Morre a Batalha

A Batalha, não obstante seu jeito meio triste nas fotos abaixo, era a mais feliz dos labradores. Comprei-a em 1998 para meus filhos, mas ela logo estabeleceu um vínculo mais forte com quem lhe dava comida e banho. Com a separação, ela ficou na casa do lado de lá. Raramente a via. Algumas vezes, depois que minha filha já morava comigo, ela descia gorda e tropegamente as escadas e entrava resolvida em meu carro. Na última vez que tentou ir comigo, estava velha, surda e babou esplendidamente em  minhas calças — os pastores tinham feito com que eu esquecesse as possibilidades dos babões do Labrador — , só saiu após ser puxada, empurrada e de chorar um pouco. Parecia saber quem era seu dono, o nome que aparecia em seu pedigree. Fiquei quieto quando soube que tinha sido sacrificada, mas tive vontade de reclamar. Por que não me avisaram? Sei que a educação que aqui gorjeia, não gorjeia de modo algum lá, mas mesmo assim fico contrariado com o sistemático desconhecimento. De qualquer maneira, acredito que foi tomada a decisão correta. Devia estar muito mal perdendo pouco a pouco o movimento das patas traseiras.

A morte de um cão não é como a morte de um ser humano. Fico infeliz quando um de nossos cães morrem, mas não tento evitar  o luto através da ação. Quando envenenaram a Callas há três anos, comprei imediatamente um outro pastor alemão, a Juno, para que não ficasse um vazio em seu lugar. Em minha opinião, os cães acompanham a gente, só substituindo pessoas em casos de solidão ou abandono, principalmente de velhos. Minha filha amava a Callas — era uma das atrações de sua nova casa, a minha — e eu não quis deixá-la nem 24 horas sem um cachorro. Foi uma teleentrega. Telefonei e veio um sujeito com toda uma ninhada. Ele disse que todos custavam a mesma coisa, mas que um dos filhote seria mais caro. Como cachorreiro, logo identifiquei e escolhi a Juno, a que custava um pouco mais. Minha filha ficou dois dias olhando atravessado para a nova cachorra, queria a Callas de volta, mas como resistir?

Bem, mas o fato é que a Batalha se foi. Lembro do dia em que a trouxemos para casa, os guris brigavam para levá-la no colo; lembro do primeiro grito que dirigi a ela e que a deixou paralisada; lembro que ficou hospedada na casa de um amigo meu e que deixava os outros dois dinamarqueses sem comida. Foi uma cachorra vigorosíssima na juventude, engordou muito, decaiu como todos decaem e passou. Viveu quase 13 anos, que penso ser a média dos de sua raça. Absurdamente, nunca teve uma ninhada, erro que quero evitar com a Juno.

Ficam 4 fotos dela aí no blog.

Aviso meus sete leitores que pretendo retomar as postagens diárias, mas tá difícil.

P.S. — Meu filho Bernardo me disse que tentou me telefonar na noite anterior àquela que a Batalha seria entregue ao veterinário para me avisar. Por algum motivo, não atendi o telefone.

O Mata-borrão

O Mata-borrão

Singelo post dedicado ao fotógrafo Ramiro Furquim,
que desconhecia a existência deste prédio
no passado de Porto Alegre.

Os mais jovens nem sabem que existiu, outros esqueceram. Uma das construções que deixavam a Porto Alegre de minha infância mais feliz e bonita era o Mata-borrão que ficava na esquina da Av. Borges de Medeiros com a rua Andrade Neves. Ele foi construído em 1958 para ser um local destinado a exposições e outros eventos, acabou servindo como central telefônica enquanto era construído o prédio da CRT do outro lado da rua e, por razões que desconheço, foi demolido no final dos anos 60. Em seu lugar foi construído o edifício perfeitamente comum da ex-Caixa Econômica Estadual (hoje “Tudo Fácil”).

Deve haver estudos sobre a debacle arquitetônica de nossa cidade, claro. Porém este não é um assunto muito comentado. Comenta-se mais a forma insistente como fazemos a autossabotagem de não olhar nunca para o Rio/Lagoa/Estuário Guaíba. Então, na minha humilde opinião, acho que deveríamos derrubar o Tudo Fácil para ali construir um enorme Monumento à Estupidez Porto-alegrense. Por quê? Ora, porque é a esquina mais representativa de nosso mau gosto e vou resumir meus motivos. Vamos a um trecho do Diário do arquiteto Fernando Corona (inédito em livro) que é revelado neste post:

Será curioso constatar o atraso intelectual na Seção de Obras da Prefeitura. Oscar Niemeyer fez um ante-projeto a sua maneira genial, pois uma vez estudado pela Prefeitura, não foi aprovado porque o Engenheiro Bozzano não achava o estilo próprio para a Av. Borges de Medeiros, alegando que iria desentonar das construções ao lado. Mais uma vez se constatou que a falta de um preparo apurado, os nossos engenheiros responsáveis pelas Obras Públicas, pouco entendem de arquitetura. Ora, se o projeto do Oscar fosse aprovado, mesmo que o nosso fosse o primeiro escolhido em concurso, eu me sentiria feliz por vez em nossa cidade um exemplar da arquitetura de Oscar Niemeyer.

Há coisas que não tem explicação. Gastam dinheiro em concursos, aprovam projetos, duvidam de seu valor, encomendam outros fora do concurso e tudo para nada. Até hoje em 1971, ao escrever estas minhas memórias, o terreno da Av. Borges de Medeiros se encontra vazio. Nenhum diretor do IPE se atreveu a construir seu Edifício Sede num terreno tão bom como esse”. Fl,s 375 e 376

Ou seja, em 1949, Oscar Niemeyer venceu um concurso para fazer um edifício naquela esquina, fato que não ocorreu porque iria destoar do restante da Borges de Medeiros… O edifício era este e seria a sede do IPE.

OK, se não era uma Brastemp, ao menos era mais aceitável do que aquela coisa que está lá hoje. Então, no lugar de Niemeyer, quase uma década depois, foi erguido o legendário Mata-Borrão com planta do arquiteto Marcos David Heckman.

O Mata-borrão — apelido que ganhou em função de seu formato, claro — era um prédio que me deixava feliz. Eu descia do ônibus na Salgado Filho ou do bonde na Riachuelo (residia na Av. João Pessoa, próximo ao Colégio Júlio de Castilhos) e passava na frente dele. Ficava olhando, fantasiando um dia morar ali. Tinha menos de 12 anos de idade…

E, além disso, ficava imaginando possiblidades de construções que nem os Jetsons conceberiam. Alguém saberia me dizer o motivo de sua demolição? Excesso de beleza? Era muito estranho? Pouca praticidade? Irritação dos militares com tanta originalidade? O que teria sido? Numa boa, nem quero pesquisar. Fico olhando as fotos e deixo assim.

O atual Tudo Fácil. É útil e feio. E destoa da vizinhança, apesar de ser igual a quase tudo. Que tal derrubar?

Beethoven – Quarteto de Cordas, Op. 132 – 3º movimento (e o inevitável 5º de minhas lembranças)

É sempre difícil escrever sobre uma música que amamos muito e que nos faz lembrar fatos pessoais. A primeira coisa que me vem à mente quando penso no Opus 132 foi aquele momento mágico em que eu, sentado na pior sala de meu passado, ouvi iniciar o Allegro Appassionato (último movimento do quarteto) e vislumbrei que, logo aos primeiros compassos, minha filha, aos cinco anos de idade, entrava girando na sala, improvisando uma valsa que dançava sozinha, de olhos fechados, por puro prazer de ouvir a música… Foi tão marcante que hoje soa-me hipócrita dizer que o movimento principal deste quarteto é o imenso Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der lydischen Tonart, um agradecimento à divindade pela recuperação que Beethoven obteve após grave enfermidade. Mas é, claro que é. O terceiro movimento, com suas duas explosões de alívio é o centro e razão de ser desta grande e fundamental obra.

Quando os últimos quartetos foram apresentados pela primeira vez, não foram bem recebidos pelo público. Ao receber a notícia, Beethoven deu a célebre resposta:

– Gostarão mais tarde.

Como ele sabia que estava escrevendo para o futuro é algo que consigo mais ou menos entender observando a evolução de sua música. Outro fato que chama a atenção é que, estética e conceitualmente, estes quartetos parecem projetar-se na evolução da história da música para colocarem-se quase 100 anos sua época, talvez logo antes dos grandes quartetos de Schoenberg e Bartók. É um mundo à parte. ISTO é Beethoven, e não seus concertos ou sonatinhas iniciais. Ela refere-se aos últimos quartetos, às últimas sonatas para piano, às Diabeli e certamente à Nona Sinfonia. O restante seria grandioso, mas menos pessoal e significativo. Lembro que quando era adolescente, nós tínhamos que nos aproximar destes quartetos respeitosamente e o Dr. Herbert Caro dizia que talvez fosse necessária maior maturidade para que um jovem pudesse entendê-los. Discordo postumamente do grande Dr. Caro, meu amigo e tradutor de Doutor Fausto, da Montanha Mágica, de Auto-de-Fé e outras tantas obras-primas; acho que sempre ouvi o Op.132 e 130 (o último acompanhado de sua Grande Fuga) da mesma forma e o respeito que sempre tive por estes quartetos emanava deles e não de minha atitude. O fato é que o Op. 132 é uma música que passou a fazer parte de mim muito cedo. Eu, um adolescente na casa de meus pais, costumava ficar deitado, antes de dormir, tentando reproduzir nota a nota o terceiro movimento. Cronometrava para ver se chegava perto de seus 15 minutos… Às vezes, pensava conseguir reproduzi-lo por inteiro. Mas nunca ninguém pode comprovar, nem eu.

Dizer mais o quê?

E, aqui, o movimento que minha filha Bárbara dançou por puro prazer numa noite fantasmagórica:

Sugestões de leitura para uma manhã pré-feriadão

Muito boas as leituras matinais do pré-feriado. Sugiro que meus sete queridos e fieis leitores comecem por Roberto Carlos não morreu (ele não morreu assado como uma galinha na estrada de Santos). Depois podem visitar Um mundo carente de terapia. Os que gostarem de futebol, pode ler minha crônica para Inter x Emelec — que incluo nas “boas leituras” apenas para me unir aos dois primeiros. Se quiser enojar-se vá ao amigo Mário Marcos e, se quiser rir, informe-se sobre como o Rio Grande do Sul se protegerá dos termos estrangeiros.

No mais, devo passar o feriado em Porto Alegre pondo alguma coisa em dia. Pois, apesar de curta, êta semaninha de merda que foi essa!

Consolo? Ah, esta foto de puro deboche pascoal que minha filha tirou no colégio:

Garanto que exportei para a Bárbara grande parte do meu espírito zombeteiro. E sou vítima dele, não pensem que não.

Óperas

Certa vez, um chato de um cético perguntou a Louis Armstrong o que era o jazz e ele respondeu: Man, if you gotta ask, you`ll never know.

Minha mulher ama e conhece muito sobre óperas. Eu não, muito pelo contrário. Não gosto mesmo.

Como morou 7 anos entre Verona, Roma e Londres, pôde passar este período assistindo ao vivo uma ópera por semana. Quando voltou para Porto Alegre, por alguns anos participou de um grupo que se reunia semanalmente a fim de assistir e comentar óperas. Uma pessoa era escolhida para estudar a ópera e fazer o comentário inicial. Depois, a peça era vista de cabo a rabo e tudo terminava num jantar. Então me conheceu e, talvez pelo fato de minha paixão pela música de concerto e de câmara ser tão açambarcante, acabou oprimida e hoje é uma ouvinte mais ou menos conformada daquilo que ouço.

Também contribuiu para seu afastamento uma briga interna com quem administrava o grupo. Alguma dureza é necessária para manter por anos um grupo do gênero, mas os ciúmes e a competição extrapolaram em muito o amor ao bel canto. Os desentendimentos eram recorrentes e voltavam-se principalmente para os que debilmente se insurgiam, se ausentavam ou demonstravam mesmo o mais humilde desejo de mudar alguma coisa.

Para assistir uma ópera é necessária toda uma infraestrutura. O gênero faz menos sentido sem a imagem. É preciso ver cantar, ver o cantor atuar. Deste modo — e já que pouquíssimas óperas são apresentadas nas cidades brasileiras — , é necessário armar-se de um DVD, sentar na frente da TV e ficar ali umas poucas horas. Nem sempre dá, então participar de um grupo com compromissos de horário e discussão é uma boa. Faz acontecer.

A novidade dos últimos anos é ver ópera no cinema, muitas vezes ao vivo. Acho uma solução sensacional, já que nossas cidades são tão ineptas para montar as suas, apesar da paixão de muitos e do excelente material humano.

O fato de minha mulher ter, digamos, “jogado a toalha”, não é uma vitória minha. Na verdade é algo que lamento ter-lhe tirado. Porém ela é muito gregária e, para mim, acompanhá-la é um suplício. O resultado é que fantasio ou durmo. Não gosto do gênero e os motivos não são claros, apenas posso contorná-los. Penso que a maioria dos enredos sejam inverossímeis e talvez cantá-los corresponderia mais ou menos com o fato de atores saírem repentinamente dançando nos musicais. Isto é, acho que a expressão sincera se perde em meio à cantoria empostada e às muitas necessidades do gênero: mostrar voz, mostrar que está sobrando potência, atuar e ainda ser delicado, raivoso, terno, amoroso, rancoroso, engraçado, malvado, interessado, ciumento e tudo. É complicadíssimo e não vejo motivo para todo aquele esforço. I´ll never know. Pior: noto certo desespero dos autores em torcer as melodias para contar a história e os recitativos – frases “semicantadas” que para mim parecem algo como um roubar num jogo (e isso também vale para os das Cantatas e Paixões de Bach) – são de matar. Há também a total proeminência de melodia ou da voz principal na música; coisa que, hoje sei, me irrita. If I gotta think about it, I`ll never know, indeed.

Porém me assusta o fato de tê-la involuntariamente roubado algo que lhe era tão importante. Ainda mais que sua paixão pela música de concerto não me parece tão avassaladora, não obstante sua devoção a Brahms. Um dia, ela vai recuperar o amor pela ópera e eu só espero que não passe a me detestar.

Hoje, ela está na Espanha com sua mãe e depois irá trabalhar em Roma. É claro que esta culpa e este texto é uma expressão em péssimo recitativo de minhas saudades. Até o dia 8.

Meu filho

Hoje, às 9h40, Bernardo faz 20 anos.

Minha mulher postou no Facebook:

Acho esta foto do meu enteado tão meiga que resolvi postar junto com meu beijo de aniversário. Um momento humano do Batman. Já sei que as gurias vão dizer: “Ahhh, que amor!” No início teve medo de me conhecer, tinha 12/13 anos e um cabelão de dar inveja ao Bode… Hoje é um super amigo e meu provador oficial de quitutes quando está na área. Dado, querido: Feliz Aniversário!

Faço 50 anos no próximo domingo. Pânico nenhum.

Publicado em 13 de agosto de 2007

Faço 50 anos no próximo domingo. Não sinto nada… na coluna… Hoje.

A Rádio da Universidade também completa 50 anos em 2007. Seu sinal está cada vez mais forte, o que mostra que os anos podem pesar, para uns e outros, de forma inversamente proporcional.

Leio um livro extraordinário: Espingardas e Música Clássica, de Alexandre Pinheiro Torres (1923-1999). Viveu 76 anos. Hum. Passou muitos anos doente. Que interessante.

Como todos sabem, a fundação da Igreja do Evangelho Quadrangular foi em 1957.

Ter um bicho de estimação reduziria em 40% as probabilidades de encontrar o amor, segundo estudo britânico. Se o bichano for um gato, o percentual sobe que é uma beleza. Notícia de hoje.

Você viu uma Romi-Isetta andando na rua? Eu vi. E não diga que era um triciclo, seu idiota. Tinha quatro rodas que nem qualquer carro, só que o eixo traseiro era mais curto. Quando vi? Ah, não enche o saco que estou estressado!

Angelina Jolie avisa que é bissexual, mas que agora, com Brad Pitt, não há mais espaço para este tipo de relacionamento em sua vida. Trata-se de uma notícia muito importante.

Em 1957, William Faulkner visitou a Grécia. Sim, Faulkner vivia quando nasci. Não, Sócrates veio bem antes. 1957 também foi o ano de nascimento de Osama bin Laden.

Hoje, isto é, no dia de hoje, Karl Rove, chamado o “cérebro de George Bush”, anunciou que deixará o governo. Sempre desconfiei que o cérebro de Bush estava fora de seu corpo.

Em 1957, John Lennon e Paul McCartney encontraram-se pela primeira vez.

Mas se você ainda acha que a Romi-Isetta tinha três rodas, veja as figuras ao lado. Viu? Não, meu pai tinha um Skoda, um carro moderno, tcheco-eslovaco, um carro comunista. Sim, tal país não existe mais. A capital era Praga. É, nem o comunismo. E nem Níkos Kazantzákis e Christian Dior, mortos em 1957. Andar de Skoda, no verão gaúcho, era algo como uma visita ao inferno. Era um carro feito para temperaturas baixas; acho que sua carroceria era de lã, com resistências incandescentes por dentro. O carro simplesmente absorvia o sol. Vocês não podem imaginar o que suei durante minha infância. Era magérrimo.

Hoje, aliás, sexta-feira passada, meu time recontratou o treinador que deixou Alexandre Pato na reserva, escalando Adriano Gabiru e Michel. Resultado: Velez 3 x 0 Inter.

No mesmo ano de 57, Carl Gustav Jung inaugurou a a exposição do Museu de Imagens do Inconsciente. Não, Freud já estava morto há trezentos anos.

Uma loja vende Bíblias camufladas e à prova d`água. “Nossa Bíblia em camuflagem arborizada é nosso produto mais vendido, seguida de perto por nossa Bíblia camuflada à prova d´água”, disse David Lingner, presidente da loja Christian Outdoorsman, do Arkansas, que vende artigos de caça e pesca com temática cristã pela internet. A capa da Bíblia traz folhas e cascas de árvore. Com isso, os cristãos podem levar os livros quando caçam. Ainda sobre a Bíblia camuflada e à prova d’água: “Água, gelo ou condensação não prejudicarão esta palavra de Deus resistente”, proclama a publicidade. Isto são trevas de 2007, não de 1957, claro.

Em 1957, morreu Sibelius e François Duvalier (Papa Doc) foi eleito para a presidência do Haiti. Uma flor de pessoa, o primeiro.

No mesmo ano, o Afeganistão tornou-se membro do International Finance Corporation.

Voltando ali atrás: a Associação Pescadores por Cristo afirma em Missão que “está ouvindo o chamado de Cristo para arrebanhar os extraviados e ser ‘pescadora de homens”‘.

No ano em que cheguei ao mundo, a cachorra ‘Laika’ foi para o espaço. Wilhelm Reich e Rivera, aquele pintor mexicano, também.

De volta a 2007: acabo de saber que o órgão regulador dos meios de comunicação em Hong Kong recebeu na última semana 2.041 pedidos para que a Bíblia fosse considerada uma publicação “indecente” por causa de seu conteúdo violento e sexual – que inclui estupro e incesto.

No ano em que nasci, o decreto Lei nº 3.357 criou o Museu da Abolição em Recife. Prova de que a Abolição já tinha ocorrido antes de eu nascer.

Agora, inventaram que sou parecido com o Frank Zappa. Já fui o Pete Townshend depois que ele ou nós envelhecemos. Sinceramente, prefiro ser parecido com Erik Satie, como também fui acusado há duas horas (descoberta de Marconi Leal e da SGC). Minha cara deve ser uma coisa muito estranha e adaptável. Em comum, o generoso nariz. Porém Satie (caricatura ao lado onde até eu me reconheço) era muito mais interessante. Compunha Prelúdios Flácidos, Penúltimos Pensamentos, escreveu Duas Peças Frias, uma Sonatina Burocrática e cometeu Pecadilhos Inoportunos. Nada me cai melhor nesta altura da vida.

O que eu ia publicar anteontem

Publicado em 21 de agosto de 2005

Observação importante: Este é o texto que ia publicar no dia de meu aniversário (19/08), mas houve a invasão do post abaixo e, agora que timidamente retomo o controle de meu blog, posso finalmente publicá-lo. Achei simpático o post de livres-associações que escrevi e, por isso, sigo falando um pouco mais em aniversário. Agradeço comovido às felicitações e manifestações de carinho de todos os que comentaram, escreveram e-mails e telefonaram.

Abro minha agenda e vejo que não falam em mim. Leio que hoje é o Dia Internacional da Fotografia, o Dia da Aviação Agrícola e o dia em nasceram Bill Clinton, Aracy de Almeida, Francisco Alves e Marcos Palmeira. Fotografia? Nunca seria um grande fotógrafo, meu daltonismo impediria. Aviação Agrícola? Sou inteiramente urbano e concordo com Cortázar quando ele diz que o campo é o lugar onde os bois passeiam crus. Clinton? Até simpatizo com ele, mas nunca fui criativo com charutos. Aracy? Como ela, adoro Noel Rosa, mas não faria aquele lamentável papel de jurada de programas de televisão que ela fez no final de sua vida. O cantor das multidões? Mal conheço, mal ouvi. Marcos Palmeira? Um ator bonito que fez um péssimo Villa-Lobos e um bom Bentinho no cinema.

Informam-me que 1957 foi o ano em que o primeiro ser vivo foi lançado ao espaço sideral. Foi um cão ou, mais exatamente, a cadela Laika, uma vira-latas soviética.

Depois de Laika, veio o primeiro ser humano. Um cara bem pequeno (tinha 1,58m) e gordinho (69 Kg) chamado Yuri Gagarin, que viajou apertadíssimo por 1h48min pelo espaço numa mini-nave, a Vostok I. Quando retornou, depois de uma queda livre a uma velocidade de 30.000 Km/h, estava perturbado e disse aquela frase infeliz que deixa os gremistas felizes até hoje: A Terra é Azul. Ora, não poderia ter dito outra coisa qualquer?

Mas isto já foi em 1961. Em 68, o simpaticíssimo Gagarin foi para a segunda divisão, digo, morreu, num desastre aéreo. Laika tornou-se selo.

Gagarin também.

Minha mãe era ainda menor que Gagarin, tinha 1,55m e hoje tem menos. Talvez tenha dançado, abraçadinha com meu pai, o grande sucesso de 57 — Love Me Tender, com Elvis Presley — que, dizem, ainda está vivo, apesar de também já ter virado selo.

Naquele ano, aconteceram coisas lamentáveis. Os negros lutavam contra o racismo nos Estados Unidos e tinham iniciado um forte protesto contra o governo do estado de Arkansas. Acontece que a Suprema Corte mandara abrir aos negros as escolas antes freqüentadas exclusivamente por brancos em todo o país. A revolta começou quando o fabuloso governador Orval Faubus contrariou a ordem federal e usou tropas militares para impedir a entrada dos negros. Com o clima de violência instalado, a Casa Branca ordenou que mil pára-quedistas saltassem sobre a cidade de Little Rock para restabelecer a ordem. Paradoxalmente, este débil metal, Faubus, acabou imortalizado por um negro, Charlie Mingus,

que compôs uma obra-prima em sua “homenagem”. A música chama-se Fables of Faubus e você deveria conhecê-la. Se não conhece, faz-lhe falta, estou certo disso. Faubus não virou selo e nem terá sua cara estampada em meu blog (ele é muito inferior a Laika, por exemplo), Mingus sim.

Nasci em 19 de agosto de 1957 e, para facilitar seus cálculos, vou logo dizendo que completo hoje 48 anos. No final dos anos 50, tinha esta cara aí.

E hoje tenho esta aqui.

E sou feliz, vivendo ao lado desta gente e de um grande (e crescente, muito crescente) grupo de amigos.

Bom, por hoje era apenas isto.

Feliz aniversário

Publicado em 19 de agosto de 2005, com minha irmã entrando em contato com os administradores da Verbeat. Eles “invadiram” e publicaram no meu blog sem eu saber

Por Iracema Gonçalves

Querido irmão!

Desculpe-me a intromissão, mas não resisti. Desde o momento em que teu álbum de fotografias de infância pousou em minhas mãos, pensei em fazer uma surpresa. Aliás, imaginavas perdido, não é?

Quero partilhar com teus amigos alguns momentos de tua/nossa meninice.

No dia 19 de agosto de um já distante ano de 1957, a menina da boneca ganhou um irmãozinho. Lembro-me bem do dia em que te conheci. Engomada, usei minha melhor roupa para ir ao Hospital Beneficiência Portuguesa. Só não esperava que tu estivesses tão “amassadinho”. Apesar disso, contextos como esse sempre sugerem uma dose de encantamento. Fazer o quê?

Com o tempo, tu te tornaste um lindo menininho. Parafraseando nossa mãe, “eras impossível”!

Certo dia, contrariando ordens superiores, fui até o centro da cidade depositar um rótulo de achocolatado para concorreres a um uniforme dos Patrulheiros Kresto. Qual não foi a surpresa? Acabaste ganhando. E eu tive que explicar direitinho como teu nome apareceu na urna. A partir daquele dia, o Edifício Paraíba passou a ter um xerife… e eu fiquei pra lá de orgulhosa com o feito!

Com o desenrolar da vida, as traquinagens deram lugar as tuas paixões – livros, música e o Internacional. Entre uma lida e outra, lembro das noites em que tu e o pai disputavam o espaço sonoro da casa, sem falar daquelas em que narravas futebol dormindo, com direito a gols, xingamentos, etc. Nossa mãe ficava apavorada… “Teria ele um parafuso a menos”?

Lá em casa, uma coisa que nunca faltava era rádio ligado, inclusive em cima de carros como este Skoda. Isso era mais evidente ainda nos dias de jogos do glorioso Internacional. Os comentários esportivos faziam parte de todos almoços e jantas e as bandeiras coloradas iam até para as areias de Tramandaí. Que honra para essa praia, hein?

A clássica posição de leitura – deitado – é a que sempre me vem à memória. A paixão pelos livros manifestou-se bastante cedo e lembro que, muitas vezes, a mãe reclamava, cheia de orgulho, de que a culpa era dela. Dizia que havia exigido muito de ti e que agora tu tinhas te viciado em literatura.

Na verdade, acho que sempre fomos uma família muito unida e as poucas brigas ocorridas eram disputas de espaço para ficarmos cada vez mais juntos. Indignada, eu costumava reclamar dos rádios e toca-discos que ocupavam a atenção dos homens da casa, bem como do enorme Correio do Povo – naquela época, tipo “Folha de São Paulo”.

Sempre foste um cara mais caseiro em relação ao nosso pai. Tínhamos que dividi-lo com o Jockey Club e com os jogos de damas. Neste último, ele era um craque e costumava fotografar-se com suas medalhas, o que pode ser conferido nesta foto. Já com os cavalos…

O tempo foi passando e o menininho, meu companheiro, deu um jeito de multiplicar-se. Os resultados foram estes sobrinhos maravilhosos, bonitos, inteligentes, carinhosos e cheios de vida! E, como se não bastasse, tu és um pai exemplar! Para quem não entendia como uma pessoa pode ficar tão boba com seu filho recém-nascido, eis o tira-teima.

A seguir, estamos nós no Natal de 2004! Confesso que já estávamos meio “altos”, mas lembro que foi na casa dos pais da Claudia… Ops! Ainda não falei dela. Esta é a mais nova integrante do clã. Foi uma “aquisição” e tanto, meu caro irmão. Ela é simpática, alegre, agregadora, está sempre disposta a ajudar e tem calor humano para dar e vender. Sem ela, esta invasão virtual não teria sido possível. Além disso, costuma deixar muito gourmet de queixo caído. Por favor, cuida bem da minha cunhada!

A pedido, destaco também teu querido sobrinho, que também tem em ti um grande amigo e companheiro.

Milton, um grande abraço de aniversário e votos de muiiiiiitos anos de vida!

Beijos da irmã que te adora!

Um esboço sobre minha irmã

Publicado em 31 de julho de 2005

Na minha opinião, estará equivocado aquele que pensar que o melhor de 1952 foi Os Brutos Também Amam ou o musical Cantando na Chuva. Estará mais errado ainda quem lembrar-se daquele ano pelas músicas Índia ou Sassaricando ou pelas Olimpíadas de Helsinki.

Vejam a foto da menina acima. Notem como ela, em fevereiro de 1956, aos 3 anos e meio, precisava de um irmão. Observem o carinho com que ela segura aquela boneca horrorosa. A coitadinha ficava sozinha na escada, sonhando com as alegrias que um maninho lhe daria. Seu olhar é presciente e indica com clareza as delícias do porvir; pois ele chegou:

E, mesmo que a foto de 1958 esteja comida pelas traças, vocês podem ver que sua simpatia, beleza, inteligência e alegria eram autênticas… Tivemos uma infância muito feliz e – fato incrível – nunca brigávamos. Ela sempre foi a melhor aluna da aula, a de melhor caligrafia, a de maior conhecimento, a de melhores dentes e, segundo um rapaz de sua escola, a de melhores beijos e abraços.

Meu pai, quando soube que sua filha de 15 anos estava namorando o Sylvio, perguntou a ela:

– Mas, minha filha, é um namoro platônico, não?

Não chamaria de platonismo aquilo que acontecia lá no sofá de casa, mas era adequado a um pai dos anos 60 fingir cuidar da virgindade de sua pimpolha. O que o pai nunca imaginaria é que ela, em 31 de julho de 2005, amanhã, estaria comemorando seu 53º aniversário e que o jantar da festa de hoje estaria sendo preparado pelo mesmo rapaz sorridente e de calças de atravessar riacho da foto. Hoje, bem mais calvo e de cabelos brancos, esperamos que ele nos prepare um grande jantar.

Nunca soube de outro namorado, mas, naqueles anos em que o rock and roll parecia produzir apenas obras-primas, há registro de festas de arromba e de certa resistência à nova música. Vejam o conflito geracional estampado nesta foto de 1969:

Meu pai faz questão de protestar silenciosa e eloqüentemente contra a música, enquanto minha mãe experimenta os efeitos do barato provocado por uma overdose de laquê e nossa heroína olha para o outro lado com os cabelos alisados e achando tudo aquilo um saco.

O casamento com o Sylvio rendeu-lhe um dividendo barulhento e agitado. Quando Filipe caiu em suas vidas

eu não sabia que estava ganhando – além de um sobrinho -, um companheiro de futebol e nem sonharia de que ele organizaria um site sobre o Sport Club Internacional e que eu seria o comentarista!

Como é inevitável, a vida seguiu seu curso e chegou a minha vez de aumentar a família. Ela recebeu um sobrinho que a adora.

E, depois da morte de nosso pai, recebeu uma sobrinha que, se não tinha seus cabelos castanhos, era crespa como ela e veio com o mesmo olhar, o mesmo jeito, o mesmo comportamento.

Hoje, espero que esta bela jovem senhora nos prodigalize uma grande festa de aniversário.

Afinal, toda esta gente tem que beber bastante e ser bem alimentada.

(Ira, feliz aniversário! Do irmão que te ama.)

Mulheres, me ajudem!

Postado em 16 de agosto de 2005

Sou bastante antiquado e romântico para acreditar que muitas crianças, diante das circunstâncias certas, são leitoras naturais até o momento em que esse instinto é destruído pela mídia.

Harold Bloom, no prólogo de Contos e Poemas para Crianças Extremamente Inteligentes de Todas as Idades.

Minha filha Bárbara, que está quase com 11 anos, precisa de indicações de livros para meninas pré-adolescentes. Minhas caras leitoras, ela é uma menina como vocês foram: é inteligente, sonhadora, altamente romântica, apaixonada pelas coisas e revela certa tendência para escrever. Nunca pertenci a seu maravilhoso sexo e, apesar de amá-lo incondicionalmente e de dedicar grande parte de meu tempo a entendê-lo, não pretendo mudar. Prova disto é que nem as visitas periódicas e obrigatórias ao proctologista tiraram-me de meu caminho. Assim, sempre li livros para meninos e, até hoje, prefiro o futebol ao balé. Não vou indicar-lhe Os Meninos da Rua Paulo, que foi meu livro mais querido na pré-adolescência, assim como de meu filho. Minha mulher lia uma inacreditável biblioteca para moças de sua avó. São livros da primeira metade do século XX e, se funcionaram para a Claudia, não funcionariam para a Bárbara. Minha ex-mulher, que se chama Suélen (ou Pâmela, não lembro), mal fala comigo.

Por favor, deixem-me comentários salvadores. Quais os livros que você indicaria antes que minha filha seja trucidada pela mídia? Tenho certeza que o fantástico grupo de leitoras que possuo — apenas como leitoras, infelizmente — não me deixará sozinho.

P.S.- Bárbara está gostando de Clarissa, de Erico Verissimo.

Comentários:

–> E tenho dicas de livros que são ótimas, pois tenho 11 anos e leio todos:Agenda de Carol Diário de Débora Agenda de Carol Fala sério mãe! Rita está crescendo Todos os cinco são muito legais. Vale a pena!
Luiza     Mulheres, me ajudem!     Jun 27 2007
–> Oi, td bom? Encontrei esse seu pedido desesperada por acaso, buscando por um dos livros citados pelas leitoras no google. Eu recomendaria os livros da série vagalume, são uma graça e podem agrdar a Gregos e Troianos. Se ela é romântica, então sem dúvida um livro de contos de Clarice Lispector ou de Lygia Fagundes Teles é um ótimo começo! Contos, pq os romances de Clarice já são bem densos… Mas se ela gostar de aventura ou suspense, aconselho Edgar Alan Poe. Ah, e se vc achar alguma versão pra adolescentes, um clássico tipo “Sonhos de uma noite de verão” seria maravilhoso. Bem, citei esses livros pq eu cresci com eles, mas tenho lido Harry POtter e apesar da mídia ser muito exagerada em cima dele, é um livro legal pra adolescentes da idade dela. Eu sinceramente recomendo! Um abraço e boa sorte!
Roberta     Mulheres, me ajudem!     Sep 1 2006
–> Gostaria de conhecer outras obras suas.
Ruama     Mulheres, me ajudem!     Dec 23 2005
–> Milton, Carolina adorava uma coleçao de contos chamada “Para gostar de ler” com seleçoes de autores muito bons como Rachel de Queiroz, Fernando Sabino, Rubens Campos, Mário Qintana, Cecília Meireles, etc. Também gostava de poesia que copiava em seus cadernos e sabia de memória!´ De minha época eu lia o que encontrava pela biblioteca do Lorde:e os que mais gostava eram os de Érico Veríssimo, Garcia Marques, Ariano Suassuna, Pablo Neruda. Gostava muito também de ler biografias… Bueno, mas vc já teve assessoria demais! Beijinhos na Bárbara.
nora borges     Mulheres, me ajudem!     Aug 25 2005
–> Postado por Milton após sugestão de Leila Couceiro e “roubo” (meu) das Garotas Que Dizem Ni: A leitura daqueles tempos As capas eram chamativas. O tamanho da letra, grandão. As páginas eram poucas e ilustrações apareciam sempre. Tudo isso acabava sendo chamariz para minha curiosidade quando eu era criança. Naquele tempo, bastava ver uma brochura esperando para ser degustada na prateleira “Infanto-Juvenil” que eu já sacava da frase favorita dos petizes: “Compra, mãe?”. Se bem que hoje eu continuo fuçando nas estantes mais coloridas da loja. A única diferença é que não caibo mais nas mesinhas e cadeirinhas disponibilizadas para a leitura dos pequenos – e sou chamada de “tia” por eles. Apesar do apelo natural que um livro voltado ao público infantil carrega, acender a vontade de ler é trabalho árduo quando se tem apenas um punhado de anos. Como competir com videogame, Internet, televisão e brincadeiras com os amigos? E olha que a escola também não colabora muito. Acho o fim aquelas leituras obrigatórias de apenas uma opção – ou seja, todo mundo vai ler exatamente o que a professora acha legal. Eu passei por tudo isso. Confesso que muitas vezes preferia tentar quebrar meu recorde no Enduro a passar a tarde lendo. Mas não há administradores de tempo melhores do que as crianças. O dia, para elas, possui umas 36 horas. Dá para fazer de um tudo – ler, inclusive. Eu conseguia. E, apesar de não haver Harry Potter naquela época, a magia era certa com… … O Gato do Mato e o Cachorro do Morro De Ana Maria Machado Existe um título infantil mais delicioso do que essa riminha aparentemente boba? O Gato do Mato vivia brigando com seu maior inimigo, o Cachorro do Morro, para decidirem quem era o mais valente e destemido da dupla. O problema é que do nada surge um leão para botar o rabinho dos dois entre as pernas. Nas minhas lembranças confusas, este livro figura como o primeiro. … O Gênio do Crime De João Carlos Marinho Quando chegamos naquela fase em que histórias de fadas e bichos viram “coisa de criança” (como se ainda não fôssemos isso), a melhor pedida é esse causo de mistério que fez parte da infância de muita gente – uma vez que foi publicado, pela primeira vez, em 1969. Foi a chance de brincar de detetive mirim e adivinhar quem estava por trás do esquema de falsificação de… figurinhas! … O Menino do Dedo Verde De Maurice Druon Era o meu “Pequeno Príncipe”. O personagem também é descrito como um menino loiro de olhos azuis e que vivia em um mundinho só dele. O dom de Tistu era, claro, o dedo verde – tudo o que ele tocava ganhava vida, principalmente as plantas. Tipo aquela cena de “E.T. – O Extraterrestre” em que o alienígena faz uma flor reviver. E a história, como no cinema, tem final triste e inesperado. … A Curiosidade Premiada De Fernanda Lopes de Almeida Toda criança já passou pela fase dos “Por quês”: para a gente era divertidíssimo saber por que a água é molhada e por que o fogo é quente; para os adultos, porém, deve ser dose. Essa brochura mostra bem o assunto levado até as últimas conseqüências. Glorinha é uma peste que quer saber tudo e incomoda muita gente com tanta curiosidade. Mas consegue, com isso, fazer até os pais aprenderem. … O Escaravelho do Diabo De Lúcia Machado de Almeida Se eu fosse falar de todos os livros que li da “Coleção Vaga-Lume”, precisaria de pelo menos um mês inteiro só versando sobre o tema. Como nem eu nem você agüentaríamos, vou me ater apenas ao principal. A história dava conta de uma série de assassinatos de pessoas ruivas que recebiam um pequenino escaravelho pouco antes de comerem capim pela raiz. Dava medo, mas era ótimo. … A Bolsa Amarela De Lygia Bojunga Outro dia vi esse volume em um sebo e amaldiçoei os céus por não ter um troco sequer na carteira para comprá-lo. Tudo bem: prometi a mim mesma voltar lá depois para reviver a saga da menina que mistura o dia-a-dia com histórias fantásticas de amigos imaginários que só uma criança sensível e imaginativa consegue criar. Faz muito tempo, mas lembro de ter devorado cada página. … Quem Manda Já Morreu De Marcos Rey Outro favorito da coleção “Vaga Lume”. Perceba que eu já adorava histórias tipo “C.S.I” desde pequena. Ali, o herói era o Edu, um rapaz que ajudava seu tio detetive – conhecido como Palha – a desvendar mistérios. O maior deles era a identidade de um tal de Boss. Depois de ler e reler e reler mais uma vez, ainda fiz com letra caprichada todo o suplemento de atividades. Sem a professora mandar. … História Meio Ao Contrário De Ana Maria Machado É tudo de trás pra frente, de ponta-cabeça. E como era divertido! Primeiro, o livro começa com “E eles foram felizes para sempre” e termina com “Era uma vez…”. Depois, a princesa se recusa terminantemente a casar-se com o príncipe encantado. A autora colocou um conto de fadas no espelho e recriou tudo assim, maluco, para a alegria dos pequenos que, como eu, tiveram a sorte de ler. … Marcelo, Marmelo, Martelo De Ruth Rocha Três histórias em um só volume: uma sobre Marcelo, um menino que resolveu criar seu próprio idioma, digamos, básico (cachorro era “latildo” e colher era “mexedor”); uma sobre Teresinha e Gabriela, duas garotinhas bem diferentes, mas que no fundo eram iguais; e uma sobre Carlos Alberto, um moleque mimado e egoísta que não gostava de perder. E tudo isso assim, de uma vez. Maravilha. … O Menino Maluquinho De Ziraldo Certamente o meu livro infantil favorito de todo o universo. Tanto que eu ainda o guardo, apesar da capa rasgada, das folhas soltas, do cheiro de mofo e dos rabiscos de canetinha que meus irmãos fizeram nele quando eram bebês. E o pego de vez em quando para falar oi ao menino que era maluquinho como todos nós éramos, mas que virou um adulto muito legal. Como eu espero ter virado.
Milton Ribeiro     Mulheres, me ajudem!     Aug 21 2005
–> Igual à maioria das mulheres aqui, também li muito e de tudo (inclusive bulas de remédio, livros “de menino” e “de adulto”, enciclopédias, dicionários, revistas da National Geographic), primeiro sem discriminação, e depois aprendendo a discriminar sozinha. Acho que o melhor é ter, em casa, uma biblioteca enorme e variada, e deixar que ela mesma entre lá e pegue o que quiser. Pode até ser que ela leia Lolita ou Grande Sertão : Veredas sem ter total capacidade para entendê-los, mas a gente não ama só o que entende completamente, talvez seja até um pouco o contrário, né ? ;o)
Cynthia     Mulheres, me ajudem!     Aug 20 2005
–> Milton, preste atenção nas bancas de revistas…sai ainda esse mês o lançamento dos Clássicos da literatura brasileira em quadrinhos para o público infanto-juvenil. Uma meia-forma de incentivo à leitura. Beijus
Luma     Mulheres, me ajudem!     Aug 19 2005
–> Amigo, eu pensei uma boa parte do dia no seu post, que preferi responder hoje. Estou dando um curso sobre rodas de leitura para professores, e seu post me fez reencontrar algumas questões importantes. Puxa, lembrei de tanta coisa boa dessa idade… A sua ansiedade e vontade de acertar como pai é simplesmente uma graça… E comove, de tão sincera. Cristo disse uma vez, “não peço que os tire do mundo, mas que os livre do mal.” Infelizmente, não fugimos da mídia… Pelo contrário, precisamos conhecê-la bem para saber combatê-la. E discordo de quem diz que somos tão frágeis ao ponto de ter nossas personalidades distorcidas profundamente. Temos uma porta interna que, se tivemos uma boa formação de caráter e personalidade, só abrimos para quem não vai nos desvirtuar. Ser curioso e sentir necessidade de conhecer de tudo a toda hora é muito comum nessa idade… E como é. Eu me lembro de ter sido assim. E foi aí que eu me lembrei que, na idade da sua filha até os meus 18 anos, eu li de tudo. Li o “Clarissa”, que a sua menina gosta… Li vários livros que falavam de adolescência ( feitos para adolescentes ), como “A Hora do Amor”, e “A marca de uma lágrima”. Li sobre sexo, li contos de mistério, li toda a obra da Agatha Cristhie e todas as bobageiras de banca daquelas Sabrinas e Biancas. E li também Machado de Assis, Maquiavel e Oscar Wilde. E todos eles, dos bons aos ruins, formaram quem eu sou hoje. Mas te digo – o melhor de ler tudo isso foi tê-los eu mesma escolhido. Então… Dê a sua filha a chance de escolher entre muitas opções. Respeite as escolhas dela… E se ela é ótima, como eu acredito que seja, encontrará por si só o seu caminho, o seu estilo, amadurecendo a seu tempo a leitora e a escritora que ela é. Agora, se você quer ser útil nessa hora, penso que o melhor é que mostre a ela o que você gosta e conte da sua paixão por este ou aquele livro. Meu avô fazia isso comigo, e eu me sentia conquistada sem que ele nunca tivesse entregado um livro em minhas mãos. E não há questões de gênero na literatura… Acho que tudo é para todos. Não é não? Perdoe o tom “professoral” da resposta… rs Ando tão chata que nem mesmo me animo a escrever pra não irritar a outros. rs Mas olha, meu coração diz que seu amor pela menina Bárbara é sempre o melhor conselheiro… O amor é sábio. Se é! Beijo enorme, pra você e pra menina. E olha, se não conhece ainda, tente o livro “Como um Romance”, do Daniel Pennac… Acho que ele pode te servir muito. 🙂
Karina     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Oi milton! agora estou vendo sua pergunta. Olha, meu livro Caixa Postal 1989 ganhou todos os prêmios , ele é da José Olympio editora. Ele é um livro adorado pelos jovens. Principalmente pelas meninas. O livro foi escrito em 89, ganhou o jabuti em 93, entre outros prêmios, e até hoje recebo mails de leitores. Há até comunidade de fãs no Orkut. Infelizmente eu não tenho nenhum exemplar em casa pra te enviar, senão, seria um prazer. Tenho outros livros em casa. Se você me passar o endereço terei prazer em presentear.
Angela     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Meu coloradinho favorito, aproveito para dizer que sou bem mais crítico do que tu em relação ao manoel de oliveira! Agora em relação aos conselhos de leitura para a tua filha, permite que te diga que sou homem e, como tu, amante das mulheres, mas não percebo porque é que só por ser homem sou excluído. Pois não me parece que as sugestões que aqui vou deixar sejam inferiores às sugestões das tuas respeitáveis leitoras: Aventuras de Alice no País das Maravilhas. As aventuras de Gulliver. Evidentemente, aconselho os mesmos livros ao pai da aconselhada (aproveito ainda para ir reler, pela enésima vez, o primeiro dos livros que sugeri). Abraço, Paulo
Paulo José Miranda     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Mílton, experimenta Minha vida de menina, da Helen Morley, ela deve gostar. Li o Monólogo até onde foi publicado, eu acho (V parte?). Queria ler o final, mas não achei. Bjins
adelaide     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Milton, compre urgente para ela: – Os livros de Karen Cushman: “Aprendiz de Parteira”, “Catarina, a Menina Passarinha”, “A Balada de Lucy Whipple” e “Matilda do Osso”; – “Ella Enfeitiçada”, de Gail Carson Levine; – A trilogia para jovens de Isabel Allende (A Cidade das Feras, O Reino do Dragão de Ouro e A Floresta dos Pigmeus); – A trilogia de Pippi Meialonga, de Astrid Lindgren, que alguém já sugeriu; – “Harriet, A Espiã” (um clássico!! mas esqueci o nome da autora…) – “O Caçador”, de Ana Lúcia Merege (hehehe); – Se ela for do tipo brincalhão, os livros da série “Witch”, tipo “Como se dar Bem com seus pais”, “Como se dar bem na escola”… – Se ela for do tipo romântico, livros de Marina Colassanti, mas só os de contos voltados para jovens. E nunca mais deixe de me consultar em assuntos importantes como esse, viu? Beijos, me visita! Ana
Ana Lúcia Merege     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Bom como hoje em dia uma menina de 11 anos ja sabe muito bem o q quer pq tenho uma q tem 12, acho q deve seguir um conselho ja dito antes leve ela em alguma livraria e deixe ela mesma escolher sua leitura. beijos
marcia     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Nossa, que coisa complicada. Mesmo pq eu não tenho gdes livros nessa época da vida. Mas aconselho o Mahabharata de Claude Carrière.
Charô aka Suricata     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> ..quanto aos livros ainda não sei,mas qto ao comentário sobre a Rádio imaginária (em teu coment. no Zadig) aqui tens uma locutora voluntária em prontidão! bjo na palma da mão!
Bugra     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> oLÁ Milton, Um dos livros modernos para meninas é o ” O mundo de Sofia” provavelmente você ja o conheça http://www.ime.usp.br/~cesar/projects/lowtech/mundodesofia/ Beijos Stella
Stella     Mulheres, me ajudem!     Aug 18 2005
–> Engraçado que minha filha de 11 a Amália ama, lê e relê as aventuras de Pipi meiolonga, os contos nordicos, russos, árabes. E por conta do filme leu toda a coleção Desventuras em série. De quebra ainda dei as duas O Genio do crime. Eu vi outro na FNAC que as duas pequenas pediram. Amália tem 11 e Roberta 9. É auqle livro da menina que entra no armário e conta histórias.. agora esqueci.. Mas no geral os contos, ela amou. Beijos Odila
Maria Odila     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Eu concordo, a mídia anda destruindo a vontade de ler.
Pedro     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Milton, pedirei que Flora opine, mas tenho uma posição quanto a ler: o importante é ler, qualquer coisa, mesmo o que possamos considerar subliteratura, pois após o desenvolvimento do hábito de ler o próprio leitor passará a selecionar bons livros; atualmente meninos e meninas lêem livros comuns, como os de J. R. R. Tolkien, Catherine Clément, Eoin Colfer, Alice Sebold e até mesmo, por estranho que pareça, Mark Twain, Charles Bukowski e Stephen King, preferencialmente os contos destes três últimos autores; por falar em contos, os mini contos de Marina Colassanti costumam fazer sucesso entre a garotada e as crônicas de Veríssimo também. Em tempo: ambos ficamos decepcionados com a Cobra Coral em Porto Alegre, não é?
Manoel Carlos     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Tem uma fase que a leitura cai um pouquinho, por mais que elas gostem de ler; é que o pensamento vagueia e vai longe… Olívia! Eu li toda a coleção Vagalume, da Ática. E todos os clássicos brasileiros. Se fosse eleger um livro mais atual e que as meninas gostam, sem dúvida seria “O mundo de Sofia”, mas diferente da maioria nada contra o “Harry Potter”. Beijus,
Luma     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Milton, minha filha adora Clarice Lispector, Ana Cristina Cesar e Caio Fernando Abreu, mas já tem 18 anos…. Acabei de falar com ela e lembramos que ela leu e adorou “O Mundo de Sofia”, de Jostein Gaarder quando tinha 11 anos. É uma excelente opção, também dei a ela, nessa época, vários livros de Vinícius e Drummond, acho que são ótimas pedidas, leves, agradáveis de ler…. Lembro que também comprei uns livros infanto-fuvenis de autores clássicos, tinha uma coleção dessas com James Joyce, Fitzgerald, Goethe, tudo com historinhas leves (por incrivel que pareça hehehe), ainda deve existir algo do tipo. Agora, nunca me rendi a esses para-didáticos horriveis que a escola obriga a ler. procurando a gente encontra coisas bacanas e compreensíveis pras meninas. ps.: quando digo para-didáticos, não estou me referindo, claro aos classicos brasileiros, mas umas coisas novas horrorosas que apareceram nos ultimos anos.
Denise Arcoverde     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Eu li todo José de Alencar, li o Tempo e o Vento (amei, li umas cinco vezes depois de novo) – eu era uma menina de fazenda, me identificava com essas coisas – e sexo não assusta não, é melhor a novela (inevitável) com o Veríssimo do que sem ele. Li tanta coisa que não consigo lembrar…acho que ainda repetia uns Lobatos de vez em quando, vício adquirido aos seis. Júlio Verne. E um monte, inesgotável, de coisas menos famosas, que eu ia catando e lendo. Acho que nessa idade, o importante é dar coisas com muito conteúdo de conhecimentos gerais, porque a memória é fantástica. Eu juro que passei no vestibular por ter lido uma porcariada de escoteiros em férias no Rio Paraguai, Verne, essas coisas. Literatura de verdade eu curtia, mas é claro que depois que reli mais velha eu percebi que não tinha entendido nada. Então vejamos, acho que tem duas coisas: uma são os fatos e informações concretas que nunca mais esquecemos, que podem ser adquiridos em todo tipo de livro, e com maior concentração em literatura “light”, tipo Verne; outra coisa é a noção das coisas humanas, do sentido da vida, essas coisas mais profundas. Para isso, para mim, foi bom ter lido literatura “adulta” quando criança, mesmo sem entender tudo. (por essa razão tenho certo “pé atrás” com Harry Potter e afins, não ensinam muita coisa prática nem muitas coisas humanas – acho que o Lobato tem uma medida mais equilibrada de fantasia e realidade, apesar de as relações humanas nele serem fraquinhas)
Julia     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Eu lia Júlio Verne, Dumas, a Condessa de Ségur e, depois, M. Deli. Além de todo o Monteiro Lobato. O que eu daria a ela? Capitães de Areia, de Jorge Amado. Os Harry Potter, sem a menor dúvida. Li os dois primeiros, são muito interessantes e tenho uma porção de pacientes-amigos que não perdem um. Acho que os ‘antigos’ clássicos tipo de Júlio Verne, Dumas, etc, ainda a atrairão. Há umas edições adaptadas por gente como Cony e Ferreira Gullar, se não me engano. No mais, leve ela pra Livraria Cultura ( ou outra assemelhada) e deixe que ela mesmo fuce e descubra os livros que quiser ler. Faço isso com minha sobrinha de 9 anos, e ela adora. Uma coisa é certa: ler é experiência de cada um. A gente ajuda, mas ela é quem irá escolher. Beijo grande, Márcia
Márcia     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Milton, meu dileto amigo. Ah, as leitoras que possuímos!! Nossa salvação. Os proctologistas, ô agrura dos cinquent’anos… Como o pedido de socorro só se estende às leitoras, aguardemos, cavalheiros… Amitiés, BetoQ. P.S.: Dia 19 se aproxima, hem?! Festa à vista nos Verbeats. Queria muito estar aí. Milton responde: Calma, Zadig, para que tanta pressa? Serão 48, apenas.
Zadig     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005
–> Minha primeira sugestão seria Mme Deli, como a Cláudia. Gostei aos 10 anos, de Os desastres de Sofia da Condessa de Ségur ( rss). Bom, a escola nos obrigva a ler os citados pela Cláudia, mas aos 12 eu lia ( escondido) Jorge Amado! Beijão
Mônica     Mulheres, me ajudem!     Aug 17 2005

Dia dos Pais de Alma Lavada

Ganhei um presente, o mais doce deles. Copio aqui o post que minha filha escreveu em seu blog:

ISSO É UMA HOMENAGEM AO MEU PAI:
Pai eu te amo muito eu não te troquaria por nada nesse mundo!!!!!!!!!
Eu te amo vc q me ajudou todos esses anos!!!
Nunka vou deixar de amalo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Eu te amo!!!!!!!!
Sempre me compriendeu!!!!!!!!!!!
Meu amor eu ti AMO!!!!!!
I LOVE YOU!!!!!!!!!!!!!!!!!
Pai vc é muito especial para mim!!!!!!!!!!!
Fasso qualquer coisa por vc!!!!!!!!!!!!!
EU TE AMO!!!!!!!!!!!!!Papai!!!!!!!!!!
Lindo efofo e gulochinho!!!!!!!!!!!!
Eu te adoro!!!!!!!!!
Meu amor!!!!!!!!!!!!!!

Bjs especialmente para o meu pai!

Digam-me: ainda preciso de presente? E no blog dela chegam comentários… É um carrossel de emoções…

A Baixinha, a FLIP

Publicado em 5 de julho de 2005

Ela tinha 1,55m. Agora deve ter no máximo 1,50m. Recebeu educação rigorosa em colégios internos de Santa Maria e Porto Alegre. Tão rigorosa que era proibida de tocar tangos no piano do colégio da capital. Uma vez, pegaram-na tocando aquela música do demônio. Seu professor – que hoje está devidamente morto e é até nome de conservatório em nossa cidade – veio por trás e fechou violentamente a tampa do piano sobre suas mãos. Uma bela educação, com efeito. Inesquecível. Ela diz ela que doeu por muito tempo, que talvez tenha quebrado algum osso. Depois, formou-se dentista numa época e num estado onde somente outras três mulheres o eram. Foi trabalhar em Cruz Alta, mas veio outro dentista e a levou casada para Porto Alegre. Trabalhou a vida toda e teve dois filhos, que criou com cuidados (muitos) e preocupações. À noite, ora arrumava as roupas do filho mais novo que jogava futebol a tarde inteira, ora tomava as lições dele e de sua irmã. Muitas vezes ela, de tão cansada, dormia durante as lições e nós ficávamos paradinhos, torcendo para que ela não acordasse. Não sei de mãe melhor e não lembro de nenhum tapa; fomos criados sem as exemplares atitudes do defunto maestro Leo Schneider. Éramos uns duros, pois meu pai gastava horrores no turfe, mas nunca faltou nada em nossa casa, nem amor ao perdulário, que, aliás, era adorado por todos. Eu detestava vê-la bem arrumada, era sinal de que iria ao cinema com meu pai e que ficaríamos sozinhos. Odiava aqueles perfumes e casacos de pele. Ela tinha algumas curiosidades: a liberação de verbas era ilimitada se fosse para comprar livros ou qualquer coisa para nossa educação; porém, se fosse para aquilo que considerava bobagens, poderia haver vetos. Uma vez, eu tinha uns 18 anos e meus pais foram para a praia deixando-me em casa. Chamei uma namorada e passamos a noite juntos. Pela manhã, ouvi meus pais brigando na frente da porta do meu quarto. O tempo estava chuvoso e eles tinham retornado. Minha mãe dizia para meu pai, enquanto protegia a porta do meu quarto e tentava conter a voz: “Ele é um adulto e não interessa se está dormindo com alguém ou não. Sai daqui! Já!”

Parabéns à Dra. Maria Luiza Cunha Ribeiro, minha mãe, que hoje faz 78 anos e que me ajudou em tudo, até em minhas ereções adolescentes.

-=-=-=-=-

Há uma série de autores que me interessam nesta FLIP. E eles não se chamam Jabor, Jô, Suassuna e muito menos Ondaatje. Pretendo assistir a duas palestras por dia, encontrar alguns amigos e respirar a atmosfera da cidade, tão especial durante a FLIP. Se der, pego carona em qualquer escuna e tomo um banho dedicado a meu filho Bernardo, que ama aquelas águas; depois, culpado, ligo para minha filha. Das estrelas, só Rushdie me interessa. Mas há muito mais: o fantástico Roberto Schwarz, o turco Pamuk, o português Pedro Rosa Mendes, o chef Bourdain, o cubano Latour, Paulo Henriques Britto e outros, além de Paulinho da Viola e do bandolim de Hamilton de Holanda. Se a festa permitir, pretendo escrever pequenos posts diários a respeito. Mas os cybers de Parati são de matar. Quem quiser me achar deve procurar aqui:

Pousada do Príncipe
Av. Roberto Silveira, 289
Telefone: (24) 3371.2120

O Acidente de Minha Filha & Festa de Aniversário de Tiago Casagrande

Publicado em 31 de março de 2005

Minha filha Bárbara ama os cavalos. Há quadros de cavalos em seu quarto, há revistas sobre cavalos na bancada onde estuda, há reclamações indignadas quando vê cavalos maltratados em carroças, há manifestações eufóricas quando vai ou volta da aula de equitação, há cômicos comentários (em minha opinião) sobre a vida particular de cada um dos animais da escola, incluindo os cães. Ela diz que será veterinária. Creio que já se faria um veterinário completo com apenas 20% de sua paixão.

Há dois anos atrás, ela convenceu-me a apoiá-la num de seus maiores sonhos. Desejava sair do balé – de que não gostava – e ir para a equitação. Recebeu a adesão da Claudia, minha atual mulher, que também queria fazer aulas. Shakespeare tem razão ao dizer que “Onde não há prazer, não há proveito”. Depois de conseguirmos a concordância de sua mãe, ela começou as aulas e surpreendeu-nos o imediato aumento de sua concentração para os estudos – antes sempre difíceis – e sua nova forma de organizar a vida. Ela melhorou demais. Nunca se saberá o papel exato que o esporte teve nisto, mas não posso evitar a idéia de causa e efeito. Além disto, o pessoal da escola é muito afetivo e sei que ela adoraria passar seus dias lá, mesmo sem aula.

Pois ontem a Bárbara desconcentrou-se e teve uma queda durante um galope. Eu estava na beira da pista, deitado, lendo o Quixote. Não vi a queda. Quando levantei a cabeça, observei que Gabrielito – o cavalo que ela montava – vinha sozinho e que a Bárbara caminhava atrás, limpando-se da areia. Ela não chorou, apenas referiu-se a uma pequena dor nas costas e preparou-se para reassumir cavalo que, segundo ela, tinha disparado. Pediu ao Sílvio – o dono da escola e professor, grande professor – para apenas andar a passo. Sílvio, experiente nestas coisas, respondeu-lhe que a aula continuava normalmente; ela deveria galopar. Bárbara achou graça e a aula terminou tranqüila, entre risos.

Para a Bárbara é sempre uma vitória enfrentar e superar tal gênero de situação. Depois, conta o ocorrido como se fosse a protagonista de uma grande aventura. E quem há de negar? Mais de uma vez, disse-me que só pessoas corajosas faziam equitação. Então, à noite, ela recebeu uma ligação casual de sua mãe e contou-lhe alegremente o caso.

– Mãe, caí do Gabrielito! Mas não houve nada, só estou com uma dorzinha nas costas.

Como resposta, obteve o seguinte:

– Pergunta para o teu pai se ele não consegue se colocar no meu lugar, pergunta sobre como eu vou me sentir se algo te acontecer, pergunta sobre o que vou dizer a ele.

Minha filha murchou no telefone e desligou. Mas… O que importa não é o que a Bárbara sentiria ou o que todos nós sentiríamos? Ou, por acaso, o que importa é como Ela – um ser dotado de natural e justa precedência divina – se sentiria?

É claro que tenho receio (muito receio, cada vez mais receio) de que algo, um dia, possa ocorrer e não precisaria de nenhum auxílio externo para me culpar. Eu mesmo trataria disto, não me faltaria vontade de morrer e talvez o fizesse. Mas não seria criminoso impedi-la de fazer o que gosta? Qual é o percentual de vítimas de equitação? É muito diferente do percentual de quem sai à noite e é baleado? E a auto-estima recém adquirida pela excelente amazona Bárbara, de dez anos de idade? Não conta? E como ficaria a oposição que, hoje, ela consegue fazer a uma mãe de personalidade totalmente diferente da sua e que não aprendeu nem a andar de bicicleta por preferir viver segura e plastificada? Só porque sua mãe vive num laboratório, preferindo evitar o contato com a realidade e as experiências mais dolorosas, não quer dizer que os outros não possam desejar uma vida real.

Sei lá. Fico tão incomodado com estas coisas que me perco. Prometo a mim mesmo estancar o giro da pimenteira sobre o que sobrou de minha relação, mas não consigo.

Ontem, aquele que é verdadeiramente o maior blogueiro do mundo (desculpa, Rafael Galvão), escreveu isto em seu decálogo:

10. Toda blogagem se dará em paz e exercitará a liberdade de expressão inerente a qualquer democracia. A blogagem estará a salvo de perseguição política, religiosa ou doutrinária de qualquer caráter. O blogueiro será livre para dizer o que lhe venha à telha, desde que, obviamente, não cometa com a linguagem crimes de calúnia ou plágio.

Estou salvo. Vamos então a algo feliz.

(Back to Last Thursday)

É simples fazer uma festa legal. Basta que haja um número suficiente de pessoas legais num ambiente legal e elas logo começam a demonstrar sua legalidade. Funciona sempre. A festa de aniversário do Tiago Casagrande foi assim. Apesar da espetacular entrevista que fiz com ele em 20 de janeiro – não deixo por menos -, ainda não o conhecia pessoalmente. Conheci o Tiago, o Gejfin, a Francesca, a Tatjana, o Rafa e muitos outros que o álcool impede de lembrar. Todos ali tinham 20 anos a menos do que eu e 10 a menos do que a Claudia, mas pessoas legais costumam conversar de igual para igual com crianças e velhos e em um minuto estávamos adaptados. O local – o Bongô, bar da Cidade Baixa de Porto Alegre – era perfeito. As cervejas sempre vieram rápidas e dentro da CNTPpC (Condições Normais de Temperatura e Pressão para Cervejas; isto é, geladíssimas). O preço era adequado. A cozinha era tão boa que voltamos no dia seguinte para conferi-la melhor. A decoração, cheia de capas de discos e de partituras de rock coladas às paredes, fez com que o grupo familiar do segundo dia passasse a desejar que o lavabo da casa que estamos construindo tivesse páginas importantes de grandes livros coladas às suas paredes. O cara poderia fazer suas necessidades lendo o trecho em que Sancho Pança chama pela primeira vez Dom Quixote de O Cavaleiro da Triste Figura ou a Parábola do Grande Inquisidor (Os Irmãos Karamázovi, Dostoiévski) ou o oitavo (discussão sobre o Opus 111 de Beethoven) ou o vigésimo-quinto (Adrian Leverkühn e o demônio) capítulos do Doutor Fausto de Thomas Mann ou uma partitura da Oferenda Musical de Bach… Já pensaram? Porém, pecado mortal, tergiverso. Voltemos à festa.

Em meio à conversa, Tiago disse que sou um excelente leitor, pois tinha-o desnudado (é uma metáfora, bem entendido) em sua entrevista, através de questionamentos que o fizeram perguntar a seu analista se ele, por acaso, era transparente. Bondade e elogio dele, é claro. Muito mais que bom leitor, sempre fui tido por excelente observador. Vi, por exemplo, o olhar comprido e nostálgico que ele lançava a certa moça em nossa mesa. A nostalgia é, em minha opinião, algo que manifesta-se não só como saudade do que passou, mas também como saudade do que virá, ou não. Vi também, deliciado, que a amizade que o une ao Gejfin é daquelas coisas que só casamentos ou nascimentos de filhos farão diminuir em freqüência, nunca em intensidade. Vi também que gostaria cultivar amizade com estes dois; são pessoas generosas, inteligentes, tagarelas, agradáveis, que valem a pena. Agradeço ao vasto mundo por fazer existir tão perto pessoas deste calibre.

Rascunho sobre a Bárbara, que fará 10 anos sábado

Publicado em 23 de setembro de 2004

Minha querida filha está de aniversário novamente. Já recebeu antecipadamente seu presente – mais um bicho em nossas vidas -, mas creio que o mais importante ainda está por vir: a Claudia está organizando sua primeira reunião dançante – com DJ e tudo o mais. A evolução que a Bárbara teve nos últimos 12 meses é visível em centímetros e sensível quando falamos com ela. Mudou muito, tornou-se uma pequena mulher, cheia daquelas surpresas que estes seres não param de nos apresentar. Sob uma perspectiva muito pessoal, as últimas novidades são as inumeráveis variações de que se utiliza para expressar sua paixão por mim.

Ela disputa com a Claudia o número de beijos trocados comigo, diz que me conheceu antes (e que, por isto, já me deu muito mais beijos do que a Claudia poderia dar algum dia), quer e oferece provas de amor a cada momento, costuma ficar olhando e provocando minha companheira enquanto me faz carinho, mete-se entre nós quando nos abraçamos, diz que é mais bonita e é criativa ao imaginar suas vantagens, vinganças, trunfos. Faz tudo isto com inalterado bom humor para com sua grande amiga e colega de equitação e loucuras, que lhe retribui a amizade da mesma forma. Pela manhã, costuma invadir nosso quarto dizendo para a Claudia se afastar, pois, afinal, tu já passaste a noite inteirinha com ele, né…? Rimos muito. O que ela faz é uma caricatura sincera de ciúmes. Sorri muito, achando maravilhoso desafiar a Claudia e ficar me chamando de bonitinho, fofinho, quentinho. Eu adoro.

Filha de pais separados, tornou-se atenta à agendas e compromissos, às roupas que estão lá e cá, às coisas que tem que ser carregadas e costuma ver com antecipação os problemas que ocorrerão por incompatibilidade de horários. Tem extremo medo disto e quer agradar aos dois lados quando destes impasses. É tarefa impossível, Bárbara.

E, ora bolas, seus medos geram dor de barriga! Quando fica angustiada, é sempre acometida deste tipo de dor. Ao saber disto, minha mãe revirou os olhos e disse que até nisto ela é igual a mim. Dor de barriga, mãe? Sim, acompanhada de muito choro. Faz um mês, um cavalo mais agitado disparou quando ela lhe cravou os calcanhares. Ela não caiu, nada de grave ocorreu, só o susto. Mas depois, toda a vez que chegava a hora da equitação, vinham as dores. Ficou 15 dias sem poder ir às aulas de equitação.

Nos últimos 12 meses, seu desenvolvimento na escola foi estupendo. Sua organização começou a aparecer nos temas e no interesse em aprender. Já não era sem tempo! Não é nada literária, gosta de matemática e de animais, só lê quando obrigada, normalmente ameaçada por terríveis torturas. Por motivos que não entendo, fico comovido quando a vejo fazer seus temas, torço para que surjam dúvidas e para que ela não me interrompa imediatamente com um “Já entendi!” que sei nem sempre ser verdadeiro.

(Meus filhos não lêem meu blog. Escrevo isto sobre a Bárbara na esperança de que ela um dia se interesse por estas memórias a seu respeito. É uma forma simples de registrar a passagem do tempo, como os aniversários também fazem. É uma forma simples de registrar como sempre foi bom amá-la.)

Bárbara faz 9 anos

Publicado em 25 de setembro de 2003 (também com fotos que não imagino quais sejam ou onde estejam)

Ela nasceu num domingo. Dizem que as crianças de domingo são as mais felizes. Deve ser verdade. Quando a vi pela primeira vez, só enxerguei suas gengivas e o céu da boca. Parecia uma cabeça oca dotada de som muito potente. Como berrava! Só depois vi o resto. Vermelhíssima, não parecia ter nada de especial, só mesmo as cordas vocais. Logo conheceu sua mãe e, sem maiores apresentações, procurou e encontrou imediatamente o alimento que lhe interessava e mandou ver. Neste momento, minha filha ouviu seu primeiro grito, que foi de dor e admiração. Também pudera, voracidade em excesso pode machucar.

Depois os cabelos pretos e lisos caíram e, em seu lugar vieram outros loiros e crespos. Ela cresceu e revelou-se um doce. Um doce de enorme feminilidade, um doce tímido que se acostumou a ser elogiado por sua beleza e que não conhece outra forma de imposição, uma pequena pessoa que se perturba facilmente quando sente ser motivo de contrariedade ou decepção. Nestas situações, chora por qualquer coisa, se atrapalha para falar, é capaz de escrever “serumano”, esquece a tabuada ou até de como se trota em um cavalo, coisa que nasceu sabendo fazer.

Do que gosta a Bárbara? Quem é a Bárbara? A primeira coisa a ser dita é que ela é muito bonita. Não é conversa de pai bobo não, é verdade! Sei que vocês estão vendo as fotos, mas precisam mesmo é vê-la falando e se mexendo! Provas? Mesmo sem permissão dos pais, ganhou fotos em 3 dos 12 meses no calendário do colégio. Mais? O clube que frequentamos estampou por mais de um ano uma foto dela em seus bloquetos de pagamento e ela ainda foi capa da revista, tudo também sem permissão ou consulta. Se somarmos a isto o fato de ela ser simpática e sedutora, estaremos frente a uma figurinha avassaladora, certo?

Desta forma, distribuindo sorrisos e recebendo elogios, ela viveu até entrar no primeiro ano, quando sua segurança foi abalada. Talvez embriagada por seu novo séquito de admiradores, não deu importância ao fato de que tinha de aprender a ler e escrever. Para alfabetizá-la, acabei por intervir a fim de convencê-la de que nem tudo na vida viria de graça. Resolvi então exercitar meu modesto talento de pedagogo. Não sei bem como, mas deu certo. Ela tentava me persuadir de que escrevia tal palavra de determinado jeito porque era o jeito dela, aí eu dizia-lhe que assim os outros não entenderiam. Fui para as sílabas, depois para as palavras simples, etc. Quem me ajudou muito foi o Bernardo, que explicou à irmã que uma vogal sozinha fazia muito pouco som e que quase tudo o que dizíamos vinha da união de duas letras. Ele batia palmas a cada sílaba: Bo-ne-ca; e a Babi escrevia OEA. Na verdade, foi ele quem lhe ensinou as sílabas. Fico comovido ao lembrar. Hoje ela é ótima na escola, apesar de fazer um esforço mínimo.

Ela ama os animais. Cavalos, cães – possui, junto com o irmão, uma cadela labrador, a Batalha – , insetos, répteis, todos. Guarda coisas incríveis em tupperwares e depois leva tudo para a aula: baratas, aranhas, gafanhotos, lagartas, lagartixas, tartarugas, girinos. Quando vê Jurassic Park, fica boquiaberta admirando os monstros. Não brinca muito com bonecas; quando brinca de mamãe, é sempre mamãe-urso, mamãe-dinossauro, mamãe-cavalo, etc. Este ano, convenceu-nos a tirá-la do balé – onde dizia ficar meio parada esperando o final da aula – e a colocá-la em um curso de equitação. É algo que nasceu com ela, pois ninguém, em minha família, foi visto antes sobre um cavalo. Treina cheia de orgulho e sorri muito.

Uma vez, uma amiga – aquela mesma que usa o nickname luigipirandello – contou-me por e-mail uma história ocorrida com ela e seu filho. É o tipo de fato que poderia acontecer com a Bárbara, é até injusto que isto não tenha ocorrido com ela…. Vejam que pérola: Adorei conhecer a Bárbara. O meu A. faz aniversário em 21 de outubro, ou seja, os dois são librianos. Quando ele tinha 5 ou 6 anos, se apaixonou por uma aranha. Estávamos no Chile e tinha levado ele no zoológico. Na saída, tinha um cara vendendo aquelas aranhas enormes e repulsivas mas perfeitamente inofensivas. O A. disse “mãe, compra pra mim… por favor… eu cuido”. Confesso que sempre me achei muito esperta… disse a ele “tá bom, se tu pegares ela, eu compro” e já estava pronta para afagar-lhe a cabeça e dizer “tudo bem… não precisa… vamos comprar um pirulito”. Mas ele não vacilou nadinha: esticou a mão e pegou o bicho como se toda a vida tivesse esperado o momento de afagar uma aranha. “Olha… ela é loira. Vai se chamar Rosinha”. E foi assim que a Rosinha foi morar lá em casa, para alegria geral de conviventes, amigos e visitantes. Porque posso ser uma idiota, mas sou uma idiota coerente e jamais deixei de cumprir a palavra empenhada. Deve ser coisa de libriano a paixão pelos bichos, comuns ou raros… talvez o dom de conquista também: por incrível que pareça, em pouco tempo o A. convenceu todo o mundo que a Rosinha era um amor. Até a V. e o B. deixavam ela passear por suas costas.

Algumas declarações de amor da sedutora. Ela é especialista nisto.
A cena: eu dirigindo, levando-os para a casa logo após a separação, o Bernardo com lágrimas no olhos, eu quase e então entra a Bárbara:
– Pai, qual é a coisa que tu mais gosta depois de mim?
– Babi, depois de ti e DO TEU IRMÃO, a coisa que eu mais gosto… acho que é de ler.
– Pai, então vou escrever um livro enorme prá ti, tá? Vou começar hoje.
Abraços e beijos.

Outra:
– Pai. Como é que tu pode ser mais velho do que eu?
– Não entendi.
– É que eu tenho a impressão, sabe, que tu nasceste no meu coração… depois que eu nasci.
Abraços e beijos.

É um carrossel de emoções!

Minha querida filha, feliz aniversário.

Bernardo faz 13 anos

Publicado em 4 de janeiro de 2004 (com várias fotos que não sei quais são)

Bernardo nasceu tão calmo que assustou sua mãe. Assisti à cesariana, realizada após uma noite de tentativas inúteis  — ele não estava na posição, digamos, correta. Ao retirá-lo, o médico segurou aquela criança de olhos bem abertos e respiração forte e anunciou:

– É um belo garotão.
– Mas… por que não grita? – disse em acentuado vibrato sua mãe.

O médico deu-lhe uma chacoalhadinha e recebeu como resposta somente um rápido “Uá”. Eram 9h40 do dia 4 de janeiro de 1991 e, por toda esta calma, não ganhou nota 10 no índice de vitalidade Apgar, ficou com 9 . Entregaram-me o pacotinho de menos de 3 Kg, levei-o para junto da mãe. Ele não chorava, não dormia, apenas revirava os olhos buscando a luz do teto. Se Goethe morreu pedindo mais luz e Victor Hugo acusando o aparecimento de uma luz negra, Bernardo nasceu fazendo acrobacias por luz. Não adiantava revirá-lo no berço, ele se voltava sempre para as lâmpadas acesas. Quando eu dava por mim, estava cantarolando Vida, de Chico Buarque, principalmente o trecho:

Luz, quero luz
Sei que além das cortinas
São palcos azuis
E infinitas cortinas
Com palcos atrás
Arranca, vida
Estufa, vela
E pulsa, pulsa, pulsa
Pulsa, pulsa mais

Mas estava apavorado. Era meu primeiro filho e eu não sabia o que fazer com aquela criança magra que tinha dificuldades para mamar e que em seus primeiros dias arrumou uma hérnia intestinal e retornou ao hospital, desta vez para a mesa de operações. A hérnia e outras complicações só serviram para amarrar mais fortemente seus vínculos com os pais. Fiquei orgulhoso quando ele, ainda bebê, escolheu-me num quesito fundamental: para dormir, preferia o colo do pai.

(Duas fotos. Quais seriam?)

Quase 13 anos separam as duas fotos acima. Quando as vejo assim juntas, dá-me vontade de rir, pois possuem os mesmos elementos, exceto o indefectível patinho. A fragilidade desta imagem contrasta com a segurança adolescente da outra. Na época da primeira, eu tinha a modesta esperança de poder criar uma boa pessoa, um cara legal, só isso; secundariamente, esperava também estar ganhando um companheiro para uma ou duas de minhas maiores paixões – futebol, música, cinema e literatura, em qualquer ordem. Na segunda, vejo retratado o quanto minhas expectativas eram modestas. É certo que ganhei mais do que esperava, recebi um oceano. É difícil imaginar minha vida sem sua atenção e carinho. A presença deste interlocutor muito inexperiente e inteligente faz-me repensar os conceitos fundamentais sob os quais vivemos. É alguém sempre disposto a falar, discutir e opinar – torna-se até chato algumas vezes! Porém, a observação da segunda foto me dá uma tranquilizadora sensação de intimidade e penso que ali talvez esteja a pessoa que mais conheço no mundo. É alguém cheio de argumentações sedutoras, mas também dotado de um humor anárquico, incontrolável e inoportuno que aprecio muito e que aprendeu nem desconfio onde… Quando saímos juntos, chegamos a um tal grau de entendimento que talvez seja nauseante para quem se detenha a assistir; é como se estivéssemos dentro de um seriado da TV americana dos anos 60, do gênero “Papai Sabe Tudo” ou “Os Waltons”, mas… puxa vida, sabem que é bom conviver assim? Creio que isto vá mudar nos próximos tempos… Penso ainda possuir uma influência avassaladora sobre suas decisões e opiniões, mas a adolescência está chegando. Talvez todo o carinho que recebo hoje vá reduzir seu fluxo para só retornar plenamente depois dos primeiros amores do garoto. Fui assim com meus pais e penso que provarei do mesmo remédio. Estou preparado.

Ele é muito informado e seus professores elogiam o acesso que seus pais lhe dão à cultura. Delicio-me com o elogio, mas sei que é uma meia-verdade, pois ele é autônomo. É só não atrapalhar. Adora explicar o que sabe – e é muito! – e o faz com clareza. Acostumado a vencer discussões, às vezes torna-se teimoso quando não tem razão, mas tudo o que sei sobre astronomia e biologia, por exemplo, foi ensinado por ele em sessões acompanhadas de farta bibliografia comprobatória.

Talvez não devesse contar a história e seguir, pois nela eu brilho tanto ou mais do que ele, mas ela serve para ilustrar um tipo de indignação muito presente no caráter dele. Ele fica louco de raiva quando vê ou é vítima de uma injustiça. Passa a não compreender o mundo, mas luta.

Na primeira série, quando tinha 7 anos, um colega roubou-lhe uma lapiseira. Bernardo queria recuperá-la e os dois estavam gritando um com o outro. Bateu a sirene do recreio e, para por fim à discussão, a professora – bastante tola, por sinal – determinou que o objeto era do outro colega. Resultado: foi seguida pelos protestos de um Bernardo indignado. Depois, ela me chamou para uma conversa.

– Eu sei que ele tinha razão, mas ele não podia vir atrás de mim no corredor discutindo. Foi um desrrespeito.
– Mas a senhora pegou a lapiseira dele e deu para outro menino!
– Eu errei, mas não interessa. Ele foi muito veemente, me seguiu até a sala dos professores. O senhor deve adverti-lo.
– Não vou fazer isso.
– Não vai fazer isso?! Mas ele não pode sair desafiando professores pelo corredor.
– Olha, Rosaura, eu era o maior cagalhão na idade dele e sofria por isto. Acho admirável que ele tenha te enfrentado; afinal, quem tinha a razão? Não vou fazer nada.

Abaixo, uma foto do Bernardo injuriado. Tinha acabado de discutir com sua irmã e a mirava cheio de raiva.

Sempre gostou muito de ciência e tecnologia. Uma vez, com três anos, chegando à escolinha, viu o pessoal do Departamento Municipal de Esgotos abrindo um buraco no meio da rua e perguntou:

– Pai, são paleontólogos?

Logo que começou a falar, demonstrou ser um cético mirim. Quando o maternal escolheu como tema religião, voltou para casa preocupado.

– Não quero deixar a tia chateada, pai.
– Por que, Bernardo?
– Ela falou que no céu tem anjos, Deus, um monte de coisas.
– E daí?
– Daí que eu andei de avião e vi que lá em cima não tem nada, só nuvens. Mas não vou dizer prá ela, ela pode ficar triste ou braba…
– É, deixa assim.

Como todo menino, ele adora as piadas e os sons escatológicos. É capaz de fazer maravilhas, principalmente com arrotos. Obrigou-me a baixar uma lei aqui em casa, a qual não é muito respeitada. A lei reza que É vetada a emissão de ventosidades por determinados orifícios corporais, mormente os traseiros. Com o tempo, o texto da lei não ficou mais coloquial mas ficou resumido a Não são admitidas flatulências ou eructações! Ignoro o que faz os homens acharem os arrotos e peidos coisas engraçadas. O Bernardo tem que ser advertido a cada reunião formal sobre a última frase grifada, pois parece pensar que os outros podem se divertir com a eufonia (é eufonia mesmo) de suas emissões.

Ganhou o apelido de Dado de sua irmã menor, Bárbara, que achava mais seguro dizer isto em lugar daquela forma complicada cheia de erres. Mas tem todos os apelidos do mundo. Para alguns tios americanizados é Benny ou Bernie, para outros é Bê, no colégio é Bena e, para algumas amigas da Bárbara, é Matagal, alusão clara a seu inacreditável “corte” de cabelo. Aliás, o cabelo é um capítulo à parte: antes queria parecer um roqueiro, depois um jogador de futebol argentino e agora está em fase de pleno experimentalismo. Está experimentando, bem entendido, o fundo do poço estético. Está com um cabelo que, apesar de limpo, raramente é cortado e nunca é penteado. Não sou nada conservador, critico exclusivamente a estética. Porém, deixemos o rapaz viver sua vida.

Apesar da cara de selvagem mal dormido, ele não morde, tem cuidado em nunca ofender as pessoas, em ser sempre gentil, etc. É claro que isto não funciona muito com os de casa, mas funciona com o resto, inclusive comigo. Preocupa-se com os problemas dos outros e não os esquece, voltando sempre depois ao assunto. Aplicou grandes doses de companheirismo durante a separação – o que me foi de grande consolo.

Nos últimos tempos, notei que ele queria introduzir um assunto importante. Desembuchou dizendo que sua mãe tinha um namorado. Deixei-o falar. O detalhe que mais me interessou foi saber que os dois tinham saído em plena terça-feira pela manhã com a finalidade de jogar tênis. É um bom sinal. A única coisa que me importa é que meus filhos estejam bem.

A mesma aceitação ele tem em relação à minha namorada. Como exemplo da abordagem cuidadosa do Bernardo, busco um trecho do e-mail que mandei em 11 de julho de 2002 para meu amigo Marcelo Backes, época em que estava pensando em apresentar a Claudia a meus filhos.

Fiquei me preparando uns dez dias até chegar no Bernardo para contar. A reação dele foi a seguinte:

– É claro que vou sentir muitos ciúmes, mas acho que tu é legal e merece isto.

É possível ser mais correto e sincero?

Reflexões (ou memória) pós-separação (III)

Publicado em 29 de julho de 2003

Lá por julho do ano passado, comecei a namorar a Claudia. Como dormia sempre na casa dela e minha cama só me via quando estava com as crianças, resolvi falar da novidade para elas. Preparei-me bastante, escolhi bem as palavras para que não houvesse choque nem rejeição. Reuni os dois e contei-lhes a história.

Bernardo, com 11 anos na época, foi muito racional. Disse-me:

– É claro que vou sentir muitos ciúmes, mas acho que tu é um cara legal e merece isto.

A Bárbara, com sete anos, não disse absolutamente nada. Uma semana depois, voltou subitamente ao assunto:

– Eu vou ter duas mães?
– Não, a tua mãe é a Laura. Tu vais ter mais uma amiga.

Então, ela abriu um sorriso e disse que queria conhecê-la logo, saber como ela era, etc. O Bernardo tinha pedido um tempo para se acostumar com a idéia, mas a Bárbara queria ver logo como era “a nova amiga”. Quem é pai sabe o quanto as crianças sabem ser insistentes. Numa manhã de domingo, quando estava com os dois, a Bárbara veio me acordar e, utilizando todo o seu arrasador poder de sedução junto a mim, fez-me prometer que eu a apresentaria à Claudia ainda naquela manhã. Convidamos o Bernardo, mas ele queria mais tempo.

Pois bem, levei-a até o apartamento da Claudia, onde tivemos uma das mais curiosas cenas de timidez de que vi até hoje. Minha filha, que é uma loira crespa linda, escondeu-se atrás de seus cabelos e de um livro e, através do pouco espaço útil disponível, espreitava minha namorada quando esta não a estava olhando. Não queria conversar, só olhava. Depois, pediu-me uma folha para desenhar e fez um casal cuja mulher tinha enormes mãos. Acho que ela – apesar da timidez – deu uma grande demonstração de coragem. Hoje, as duas são companheiríssimas.

Bernardo conheceu-a depois. Pediu-me que fosse numa reunião com mais gente presente. Foi atendido. Fizemos uma apresentação quase formal. Cumprimentaram-se como dois embaixadores de potências inimigas. Mas a formalidade logo foi dando lugar à naturalidade. Eles também se relacionam bem.

Fico pensando o quanto podem ser diferentes dois irmãos.

Tô brincando com o pensamento, pai

Publicado em 12 de fevereiro de 2004

Só a indiferença é livre. O que tem caráter distintivo nunca é livre; traz a marca do próprio selo; é condicionado e comprometido.

THOMAS MANN

Tento ser duro, mas resisto tanto quanto um pedaço de gelo ao sol. As crianças viajaram em férias com sua mãe, C. foi fazer um trabalho a 467 Km de distância e eu me vi com a toda a liberdade e tempo do mundo. Que beleza! Fiz planos para trabalhar muito e, nas folgas e nos finais de semana, ouviria Mahler no devido volume – os vizinhos têm de ser culturalizados, não? -, leria sem interrupções até dizer chega e, quando cansasse de tudo isto, abriria a porta de casa em direção a um cinema, sem ter que combinar nada nem esperar longamente, fora do quarto, por aquela tradicional escolha de roupas femininas…

Nos primeiros dias, cumpri meus objetivos com brilhantismo; depois, algo começou a emperrar além da falta da presença física que começava a incomodar. Eu havia lido, ouvido e visto tanta coisa que precisava comentar com alguém. Pensei em escolher alguns interlocutores inteligentes, mas este estava em férias, aquele compreenderia a parte Mahler do discurso mas não a parte Thackeray/Bernhard, aqueloutro não tem muito humor e… é melhor ligar logo para a C.

Descubro assim que aquilo que observava em meu filho quando criança acontece também comigo. Explico: Bernardo, quando pequeno, narrava sua vida para quem estivesse perto e, mesmo que não houvesse ninguém para ouvir, seguia descrevendo para si mesmo todos os acontecimentos e idéias que lhe ocorriam. Muitas vezes eu chegava perto dele e perguntava: “E daí, narrando a vida?” Não foram poucas as vezes que achei que estava criando o Rei dos Chatos! Porém, a idade fez-lhe muito bem.

Agora sou eu quem precisa descarregar suas histórias e acontecimentos sobre a namorada. Já minha filha foi diferente, era muito silenciosa. Brincava em tal silêncio que era bom sempre verificar se ela brincava de verdade ou se estaria desacordada (talvez morta) em algum canto da casa. Bárbara hoje fala pelos cotovelos, mas não é raro termos dúvidas sobre sua presença conosco, tais os silêncios em que abisma-se. Muitas vezes, sem fazer barulho, vou observar o que ela faz. É incrível, seu passatempo preferido é o de caminhar sobre os sofás, pulando de um para outro e voltando pelo mesmo caminho enquanto ouve a música que ponho no CD. Por que faz isto? De início, pensava que ela gostava de ouvir música erudita, mas mudei de opinião. Hoje sei que aquilo é somente uma trilha sonora para…

— Bárbara, o que tu tá fazendo?
— Tô brincando com o pensamento, pai.

Tendo hoje 10 anos, minha filha não é mais uma criança potencialmente suicida como são as pequenas e, muitas vezes, confiro sua presença e estado – vígil ou soporífero -, gritando assim:

— Babi, tá brincando com o pensamento?
— Sim!

Sou hábil em criar subterfúgios, não? O que eu queria dizer desde o início é que estou morrendo de saudades deles. São 22 dias sem ver meus filhos e 19 – com uma pequena interrupção durante o Fórum Social Mundial — sem ver a C. Isto me faz mal. Voltem, por favor, sinto falta de vocês!

Apesar de terem razão, ecologistas são chatos e preguiçosos

Geralmente as sacolas plásticas têm mais conteúdo do que os ambientalistas.

Ricardo Henriques, vulgo @calhau

Não sei o motivo pelo qual tanta gente chata se interessa por ecologia. É algo complicado. Conheço uns legais, mas afirmo que são minoria. Parece que certos temas são perseguidos por chatos. É algo a ser analisado e combatido, porque o meio ambiente… Não, eu não!

Eu talvez tenha feito a minha parte ao apoiar as decisões daqueles que projetaram nossa casa de forma um pouco diferente e original. Construímos com dificuldades ainda não totalmente pagas um pequeno edifício de dois apartamentos e terraço de uso comum. No primeiro andar ficamos nós, no de cima a família do irmão de minha mulher — que não mora mais lá — , e no térreo é a garagem e os quartos dos guris (Bernardo e Bárbara). Na verdade, quem concebeu as novidades mais econômicas e corretas do ponto de vista ecológico foi o irmão da Claudia, que é engenheiro — essa raça cheia de fantasia, principalmente a que de são objetivos. A construção foi lenta, mas as características que vou tentar descrever abaixo tiveram pouca influência na demora. O que influenciou mesmo foram “os recursos” e a necessidade de obter empréstimos em meio a obra.

O que há de diferente em nossa nova casa:

1. As paredes duplas.

Objetivo: manter o conforto térmico sem gastar carradas com ar condicionado.

Construir um prédio com operários brasileiros e com especificações diferentes das habituais é uma coisa para loucos. A nossa construção possui paredes duplas de tijolos maciços. Entre elas, fica o melhor isolante térmico, o ar. Mas os pedreiros demonstraram sempre uma insopitável vontade de preencher o ar entre elas com cimento… Ai, meu Jisuis, até todas as possibilidades de acesso ao vão serem fechadas, tivemos que conviver com a ameaça de ver o conforto térmico planejado ir pelos ares ou ser tapado por cimento. Não foi uma vez que um pedreiro começou a virar baldes de cimento naquele espaço inútil…

Resultado prático: Nulo. Quando esquenta, os habitantes (inclusive eu) abrem as janelas. Quando esfria, tudo é fechado. As paredes duplas são boicotadas pelos habitantes.

2. O telhado de grama.

Objetivo: o mesmo anterior.

Muito comum na Europa e principalmente nos países nórdicos, o telhado de grama fica sobre o terraço impermeabilizado, acrescido de uma geomembrana, utilizada também em lagos artificiais. A grama, assim como nós, precisa manter sua temperatura estável. Para sobreviver, utiliza sua umidade. Claro que, se tivermos um gramado sobre a casa, quem estiver em baixo receberá o ganho secundário de não ter uma potencial estufa em seu teto. Protegido desta forma e com muita fé na ciência — ou seja, com as quatro paredes laterais e o teto livre da canícula — , o irmão da Claudia não previu a colocação de nenhum ar condicionado, não fazendo nem os buracos nas paredes para recebê-los.. Nós, mais céticos, aprovamos as idéias, mas mantivemos nossos buracos… Afinal, nossos termostatos parecem ter sido regulados na Suécia; odiamos o calor excessivo. A curiosidade é que o banco financiador, o Banrisul, por pura ignorância, não aprova projetos com telhados de grama. Apesar de toda a documentação apresentada, eles morrem de medo de infiltrações na construção que lhes servirá de garantia em caso de não pagamento. Ou seja, cidadãos comuns como nós estamos mais avançados do que o estabelecido pelos “técnicos” do banco financiador.

Resultado: Nulo, enquanto não nos livrarmos do Banrisul.

3. Reaproveitamento da água.

Objetivo: óbvio.

A maior parte da água consumida em uma casa é aquela que finaliza nossos nros. 1 e 2 diários ou, sendo mais claro, vai para as privadas. A água das privadas de nosso prédio será aquela que já foi utilizada em nossos banhos, na lavagem de nossa louça, etc. Esta é mais uma idéia do irmão da Claudia – o qual até tem nome, chama-se Natal, uma tragédia que herdou. Ele é engenheiro mecânico e trabalha no DMAE (Departamento Municipal de Água e Esgotos) de Porto Alegre, conhece estas coisas de hidráulica. Porém, toda vez que um técnico vai em nossa casa fazer algum reparo, pergunta:

— Isto foi projetado pelo professor Pardal?

Resultado: acho que funciona.

4. Sombreamento de áreas do pátio com trepadeiras e plantas frutíferas.

Objetivo: produzir sombra no verão e deixar passar o sol no inverno.

No pátio, temos maracujás e parreira e bergamoteira e alfazemas e trepadeiras e manjericão para o pesto. Com o tempo, descobri que os corretos ecologistas são bons de promessa, não de botar água nas plantas. Sobra sempre para mim que, menos ambientalista e mais político, nego-me a ter um DOI-CODI de plantas em casa. Extingui de vez a Central de Torturas, que só se mantém no terraço, a fim de que sirva de lição para a humanidade não provocar outros holocaustos. Quando começaram as mortes, fui obrigado a assumir toda a plantação — menos a do terraço. Os ecologistas me veem da janela e, por vezes, abanam ou puxam conversa. Só.

Resultado: há alguma felicidade entre as plantas, mas não é devida a quem planejou a coisa.

5. Composteiras e outras bichices.

Os ecologistas cansaram, outros ficaram com medo de ratos e outros animais ferozes. Nunca saíram dos planos.