Quando tudo está certo, mas a música é ruim

Não, não adianta. Nunca vou conseguir suportar a pianística de Rachmaninoff. Ontem,  com a OSPA, assisti a Rapsódia Sobre um Tema de Paganini, Op. 43, para Piano Hero e Orquestra. Céus, que música chata! Mas logo haveria algo semelhante: Berlioz.

Rachmaninoff: nem ele se aguenta...

Comecemos pelo Rachmaninoff. O problema não é o de ele ter sido um romântico tardio, mas sim o de fazer música virtuosística vazia para concertos onde era o solista. Rach foi um hábil pianista. Também era grande: tinha 2 metros de altura e uma mão que, aberta, abarcava 30 centímetros. Dizem que era sindrômico, Síndrome de Marfan. Para piorar, ainda compunha temas sobre Paganini, espécie de primeiro rock star que apavorava por sua aparência, virtuosismo e vazio. Ou seja, Rach fazia música difícil para si mesmo. Meu estômago acaba se revoltando, quer ficar vazio também, fico nauseadíssimo e meu humor vai embora. Prefiro suas peças orquestrais como A Ilha dos Mortos e Os Sinos, muito mais interessantes e, aliás, as preferidas pelo compositor em momentos mais razoáveis. O pianista de ontem, Sergio Monteiro, era pequeno, mas se houve muito bem nas peripécias.

Berlioz não precisava de guarda-chuva

Depois tivemos Berlioz e sua Sinfonia Fantástica, Episódio da Vida de um Artista. Uma hora de duração! Uma sinfonia programática, romântica até o último fio, de autoria de alguém que conhece as potencialidades de uma orquestra. Sinfonia difícil, mas breguinha como só ela.

Claro, o problema é meu. A plateia estava contente, apesar de ter ouvido uma crítica pesada a Berlioz de um casal que desceu as escadas da Reitoria na minha frente: “Que música de merda!”. A orquestra esteve muito bem, parecia feliz e animada. O regente Shinik Hahm é ótimo e sabe se portar: recebe os aplausos junto com os músicos, abandonando o estrado, ou seja, colocando-se ao nível deles sem nenhum Complexo de deus. Mas espero ter largado de vez tanto o pianismo de Rachmaninov quanto o romantismo de Berlioz por completo. Detesto-os desde a infância com meu pai. Não tenho mais idade para perder tempo com bobagens.

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  1. Eu gosto da valsinha do movimento “Un bal” da Sinfonia Fantástica. É música programática? É. E daí? Rachmaninoff foi o último esbirro do romantismo clichê? Talvez seja. Muita gente gosta de romantismo clichê. Inclusive músicos. Sabe por que não falo mal de concertos de jazz? Não vou a concertos de jazz.

  2. Talvez tenha sido um aviso da OSPA, na mesma noite, para não se ouvir “música de merda”, Milton. Compartilho a tua opinião sobre Rach e Berlioz. Acho o Berlioz mais chato do que o Rach. A única peça que se salva do francês é a Sinfonia Fantástica aludida por ti – embora com ressalvas. Entre as sinfonias dos “romanticões” franceses, eu prefiro a sinfonia de Bizet, cheia de vida e alegria. A Sinfonia programática de Berlioz é um pé no saco. Sobre Rach, citaste o poema sinfônico A ilha dos mortos, que repulto como sendo uma das melhores composições do russo e Os sinos, que também é bastante interessante. Mencionaria ainda a Sinfonia no. 1 e as Danças Sinfônicas, uma das últimas peças compostas pelo russo na década de 40. O resto é duro. E quando o russo de linguagem “melancólica” se reporta a Paganini, alguém que eu nunca tive coragem de ouvir, a coisa fica insuportável. Meus pêsames, Milton. Foi um programa duro de aguentar. O casal que emitiu a opinião foi claro na definição.

  3. A questão do interesse musical é complicada. Envolve afinidades estéticas que muitas vezes, nem conseguimos explicar. Muitas das obras de grande profundidade musical, são raramente ouvidas, mesmo pelos especialistas.
    Acredito, deixar-se seduzir por música mais leve é salutar. Nem sempre se está motivado apenas para profundos e pesados discursos. Por que não ouvir ou brincar com um repertório intencionalmente lúdico, de época.
    Um compositor fácil e virtuosístico como Paganini, seduziu compositores como Liszt, Brahms e Schumann. Veja as referências de Brahms às Valsas de Strauss. Ou a inventividade e expontaneidade melódica de compositores considerados menores, tarefa que muitas vezes exigia enorme esforço dos grandes, apesar da capacidade de elaborar grandes e dramáticas formas.
    Compartilho da opinião que pode-se ouvir com prazer música mais leve e desprentensiosa, sem culpa. Aprecio Rachmaninoff, sobretudo os concertos e obras para piano. Em relação a Sinfonia Fantástica, tem momentos interessantes, apesar de nunca ter me cativado totalmente.

      1. Tudo bem, Milton. Penso que apreciar música é um processo dinâmico, onde vamos incorporando novas linguagens e, muitas vezes abandonado outras. Penso que somos também influenciados pelas fases e experiências de vida, em fim…

  4. Ora, Milton, pra que tanta fúria contra o pobre do Rach, o cara era tão que se depressivo se matou. Concordo, suas músicas pra piano no geral são chatas, seus prelúdios são insuportáveis, mas ele tem coisas boas. Gosto do concerto nº2 e dos seus Trios Elegíacos. A Sinfonia Os Sinos talvez seja sua melhor obra. Quanto ao Berlioz, a Sinfonia Fantástica ainda passa. Ruim mesmo é a Haroldo na Itália. Mas o seu Réquiem é muito bom, eu gosto bastante.

    Agora, mais chato que esses dois, para mim, é o Stravinsky. Tirando a Sagração da Primavera, tudo o mais que escutei é de uma chatice sem limites.

      1. É, eu até gosto de jazz, mas quando misturado com a música clássica não me atrai muito. Cada qual no seu lugar. Sabe, sou meio purista. Gershwin, por exemplo, acho um saco.
        E sim, eu tinha visto a foto do Rach. Tu tens que entender Milton, que se exibir no piano era a única alegria dele.

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