Tubular Bells e a Caminhante

Por motivos semiprofissionais tenho que ler rapidamente As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, e Ficções, de Jorge Luis Borges. O Calvino já foi lido e hoje comecei o argentino. Li-o há tanto tempo que — bem, pensava lembrar-me de tudo, mas não é exatamente assim. O curioso é que quando indagorinha comecei a ler o livro de Borges, veio-me à cabeça o disco Tubular Bells (1973) de Mike Oldfield. Nossa, faz mais de trinta anos que não ouço esse vinil! Pensei nos anos de leitura de um e de audição do outro e soube o que vocês, meus sete espertos leitores, já descobriram. Sim, tudo da mesma época.

Acabo de baixar o CD e o ouço neste momento. É mais ou menos um pastiche de coisas que tem tanto a ver uma com a outra como o livro de Borges tem com o de Calvino. Não, Borges e Calvino têm mais a ver, certamente. São narrativas curtas, cheias de fantasia (acepção antiga da palavra) e nas páginas há mundos sendo permanentemente construídos como em poucos livros. Reli os dois primeiros contos — Pierre Menard, autor do Quixote é enlouquecedoramente belo em sua concisão e Tlön, Uqbar, Orbis Tertius é excelente — o que não é perfeito neste livro? — , mas os contos seguintes me agradam ainda mais, sei disso.

Amanhã, vou buscar a Caminhante (2 links) no aeroporto. Depois, sábado à tarde, chegam a Nikelen e o Farinatti. São uns chatos, vão ficar dando voltinhas pela cidade antes de virem para cá, os putos. Encontro de blogueiros é algo tão démodé quanto Mike Oldfield, então chamemos de um encontro entre amigos que se conheceram por via virtual. Hã? Nem isso, pois apenas vale para a Caminhante, porque os outros foram (re)conhecidos pelas vias convencionais.

Já ouço o lado 2 do disco. Bem ruinzinho…

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  1. Ficções foi o livro que, aos 22 anos, me ensinou a ler. Comentário absolutamente paralelo e desnecessário, mas achei legal pontuar.

    1. Como nunca fico mais de um fim de semana, uma sacolinha de CDs basta. Sou um cara que ama o mar — principalmente os banhos — e detesta a algaravia e o modus vivendi dos veranistas. Também detesto o sol direto. Então, tomo banho lá pelas 19h até o anoitecer. Vou sozinho e muitas vezes me roubam os chinelos que deixo ao lado da casinha do salva-vidas.

      Minha mulher odeia a praia 100%.

  2. Ainda bem que você disse não gostar de Tubular Bells. Eu acho esse álbum ruinzinho de doer. Nem acreditei nos meus ouvidos quando o baixei há dois anos e o ouvi pela primeira vez. Tão conceituado! Tão venerado! Lembro que o baixei por ter dito certa vez aqui, que estava ouvindo três álbuns sublimes do Vangelis, e aí apareceu o ranheta do Marcos Nunes (embora não costumo falar mal de quem já fez a passagem) e disse algo no estilo “Vangelis!!!Eca, se ao menos fosse Mike Oldfield”. Daí baixei-o-o (o álbum, não o Marcos Nunes, que mesmo se tivesse algum pertence pessoal dele, uma cueca, um chaveiro, para levar ao centro espírita, tenho medo de que, uma vez invocado, ele cisme por me acompanhar e em se instalar em minha casa. “Vá falar com a Rachel! Vá falar com a Rachel! Preciso falar com a Rachel!”)

    Disquinho horrível. O tema inicial não foi copiado discaradamente de O Exorcista? E aquela parte chatíssima do anúncio dos instrumentos, parece uma cartilha didática do maternal. Vangelis é infinitamente melhor que Oldfield. Já que estás a conectar matérias disparatadas (parece uma resposta pra lá de sarcástica à minha crítica sobre os dois livros não terem nada a ver, mas, apesar das evidências ao contrário, eu não sou o centro do mundo), baixe aí o Opera Sauvage, o Heaven and Hell, e o mais que sublime Odes, do Papathanasiou, e, ouvindo-os com os ouvidos livres de discriminação e limpos de Mahler, me diga se não são ótimos.

    A Caminhante já deixou claro que não fará um post sobre essa visita. Para provocá-la, sugiro que faça um post bem dos grandes, com várias fotos dela. (A Fernanda faz parte de uma categoria óbvia de mulheres que alegam não gostarem de ser fotografadas, mas não tire uma foto dela para ver se não é uma mancha para a vida toda.)

      1. Tubular Bells é trilha sonora do filme “O Exorcista”, não foi copiada. Em 92, para celebrar 20 anos do disco, aconteceu a maquiagem chamada Tubular Bells II. E, na boa, querer avacalhar Oldfield comparando com Vangelis(que é bacaninha)?
        Fica a pergunta: qual dos dois toca mais em consultório médico?

        1. Pedro, isso é puro preconceito. O Vangelis tem uma passagem reveladora e constrangedora em sua biografia: havia sido escalado para fazer parte do Yes, quando a banda estava no auge, mas tanto parte da imprensa inglesa e outros fatores de uma inventada burocracia trabalhista barraram a empreita. Por ser ele grego. Assim como fantásticas bandas de progressivo italiano, iuguslavo, etc, não tiveram nenhuma repercussão na mídia musical europeia e norte-americana.

          Vangelis é um magnífico compositor. Esqueça o Carruagens, o Blade Runner, o filme do Colombo. Ouça o Opera Sauvage,e saberá o que estou dizendo.

          Foi curtição o lance do O exorcista.

          (Czarnina, o Elias Canetti dá uma dica para romper esse preconceito estupidificante que nos impede de ouvir uma boa música por ela ser indevidamente adotada em arquétipos. Ele diz_ em O Jogo os Olhos_ que a música moderna de Schonberg etc, teria sido melhor aceita em Viena se não lhe tivessem dado o peso tradicionalista de “música”. Ele sugere que fosse dada a esse música a definição checa para a música: Hudba. Se tudo depois de Brahms, se a música inovadora do século XX fosse chamada de “hudba”, ou seja, desatrelada da ortodoxia acadêmica, os ouvintes acabrestados pelo respeito excessivo à erudição teriam-na curtido sobremaneira.

          Eu, particularmente, adoro música e consultório médico, de propaganda de shampoo, e de elevadores. Já usava a técnica hudba sem saber.

        2. É verdade! Preconceito meu achar que música de consultório dentário é chata pra caralho. Mas é o que eu penso, fazer o que, né… Se todos pensassem igual (ou seguissem os críticos), o mundo seria uma grande merda, pensada.
          Adoro tangos e boleros, mas ouvir aqueles arranjos de violinos e sopros deturpando a essência da música, antes da broca dentária, é foda. Fica uma péssima companhia para sr. Vangelis, apesar de que gosto muito dele. Mais do que do Oldfield até. O grande lance de Mike Oldfield foi se destacar com 19 anos, bem jovem. E, depois, lançar discos como Incantations…
          Há alguns milênios, quando meu alter ego foi locutor e programador de uma rádio chamada FELUSP FM, durante a madrugada, gostava de rodar uma música do Vangelis com o vocalista do Yes. Depois, sempre colocava no mesmo bloquinho a Premiata Forneria Marconi (tenho ainda os vinil, se quiseres), um Genesis básico e, fechava com nossa turma, Marco Antonio Araujo(MG), Cinema Show (POA) ou GrandBell. Gente bacana, mas que infelizmente nunca ouvi no consultório…

        3. Na verdade, pensando aqui com os meus botões, nunca ouvi música em consultórios médicos, mas sempre uma televisãozinha de 14 polegadas sintonizada na Ana Maria Braga ou naqueles programas de fim de tarde à lá Silva Popovich etc. Nem nunca entrei em elevador que tocasse a tão falada música para elevadores (que Brian Eno, se não me engano, apelidou um de seus trocentos discos com tal título; deves gostar do Eno, por sinal), o que me faz crer se tratar de algum americanismo adotado mais pela formosura da imagem do que pela experiência pragmática.

          Mas é claro que é muito bom termos preconceitos e descermos o sarrafo, senão do que adiantaria a nossa avantajada cultura superior? É como aquela piada do cara na ilha deserta com a gostosa, mas que não tem mais nenhum tezão para comê-la pois, para quem contaria depois? Mas nesses últimos anos venho me permitindo uma felicidade mais despojada. Ontem mesmo ouvia uma coletânea do Abba no último volume, e não há música pop mais perfeita que “Knowing Me, knowing you”, e chorei em “Chiquitita”, que me faz lembrar de uma passagem muito pessoal de Guerra e Paz (na real, sem brincadeira!). E “Super Trouper”? De arrepiar!

          Também gosto muito de umas três músicas do Julio Iglesias, incluindo sua versão para Guantanamera, e uma outra que, se não me engano, se chama “Me olvide de vivir”. Lindíssima. E adoro uma música do parceiro de Vangelis, o Demi Rousseau, chamada “My Friend the Wind”.

          Lembro que um dos agradecimentos de Arthur Clarke para quem o inspirara a ter aquelas magníficas intuições científicas de seus livros foi para Vangelis (e um outro para Jean Michel Jarre).

          Sendo assim, atualmente mesmo só não gosto, irrelativamente, de axé, de forró, sertanejo, funk, que não chegam a ser música mas excitantes acústico glandulares.

          E não é implicância minha: achei o Oldfield uma grande farsa.

          O PFM é ótimo. Tinha um radialista em Goiânia que colocava essas músicas de madrugada, e era um verdadeiro cult. saudades!

        4. Fiquei a imaginar se pensavas em Natacha ou na Maria Bolkonski ouvindo chiquititas… Ótima essa.
          Brian Eno é tri, seja no 801, no Roxy Music, com David “s” (o Byrnie e o Bowie), e uns outros menos cotados. Ou solo, onde fez música para “aeroportos”… Mas, gosto mesmo daquele disquinho que ele produziu, o Zooropa.
          De resto, entendo a neura com Oldfield. É como com o Chico. Nem todos gostam. E gosto, é como o nariz (rsrs) cada um tem o seu.

          “E, por favor, deixai-me colocar as pantufas da mediocridade
          E nelas repousar meus pés rotos após tão dura jornada,
          Tão dura quanto inútil,
          Afinal, nasci para o brilho opaco nos parabrisas dos automóveis lentos…”

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