Ospa: coisas vivas e outras apenas perfeitas na danação acústica da Igreja da Ressurreição

Ontem o concerto da Ospa previa um Festival Mozart. O programa era o que segue, copiado site da Ospa:

W. A. Mozart: La Clemenza di Tito – Overture
W. A. Mozart: Concerto para Flauta nº 1, em Sol Maior
W. A. Mozart: Andante para Flauta e Orquestra, em Dó Maior
W. A. Mozart: Sinfonia nº 41, em Dó Maior

 

SOLISTA: Leonardo Winter (flauta)
REGENTE: Ricardo Sciammarella

A acústica da Igreja da Ressurreição é uma coisa, o blog é uma coisa pessoal e Mozart é um coisa pessoal problemática. Há muitas obras de Mozart que estão no meu panteão, mas não sou um admirador incondicional de sua música assim como sou da de Bach, Beethoven, Brahms ou Mahler. Grosso modo, a qualidade da música de Mozart eleva-se juntamente com o número do Koechel. Explico: Ludwig Alois Friedrich Ritter von Köchel (1800-1877) foi um musicólogo, escritor, compositor, botânico e editor austríaco, mas imortalizou-se como musicólogo ao catalogar toda a obra de Mozart, originando os números de Koechel, pelas quais as obras de Mozart são conhecidas. Desta forma, a belíssima Sinfonia concertante de dois posts atrás é a Sinfonia Concertante para Violino e Viola, K. 364. Estranhamente, o programa da Ospa falhou ao não incluir “os Ks”, mas a gente informa pra vocês sem problemas.

Como o catálogo Koechel é cronológico, fica fácil de notar que a música da juventude de Mozart era gentil, perfeita, bonita e equilibrada. Depois, a vida, as dívidas e o contratos começaram a influenciar e sua música ganhou drama, sangue e agressividade. Melhorou muito. A abertura La Clemenza di Tito, K. 621 e a Sinfonia Nº 41, Júpiter. K. 551, são obras da maturidade do compositor. Já o Concerto para Flauta Nº 1 tem K. 313, e o Andante para Flauta e Orquestra, K. 315, são obras que se encaixam naquele mundo inodoro e perfeito do Mozart inicial. Como disse lá no início, o blog é uma coisa pessoal e eu não gosto destas obras para flauta. É muita limpeza e pouco drama.

A execução valeu pelo excelente solista Leonardo Winter que, como sempre, fez um trabalho notável, apesar do Andante arrastado demais do regente Ricardo Sciammarella, que, pelo ouvido, o desejava Adagio.

Já a qualidade musical, o pulso e a veemência da Júpiter e de La Clemenza di Tito trazem tanto interesse a um concerto que a gente consegue ignorar o fato da acústica da Igreja da Ressurreição ser tão ruim. A Júpiter é tão boa que até o minueto — terceiro movimento da forma sinfônica clássica — é legal. Por motivos certamente ligados à inadequação acústica da sala, Sciammarella fez uma virou a Ospa de cabeça para baixo, colocando, a partir da esquerda, os primeiros violinos (com os contrabaixos atrás), os violoncelos, as violas e os segundos violinos. Boa tentativa, mas a sala é incontrolavelmente demoníaca.

P.S. — Um fato desagradável que pode ser evitado: o programa indicava que haveria um  intervalo antes da Júpiter. Por isso todos levantaram enquanto os alto-falantes mandavam a plateia sentar. Chato, né?

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791)

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