Esta bela escultura de Isaac Cordall é intitulada “Políticos falam sobre mudanças climáticas”

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Das afinidades

Das afinidades

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Balthus (1908-2001)

Balthus (1908-2001)

A gravura acima chama-se singelamente Guitar Lesson (1934) e causou certo escândalo ao mostrar uma púbere sendo molestada sexualmente por sua professora. A produção de Balthasar Klossowski de Rola, Balthus, não era nada bissexta, era antes copiosa, cheia de meninas em poses lânguidas. Porém, não se enganem, foi um imenso pintor.

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Imagens do empreendedorismo dos bandeirantes

Imagens do empreendedorismo dos bandeirantes

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A sociedade dos empregos de merda

A sociedade dos empregos de merda

POR DAVID GRAEBER
Do Outras Palavras
180608-Merda-1

Como o capitalismo contemporâneo cria sem cessar ocupações inúteis, enquanto remunera muito mal as mais necessárias. Quais as alternativas? Garantia de trabalho? Ou Renda Cidadã Universal?

David Graeber, entrevistado por Eric Allen Been, na Vice| Tradução: Antonio Martins

Em 1930, o economista britânico John Maynard Keynes previu que, no final do século 20, países como os Estados Unidos teriam – ou deveriam ter – jornadas de trabalho de 15 horas semanais. Por que? Em grande medida, a tecnologia tiraria de nossas mãos tarefas sem sentido. Claro, isso nunca ocorreu. Ao contrário, muitíssimas pessoas, em todo o mundo, estão submetidas a longas jornadas como advogados corporativos, consultores, operadores de telemarketing e outras ocupações.

Mas enquanto muitos de nós julgamos nossos trabalhos muito aborrecidos, algumas ocupações não fazem sentido algum, segundo o escritor anarquista David Graeber. Em seu novo livro, “Bullshit Jobs: A Theory” [“Trabalhos de Merda: Uma Teoria”], o autor argumenta que os seres humanos consomem suas vidas, muito frequentemente, em atividades assalariadas inúteis. Graeber, que nasceu nos EUA e que já havia escrito, entre outras obras, Dívida: Os Primeiros 5000 anos e The Utopia of Rules [ainda sem edição em português] é professor de Antropologia na London School of Economics e uma das vozes mais conhecidas do movimento Occupy Wall Street (atribui-se a ele a frase “Somos os 99%”).

A “Vice” encontrou-se há pouco com Graeber para conversar sobre o que ele define como “emprego de merda”; por que os trabalhos socialmente úteis são tão mal pagos, e como uma renda básica assegurada a todos poderia resolver esta enorme injustiça.

Em primeiro lugar, o que são empregos de merda e por que existem?

David Graeber: Basicamente, um emprego de merda é aquele cujo executor pensa secretamente que sua atividade ou é completamente sem sentido, ou não produz nada. E também considera que se aquele emprego desaparecesse, o mundo poderia inclusive converter-se num lugar melhor. Mas o trabalhador não pode admitir isso – daí o elemento de merda. Trata-se, portanto, em essência, de fingir que se está fazendo algo útil, só que não.

Uma série de fatores contribuiu para criar esta situação estranha. Um deles é a filosofia geral de que o trabalho – não importa qual – é sempre bom. Se há algo em que a esquerda e a direita clássicas frequentemente estão de acordo é no fato de ambas concordarem que mais empregos são uma solução para qualquer problema. Não se fala em “bons” trabalhos, que de fato signifiquem algo. Um conservador, para o qual precisamos reduzir impostos para estimular os “criadores de emprego”, não falará sobre que tipo de ocupações quer criar. Mas há também partidários da esquerda insistindo em como precisamos de mais ocupações para apoiar as famílias que trabalham duro. Mas e as famílias que desejam trabalhar moderadamente? Quem as apoiará?

Até mesmo os empregos de merda garantem a renda necessária para que as pessoas sobrevivam. No fim das contas, por que isso é ruim?

Mas a questão é: se a sociedade tem os meios para sustentar todo mundo – o que é verdade – por que insistimos em que os trabalhadores passem sua vida cavando e em seguida tapando buracos? Não faz muito sentido, certo? Em termos sociais, parece sadismo.

Em termos individuais, isso pode ser visto como uma boa troca. Mas, na verdade, as pessoas obrigadas a tais trabalhos estão em situação miserável. Podem considerar: “estou ganhando algo por nada”. Bem, as pessoas que recebem salários bons, muitas vezes de nível executivo, certamente de classe média, quase sempre passam o dia em jogos de computador ou atualizando seus perfis de Facebook. Quem sabe, atendendo o telefone duas vezes por dia. Deveriam estar felizes por ser malandros, certo? Mas não são.

As pessoas contratadas para tais trabalhos relatam, regularmente, que estão deprimidas. E se lamentarão, e praticarão bullying umas contra as outras, e se apavorarão com prazos finais porque são de fato muito raras. Porém, se pudessem buscar uma razão social no trabalho, uma boa parte de suas atividades desapareceria. As doenças psicossomáticas de que as pessoas padecem simplesmente somem, no momento em que elas precisam realizar uma tarefa real, ou em que se demitem e partem para um trabalho de verdade.

Segundo seu livro, a sociedade pressiona os jovens estudantes para buscar alguma experiência de emprego, com o único objetivo de ensiná-los a fingir que trabalham.

É interessante. Chamo de trabalho real aquele em que o trabalhador realiza alguma coisa. Se você é estudante, trata-se de escrever. Preparar projetos. Se você é um estudante de Ciências, faz atividades de laboratório. Presta exames. É condicionado pelos resultados e precisa organizar sua atividade da maneira mais efetiva possível para chegar a eles.

Porém, os empregos oferecidos aos estudantes frequentemente implicam não fazer nada. Muitas vezes, são funções administrativas onde eles simplesmente rearranjam papéis o dia inteiro. Na verdade, estão sendo ensinados a não se queixar e a compreender que, assim que terminarem os estudos, não serão mais julgados pelos resultados – mas, essencialmente, pela habilidade em cumprir ordens.

E os empregos tecnológicos ou na mídia. Seriam, também, de merda?

Certamente. Por meio do Twitter, pedi às pessoas que me relatassem seus empregos mais sem sentido. Obtive centenas de respostas. Havia um rapaz, por exemplo, que desenhava bâners publicitários para páginas web. Disse que havia dados demonstrando que ninguém nunca clica nestes anúncios. Mas era preciso manipular os dados para “demonstrar” aos clientes que havia visualizações – para que as pessoas julgassem o trabalho importante.

Na mídia, ha um exemplo interessante: revistas e jornais internos, para grandes corporações. Há bastante gente envolvida na produção deste material, que existe principalmente para que os executivos sintam-se bem a respeito de si próprios. Ninguém mais lê estas publicações.

A automação é vista, muitas vezes, como algo negativo. Você discorda deste ponto de vista, não?

Certamente. Não o compreendo. Por que não deveríamos eliminar os trabalhos desagradáveis? Em 1900 ou 1950, quando se imaginava o futuro, pensava-se: “As pessoas estarão trabalhando 15 horas por semana. É ótimo, porque os robôs farão o trabalho por nós”. Hoje, este futuro chegou e dizemos: ”Oh, não. Os robôs estão chegando para roubar nossos trabalhos”. Em parte, é porque não podemos mais imaginar o que faríamos conosco mesmo se tivéssemos um tempo razoável de lazer.

Como antropólogo, sei perfeitamente que tempo abundante de lazer não irá levar a maioria das pessoas à depressão. As pessoas encontram o que fazer. Apenas não sabemos que tipo de atividade seria, porque não temos tempo de lazer suficiente para imaginar.

Pergunto: por que as pessoas agem como se a perspectiva de eliminar o trabalho desnecessário fosse um problema? Deveríamos pensar que um sistema eficiente é aquele em que se pode dizer: “Bem, temos menos necessidade de trabalho. Vamos redistribuir o trabalho necessário de maneira equitativa”. Por que isso é difícil? Se as pessoas simplesmente assumem que é algo completamente impossível, parece-me claro que não estamos em um sistema eficiente.

Um dos pontos mais interessantes do livro são suas observações sobre como os empregos socialmente valiosos são quase sempre menos bem pagos que os empregos de merda.

Foi uma das coisas que, pessoalmente, mais me chocou na fase da pesquisa. Comecei a tentar descobrir se algum economista havia observado o fenômeno e tentado explicá-lo. Houve antecedentes, na verdade. Alguns eram economistas de esquerda; outros, não. Alguns eram totalmente mainstream.

Mas todos chegaram à mesma conclusão. Segundo eles, há uma tendência: quanto mais benefícios sociais um emprego produz, menor tende a ser a remuneração – e também a dignidade, o respeito e os benefícios. É curioso. Há poucas exceções e não são tão excepcionais como se poderia pensar. Os médicos, é claro, são um caso notório: é evidente que são pagos com justiça e oferecem benefícios sociais.

Porém, há um argumento recorrente: “Não seria bom que pessoas interessadas apenas em dinheiro ensinassem as crianças. Não se deve pagar demais aos professores. Se o fizéssemos, teríamos gente gananciosa na profissão, em vez de professores que se sacrificam”. Há também a ideia de que se um trabalhador sabe que sua atividade produz benefícios, isso pode ser o bastante. “Como, você quer dinheiro, além de tudo?” As pessoas tendem a discriminar qualquer um que tenha escolhido um emprego altruísta, sacrificante ou apenas útil.

Aparentemente, você é pouco favorável à ideia de garantia de trabalho, defendida entre outros por Bernie Sanders [candidato de esquerda à presidência dos EUA], por preferir a garantia de renda cidadã.

Sim. Sou alguém que não quer criar mais burocracia e mais empregos de merda. Há um debate sobre garantia de trabalho – que Sanders, de fato, propõe, nos EUA. Significa que os governos deveriam assegurar que todos tenham acesso ao menos a algum tipo de trabalho. Mas a ideia por trás da renda universal da cidadania é outra: simplesmente assegurar às pessoas meios suficientes para viver com dignidade. Além desse patamar, cada um pode definir quanto mais deseja.

Acredito que a garantia de trabalho certamente criaria mais empregos de merda. Historicamente, é o que sempre acontece. E por que deveríamos querer que os governos decidissem o que podemos fazer? Liberdade implica em nossa capacidade de decidir por nós mesmos o que queremos e como queremos contribuir para a sociedade. Mas vivemos como se tivéssemos nos condicionado a pensar que, embora vejamos na liberdade o valor mais alto, na verdade não a desejamos. A renda básica da cidadania ajudaria a garantir exatamente isso. Não seria ótimo dizer: “Você não tem mais que se preocupar com a sobrevivência. Vá e decida o que quer fazer consigo mesmo”?

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Estônia será primeiro país do mundo com transportes públicos gratuitos

Estônia será primeiro país do mundo com transportes públicos gratuitos

Face ao sucesso da medida na capital, Tallinn, o governo da Estónia alocou uma parcela do Orçamento nacional para permitir que as restantes cidades possam disponibilizar o acesso gratuito aos transportes públicos para os seus residentes.

Do esquerda.net

Tallinn, a capital da Estônia, conduziu há cinco anos um referendo onde propunha a possibilidade de acesso gratuito aos transportes públicos, ao qual 75% dos eleitores votaram positivamente.

Para usufruir desta medida era necessário residir na cidade e pagar 2€ por um “cartão verde”. Esta medida não abrangia turistas e visitantes de outras cidades do país, que têm de pagar para usar os transportes públicos da cidade.

Esta medida provou ser de tal forma popular que agora o governo da Estônia está tornando gratuitos os ônibus de todo o país. A partir de 1 de julho, todas as cidades poderão implementar o acesso totalmente gratuito aos transportes públicos para os seus residentes.

Embora esta não seja uma medida obrigatória, quem o fizer receberá um financiamento adicional que constará no orçamento nacional do país para os transportes públicos.

“Não há dúvidas de que não só conseguimos cobrir as despesas, como obtemos lucro”, afirmou Allan Alaküla, chefe do gabinete da União Europeia em Tallinn, à PopUpCity. “Ganhamos o dobro daquilo que investimos desde a introdução dos transportes públicos gratuitos. Estamos contentes por perceber que há tantas pessoas motivadas para se inscreverem como residentes de Tallinn para acederem aos nossos transportes públicos gratuitos”.

Algumas cidades francesas e alemãs também estão a ponderar a introdução de medidas semelhantes de forma a reduzir o número de carros nas cidades e a poluição por estes causada. Também o País de Gales está a aplicar o acesso gratuito aos ônibus durante o fim de semana.

E Tallinn ainda é bonitin.
E Tallinn ainda é bonitin.

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Ensinando a roubar livros

Ensinando a roubar livros

Em minha opinião, o roubo de livros é uma atividade adolescente, no máximo universitária. Um ladrão de livros com mais de 23 anos é um sujeito digno de lástima, a não ser que não tenha absolutamente dinheiro para obtê-los. O amor aos livros justifica o erro e esta atividade deve ser coibida pelo livreiro com compreensão, até com carinho por seu futuro cliente. Roubei muitos livros na época em que tinha entre 15 e 22 anos. Quando chegava em casa, escrevia meu nome e a data, acompanhado da misteriosa inscrição “Ad.”, de adquirido. Nunca me pegaram. Hoje tenho 59 anos e nem penso mais nisso. Porém, já fui um ladrão de livros. Comecemos pela ética da coisa e depois vamos às instruções.

ideafixa.co

Nunca roubarás as pequenas livrarias. Pois as pequenas livrarias foram feitas para a amizade, para as conversas e não combinam com atitudes detetivescas. Também não se rouba onde é fácil demais e onde o livreiro atende o cliente pessoalmente. Além do mais, roubar uma pequena livraria é colaborar com a proliferação das megalivrarias, estabelecimentos sem personalidade, de atendimento impessoal e onde grassa a ignorância a respeito do próprio acervo. Não se roubam livreiros que sobrevivem com dificuldade.

Nunca roube, a não ser que sejas estudante ou estejas desempregado. Roubo de livros não combina com salário e cleptomania. O roubo de livros deve nascer de uma necessidade absoluta de literatura ou informação, de um imperativo interno que esteja catalogado no CID.

Nunca olharás em torno. O fundamental, para quem pretenda atuar nesta área, é manter o ar casual. É como colar numa prova. Se, durante uma prova, você abre sua bolsa para pegar um lápis, você não olha para o professor. Se você for colar, aja com a mesma naturalidade. Não olhe para os lados, não observe onde o professor está — evite, é claro, fazê-lo com ele a seu lado –, pois se você se comportar como um periscópio de submarino, o inimigo irá observá-lo.

Nunca venderão livros onde vendem mondongo. Na minha época, a vítima principal de meus roubos era um supermercado. Vender livros em supermercados… Vender livros ao lado de azeitonas, bifes de fígado, mondongo e alvejante é algo que desmerece a literatura e, se nossas leis fossem inteligentes, tal absurdo seria proibido. O roubo era simples, mas envolvia alguns gastos. Eu pegava o livro na estante e me dirigia com ele à lancheria. Levava o livro como quem não quer nada, como se fosse seu dono. Lá, sentava-me e pedia qualquer porcaria, de preferência gordurosa. Enquanto esperava, pegava minha caneta e iniciava a leitura. Quando passava por uma parte interessante, sublinhava-a; se houvesse algo engraçado, desenhava uma carinha rindo; se triste, uma cara triste. Na última página, escrevia um número de telefone, como se ontem estivesse em casa com meu livro sem um papel para anotar e tivesse anotado na última página da coisa mais à mão, meu livro. Outra coisa importante que fazia era ler girando a capa até a contracapa, segurando o livro com firmeza, de forma a marcar a lombada. Fazia isso em vários pontos até a metade do volume. Sim, exato, você o deixará usado! Depois, é só sair do super com o livro na mão, naturalmente, à vista de todos.

Nunca terás pressa. Havia outras livrarias que colaboraram para meu acervo da época. Nelas, o método era outro. Sabemos que um bom leitor, utiliza seus livros como objetos transicionais; ou seja, ele leva seus livros aonde vai, da mesma forma que uma criança leva seu bichinho, travesseirinho de estimação, sentindo-se mal se ele não está próximo. Então, entrava na livraria sem pressa e pegava um livro. Caminhava lentamente mais ou menos 1 Km dentro do salão. Se alguém o estivesse observando, certamente cansaria. Lá pelo meio da jornada, colocava o livro a ser surrupiado junto do livro que trouxera, o objeto transicional. Caminhava mais 1 Km dentro da livraria. Chegava a cansar de ser dono daquele livro. Saía calmamente. Ficava um bom tempo na porta da livraria examinando os lançamentos, parava na frente da vitrine, demonstrava segurança, espezinhava o medo. Depois disso, podia ir para casa.

Nunca deixarás de examinar todas as variáveis à luz da tecnologia de nossos dias. Como já disse, não estou mais em idade de cometer tais pequenos crimes. Portanto, estou desatualizado e desconheço o método correto. Posso apenas sugerir posturas. As megalivrarias tem aquela coisa magnetizada ou com chip que acompanha o livro. Aquilo tem de ser anulado ou retirado. Estará a juventude de hoje destinada a pagar por todos os seus livros? E depois falam em incentivo à leitura! Olha, talvez não seja necessário pagar sempre. Há que anular o troço, talvez até arrancando a geringonça do livro. Pergunta: se você colocar o objeto de desejo dentro de uma bolsa, entre papéis ou de alguma forma tapado, mesmo assim acordará o alarme no momento da saída? Sim, o risco é imensamente maior e nem imagino o que os homens da segurança farão com você. Outro jeito é usar a ciência e desmagnetizar a coisa. Leve ímãs, leia a respeito, pesquise. Como esses livrarias são grandes e às vezes têm cafés, você pode avaliar com tranquilidade os riscos e a forma mais adequada de ler o próximo Thomas Pynchon. Todos nós já vimos como o caixa realiza a mágica de desmagnetizar; ele apenas adeja algo semelhante a um limpador de discos de vinil sobre a contracapa do livro. O que é aquilo? Concordo, é uma merda, haverá menos romantismo e mais aventura.

Nunca roubarás pockets. Sabemos que o preço do livro no Brasil é escandaloso. Para solucionar o problema, a L&PM começou a comercializar pocket books. Outras a imitaram. É uma coisa boa. Não, meu amigo, roubar esses bons livrinhos de menos de R$ 20,00 é pecado e, se você o fizer, merecerá o patíbulo.

Nunca negarás o empréstimo de livros. Um dos lugares-comuns mais ridículos que as pessoas dizem é “Não empresto meus livros”; verdadeiro clichê de quem não gosta e não confia nos amigos. Estes merecem o açoite. Imaginem que já emprestei até meu Doutor Fausto! Um livro lido e posto numa estante até o fim de seus dias é um livro que agoniza por anos. Comprar e nunca ler é fazer do livro um natimorto. Mas o pior são os do outro lado: aqueles que efetivamente não devolvem os livros tomados por empréstimo, justificando a atitude paranoica do primeiro. Patíbulo, novamente.

Biblioteca-Quadro

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Atenção bebuns, quem diz não sou eu, mas Shakespeare em Macbeth:

Atenção bebuns, quem diz não sou eu, mas Shakespeare em Macbeth:

MACDUFF: E que três coisas a bebida provoca?

PORTEIRO: Ora, senhor, nariz vermelho, sono e muita urina. A luxúria, senhor, é também por ela provocada e invalidada: provoca o desejo, mas rouba-lhe a potência. Portanto, bebida demais, senhor, pode-se dizer que é enganadora com a luxúria: faz o homem e o aniquila, deixa o homem pronto e impede-o de comparecer, ela o persuade e desencoraja-o, deixa-o teso e faz ele broxar. Em suma, engana-o até a sonolência, coloca-o para dormir e deixa-o sozinho.

Trad. Beatriz Viégas-Faria — Ed. L&PM

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“DRINK, SIR, IS A GREAT PROVOKER OF THREE THINGS… NOSE PAINTING, SLEEP AND URINE. LECHERY, SIR, IT PROVOKES AND, UNPROVOKES; IT PROVOKES THE DESIRE BUT TAKES AWAY THE PERFORMANCE.”

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Charlie Hebdo satiriza imagem de Aylan Kurdi em novas charges

Charlie Hebdo satiriza imagem de Aylan Kurdi em novas charges

aylanEnquanto o mundo têm se comovido com o destino de Aylan Kurdi, a criança síria que se tornou o símbolo da crise dos refugiados, o jornal satírico francês Charlie Hebdo tratou de zombar do fato.

Oito meses após o ataque terrorista que atingiu a sua sede em Paris , em janeiro, Charlie está de volta à cena com um novo set controverso de desenhos, nos quais faz piada com a imagem de Aylan, recentemente encontrado morto em uma praia turca.

Intitulado “Tão próximo de seu objetivo”, o primeiro desenho caracteriza Aylan deitado de bruços na praia perto de uma placa de publicidade de um “2 pelo preço de 1” da McDonald`s que diz “Dois menus criança pelo preço de um “.

charlie hebdo 1 aylan

Digamos que o primeiro ainda posa ser chamado de humor, mas o segundo vai contra o próprio ateísmo da revista. Ou não? Este chama-se “A prova de que a Europa é cristã”, mostrando uma criança afogando-se nas águas. No lado esquerdo, um homem, supostamente Jesus, caminha sobre as águas. o texto diz: “Cristãos caminham sobre as águas. As crianças muçulmanas crianças afundam. ”
charlie hebdo 2 aylan

O debate sobre estas imagens e sobre a verdadeira intenção da publicação está nas redes sociais. Há quem acuse o Charlie Hebdo de racismo. No entanto, há quem discorde e que argumente que estes cartoons versam sobre a reação europeia em relação à crise dos refugiados. Há oito meses atrás, eu disse que a Charlie era uma revista de humor grosseiro e quase fui fatiado. Sou a favor da liberdade de expressão da revista e de todos, sou contra bombardearem uma redação, claro, mas sigo achando a Charlie uma publicação de considerável mau gosto.

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Onde começa e termina a ideologia (um divertido esboço, ao menos para mim)

Onde começa e termina a ideologia (um divertido esboço, ao menos para mim)

Para descobrirmos a ideologia de uma pessoa, basta saber como ela trata seu dinheiro.

IVAN OSÓRIO (1)

Para identificarmos um mau caráter, basta observar como ele trata as crianças. Se ele as despreza ou humilha, não é incontestável, mas o cara tem boas possibilidades de ser um deles.

N. F. (1)

Caso 1. Meu primo J.R. é engenheiro e não sei se é de esquerda, centro ou direita. Ele gosta de dormir, mas tem que chegar ao trabalho às 8h da manhã. Então, calculou a forma mais otimizada de fazê-lo. Sabe como deve fazer para dar o menor número de passos dentro de sua casa e o algoritmo ideal para não precisar entrar duas vezes no banheiro. Sabe igualmente as melhores ruas para trafegar e que, acordando às 7h10, pode ficar 3 minutos rolando na cama. Nem mais, nem menos. É organizado, confiável, correto, bem humorado. Parece viver feliz. Ele é inteiro. (2)

Caso 2. Meu amigo A. é matemático e comuna. Ele gosta do trabalho de sua empregada, a Nenê, que vai a sua casa há trinta anos, três vezes por semana. Eu soube que um dia A. chegou em casa fora do horário habitual e Nenê estava lá, sentada, olhando pela janela. Não era dia de faxina e ele perguntou o que ela estava fazendo. Ela respondeu constrangida que estava com problemas em casa e achou que podia passar alguns momentos de tranquilidade no apartamento dele. Ele arranjou uma desculpa, pegou qualquer coisa sobre a mesa e disse-lhe que ficasse à vontade. A propósito, ele é inteiro. (2)

Caso 3. Meu amigo T. é ecologista e pensa ser um liberal de esquerda. Gosta de criar belas metáforas e analogias para ornamentar seus discursos, mas nem todos as entendem. Sabe como criá-las utilizando suas idéias. São bonitas. Quando estava por se separar, pensou se não seria ecológico para sua alma tentar fazer renascer o amor entre ele e sua mulher. Deu certo. É adorado por ela. Hoje estão juntos. Sob outros acordos. Ele é inteiro. (2)

Caso 4. Minha amiga P. é violinista, budista e de direita. Ela gosta de Bach e tatuou aqueles dois esses que furam o tampo frontal dos violinos e violoncelos, ladeando as cordas. Ela os têm ladeando sua espinha dorsal, pouco abaixo da nuca, como se ela toda fosse um violino. Ficou sexy, sabe? Que som terá? Como budista, ela tenta aprimorar-se e evoluir em tudo. Em dez anos, tornou-se excelente musicista e a mulher mais agradável, interessada e gentil que conheço. É impressionante como nos sentimos bem com ela por perto. Ela é inteira. (2)

marx

Caso 5. Minha amiga X. é a socióloga e intelectual de esquerda mais culta que conheço. Gosta de pontificar brilhantemente durante horas, mas não tem tempo para tornar-se militante de nada, só do instituto de beleza. Sabe como poucos amassar adversários em discussões. Era casada com meu amigo I. que é de centro. Quando se separaram, ele entrou em depressão, parou de trabalhar e perdeu muito dinheiro. Orientada pelo pai, ela fez com que ele assinasse a passagem de todos os bens para ela, além de ter negociado um acordo que, a rigor, o arruinaria. Ela é… Os cacos do espelho espalharam-se pelo mundo. (3)

Caso 6. Minha amiga A. é blogueira, provavelmente historiadora, de esquerda e relaciona-se com o mundo através da ironia. Gosta de ridicularizar aquilo que acha vulgar. Escreve posts semelhantes às notícias de Caras ao lado de outros com interessantes análises políticas. Sabe ser engraçada e parece inteligente, mas L. sempre desconfiou de quem zomba e conhece tanto sobre a vulgaridade alheia. L. fez um comentário no estilo de A., tendo como mote um erro cometido por ela. Ela teve um chilique ao ver-se alvejada. Deletou o post inteiro. Ofendeu-se e ofendeu. Ela é… Os cacos do espelho espalharam-se pelo mundo. (3)

Caso 7. X. é petista e quer ajudar todo mundo. Mas ocorreram problemas em seu terceiro ou quarto casamento e ela não apenas trocou as chaves de casa, deixando seu ex-marido na rua, como mentiu a amigos sobre ele. Ele usava o dinheiro dela, queria roubar sua casa numa partilha, detestou-a pelo fato de ela não poder ter filhos, era desinteressado sexualmente, etc. Ela também repete o padrão de odiar a ex-mulher do atual marido e de tentar cooptar os filhos no ex-casal para sua área de influência. Ela é… Os cacos do espelho espalharam-se pelo mundo. (3)

Pergunto: Onde começa a ideologia? Ela vem do íntimo e sobe para a vida social ou é o contrário? Por que nem sempre ela invade o comportamento? Como alguém pode isolar as ideias que professa de sua práxis íntima? E o contrário faz alguém feliz?

(1) Afirmações reais de amigos reais, falsa e idealmente ouvidas à noite, em torno de uma mesa, com boa bebida, comida idem.

(2) Pessoa inteira: do jargão psi. Trata-se de uma pessoa centrada, mas não auto-centrada ou em faixa própria. Alguém que possui uma trajetória com um conceito, com uma essência que o apóia. Pessoa de ética inabalável, não casuísta. Simplificando, o “inteiro” é o mesmo em qualquer circunstância, não diz uma coisa e faz outra, nem tem duas caras.

(3) Em A Rainha da Neve (1845), de Hans Christian Andersen (1805-1875), o diabo fabrica um espelho que exagera os menores defeitos dos objetos refletidos. Ao elevá-lo ao céu, com o objetivo de lá refletir os anjos, o espelho escapa das mãos do demônio, partindo-se em milhões de pedaços. Estes penetram nos olhos e nos corações dos homens, que passam a ver apenas o mal e a fealdade a seu redor. Neste conto, há a frase Os cacos do espelho espalharam-se pelo mundo.

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Filme 'O Som ao Redor' faz piada com leitor da Veja

Há uma pequena e excelente safra — esperamos que crescente! — de filmes pernambucanos. Um deles é O Som ao Redor, que está em cartaz pelo Brasil. O curioso é que o diretor Kleber Mendonça Filho, ao desejar caracterizar alguém truculento e de direita, usou a revista Veja. É uma bela e sutil piada do filme.

O Som ao Redor, que trata do cotidiano da classe média, tem uma cena que é uma reunião de condomínio. Nela, uma das moradoras reclama do porteiro e diz que sua revista Veja “está chegando sem o plástico”. Pronto! Para o espectador brasileiro, a personagem está explicada. Afinal, com raras exceções, é isso mesmo. A inesperada referência à Veja torna a cena hilariante. Muita coragem do diretor, que pode se preparar para a volta. Te cuida, Kleber!

(Uma lembrança do ótimo Educação Política.)

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Meu sonho de Natal

Quando eu era pequeno, gostava do Natal. Na verdade, adorava, claro, porque meus pais nos enchiam de presentes. A festa era diferente, era matinal. A gente ia dormir pensando naquilo que o Papai Noel nos deixaria durante a noite e, quando acordávamos, nossa, ele tinha adivinhado nossos mais profundos desejos! Lembro especialmente de quando ganhei um autorama, mas isso é outro papo.

Depois, meu esfriamento em relação à data chegou a grau zero. Ainda na pré-adolescência, sem ler nada e sem maior influência, tornei-me ateu, um ateu natural e a data, que originariamente é uma festa pagã, passou a me irritar em razão de seu substrato religioso. Acho que todos os meus sete leitores sabem que a origem da festa não guarda o menor ranço de cristianismo: é o Solis Invictus (Sol Invencível), o Solstício de inverno. Era uma enorme festança que acontecia na noite mais longa do hemisfério norte para comemorar o recomeço, pois dali por diante os dias seriam mais longos, pouco a pouco mais quentes, e haveria a possibilidade de novas e fartas colheitas. Uma belíssima data do hemisfério norte, uma data bem realista que nos foi tomada pela igreja. De certa forma, era mais ou menos (eu escrevi mais ou menos) o que é nossa virada de ano, com suas renovadas esperanças, resoluções e renovação.

Depois, quando vieram as crianças, cheguei a me vestir de Papai Noel. No segundo ano, o Bernardo ficou me olhando como quem diz “Mas esse aí é o meu pai” e, perguntado se não era no dia seguinte, neguei e desisti de novas tentativas. A Bárbara deve ter aproveitado menos dessas festinhas. Também pudera! Ela, com três anos de idade e já sob a influência do irmão três anos mais velho, costumava observar aos coleguinhas de maternal que nem Deus nem Papai Noel existiam, fato que a deixava extremamente popular entre seus amiguinhos e objeto de desconfiança dos outros pais. Quem seria aquela crespinha louca, de três anos, que fazia proselitismo ateu num maternal?

Terrível: Bárbara por volta da época em que fazia proselitismo ateu. Ainda faz, acho.

Hoje, nem dou bola para o Natal, mas acho que está na hora dos movimentos ateus serem menos mal humorados. A data é nossa. Simples assim. Por exemplo, o presidente da Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, da qual sou sócio), Daniel Sottomaior, comemora tranquilamente e não se incomoda com a data. Ele tem uma filha de 8 anos que adora o 25 de dezembro. Diz ele: “Nossa árvore é uma árvore de referência a Isaac Newton, que nasceu nesta data e que descobriu a Lei da Gravidade. Ela tem maçãs e luzes. Os outros simbolismos – perus, renas, presentes, árvores, Roberto Carlos – , nada disso nasceu com o Natal”. E completa: “Estamos apenas retomando uma data pagã que nos foi roubada pela igreja e que foi comemorada por sete mil anos antes do século III”.

Aqui em casa, durante o Natal, meu filho costumava  — esse ano ele não fez (por quê?) — escrever no quadro de avisos da cozinha em letras garrafais: Natalis Solis Invictus, isto é, Nascimento do Sol Invencível. O nascimento do Sol Invencível é o momento em que o Sol inicia a Sua ascensão triunfante, representando, neste momento, a Luz que nunca morre e vence sempre, reflexo da imortalidade. (E que acabará com a Terra, daqui a 5 bilhões de anos…). Á época, a data era uma coisa tão forte que a igreja trouxe o nascimento de Jesus justo para o 25 de dezembro… Vergonha.

Então, meu sonho de Natal é que o paganismo retome a data. E que, no hemisfério sul, a gente invente um modo bem livre e religiosamente incorreto de comemorá-lo. Eu acharia muito justo se os namorados perseguissem uns aos outros nus pelas ruas, algo assim. É sonho, e em sonhos vale tudo.

P.S. — Rodrigo Cardia que, assim como eu, odeia o verão, escreveu: O texto do Milton Ribeiro me fez lembrar do significado original da celebração: o solstício de inverno no hemisfério norte, noite mais longa do ano, depois elas começam a ficar mais curtas. E então percebo que tenho algo a celebrar: aqui no hemisfério sul as noites começam a ficar mais longas… 

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Nada de choro, o fim-de-semana não foi tão ruim assim

Pensem como esta eleição foi boa:

1. Haroldo de Souza está fora da câmara dos vereadores de Porto Alegre.
2. O Brasinha também.
3. Mônica Leal idem, mas acabará certamente em alguma secretaria.
4. Outra boa notícia é que Tarsila Crusius não emplacou.
5. Os jogadores de futebol que estrearam na política também não foram eleitos.
6. A Universal ficou de fora com Russomanno.
7. O vereador mais votado de Florianópolis é gay.
8. E, hoje, no Chile, estudantes anunciaram uma greve e convocaram manifestação nacional — Me gustan los estudiantes. Chances de ver novamente Camila Vallejo, mesmo ela não sendo mais a presidente da Fech? Saudades.
9. Bem lembrado, Lennon: e o Chávez ganhou!

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Milton Ribeiro em 21 de março de 1964

9 dias depois da inauguração do Araújo Vianna, 10 dias antes do Golpe, eu brincava no gramado do auditório, hoje cercado.

Naqueles dias, a gente subia e descia e rolava na grama e ainda sentava para tomar sol no gramado que circunda o Araújo Vianna.

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General Câmera: sorria, você está sendo filmado

A pressa com que a prefeitura faz nascer placas nesta época pré-eleitoral está prejudicando não somente a paisagem porto-alegrense, como também a correção do nome de suas ruas. Se todo mundo já chama a rua do Sul21 de Rua da Ladeira, agora corremos o risco de acentuar a confusão, pois foi criada uma nova forma de referir-se ao logradouro. Este envolve um ato falho, pois, se utilizarmos uma câmera, veremos que não há nada por trás da placa, nem um buraquinho…

A placa apareceu bem depois do dia 18 de julho, segundo o vigilante porteiro do prédio do Sul21

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Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?

Eram três da tarde quando Jesus lançou este grito ao céu. Há três longas horas Ele estava suspenso na cruz, pregado pelas mãos e pelos pés.

Mas se fosse essa moça na cruz, o povo resolveria o problema imediatamente.

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Refletindo sobre o humor em texto rápido

Para L.W. e I. B.

Ontem, ouvi um parvo desqualificando uma pessoa por não se levar à sério. “Ora, uma pessoa que faz isso não se leva a sério”, dizia o beócio. Cada vez que alguém é desqualificado por não ser sério, desconfio imediatamente do acusador. É inequívoco que uma acusação do gênero só pode partir de quem está incomodado e é muito mais interessante descobrir exatamente onde este foi tocado. Pois assim como uma ofensa diz bem mais sobre quem ofende do que sobre o ofendido, a denúncia de não ser sério faz com que o detrator se desnude muito mais do que o “inconsequente” autor de alguma gracinha. Digo “gracinha” com extremo amor aos bem humorados. Penso que o bom humor seja uma manifestação de inteligência do ser humano e um dos fatores mais importantes na aproximação entre os indivíduos. Obviamente, existe a figura do bobo feliz, porém mesmo este é melhor do que o bobo mal humorado. Também não há grande relação nenhuma entre bom humor e imaturidade e meu teórico literário preferido, Mikhail Bakhtin, mata a pau neste ponto.

Mikhail Bakhtin

“Somente o riso pode ter acesso a certos aspectos extremamente importantes do mundo”. Como diz este texto, “o humor é capaz de relativizar a força dos valores ligados à ordem, à produtividade, à intemporalidade, à razão. De modo semelhante, Jankélévitch sustenta que a consciência irônica, ao substituir o absoluto pelo relativo, produz o apagamento das fronteiras entre o certo e o errado, o positivo e o negativo, o grave e o irrisório, o fundamental e o acessório, provocando assim um movimento de recuo da consciência. Esse deslocamento de perspectiva abre caminho para a auto-reflexão e para se repensarem os próprios limites”.

E segue: “O humor não é um fenômeno menor. Relegá-lo ao segundo plano é um sintoma do levar-se a sério demais, da pretensão. O próprio fato de se construir pelo avesso, por meio de desvios e transgressões, lhe fornece uma dimensão privilegiada, reveladora de formas de organização do tecido social e de modos de funcionamento das instituições. Por outro lado, além de revelar um profundo enraizamento no terreno social que o produz, tornando-se assim um de seus mais espontâneos reflexos, o propósito humorístico nos toca igualmente pelo caráter econômico e sintético de sua articulação”.

Bakhtin sustentava que “o humor é uma das formas capitais pelas quais se exprime a verdade sobre o mundo na sua totalidade”. E digo eu que o humor é responsável por criticar, de sua forma irreverente, a estrutura de poder da sociedade. O humor é de oposição. Quando ao lado do poder, ou tem de ser muito bem feito ou dará lugar à ridicularização ofensiva e banal de fatos e pessoas.

Sempre tive para mim que somente os inteligentes não levam tudo a sério e sabem se divertir mesmo com as intermináveis chatices cotidianas. Sempre tive para mim que somente pessoas problemáticas e neuróticas podem realmente entediar-se em nosso século.

E volto ao trabalho.

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Ser saudável nem sempre resulta em boa aparência

Na verdade, às vezes dá muito errado! As latinhas de Gillian McKeith e de Nigella Lawson — OK, admitamos que Nigella nasceu com mais sorte — , ambas de 51 anos, apresentam estados muito diferentes de conservação… McKeith é aquela apresentadora que cheira o cocô de gente gorda na TV inglesa. Ela se compraz em fazer sofrer as pessoas cuja vida examina. Por exemplo, bota sobre uma mesa tudo o que um gordão vai comer num mês e berra com o coitado. É uma sádica, atitude que faz muito sucesso na TV inglesa, onde pessoas comuns aparecem nos programas para serem corrigidas e humilhadas (Super Nanny e mais uns três ou quatro que não vou lembrar agora, mas que passam ad nauseam no canal pago GNT). O sadismo lhe fez mal, nossa.

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Símbolos

Não ignoro que este assunto só poderia ser discutido em calhamaços, mas vou tentar fazer uma pré-introdução-resumida-e-sumular ao assunto da simbologia na arte.

Ela existe desde tempos imemoriais. Creio que as primeiras representações através de símbolos ocorreram na pintura. Há sempre um livro ou alguém disponível para nos explicar o que estão fazendo aquelas pessoas estáticas. Uma vez, li um tratado sobre as gravuras de Brueghel e Dürer. Impressionante. Bach também punha recadinhos nada inconsistentes em sua música.

Na literatura e no cinema, o mainstream da linguagem subliminar corre por dois veios. O primeiro é visto ou lido. É o planeta Melancolia do filme comentado ontem. Por ser visto e palpável, ele é um veio MacGuffin, para falar em linguagem hitchcockiana. O que em Hitchcock é mero pretexto para ação ou suspense, aqui é o cerne de uma história qua aponta para fora de si. Deste modo, sua realidade é melhor compreendida como uma representação de algo maior ou que simplesmente não está ali. Os MacGuffins de Lars von Trier são realmente grandes demais, deselegantes demais, claros demais.

Mas há um o outro tipo de símbolo que eu chamaria de símbolo-situação. Os personagens são colocados de tal modo que o contexto onde se encontram passam a fazer referência a outras camadas de realidade — superiores ou inferiores ou ambas. A situação fala de forma triste, cômica, irônica e o escamabu, dizendo-nos muito mais do que aquilo que é mostrado ou falado. E é aqui que gente como Philip Roth e Lars von Trier fazem suas festas. A liberdade que suas histórias — e as de tantos outros, pois a expressão “outras camadas de realidade”, por exemplo, é de Tchékhov” — nos dão para imaginar tais camadas é algo glorioso e este diálogo que me deixa eufórico com alguns livros e filmes.

Albrecht Dürer e seu Melancholia (1514): com um planeta aos pés? Ou outro está vindo lá atrás com uma faixa de Melencolia?

Quando Justine arruma aqueles quadros, há muito Brueghel (aliás, na abertura já aparece Os Caçadores na Neve), mas vocês viram o Dürer ali atrás? Ah, pois é. Para Lars von Trier ser um formidável, só lhe falta morrer.

O Quadrado Mágico de Dürer em Melancholia. Tudo soma 34

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Um Quiz!

Quem falou o quê? Quem disse algo brilhante, engraçado ou o maior dos disparates? O leitor que acertar mais ganha o livro Satori em Paris, de Jack Kerouac (L&PM), e As Confissões de Lúcio, de Fernando Monteiro (Francis). Coisas boas, é claro. São 20 citações inteligentes ou tolas, lógicas ou destrambelhadas, sobre quaisquer assuntos.

Aviso: a esmagadora maioria delas você não encontrará no Google.

RESPOSTAS PARA [email protected]

1. “Fora tu, G. K. Chesterton! Cristianismo para uso de prestidigitadores, barril de cerveja ao pé do altar, adiposidade da dialética cockney com o horror ao sabão influindo na limpeza dos raciocínios!”
a) Graciliano Ramos
b) Fernando Pessoa
c) Idelber Avelar
d) Arnaldo Jabor

2. “Elegem Clodovil, reelegem Maluf, Collor e Sarney. Depois vão passar quatro anos dizendo que todo político é ladrão.”
a) Élio Gaspari
b) Luiz Carlos Azenha
c) Emir Sader
d) Natal Antonini

3. “O otimista é um mal informado.”
a) De um líder palestino não identificado
b) Hardy, a hiena
c) Millôr Fernandes
d) Olavo de Carvalho

4.”O tempo vai passando e o espaço entre você e o final vai se apertando. O que resta é tentar levar a palavra à festa.”
a) João Gilberto Noll
b) Clarice Lispector
c) Guimarães Rosa
d) Joãosinho Trinta

5. “Morrer é como antes de nascer.”
a) Bertrand Russel
b) Claudia Antonini
c) Werner Herzog
d) Joseph Ratzinger

6. “É mais difícil esquecer os ódios do que os amores ou, de outro modo: é mais fácil detestar o Inter, por ligações directas, no meu cérebro, ao Benfica, do que juntar ao clube que amo – o Porto – outros clubes para amar.”
a) Lobo Antunes
b) Jorge Sequeiros
c) Paulo José Miranda
d) José Saramago

7. “Sempre espero o pior dos seres humanos e raras vezes me decepciono.”
a) Heloísa Helena
b) Machado de Assis
c) Ronaldinho Gaúcho
d) Álvares de Azevedo

8. “A cultura é a sublimação das verdades ontológicas.”
a) Martin Heidegger
b) Carl Gustav Jung
c) Sigmund Freud
d) Anthony Garotinho

9. “I fuck on the first date.”
a) Michel Douglas
b) Mick Jagger
c) Menino obeso americano não identificado
d) Angelina Jolie, sussurrando para uma amiga

10. “Diga que descobriu o Hitler que existe dentro de você e que dedica o flagrante a toda a direiteca brasileira, que sempre teve razão quando xingava a esquerda. Eu tenho que explicar tudo, bagual?!?”
a) José Dirceu a Olívio Dutra
b) Nelson Moraes a Milton Ribeiro
c) José Genoíno a Raul Pont
d) João Goulart a Emílio Médici

11. “Provavelmente, Jesus e Maomé eram esquizofrênicos. Viam e ouviam coisas.”
a) Marcos Nunes
b) Charlles Campos
c) Bernardo Ribeiro
d) Ramiro Conceição

12. “Onde não há prazer não há proveito.”
a) Cicciolina
b) William Shakespeare
c) Fernando Gabeira
d) Daniela Ciccarelli

13. “Eu desconfio de tudo o que sangra por três dias e não morre.”
a) Rafael Galvão
b) O cozinheiro negro de South Park
c) Jece Valadão
d) José Serra

14. “É estranho que, sem ser forçado, alguém saia em busca de trabalho.”
a) Provérbio baiano
b) Garfield
c) William Shakespeare
d) Karl Marx

15. “O Congresso Nacional, com seus integrantes honestos, corruptos, ingênuos ou oportunistas, deverá ser a representação aproximada do país. Nunca fugiremos disto.”
a) Roberto Pompeu de Toledo
b) Reinaldo de Azevedo
c) Jânio de Freitas
d) Eu a escrevi agora

16. “Vou escrever um post sobre o tema E se Jesus tivesse morrido empalado? – Repercussões na Cultura Ocidental.”
a) Flavio Prada
b) Caminhante
c) Diário Ateísta
d) Jesus me chicoteia

17. “Não aprendemos a fazer o que nos dizem; aprendemos a fazer o que nos fazem.”
a) Marcos Ferreira Santos
b) Samantha Gailey
c) Renato Mezan
d) Claudio Costa

18. “Isto não é uma ópera, é uma pornofonia!”
a) Lênin
b) Stalin
c) FHC
d) Jânio Quadros

19. “Se naquele dia alguém olhasse as pessoas na rua através de uma janela, seria difícil não pensar nos primórdios do cinema, quando a cadência excessivamente rápida das imagens mostrava os personagens correndo e gesticulando como marionetes desarticuladas.”
a) J.M. Coetzee
b) William Faulkner
c) Ian McEwan
d) Georges Simenon

20. “Ou eu corro ou eu penso. Os dois não dá.”
a) Claudiomiro, ex-centroavante do Internacional
b) Edu, ex-ponteiro direito do Palmeiras
c) Dario, ex-centroavante do Atlético-MG e do Internacional
d) Nélson Piquet, ex-piloto da Fórmula 1

As respostas serão publicadas terça-feira, ao meio-dia. Vocês têm até lá para gabaritarem.

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