O mundo é um lugar muito estranho

Fiquei bastante chocado com algumas opiniões acerca do filme Melancolia, de Lars von Trier. Depois de fazer meu elogio ao filme, fiquei observando as opiniões de quem escrevia a respeito. Alguns elogiavam — houve associações de críticos que até lhe deram prêmios de filme do ano e outros — e houve quem se ofendesse com sua extrema ruindade. Lendo os últimos, várias vezes tive vontade de rir, o que não é tão estranho, considerando-se o conteúdo do filme. Do meu lado, entre os que gostaram, ninguém chegou tão próximo de minha opinião quanto a escritora Lélia Almeida, que hoje publica uma colorida, incontrolável e “compreensiva” coluna” no Sul21.

É óbvio que quem detestou o filme não é burro, acredito mesmo que gostar ou não dele trata-se de uma opção estética (pois Von Trier coloca um filtro bem espesso entre o tema e o espectador), mas fiquei menos sozinho ao ler vários parágrafos que foram pensamentos meus quando vi o filme. Sim, Lélia, a terra é mãe, é má e é boa, assim como todos nós. E o filme fala de forma muito inteligente sobre as mulheres e as posturas de todos. O roteiro do filme é um jogo no qual as irmãs são colocadas contra diferentes tragédias. De minha parte, apesar de mais espectador do que em outros filme, identifiquei-me totalmente com Justine (Kirsten Dunst), a personagem sem beira que sabe o que fazer, mas só no fim do mundo. Mas indico a coluna da Lélia, querida amiga que não conheço.

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  1. Eu queria ter saco para essas picaretagens intelectuais (me refiro ao filme).

    Parafraseando o Tim Maia, se eu queria ter três horas de instigante angústia filosófica e sofisticada visão artística, a única coisa que consegui com Melancholia foi perder essas três horas. Poderia fazer uma lista de coisas mais produtivas para preencher essas três horas, desde ir direto na fonte e ler Schopenhauer (se bem que no caso, o exemplo seguido no filme é do mais defasado existencialismo cósmico sartreano), até participar de um concurso de quem chupa mais chicabons.

    Mas já que estamos nesta seara das citações, me lembrei de um diálogo de um filme em que o personagem discorre sobre o porque Sean Penn não conseguiu emplacar seu doente mental em Uma Lição de Amor. À lá aquelas discussões de filosofia pop dos filmes do Tarantino, o personagem diz que faltou alguma idiossincrasia notável no personagem de Penn. Só sua paixão pelos Beatles não era suficiente. E o personagem, a título de exemplo, vai elencando vários atores que conseguiram emplacar no cânone das grandes interpretações seu herói com algum grau de doença mental: Hoffman deu desde o jeito peripatético de andar até os ataques de fala disparada ao seu personagem autista em Rain Man; Nicholson tinha tal coisa a mais em O Iluminado.

    Assim, falta o elemento idiossincrático de “ternura” a von Trier. Ele parece um Samuel Beckett que voltou de um coma de cinco anos que lhe fez perder a parte cerebral equivalente ao coração generoso, e que daí reescreveu o Godot tirando-lhe todo sinal de esoterismo, só ficando o pobre e vazio desespero. Ou se parece com um Ingmar Bergman que foi possuído por um marciano e, para manter as aparências com os que ainda não foram dominados, simula as aflições da alma humana da mesma maneira má-intencionada e ingênua que um marciano faria.

    1. Triers é o livro de Moral e Cívica da alta cultura institucionalizada. Seus dois últimos filmes pegam toda a tralha que um dia muito distante já foi levada a sério, e vai costurando cada um de seus elementos em uma exposição didática da psicologia, filosofia e arte. Puro didatismo e nenhum talento. Ele chega a gritar por detrás da película: “Olha só mamãe, como eu aprendi bem os cacoetes acadêmicos e pareço um sofisticado intelectual europeu desiludido, amoral e a ponto do suicídio da década de 1930!” Pura empolação!

          1. hauhauahuah pra não ficar só na repetitiva babação de ovo, charlles, me lembro de tu ter tecido longos e elogiosos comentários a respeito de Anticristo. se não me engano, e posso muito bem estar enganado em tudo, até entrando numa discussão com o Marcos Nunes, que estava contrariado com temas da psicologia.
            De qq modo, ambos me pareceram exatamente o q disseste agora – ainda mais O Anticristo. Melancolia pelo menos consegue ser um pouco melancólico, mas mais pela força de algumas imagens isoladas (alguém sem auto-controle poderia dizer q ele assumiu o risco de parecer muito “forçado” na busca da melancolia – o nome do filme, o nome do planeta, a colisão, o fim descarado – só pra dizer para si “ora, no fim alguém tem q fazer isso: eu posso”, como não é qualquer um que se arrisca em escrever um livro intitulado “Justiça” ou sei lá.).

          2. ah, o mea cula já tinha acontecido. bueno:
            “charlles campos em 8 de agosto de 2011 às 10:15 disse:
            Gostei muito de Dogville e esse filme que sustenta a substância artística de Lars von Trier para mim. Assisti ao O Anticristo com o bom assombro que filmes de primeiro incognoscíveis provocam (como 2001, por exemplo), mas tenho por certo que, ao contrário de 2001, não me prestarei a assistí-lo novamente. Há uma série de filmes que subtraem nossa compreensão imediata e nos ativa outros sentidos, e que só temos a impressão de um entendimento mais pleno dias após deixarmos o cinema. (Foi assim que entendi que 2001 era uma saga sobre o desenvolvimento moral do homem, e não um filme de ficção científica.)

            Mas acho que os símbolos e as referências de von Trier são muito forçados, estão mais à superfície do que a trama e acabam por incorrer no erro grave de perderem a relevância das informações veladas. É como se, nas fábulas, a rapoza levasse uma placa no pescoço com a frase: “desprezo as maçãs por não poder alcançá-las.” Assim, a cada cena de O Anticristo (não assisti Melancholia), há uma poluição de linguagem mítica de um universo psicanalítico muitas vezes simplista demais: pênis ejaculando sangue, pinhas caindo eternamente sobre o telhado, pesos de concreto soldados nos ossos do tornozelo, bosques dantescos com árvores distorcidas, a esquizofrenia do casal isolado num universo telúrico semelhante ao inferno. Quando o diretor afirma que sua obra funciona na interpretação exaustiva das referências nela impregnadas, a coisa fica ao deus dará como as temporadas finas de Lost em que o tiro para todo lado dava ares de paródia involuntária.

            Por isso que, retroativamente, vejo que me empolguei com o Anticristo mas que agora o acho um filme falho, ingênuo, pouco criativo. Von Trier usa para impressionar o velho truque de uma abertura megatômica com todos os recursos de videoclipes, uma cena isolada que, no final das contas, é a única que vale no longuíssimo filme restante (assim como no fracasso de Um Hotel de Um MIlhão de Dólares, não sei de qual diretor, a única cena espetacular e inesquecível é a do suicídio inicial).

            Achei sim sua declaração sobre Hitler bastante leviana e infelizmente importante para a interpretação de sua obra. Trier não é um gênio, não pode ser perdoado com a mesma balança que se usa com Bergman ou Kubrick. Ficar mais que duas horas submetido à interpretação esgotante de uma cabala que não foi produzida por um profeta hebreu autenticado pelo tempo, nem por um gênio, e nem por um artista capaz de sutilizar sua mensagem na boa narração de uma história, me soa como um tempo perdido.”

          3. Em outro comentário aqui no blog do Milton, fiz minha correção sobre essas primeiras impressões sobre Anticristo, arbo. Por isso acho que o que realmente achamos sobre dada obra só se pode dizer após passar o sangue quente do primeiro momento. Acontece direto comigo achar tal coisa muito boa, mas, passado um tempo (geralmente semanas) me cai a ficha que se trata de algo ruim. É bem mais raro o contrário: achar uma coisa ruim e mudar de opinião.

            Recentemente, li Habitante Irreal, e o achei muito bom. Depois, coisa de dias, já deixei esfriar e vi os sérios defeitos que esse romance tem. Como o li emprestado, a tendência é eu, em breve, comprá-lo, só por via das dúvidas. Nesta reavaliação de Habitante Irreal, o Milton tem muita culpa. Sei que o Cassionei o leu, e espero uma resenha dele.

          4. Depois do comentário excelente do arbo, creio que se visse o mencionado filme, tema desse post, teria aquela sensação que tive ao ver pela metade, na primeira vez, e última!, por exemplo, “Guerra nas estrelas”, “Matrix”, “A paixão de cristo”, “Sinais”, “O senhor dos anéis”, “Sobre meninos e lobos” e todo o lixo pseudocultural americano ou europeu:
            QUE EMBUSTE!

  2. ” até participar de um concurso de quem chupa mais chicabons.”
    lembrei da única vantagem de antes charlles campos não ter um blog.
    era ele comentar mais vezes no milton (mas tbm, o milton tem dado poucas chances – agora mais até).

  3. Tô entre aqueles que acharam Melancolia apenas uma bosta presunçosa que só faz externar a misantropia e misoginia de um autor mergulhado em uma depressão do tipo sarcástica, de tal forma que lhe parece divertido que o mundo todo seja tomado pela melancolia que não basta para matá-lo, mas que ele abraça como um fenômeno global dos mais interessantes, quando, como diria o Antonio Conselheiro, “o fim está próximo”. Depois duma primeira parte a exemplo do já feito e mal ajambrado “Festa em Família”, com todo aquela caudal de hipocrisia, insatisfaçõs e taras, temos o mergulho na depressão afim ao apocalipse global. Em poucas linhas, seria isso. Petulante, ruim, expressão de vaidade de um artista que gosta de cultivar seus preconceitos favoritos e zombar daqueles que o acham um gênio, quando ele sabe muito bem o que ele é: uma fraude.

  4. Está ai um diretor que não me convence…apesar de não levar Cinema tão a sério (prefiro outras artes), procuro ver bons filmes (em minha opinião, claro)

    Não gostei de Anticristo, e achei Dogville um bom filme, nada mais do que isso.

    Nem cheguei a ver Melancolia.

    1. Também sou uma das que não conseguem gostar do Lars, exceção feita em Dogville.
      Ter visto os filmes que seguem de perto o tal Dogma 95 foi, em alguns momentos, um verdadeiro exercício de paciência pra mim (só de lembrar a câmera na mão, extremamente trêmula e frenética, já sinto arrepios).
      Melancolia está distante dessas regras, mas tbm não consegui gostar dele. E juro ter tentado, mas tenho tantas ressalvas quanto ao desenvolvimento dos personagens, diálogos e trama, que não consegui. Acho que a maneira cínica com que às vezes ele trata esses três pilares é o que mais me desagrada (e nessa hora penso no cinema iraniano, em especial no Kiarostami, e vejo como as coisas podem ser bem diferentes – e sim, eu sei que são estilos bem diferentes, mas…).
      De qualquer modo, tenho de tirar meu chapéu para o Lars, pois é um diretor que me faz ver seus filmes, por mais que dele reclame ou desgoste (aliás, a mesma coisa acontece com o Wong Kar-Wai, do qual consigo gostar um pouco mais só por causa do “Amor à flor da pele”).

  5. Se alguém não leu o link da Lélia Almeida sugerido pelo Milton, vai lá. Tem um parágrafo sensacional sobre sua expulsão de um grupo de danças circulares (wtf?). Ri alto. Talvez veja “Melancholia” depois desse artigo dela. Final de semana passado, fui cheio de expectativa ao cinema para “A dançarina e o ladrão” e saí meio frustrado.

      1. Há tempos, fui a uma festa de uma galera bacana, pessoas diferentes entre si, com ocupações diversas e interesses variados. Tinham, em comum, a participação num grupo de danças folclóricas com algum charme. A festa era o terror nos seus quatro ou cinco ambientes, um deles forrado com imagens pornográficas coladas nas paredes, música holística e gente que dançava se abraçando em volúpia e catarse. Quem nunca se meteu numa roubada similar? Acho que por isso eu ri alto com o trecho, porque eu e uns três amigos tivemos crises de riso no meio daquela horda, a gente não podia nem olhar para a cara do outro – e meio que fomos convidados a deixar a festa, o que fizemos às gargalhadas. No mais, o texto da Lélia Almeida é um desbunde de gostoso de ler.

          1. Nunca notei isso, não, Ramiro. A capoeira, misto de dança e luta, é um jogo de ataques e defesas. Diz-se que o leque do mestre-sala esconde punhal entre plumas para defender a bandeira. Na chula gaúcha, é bem nítido o duelo. Se a gente considerar que tais danças substituem a violência real pela simbólica, bem, aí a coisa muda de figura.

          2. Do pessoal da semiótica do espetáculo, aliás, o espaço da festa sacraliza o profano (e profana o sagrado).

            É curioso ainda, Ramiro, que o primeiro milagre atribuído a Jesus (e que o Milton perdoe a profanação de seu sagrado espaço ateu) não seja uma ação de paz, de cura, de “bem” em sentido, digamos, clássico ou bíblico. Foi a transformação de água em vinho para que a festa, Bodas de Caná, prosseguisse sem constrangimento anfitrião.

            Nos estudos de segurança pública atuais e na tal cultura de paz, o uso de álcool está muitas vezes associado ao aumento de crimes e de violência.

      2. Pode ser, Ramiro. Tem a minha simpatia, apesar da minha absoluta falta de ginga. Mas há registros que dizem não ser. É mais bonitinho pensar nos girassóis, mas não é questão de condescendência. Pachamama é má (e boa), diz a Lélia – e eu gostei bastante do ângulo dela, talvez até mais pesado que o meu.

  6. o mundo e um lugar muito sinistro como tal so da para estar ligado ao soberano criador dos ceus e da terra jeova deus ele que e todo poderoso e que e a fonte confiavel para esta pergunta que tem intrigado muita gente.o munto no meu ponto de vista e uma fera muito perigosa.

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