Leia, mas antes multiplique por -1

Abaixo, o editorial da Folha de São Paulo do último domingo. Esclarecimento: jornalismo independente e apartidário é o deles, claro. Enviado por e-mail pelo Diário Gauche. Os comentários abaixo também são do Cristóvão.

Mais: a Folha está acusando os golpes. Sente-se ameaçada por todos os lados. Manifesta temor pela ameaça representada pelos operadores de banda larga (chamada exageradamente de Leviatã). Provavelmente esteja se referindo à entrada do grupo Vivendi (comprou a GVT), o maior grupo midiático e de entretenimento da Europa. Teme também a entrada do grupo Prisa (El País, de Madri), que faz um jornalismo menos rançoso. As teles — OI, Vivo, etc. — também se preparam para operar na web, tv a cabo e informação. O impasse é o conteúdo, que poucos têm, pelo menos para fazer frente à crise do jornalismo impresso e a erosão de credibilidade no rádio e TV.

Outro temor: a vitória de Dilma em 2010, ou seja, mais uma caquerada de anos sem a proximidade aconchegante do poder.

É duro!

Direito à informação

Práticas desleais na internet colocam em risco as bases que permitem o exercício do jornalismo independente no país

DEMOCRACIAS tradicionais aprenderam a defender-se de duas fontes de poder que ameaçam o direito à informação.

Contra a tendência de todo governo de manipular fatos a seu favor, desenvolveram-se mecanismos de controle civil -caso dos veículos de comunicação com independência, financeira e editorial, em relação ao Estado. Contra o risco de que interesses empresariais cruzados ou monopólios bloqueiem o acesso a certas informações, criaram-se dispositivos para limitar o poder de grupos econômicos na mídia.
Essas salvaguardas tradicionais se veem desafiadas pelo avanço da internet e da convergência tecnológica nas comunicações – paradoxalmente, pois esse mesmo processo abre um campo novo ao jornalismo.

Apesar da revolução tecnológica e do advento de plataformas cooperativas, a produção de conteúdo informativo de interesse público continua, majoritariamente, a cargo de organizações empresariais especializadas. O acesso sistemático a informações exclusivas, relevantes, bem apuradas e editadas sempre implica a atuação de grandes equipes de profissionais dedicados apenas a isso. Essas equipes precisam ser remuneradas -ou o elo se rompe.

Quando um serviço de internet que visa ao lucro toma, sem pagar por isso, informações produzidas por empresas jornalísticas, as edita e as difunde a seu modo, não só fere as leis que resguardam os direitos autorais. Solapa os pilares financeiros que têm sustentado o jornalismo profissional independente.

Quando um país como o Brasil admite um oligopólio irrestrito na banda larga -a via para a qual converge a transmissão de múltiplos conteúdos, como os de TVs, revistas e jornais -, alimenta um Leviatã capaz de bloquear ou dificultar a passagem de dados e atores que não lhe sejam convenientes. A tendência a discriminar concorrentes se acentua no caso brasileiro, pois os mandarins da banda larga são, eles próprios, produtores de algum conteúdo jornalístico.

Quando autoridades se eximem de aplicar a portais de notícias o limite constitucional de 30% de participação de capital estrangeiro, abonam um grave desequilíbrio nas regras de competição. Veículos nacionais, que respeitam a lei, têm de concorrer com conglomerados estrangeiros que acessam fontes colossais e baratas de capital. Tal permissividade ameaça o espírito da norma, comum nas grandes democracias do planeta, de proteger a cultura nacional.

Contra esse triplo assédio, produtores de conteúdo jornalístico e de entretenimento no Brasil começam a protestar.

Exigem a aplicação, na internet, das leis que protegem o direito autoral. Pressionam as autoridades para que, como ocorre nos EUA, regulamentem a banda larga de modo a impedir as práticas discriminatórias e ampliar a competição. Requerem ao Ministério Público ação decisiva para que empresas produtoras de jornalismo e entretenimento na internet se ajustem à exigência, expressa no artigo 222 da Carta, de que 70% do controle do capital esteja com brasileiros.

A Folha se associa ao movimento não apenas no intuito de defender as balizas empresariais do jornalismo independente, apartidário e crítico que postula e pratica. Empunha a bandeira porque está em jogo o direito do cidadão de conhecer a verdade, de não ser ludibriado por governos ou grupos econômicos que ficaram poderosos demais.

7 comments / Add your comment below

  1. Dois passos para trás, que à frente…

    Décadas e décadas trabalhando com êxito pela melhor forma de capitalismo: monopólios, trustes e oligopólios controlando a economia, e partidos por eles sustentados formando a maioria absoluta dos quadros dos Três Poderes. Hoje, nosso papel, decaído, não é mais de Quarto Poder, mas algo que se decompõe, a cada diz um naco a menos, credibilidade próxima de zero, influência restrita aos nostálgicos de classe média.

    Olavinho (apesar do nome, um sujeito de seus setenta anos, corpulento, mas de olhar naufragado em olheiras destacadas por bolhas que pendem sobre as bochechas flácidas) percorre a redação, editorial na mão, mas tão silenciosamente e anonimamente quanto lhe é possível, fingindo não perceber que os computadores de vários repórteres estão percorrendo páginas na Internet, atestando que, no final das contas, quando se quer informação relevante, não se lê mais jornais, tese comprovada pelo número de acessos à própria versão eletrônica do jornal, diariamente maior que o de exemplares vendidos aos assinantes e nas bancas.

    Abre a porta do redator chefe, maldito, também à Internet, de costas para a porta.

    – Não gostei!

    O redator chefe se levanta, faz os rapapés de praxe e explica o sentido da matéria a Olavinho, para quem a posição era por demais reacionária, por mais correta que fosse, e conspirava contra a modernidade supostamente defendida pelo jornal, ao menos nas páginas de entretenimento e cultura.

    – É necessária uma posição mais radical à direita para alcançar a meta ao centro.

    Olavinho respira fundo e responde ao pragmático redator:

    – O problema é que se chegarmos ao centro é o quanto basta; estaremos todos perdidos.

    O redator chefe guarda o risinho sacana para si mesmo.

  2. “A Folha se associa ao movimento não apenas no intuito de defender as balizas empresariais do jornalismo independente, apartidário e crítico que postula e pratica.”

    E eu sou o Papai Noel… Jornalistas da Folha, continuem se comportando bem pra ganhar presente daqui a 37 dias!

  3. Temos dois entraves ao pleno acesso à informação – os jornais e os jornalistas. A presença dos grupos citados pode resolver o primeiro (veja bem, pode), mas e quanto ao segundo?

  4. “Apesar da revolução tecnológica e do advento de plataformas cooperativas, a produção de conteúdo informativo de interesse público continua, majoritariamente, a cargo de organizações empresariais especializadas.”

    Continua, mas não tem que continuar pra sempre. Isso que o editorial “esqueceu” de ver – porque, claro, em primeiro lugar os próprios interesses.

    Abs.

  5. O mundo mudou. Acho que:
    1 – hoje, o entretenimento vende mais que a notícia; futebol, por exemplo, é entretenimento e dá assunto (bom) pra conversa, pois todos nós somos os melhores técnicos, os melhores juízes e sabemos tudo de futebol. Vide a definição de técnico, pelo atual ‘professor’ do Cruzeiro: “O técnico é uma ilha de ignorância cercada pela sabedoria por todos os lados”;
    2 – a notícia política não existe, é só opinião (vendida);
    3 – se a notícia é “o fato”, este independe da “grande imprensa” para chegar ao conhecimento do mundo;
    4 – há notícias globais e notícias locais; estas interessam muito mais;
    5 – só nos importamos com aquilo de que fazemos parte; o resto é curiosidade mórbida;
    6 – não bastam as notícias, é preciso ter “formação” para entendê-las: por isso os jornais (tele, inclusos) são feitos para analfabetos;
    7 – A Economia quer ser (e muitas vezes, é) mais importante que a Política;
    8 – Da assertiva anterior se deduzem os motivos pelos quais a ‘inteligentzia’ critica o atual governo;
    9 – Capital e Religião: duas forças de dominação;
    10 – Como dirá Milton Ribeiro: o Palmeiras já era.

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