Símbolos

Não ignoro que este assunto só poderia ser discutido em calhamaços, mas vou tentar fazer uma pré-introdução-resumida-e-sumular ao assunto da simbologia na arte.

Ela existe desde tempos imemoriais. Creio que as primeiras representações através de símbolos ocorreram na pintura. Há sempre um livro ou alguém disponível para nos explicar o que estão fazendo aquelas pessoas estáticas. Uma vez, li um tratado sobre as gravuras de Brueghel e Dürer. Impressionante. Bach também punha recadinhos nada inconsistentes em sua música.

Na literatura e no cinema, o mainstream da linguagem subliminar corre por dois veios. O primeiro é visto ou lido. É o planeta Melancolia do filme comentado ontem. Por ser visto e palpável, ele é um veio MacGuffin, para falar em linguagem hitchcockiana. O que em Hitchcock é mero pretexto para ação ou suspense, aqui é o cerne de uma história qua aponta para fora de si. Deste modo, sua realidade é melhor compreendida como uma representação de algo maior ou que simplesmente não está ali. Os MacGuffins de Lars von Trier são realmente grandes demais, deselegantes demais, claros demais.

Mas há um o outro tipo de símbolo que eu chamaria de símbolo-situação. Os personagens são colocados de tal modo que o contexto onde se encontram passam a fazer referência a outras camadas de realidade — superiores ou inferiores ou ambas. A situação fala de forma triste, cômica, irônica e o escamabu, dizendo-nos muito mais do que aquilo que é mostrado ou falado. E é aqui que gente como Philip Roth e Lars von Trier fazem suas festas. A liberdade que suas histórias — e as de tantos outros, pois a expressão “outras camadas de realidade”, por exemplo, é de Tchékhov” — nos dão para imaginar tais camadas é algo glorioso e este diálogo que me deixa eufórico com alguns livros e filmes.

Albrecht Dürer e seu Melancholia (1514): com um planeta aos pés? Ou outro está vindo lá atrás com uma faixa de Melencolia?

Quando Justine arruma aqueles quadros, há muito Brueghel (aliás, na abertura já aparece Os Caçadores na Neve), mas vocês viram o Dürer ali atrás? Ah, pois é. Para Lars von Trier ser um formidável, só lhe falta morrer.

O Quadrado Mágico de Dürer em Melancholia. Tudo soma 34

Sobre Lars Von Trier: uma posição tola, a do crítico e várias inteligentes

A tola:

O tom de Lars Von Trier

Se alguém ainda tinha dúvida sobre a misoginia e a arrogância de Lars Von Trier, nesta semana em Cannes ele tratou de dirimir todas. Afora ser deselegante com Kirsten Dunst, mais uma atriz que entra para o rol das que humilhou em sets e filmes, e exibir uma tatuagem com palavrão nos dedos, ele disse ter simpatia por Hitler. Como todo covarde, depois pediu desculpas dizendo que falou em tom de brincadeira. Mesmo que fosse verdade, a declaração não vale nem como provocação. Mas foi dita com o tom que lhe é peculiar, e o pôs ao lado do estilista John Galliano como um exemplo de que os preconceitos de raça e gênero continuam vivos.

Daniel Piza

A jornalística:

Quando conversei com Lars em Mougins, ele contou que sua sensação era a de derrapar na curva e perder o controle do carro — `Não dava mais para parar`, disse — , confesso que me lembrei de Joseph Conrad e Albert Camus. Lord Jim, consciente de que sua covardia no falso naufrágio do Patna seria sua danação eterna; Mersault, ouvindo aqueles tiros ressoarem na eternidade. Estou tendo, talvez, um surto poético, ou literário. Mas o que me doi é que o filme, `Melancholia`, tão belo, talvez nunca venha a ser devidamente apreciado por isso. Tergiverso. Daqui a pouco, tenho minha entrevista com Catherine Deneuve. Vou dar uma volta na Croisette, carpe diem, antes de recomeçar a correria.

Luiz Carlos Merten

E as razoáveis e inteligentes: