente 40 minutos… Porém, depois…, como é costumeiro a esse tipo de gentalha, fui censurado!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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