Roberto Bolaño: “Roubar livros não é um delito”

Roberto Bolaño: “Roubar livros não é um delito”

BolañoNeste texto, escrevi sobre a necessidade de roubar livros em determinadas situações e idades. O grande escritor chileno Roberto Bolaño — 2666, Os Detetives Selvagens, Noturno do Chile, etc. — fala muito a respeito disso em seus livros. E fala sempre divertidamente, de uma forma muito viva e, bem, experiente. Sei que meus amigos livreiros detestam esse assunto, mas outros, não livreiros, insistem nele. Um deles me enviou o vídeo abaixo. Para mim, afora o tema, é um enorme prazer ver Bolaño (1953-2003) falando alegremente, ainda com boa saúde.

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Gente, a PF invadiu minha casa hoje pela manhã e outros tópicos

Gente, a PF invadiu minha casa hoje pela manhã e outros tópicos
Foto: Fernando Guimarães
Foto: Fernando Guimarães

OK, o japa poderia ter dado uma afofada naquela almofada antes de sacar a foto.

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Um milagre na Câmara. Existem vários absurdos no sistema eleitoral brasileiro. Os piores, na minha opinião, são o modelo de financiamento e as coligações nas proporcionais, que só existiam aqui e que ontem começaram a acabar. Ou seja, se for novamente aprovada pela Câmara em segundo turno, a distribuição dos votos para deputados, em 2018, só levará em conta aquilo que seus partidos receberem, sem permitir alianças. Antes, com as coligações malucas que os políticos inventavam, misturando alhos com bugalhos, você votava em uma candidato, por exemplo, do PT, e ajudava a eleger um do PMDB (porque o PT estava coligado com o PMDB).

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Votação de Aécio em 2016:
51.041.155 votos
Valor encontrado no apê de Geddel:
51.038.866 reais

O que significa? Sei lá.

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Os gregos não escreviam necrológios

Os gregos não escreviam necrológios

Li algures que os gregos antigos não escreviam necrológios,
quando alguém morria perguntavam apenas:
tinha paixão?
quando alguém morre também eu quero saber da qualidade da sua paixão:
se tinha paixão pelas coisas gerais,
água,
música,
pelo talento de algumas palavras para se moverem no caos,
pelo corpo salvo dos seus precipícios com destino à glória,
paixão pela paixão,
tinha?
e então indago de mim se eu próprio tenho paixão,
se posso morrer gregamente,
que paixão?
os grandes animais selvagens extinguem-se na terra,
os grandes poemas desaparecem nas grandes línguas que desaparecem,
homens e mulheres perdem a aura
na usura,
na política,
no comércio,
na indústria,
dedos conexos, há dedos que se inspiram nos objectos à espera,
trémulos objetos entrando e saindo
dos dez tão poucos dedos para tantos
objectos do mundo
e o que há assim no mundo que responda à pergunta grega,
pode manter-se a paixão com fruta comida ainda viva,
e fazer depois com sal grosso uma canção curtida pelas cicatrizes,
palavra soprada a que forno com que fôlego,
que alguém perguntasse: tinha paixão?
afastem de mim a pimenta-do-reino, o gengibre, o cravo-da-índia,
ponham muito alto a música e que eu dance,
fluido, infindável, apanhado por toda a luz antiga e moderna,
os cegos, os temperados, ah não, que ao menos me encontrasse a paixão
e eu me perdesse nela
a paixão grega.

– Herberto Hélder

Herberto Hélder (1930-2015)
Herberto Hélder (1930-2015)

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Financiamento zero, despesa nula: esta é a verdadeira e necessária reforma política

Financiamento zero, despesa nula: esta é a verdadeira e necessária reforma política

PUM - Partido Utopico Moderado

Certa vez, eu e o Francisco Marshall estávamos assistindo um concerto qualquer quando eu falei no financiamento público de campanha, esta invenção tão incompreensível e injusta para o povo quanto antidemocrático é o financiamento próprio ou das empresas. E o Chico gritou:

— Financiamento público? Então eu vou ter pagar por aquilo? Eu quero financiamento zero, despesa nenhuma, jogo limpo e igual para todos, isso sim!

E reinventamos (ou ele reinventou, não lembro bem) rapidamente uma Lei Falcão para o século XXI. Foto do(a) candidato(a), currículo, plataforma, partido, talvez uma fala de alguns minutos e só. Nada de santinho, nada de outdoor, nada de jingle (jingle para me representar? Isso é um show?), nada de empresas ou cidadãos metendo dinheiro, nada. Uma campanha igual para todos. No máximo comícios, debates na TV e fim. Após eleitos, como brinde, o PUM oferece a cada deputado muitos agentes da PF para fiscalizá-los 24h. Recebeu propina, PUM!, fora.

Sempre ventilando a política, o PUM apoia a medida. A surpresa é que o Chico, neste fim de semana, em sua coluna de ZH, colocou em palavras este Nirvana eleitoral. A seguir, deixo-lhes o texto completo:

Despesa nula em campanhas eleitorais, a verdadeira e necessária reforma política

Por Francisco Marshall

Os políticos acostumaram-se com esse esquemão e o adaptam, com duas falácias: financiamento público de campanha e o fundo partidário.

Os maiores inimigos da democracia são a demagogia e o marqueteiro. A demagogia é monstro antigo, que pode ser domesticado e servir para se interpretar a vontade popular; ela torna-se um mal quando são prometidos benefícios impossíveis, para iludir o povo, onerando o Estado ou criando desencanto com a política. Já o marqueteiro é sempre inimigo da democracia: cria imagens enganosas, vende o ruim como se bom fosse, gasta o escasso recurso (privado e público) para iludir, premia a eugenia e pavimenta o caminho para muitos delitos: desvios, sobras de campanha e compromissos com doadores e veículos de imprensa. Não à toa, o próprio termo marqueteiro é corruptela da palavra marketing, evidenciando que aqui temos um vendilhão com técnica publicitária.

O engano produzido por marqueteiros só tem utilidade para os farsantes que querem se eleger à custa da boa-fé dos ingênuos e da dignidade da política. Perde a publicidade, maculada por essa promiscuidade, e perde o espaço público, empestado com mensagens inadequadas. Agrava-se a assimetria e a prevalência do interesse econômico, nada isonômicas. Pior, os políticos profissionais já se acostumaram com esse esquemão e agora o adaptam, com duas falácias: o financiamento público de campanha e o bilionário fundo partidário. Contra este mal, a sociedade pode aplicar antídoto eficiente e de grande benefício para a melhora da política: despesa nula, zero gasto possível em campanhas eleitorais. Como funcionaria?

Os tribunais eleitorais elaboram uma base de dados padronizada, com identificação e CV do candidato, suas propostas e um canal de comunicação, com interface simples, acessível intuitivamente por qualquer pessoa do povo. Na campanha, os candidatos ficam proibidos de realizar despesa eleitoral, inclusive manter páginas na internet, mas especialmente a produção de materiais publicitários de qualquer espécie; isto é de fácil fiscalização. É preciso lei rigorosa contra robôs nas redes sociais, um veneno que já está impregnando a internet. Sem santinho, programa partidário com forma de novela ou outdoor: cidade limpa, base de dados digital. Nada impede a realização da agenda de comícios e de debates, seguindo regras públicas. Espécie de Lei Falcão da era digital.

E como se dará o acesso de quem não tem computador?

Os tribunais eleitorais, em parceria com os Executivos e Legislativos, podem usar os recursos hoje empregados no fomento direto a partidos para subsidiar a implantação e a manutenção de um novo serviço cívico: ilhas digitais com terminais assistidos disponíveis para o povo e ampliação da cobertura pública de wi-fi. Nos interstícios eleitorais, essas ilhas podem funcionar como bibliotecas digitais cidadãs, com ferramentas que permitam às pessoas acesso a benefícios sociais (se sobrar algum da devastação atual), chances de emprego e informação com efeito educacional. Se essas ilhas tiverem ao lado praças para atividades culturais e desportivas, o Brasil estará salvo em poucos anos. Despesa nula em campanhas eleitorais, a verdadeira e necessária reforma política.

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O Fim da Turnê, de James Ponsoldt

O Fim da Turnê, de James Ponsoldt

Ontem à noite, vimos O Fim da Turnê. O filme mostra a entrevista de cinco dias do jornalista David Lipsky, da Rolling Stone, com o escritor David Foster Wallace, ocorrida em 1996 durante a turnê de lançamento do livro de Wallace, Infinite Jest (Graça Infinita). A convite do autor — convite um pouco súbito e ditado pela simpatia inicial –, Lipsky hospedou-se na casa da fazenda onde Wallace vivia recluso com seus dois cachorros, foi às aulas que ele ministrava na universidade e também na última viagem de lançamento de Graça Infinita — uma palestra para leitores mais noite de autógrafos.

Lipsin e DFW em viagem
Lipsky e DFW em viagem

Como o filme sublinha, Wallace não pode ser uma figura mais norte-americana. É um daqueles rebeldes que contestam o próprio país ao mesmo tempo que amam McDonalds, TV, Coca-Cola, etc. Ao mesmo tempo, trabalha recluso numa fazenda, sem TV e com dificuldades em se relacionar com as pessoas — tem o receio de magoá-las. Demonstra especialmente dificuldades com mulheres. (O entrevistador Lipsky, também escritor, sente inveja do talento e do sucesso de DFW, enquanto este morre de ciúmes do trato social que Lipsky tem com elas).

Curiosamente, a reportagem jamais foi publicada. Lipsky só traria sua versão daqueles dias no livro que dá origem ao filme, Although of Course You End Up Becoming Yourself: A Road Trip With David Foster Wallace, lançado em 2010, dois anos após o suicídio de DFW.

Como cinema, O Fim da Turnê pode não ser espetacular, mas seus diálogos são 100% do tempo interessantes, assim como o jogo de tensões que estabelece entre entrevistador e entrevistado. Nunca li DFW. Seus temas, que descobri faz tempo lendo resenhas e reportagens, não me seduziram, mas o filme faz tudo para que eu mude de opinião.

DFW pensava que a forma com que o homem lida com a tecnologia faz com que ele se torne refém dela. A negação em ter uma TV em casa — logo depois sabemos que Wallace era capaz de passar horas e horas abobado na frente da telinha assistindo coisas 100% bobas — é parte deste “tornar-se refém”. Ele também se refere ao sexo que agora vem pelo computadores e que dominará todos os nossos prazeres, não somente os sexuais. Claro que isso é uma redução. Nem só de reflexões sobre tecnologia é feito DFW. Seu principal tema é extremamente literário, penso. A literatura, escrita ou lida, representaria uma forma de superar a solidão e os efeitos de um individualismo radical.

A atuação de Jason Segel como David Foster Wallace e a Jesse Eisenberg como o jornalista David Lipsky são grandiosas. Segel dá eco ao bom roteiro conseguindo deixar clara a fragilidade emocional do escritor e o verdadeiro tumulto de seu cérebro. Sua figura, a de um riponga sempre entre o doce e o perturbado, é magnética. O filme de James Ponsoldt nos dá um caminho para compreender o que há de genial em DFW.

Para finalizar, sabem que Wallace era devoto de Dostoiévski? Pois é. A grande coisa que torna Dostoiévski inestimável para os leitores e escritores norte-americanos é que ele parece possuir graus de paixão, convicção e engajamento com dilemas morais profundos que nós – aqui, hoje – não podemos ou não nos permitimos. (…) …exigimos de nossa arte uma distância irônica das convicções arraigadas ou das questões aflitivas, de modo que os escritores atuais devem ou fazer piadas com elas ou tentar camuflá-las sob algum truque formal.

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Noções bestinhas (mas verdadeiras) da língua russa

Noções bestinhas (mas verdadeiras) da língua russa

Nabokov se diz Nabôkav. Mas dizer o nome do autor de Anna Kariênina — sim, Karênina é apenas o nome de um dos cachorros de meus filhos — é mais complicado. É Talstói, porque o “o” que é não tônico vira “a” na pronúncia (vide Nabôkav). E sim, é Dastaiévski, tão pensando o quê? E o livro de Gontcharov (Gantcharóv), Oblómov, se diz Ablômav. Já o nome de Tchékhov (Tchéhav) envolve fonemas decididamente alienígenas. Então, se você encontrar um russo, pergunte “Como é mesmo o nome do autor de A Dama do Cachorrinho, As Três Irmãs, que era contista, dramaturgo e médico?” Quando o cara responder, preste bem atenção porque eu não consigo dizer aquilo. E o primeiro nome é Antôn…

Shastakovich, Prakófiev, Gógal, samavar… Vai por aí.

Me chamem de Dastá, nada de Dostô.
Me chamem de Dastá, nada de Dostô.

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Bach, Vivaldi, suas mortes e a ironia das datas

Bach, Vivaldi, suas mortes e a ironia das datas
Vivaldi e Bach

Ingmar Bergman, o cineasta que dedicou parte de sua obra a analisar o silêncio de Deus e a solidão do ser humano, morreu em Fårö no dia 30 de julho de 2007, na mesma data em que morria em Roma Michelangelo Antonioni, o cineasta da incomunicabilidade. Miguel de Cervantes faleceu em Madrid na data de 23 de abril de 1616, mesmo dia da morte de William Shakespeare em Stratford-upon-Avon. O fato de a morte dos dois maiores escritores da Idade Moderna ter ocorrido na mesma data apenas é deslustrado por uma verdade que destrói o mito temporal: Shakespeare faleceu sob a regência do calendário juliano, o que empurra sua morte para dez dias depois. Já Johann Sebastian Bach (1685-1750) não morreu no mesmo ano em que Antonio Vivaldi (1678-1741) faleceu, mas há muitas coincidências que ligam os dois maiores nomes da música barroca — para começar, ambos “escolheram” o 28 de julho como data de morte.

Bach e Vivaldi foram compositores totalmente diferentes. Basta uma audição de alguns segundos para que fique identificado um e outro. Eles criaram suas obras numa época especialmente complicada — são compositores do barroco tardio, ou seja, produziam no momento histórico em que se iniciava o período clássico. Eram, portanto, compositores antiquados em seu tempo. Os filhos compositores de Bach já encaravam o pai como alguém do passado e Frederico II, quando o convidou para visitar sua corte, ouviu-o sem o menor respeito, como quem ouve um animal em extinção, apesar do que dizem algumas lendas desinformadas. Já Vivaldi, il prete rosso, sem público em Veneza, vendeu grande parte de seus manuscritos para pagar uma viagem a Viena, onde Carlos VI o admirava, mas o imperador faleceu dias depois de sua chegada, frustrando os planos do italiano. A consequência é que ambos, Bach e Vivaldi, morreram pobres e fora de moda.

Vivaldi: um talentoso padre que não escondia suas relações com mulheres

Se não havia relações de estilo, havia relações musicais entre ambos, ao menos no sentido de Bach ter sido um admirador do estilo italiano e de conhecer profundamente a obra de Vivaldi. Ele fez mais: transcreveu vários dos concertos de Vivaldi para o cravo e o órgão. Alguns concertos para violino do L’Estro Armonico (1712) e de outros ciclos foram transcritos por Bach e certamente interpretados por ele, seus filhos e alunos. Podemos citar também a quase inevitável religiosidade dos dois compositores numa época em que se ensinava religião por mais da metade do horário escolar. Por muito tempo, Bach foi considerado uma espécie de santo, ao menos até Emil Cioran colocar alguns empecilhos, separando Bach e Deus, com vantagem para aquele: Sem Bach, Deus seria apenas um mero coadjuvante. Sem Bach, a teologia seria desprovida de objetivo, a Criação fictícia, o nada peremptório. Se há alguém que deve tudo a Bach, é seguramente Deus. E Vivaldi? Vivaldi era padre. Il prete rosso, o padre ruivo, ou vermelho.

Apesar de sacerdote, Vivaldi teve muitos casos amorosos, um dos quais com uma de suas ex-alunas do conservatório de Ospedale della Pietà, a depois influente cantora Anna Giraud (ou Girò), com quem mantinha também relações profissionais na área da ópera veneziana. As biografias mais pudicas dizem que Anna foi a moça por quem o grande compositor se apaixonou, a inspiradora de suas óperas e a tormenta de todos os seus dias, até a morte. Ela teria muitas vezes beneficiado Vivaldi em troca de papéis adaptados a suas capacidades vocais. Tais trocas levaram outros compositores, como Benedetto Marcello, a escreverem panfletos contra Vivaldi e Giraud. Já Bach teve dois longos casamentos. O amor por suas esposas pode ser depreendido através de suas cartas e dos vinte filhos resultantes — sete com a prima Maria Bárbara e treze com Anna Magdalena, uma cantora profissional com metade de sua idade. O casamento com Maria Bárbara acabou em razão da inesperada morte da mulher e o com Anna Magdalena ocorreu em 1721. Bach tinha 36 anos; Anna, 18.

Bach: evolução permanente e cegueira

Bach escreveu mais de mil obras. Muitas são curtas, mas há mais de 200 Cantatas com duração aproximada de vinte minutos e Paixões com 3 horas de duração. Sua obra completa foi gravada numa coleção da Teldec: são 153 CDs, mais ou menos 153h ou 6 dias e 8 horas de música, sem repetições. Já Vivaldi escreveu 477 concertos — segundo o hostil Stravinsky, tratava-se de 477 concertos iguais — , mais 46 óperas e 73 sonatas. Em seu caso, ainda há muitas óperas não gravadas — porém, considerando o porte das óperas gravadas, é crível que o tamanho de sua obra seja semelhante ao de Bach.

Vivaldi parecia ter nascido pronto, seu estilo de composição variou pouco durante sua vida. Já a música de Bach, se não teve seu estilo alterado de forma radical, foi ganhando qualidade de forma inacreditável. Grosso modo, suas últimas composições foram as Variações Goldberg, A Oferenda Musical e A Arte da Fuga. Estas são monumentos, verdadeiras catedrais construídas em homenagem ao contraponto e à polifonia. No final de sua vida, Johann Sebastian Bach estava em seu auge, criando, se não suas obras mais perfeitas, aquelas que mais recebem tempo e dedicação dos especialistas.

Bach fora míope durante toda a vida e, durante a composição de A Arte da Fuga, sua visão se apagou. Porém, em fins de março de 1750, ano de sua morte, o famoso cirurgião oftalmológico John Taylor esteve de passagem em Leipzig. Ele foi levado até Bach e o operou. Taylor afirmou que em dois os três dias o paciente voltaria e enxergar. Depois de algumas semanas, como o paciente não apresentasse melhoras, houve uma nova operação, além de sangrias, ventosas e bebidas laxativas para limpá-lo. Apareceu um outro médico que brigou com Taylor. Então foi utilizado sangue de pombo nos olhos do compositor, além de açúcar moído e sal torrado. Dizem que em 18 de julho, dez dias antes de morrer, ele voltou a enxergar, mas no mesmo dia teve febre alta e caiu na inconsciência.

Não era alguém importante para a época. Nem sequer seu túmulo foi indicado. O corpo se perdeu. É um fato tristemente cômico que aquilo que está na catedral de São Tomás, em Leipzig, uma espécie de jazigo construído em sua honra em 1950 — por ocasião do bicentenário de sua morte — não sejam seus restos mortais, mas apenas o testemunho de seu esquecimento. Sua obra começou a ser recuperada por Felix Mendelssohn em meados do século XIX. Mas não é mera casualidade o fato de Mozart e Beethoven terem conhecimento de parte da obra do mestre. Eram estudiosos. Tanto que Beethoven escreveu que seu nome não deveria ser Bach (regato, ribeiro) e sim mar.

Túmulo de Bach na Catedral de St. Thomas, em Leipzig: Bach não está aí

Já Vivaldi foi esquecido por muito mais tempo. Sua ressurreição começou apenas em 1939, quando o compositor italiano Alfredo Casella organizou uma exótica Semana Vivaldi. Depois veio a guerra e só em 1947 foi fundado um tímido Istituto Italiano Antonio Vivaldi com o propósito de promover a música de Vivaldi e publicar novas edições de seus trabalhos. O longo inverno vivaldiano começou logo após sua morte. Quando morreu, era um mendigo em Viena. Teria morrido de “infecção interna”.  Em 28 de julho, ele foi enterrado em um túmulo simples no cemitério do hospital de Viena. Seu corpo, assim como o de Bach, foi perdido. Hoje existe apenas uma placa de homenagem na parede da Universidade de Viena registrando um dos possíveis locais do seu túmulo.

Placa indicando a possível localização do túmulo de Vivaldi, em Viena (Áustria)

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Igreja da Irlanda tem site de ajuda a filhos de padres

Igreja da Irlanda tem site de ajuda a filhos de padres

por Patsy McGarry
para National Catholic Reporter
Retirado do Paulopes

Um site de autoajuda criado na Irlanda para dar assistência aos filhos dos padres católicos tem sido procurado por mulheres de todas as idades do mundo todo, desde a senhora de mais de 80 anos de Boston até a mãe de uma criança de três anos das Filipinas.

Filhos de sacerdotes
Filhos de sacerdotes

“Isso prova que o problema não se limita ao passado. Continua existindo”, afirmou Vincent Doyle (34), fundador do site www.copinginternational.com, que é financiado pelo arcebispo de Dublin, Diarmuid Martin.

Ele disse ao jornal The Irish Times que desde meados de agosto 1.062 pessoas logaram no site, que teve 8 mil visitas e 38 mil acessos de 53 países.

Seu pai, padre John J Doyle, de Co Longford, morreu em 1995. Após confirmar a paternidade do padre em 2011, ele assumiu o sobrenome.

Um artigo publicado no site em 2015 afirma que os acordos de confidencialidade com as mães dos filhos dos sacerdotes eram “uma forma de chantagem contra a mãe e a criança”. Escrito pelo conceituado advogado canônico dos EUA, padre Tom Doyle, afirma que “não há razão válida para tais acordos ou contratos sob qualquer circunstância”.

Em 2015, em resposta às observações do padre Doyle, os bispos católicos da Irlanda disseram que um acordo de confidencialidade era possível “se as partes entrarem em acordo livremente, com o objetivo último de proteger os interesses da criança”.

Esse acordo seria “injusto” se “a mãe fosse indevidamente pressionada” ou se fosse usado “principalmente para proteger a reputação do sacerdote ou a Igreja institucional, criando um véu de sigilo”, disseram.

Em uma carta aberta em apoio ao trabalho da Coping International, o Arcebispo Martin disse que estava disposto a “ajudar, gratuitamente, qualquer filho de sacerdote que o procurasse”.

Peter Murphy, filho do falecido Bispo de Galway Eamonn Casey, recentemente disse ao Boston Globe que a divulgação da identidade de seu pai, em 1992, significou tornar-se uma celebridade instantânea. Ele tinha 17 anos e morava com sua mãe Annie Murphy em Connecticut, nos EUA.

Em um artigo do Spotlight sobre o Coping International, Murphy declarou: “Falei com um (repórter) irlandês de manhã, fui para a escola e pensei: “OK, é só isso”. Mas quando cheguei em casa, eu diria que mais de 100 jornalistas estavam ao redor do condomínio”, disse ele ao Globe.

Com tradução de Luísa Flores Somavilla para IHU Online.

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