Barbara Hannigan no pódio, sem terno

Barbara Hannigan no pódio, sem terno

Tradução amadora feita a partir deste original.

Dedico a tradução a minhas sete leitoras, e, em especial,
à Elena e a minha Bárbara com acento.

Quem disse que as mulheres não podem ser regentes? Bem, um monte de homens. Então, o que a famosa soprano Barbara Hannigan aprendeu desde que ela pegou a batuta e começou a brandi-la em um — choque! — vestido sem mangas?

Por Barbara Hannigan

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Quando eu tinha 10 anos, decidi que ia ser uma musicista. Eu não tinha certeza de que tipo, mas a regência não era algo que eu sequer considerasse. Crescendo em uma pequena vila na costa leste do Canadá nos anos 70 e 80, eu pensei que as mulheres só podiam reger coros ou, na melhor das hipóteses, orquestras escolares. Eu não sabia o que significava o sexismo. Além disso, eu adorava cantar e logo percebi que era isso o que ia fazer na vida.

Passei grande parte da minha carreira com o foco na música erudita contemporânea, trabalhando com os compositores em novas criações e explorando as obras do século 20. Um dos meus papéis favoritos é o de Lulu, de Alban Berg. Para mim, ela não é uma femme fatale nem a vítima que alguns dizem ser. Ela é uma mulher infinitamente fascinante, deliciosamente contraditória e que desafia os rótulos. E é sempre fiel a si mesma. Se ela usa salto alto e vestido ou uma roupa de ginástica vermelha e sexy, ela permanece confortável em sua própria pele até o final da ópera, quando, forçada à prostituição, organiza seu próprio assassinato a fim de escapar de um futuro que ela não poderá suportar. Ela é uma mulher extremamente poderosa. Incorporá-la em minha vida teve um enorme impacto sobre mim.

Chegar aos 40 anos foi doloroso para mim. Eu tinha ideias sobre o meu valor e lugar como performer e estes estavam relacionados com a minha idade. Comecei a evitar-me no espelho. Eu queria manter minha idade em segredo. Gastei depois muito dinheiro em cremes inúteis para o rosto. Em parte, isso tinha a ver com a minha vida de prateleira como cantora. Muitos de nós sentimos que temos uma data de validade estampada em nossas testas. Quando passamos dos 50, as vozes, especialmente os registros mais agudos e leves, perdem elasticidade, flexibilidade e beleza de tom. Eu estava sentindo a pressão do tempo.

Mas Lulu me ajudou a crescer. Cantei-a aos 41. Ela me fez perceber que eu não poderia estar mais preparada para cantá-la até exatamente essa idade — os meus anos de investimento, a experiência, as 20.000 horas de prática realmente faziam diferença. Eu tinha tudo o que precisava. Senti a confiança sobrevivendo à experiência.

Barabara Hannigan em Lulu
Barabara Hannigan em Lulu

Pouco antes, quando me aproximei dos 40 anos, eu também tinha começado a reger. Fiz minha estreia como maestrina no Châtelet em Paris com a ópera de câmara de Stravinsky Renard e com Mistérios do Macabro de Ligeti, onde cantava e regia. Foi uma experiência avassaladora, uma lição de humildade. O maestro é em parte servo, em parte líder e, na maioria das vezes, tem que apenas ficar fora do caminho. Ofertas para conduzir e cantar com grandes orquestras começaram a chegar. Sir Simon Rattle me pediu para executar Façade, de William Walton, com ele e os membros da Filarmônica de Berlim, em 2012, dividindo as tarefas de regência e narração entre nós.

É claro que o soprano é um campo só para mulheres. Com a regência, vi expandir-se para mim um campo dominado por homens. Eu realmente não penso em mim como uma pioneira — era simplesmente algo que eu precisava explorar como musicista. Mas, à medida que o tempo passava, percebia que o “feminino” estava agora ligado ao rótulo de “maestro”. Eu nunca tivera este rótulo como cantora.

Para Façade, eu usava roupas apropriadas para a teatralidade da peça — um vestido de noite sem alças. Um amigo comentou sobre a expressividade dos meus braços, e pareceu-me que isso era parte da minha força como maestrina. Quando eu fiz a minha estreia no Châtelet, que eu tinha usado um terno: muitas mulheres regentes usam roupas ou de gênero neutro ou algo parecido com um terno de um homem. Pensei que calça e jaqueta eram o “traje correto”. E usei também. No entanto, eu nunca uso terno na vida real! Desde Façade, passei a usar um vestido sem mangas para reger. É algo onde eu posso me mover e que cabe na música… Eu também não amarro meu cabelo para trás, a menos que ele esteja num mau dia. Tive feedbacks positivos sobre isso vindo de orquestras e audiências. Ninguém vê problema em eu não estar sobriamente vestida com um terno escuro. Porém, os críticos sempre observam minha roupa, o que não é algo que eles costumem fazer com regentes homens.

A discussão pública de questões de gênero é muito carregada. Pegajosa. Eu hesitei aqui e quase comecei a me censurar. Vasily Petrenko, o maestro Real Liverpool Philharmonic, e Bruno Mantovani, diretor do Conservatório de Paris, fizeram comentários depreciativos com o foco no feminino. Mesmo o professor Jorma Panula, fez comentários depreciativos na TV um ou dois dias antes de eu reger o Concertgebouw de Amsterdam. Mesmo que seus comentários não fossem pessoais, eu me senti terrivelmente ferida. Eu tinha recém trabalhado intensamente em conjunto com os músicos da orquestra em obras de Stravinsky, Schoenberg e Ligeti, e eles vieram criticar minha musicalidade e habilidade para reger com base no sexo, alegando que mulheres só deviam conduzir “música de mulheres”, como Debussy e Fauré. “Não é um problema”, disse Panula, “se as regentes escolherem obras mais femininas. Bruckner ou Stravinsky elas não devem fazer, mas Debussy é OK. Isto é puramente uma questão de biologia “.

Eu me pergunto se eles lamentam o que disseram.

Sempre que sou questionada sobre o assunto em entrevistas, eu aproveito para combater essas ideias. No início deste ano, a caminho de um concerto, eu li no New York Times que dois alpinistas finalmente alcançaram o topo do Dawn Wall. “Espero que [nossa conquista] inspire as pessoas a escalarem seus Dawn Walls secretos”, disse um deles. Eu subi no palco naquela noite energizada por essa citação. Eu a carregava comigo: reger tornou-se o meu próprio e nem tão secreto Dawn Wall. É uma daquelas poucas fronteiras finais em que há escassez de mulheres. Para mim, porém, a questão é muito mais complicada do que uma chamada de “Precisamos de mais mulheres regentes!” Reger é ter a musicalidade, a psicologia e a habilidade técnica reunidas em um raro tipo de liderança que é indescritível. E ela não é nem de homem nem de mulher. A convenção manteve o campo dominado por homens. Convenção e, é claro, algum sexismo cotidiano — porque antes de uma mulher ficar no pódio, ela precisa entrar em uma aula de regência na universidade, e antes disso, mesmo, ela precisa ver a carreira como uma opção viável, algo que eu não tive quando criança.

A jovem filha de um amigo me viu regendo na TV outro dia, e disse: “Mamãe, eu não sabia que deixavam as mulheres serem maestros”.

.oOo.

Abaixo, aos 6min39, Hannigan empurra Rattle e regê parte de Mysteries of the Macabre, de Ligeti. Divirtam-se com esta enorme artista.

György Ligeti
Mysteries of the Macabre

London Symphony Orchestra
Sir Simon Rattle

Barbara Hannigan
Soprano

Apesar do calor, Porto Alegre é uma festa (noite do dia 7, noite do dia 9)

Apesar do calor, Porto Alegre é uma festa (noite do dia 7, noite do dia 9)

Dia 7 era a noite de aniversário do Philip Gastal Mayer. As mulheres sempre demoram um pouquinho mais para sair.

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Mas o resultado vale a pena, claro.

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Infelizmente, não temos registros humanos do festim, pois o “fotógrafo” Augusto Maurer parecia mais apaixonado pelos assados preparados pelo Philip.

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Veganos e vegetarianos, voltem suas faces puras para o lado ou cliquem “Page Down”. Provei e comprovei. Espetaculares.

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Não pensem que sobrou.

Bérbara
Minha filha Bárbara e Elena Romanov

E ontem, no Comitê latino-americano, foi a festa de 23 anos de meu filho Bernardo.

Natália Karam, namorado do Bernardo, o próprio e minha filha.
Natália Karam, namorada do Bernardo, o próprio e Bárbara.

Como é bonita a juventude, né?

Elena e eu, fazendo palhaçada.
Eu, fazendo palhaçada, e Elena.

Um pouco mais velhos ma non tanto…

Um olha pro outro
Com Iuri Müller, Camila Costa Silva e André da Rocha.

Acima, eu contava um causo. Um olha pro outro. Eu olho o vazio.

Sim, eu disse uma besteira qualquer.
Os mesmos.

Fim de causo. E sábado tem mais festa. Haja disposição pra trabalhar!

Sim, orgulho: meus filhos na Marcha das Vadias

Também é uma festa, também é uma piada, mas as piadas e as brincadeiras podem envolver fatos muito sérios. Uma explicação para marcianos — pois notei, através de sites, que há muitos recém chegados daquela planeta: a Marcha das Vadias (em inglês SlutWalk) é um movimento que surgiu a partir de um protesto realizado no dia 3 de abril de 2011 em Toronto, no Canadá, quando um delegado culpou uma mulher por ter sofrido abuso… Afinal, ela estava vestida de forma provocante… Desde então esta Marcha se internacionalizou como um protesto contra a crença de que as mulheres que são vítimas de estupro porque “pedem” para ser estupradas com base em sua forma de vestir. Durante a marcha, algumas mulheres usam roupas cotidianas, mas a maioria vão seminuas com roupas transparentes, lingerie, saias, salto alto ou apenas sutiã. Em Porto Alegre, a Marcha teve também presença masculina. Em solidariedade a elas, eles vestiram saias ou outros itens do “provocante” vestuário feminino.

A Marcha das Vadias é um movimento indiscutível, cheio de razões de ser. Meus filhos Bárbara e Bernardo participaram da Marcha. Ele é fotógrafo, mas como aparece em duas, acho que a única de sua autoria é a da Bárbara, as outras devem ser da Natália Karam e da Bárbara Ribeiro, quando ausentes das fotos.

Bárbara já esta paramentada, o Bernardo ainda não tinha encontrado a Natália, da qual receberia a saia para participar.
Bárbara já esta paramentada, para o Bernardo só faltava desamarrar a saia que recebera da Natália.

Mais fotos:

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Bárbara, 18 anos, hoje

Pois então minha filha está completando 18 anos hoje. De forma muito carinhosa, guardo comigo a parte de sua biografia que ela não conhece e que se torna cada vez menor em proporção à parte que eu não conheço. Interessante, nunca tinha pensado nisso. Mas, enfim, a gente faz os filhos para o mundo.

Organizamos uma festa surpresa no último sábado. Tudo foi antecipado. Conseguimos evitar dar-lhe o presente antes da data, apesar de que ele só poderá ser fruído muito depois, no final de janeiro.

Nada sei dessas coisas de datas, mas suponho que o 25 de setembro seja um dia de gente muito apaixonada, tímida, realista e… cabeça-dura, posso afirmar com certeza. Basta dizer que ela tem como companheiros de natalício as figuras de Dmitri Shostakovitch e William Faulkner. Só acho que ela não é tão propensa à melancolia como os citados, apesar de, como eles, amar uma boa desconstrução.

Feliz aniversário, Babi. É o que deseja teu pai, hoje todo atrapalhado pelos compromissos.

Festa pra mim?

Festim Diabólico CCXIV

(Por isso é que mantenho a categoria “Amigos, tudo”).

Acho que ainda não chegamos à edição de nº 214, mas certamente já passamos fácil das 50 edições. Os Festins Diabólicos são as festas aqui de casa, sempre com 20 pessoas para fora. Sábado, foram 36. O motivo do nome do encontro é o filme de Hitchcock, que tinha um baú no meio da sala. Já sabem o que temos no meio da nossa, mas sem um morto dentro, se lembro bem. Ultimamente, após o jantar, quase sempre alguém senta em nosso combalido piano ou pega seu instrumento e a música acontece. São amigos, músicos profissionais, que tocam aqui em casa por pura amizade. Poderiam deixar seus instrumentos e partituras em casa. Poderiam dizer que não estavam a fim, poderiam alegar uma tendinite ou simular um desmaio, qualquer coisa que todo mundo compreenderia, mas não, eles tocam pra nós.

No grupo, há o núcleo duro, os que sempre são convidados. Dentre eles, há gente como a Nikelen e o Guto que viajam incondicionalmente por quatro horas com um filho pequeno e o deixa com a avó num hotel. E viajam mais quatro horas de volta, tudo por quatro horas de festa. É maravilhoso isso. Lamentavelmente, alguns dos habituais participantes acabaram ficando de fora no último sábado porque a casa poderia explodir de tanta gente. Fazer o quê? Bem, os dois últimos Festins foram muito particulares, mas o de ontem foi invulgar para mim. Era meu aniversário e houve algumas manifestações que realmente me tocaram.

A Claudia, minha mulher, sempre faz a comida e a bebida é trazida pelos comensais. A “chef” que fica mais próxima dela é a Astrid. Pois ontem ela veio com um exército de canapés. Dizendo assim, parece pouco. Parece até que ela comprou ali na esquina. Nada disso, ela, que está super estressada com uma série de coisas, fez um por um para quase quarenta pessoas. E eram ab-so-lu-ta-men-te geniais. Assim como os músicos que tocam aqui expressam seu carinho através de seu trabalho, há pessoas que o fazem através da comida. É o caso da Claudia e da Astrid. Agora cheguei a um impasse em meu texto porque sou bom para comer mas péssimo para descrever comida. Talvez consiga algumas fotos depois… Para que meus sete leitores tenham uma ideia, no dia seguinte, domingo, quando acordou, o meu concunhado Bruno ligou aqui pra casa perguntando se tinha sobrado canapés. Das centenas, tinha sobrado um (1) e a primeira coisa que fiz ao acordar foi zerar a conta. Peço desculpas a ele.

A música. Deve ter sido ideia da Elena Romanov. De repente, logo após o jantar, ela, que é violinista e seu marido, o violista Vladimir Romanov, prepararam as estantes. Até aí, tudo normal. O pianista Alexandre Constantino estava sentado ao meu lado com uma partitura e me informou vou tocar com eles e eu disse que estava ótimo, ora. Tudo normal. Então, o Alexandre juntou-se ao casal e eles começaram o Andante da Sinfonia Concertante para Violino, Viola e Orquestra de Mozart. A Elena sabe de amor que tenho por esta música, protagonista de minha novelinha O Violista. Foi a coisa mais linda e só pensei que aquilo era endereçado a mim quando estavam terminando. Queria até que repetissem… Eles tocaram uma redução onde o acompanhamento é feito pelo piano. Abaixo, o original.

Tchê, foi lindo. Depois o professor doutor Luís Augusto Farinatti, o Guto, fez mais um de seus tradicionais e irresistíveis stand-ups. A Carmen Crochemore me disse hoje que nunca tinha rido tanto. O curioso é que o Farinatti acha que a gente se incomoda com as repetições. Negativo, rapaz.

E depois para terminar. O Marcelo Delacroix deu um show completo aqui em casa com mais dois músicos seus amigos — o Rodrigo Calveyra e Manuel de Olaso. Confesso que tinha pedido pra ele como presente. A afinação, seu bom gosto e senso de estilo são um verdadeiro absurdo e às vezes tenho que olhar para a sala refletindo que recebi tudo o que ele desempenhou de presente, somado ao Farinatti, ao Mozart do trio e à gastronomia da Astrid e da Claudia. É óbvio que nenhum dos não citados deixam de ser extraordinários; todos são inquilinos de meu ventrículo esquerdo — que é onde o coração bate mais forte (minha irmã me ensinou) — , só que a amizade + a música ou o riso ou a gastronomia tornam tudo mais memorável, não? Ou, melhor dizendo, a amizade mais a arte acaba sendo superior, o que não significa que esta não esteja assentada naquela. Bem, ao menos aqui em casa, sempre está.

A seguir, fotos. Não sei se todos estão nelas, não contei.

Vladimir Romanov e Lia Zanini aguardando o vinho que o Augusto Maurer abre lá atrás.
Astrid Müller e Rovena Marshall: brinde e risadas para alguém fora do quadro.
Augusto Maurer e Marcelo Delacroix em primeira leitura do primeiro.
Meus filhos Bárbara e Bernardo estremecendo a foto.
Os mesmos da foto acima, mas agora absolutamente enfeitiçados pelo Farinatti. Olhem as caras.
Batatas.
Gente falando bobagem, gente ouvindo bobagem. Eu, Dario Bestetti e Luís Augusto Farinatti.
Cadê?
Antônio Castro num impasse: como pegar o garfo? Carmen Crochemore o orienta.
Igor fica aliviado quando Castro logra libertar as mãos. Com Igor Natusch, Bruno Zortea, Nikelen Witter, Farinatti, Carmen, eu e as mãos.
Mãos muito, extremamente bobas. Com Anderson Larentis, Rachel Duarte e Igor.
Claudia Guglieri ensina Vladimir como se bebe o suco.
Credo, como esse cara come (e mente). Nikelen e Farinatti.
Magro de ruim.
Grande momento. Marcelo Delacroix solo.
Uma toca violino, todos tocam piano. Com Elena Romanov, Alexandre Constantino e Liana Bozzetto.
Preparação para o Andante. Com Elena e Vladimir. Adorei.
Credo, se tu soubesses como eu te odeio, Chico Marshall! Com Farinatti , o odioso e Nikelen.
E o impossível acontece. Farinatti para de movimentar os braços.
Sei lá, acho que alguém já bebera um ribeiro de vinho. Com Chico e Astrid.
Aspecto singular da sala dos Antonini Ribeiro.
Todos ouvindo Elena, Vladimir e Alexandre. Em primeiro plano eu a Claudia.
Ah, não. Me sujei de novo! Com Rovena Marshall.
O pé da Bárbara, meu cunhado Sylvio e minha irmã Iracema. Ao fundo, no espelho, o casal Rovena e Chico.
Alexandre, o Cavaleiro das Trevas.
Tão bonita, só que ninguém queria fotografar a Bianca! Lá à direita. Com Claudia Antonini e Bruno.
Apagando a (1) velinha com la Guglieri.

Obs.: Fotos de Liana Bozzetto, Lia Zanini e Augusto Maurer.

Volver a los 17

Hoje nasceram muitas pessoas e coisas sensacionais. Nasceram meus amados Dmitri Shostakovich, Glenn Gould e Jean-Philippe Rameau, além da Casa de Cultura Mario Quintana e até Catherine Zeta-Jones. E, em 1994, num domingo como hoje, às 19h35, nasceu minha filha. É uma data muito bem frequentada.

Como era
E a débil de hoje, numa festa da escola

Grandiosa obra de arte posta à venda

Em tempos de Bienal do Mercosul, minha filha Bárbara, de 16 anos e que prestará (prestará?) vestibular para História em janeiro, experimentou uma súbita criatividade durante o almoço e criou a peça-instalação Capitalismo Selvagem. Pelo custo de R$ 5.000, damos uma mesa pequena de fórmica, uma toalhinha branca e bela peça abaixo, cunhada por ela. Tudo acompanhado por uma plaquinha

Capitalismo Selvagem

Bárbara Ribeiro

(2011)

Ideal para sua sala. A peça é única e exclusiva. 5 pilas, OK?

Capitalismo Selvagem, obra de Bárbara Ribeiro (peça única, irrepetível, exclusiva)

Aniversário em 25 fotos

Reunir um grupo de amigos como o que reunimos lá em casa no último sábado é motivo de orgulho para este que vos escreve. O pretexto, meu aniversário, era francamente secundário; os amigos que foram à festa, não. Foi uma bela noite com boa comida e pessoas que se conheciam ou que se conheceram e se entrosaram. Éramos quase 40 e fiquei com vontade de convidar mais outro tanto. Selecionei algumas fotos abaixo, mas há gente que some delas. fazer o quê? Muito obrigado pela presença de todos! Foi uma baita festa.

Começamos por uma geral. À esquerda, sentada, a única foto em que aparece Rachel Duarte e, no primeiro plano, Benedito Tadeu César e minha irmã Iracema Gonçalves. Atrás, iluminado por uma aura como se fosse uma espécie de santo agnóstico, Ricardo Branco conversa com Alejandro Borche Casalas. Ao lado, Helen Osório de papo com Jussara Musse.
Claudia explica alguma coisa a Vladimir Romanov. Igor Natusch (esquerda) faz o mesmo, assim como o Felipe Prestes (meia esquerda). Eu (direita) confiro o placar de Brasil x Portugal.
Eu faço o que sei fazer e, em sentido anti-horário, temos Alejandro, Elena Romavov, Rovena Gobbato Marshall, Vladimir Romanov, Francisco Marshall, Jussara e o  Branco.
Animação contagiante: Igor, Prestes, Gabriela Bordini, Adroaldo Mesquita da Costa e Benedito: todos olhando a repetição do segundo gol de Portugal. Depois, ao ouvir o início de Abbey Road em vinil, Igor disse: “Ouvir um som de baixo vindo de um bom disco de vinil me dá vontade de chorar. É lindo.”
Meus filhos Bernardo e Bárbara, esta em momento garçonete. À direita, meu cunhado Sylvio Gonçalves.
Sylvio faz alongamento ao lado de Gabriela, enquanto Claudia traz os doces sob o olhar faminto de Marshall.
Claudia, Augusto Maurer e Vladimir fofocam. Eu explico ao Marshall o funcionamento de nossa mesa. Adoro explicar isso.
Iracema dá uma gaitada de galpão reagindo a algum absurdo dito pelo Augusto.
Elena Romanov troca o violino pelas batatas. Depois até tocou um pouquinho de piano.
Laura Luz e Filipe Gonçalves fazem tudo rapidamente para não perderem a festa do Guilherme Carravetta.
Da série “Paixão de Casais com Menos de 5 anos”: Astrid Müller e Augusto.
Adroaldo, Benedito e eu observamos alguma coisa sob os olhares desatantos de Bergman, Antonioni e Fellini na parede.
Mais um para a série: Dario Bestetti e Cláudia Guglieri.
Mais um: Bruno Zortea e Bianca Antonini casarão em outubro. Fui escalado para padrinho. Gostaria de saber qual é minha função.
Come, Astrid, come.
Bebe, Dario.
Vladimir mostra seu sorriso “Daniel Craig” ao lado do Alejandro.
Arthur Maurer faz cara de doido varrido antes de atacar um prato preparado especialmente. Conversa entre ele e a Bárbara:  “Tu gosta do teu pai?”, “Claro, gosto.” “É, não tem como não gostar dele”. Pô, obrigado, Arthur!
Augusto com seu filho Pedro Maurer. Quem ficou brincando come atrasado.
Rovena e Claudia na hora do chá. Claudia já estava altamente alcoolizada, mas mantinha a dignidade.
Bernardo acerta as pontas com Lia Zanini (autora da maioria das fotos) antes de “chupar” do narguilé.
O último da série “Paixão”: Marcelo Delacroix (Cury) e Lia fotografam-se no espelho, tendo como ornamento uma fogueira de Jussara.
Mais um casal, desta vez mais velho, de irmãos.
Marshall exercita ritual pagão em Vladimir Romanov. Aliás, frase dita pelo Vladimir: “Podem nos convidar sempre para vir aqui. A gente vem”.
O trio russo conta para Rovena como funcionava o Gulag. Ah, as fotos que são não da Lia, são da Elena.

Beethoven – Quarteto de Cordas, Op. 132 – 3º movimento (e o inevitável 5º de minhas lembranças)

É sempre difícil escrever sobre uma música que amamos muito e que nos faz lembrar fatos pessoais. A primeira coisa que me vem à mente quando penso no Opus 132 foi aquele momento mágico em que eu, sentado na pior sala de meu passado, ouvi iniciar o Allegro Appassionato (último movimento do quarteto) e vislumbrei que, logo aos primeiros compassos, minha filha, aos cinco anos de idade, entrava girando na sala, improvisando uma valsa que dançava sozinha, de olhos fechados, por puro prazer de ouvir a música… Foi tão marcante que hoje soa-me hipócrita dizer que o movimento principal deste quarteto é o imenso Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der lydischen Tonart, um agradecimento à divindade pela recuperação que Beethoven obteve após grave enfermidade. Mas é, claro que é. O terceiro movimento, com suas duas explosões de alívio é o centro e razão de ser desta grande e fundamental obra.

Quando os últimos quartetos foram apresentados pela primeira vez, não foram bem recebidos pelo público. Ao receber a notícia, Beethoven deu a célebre resposta:

– Gostarão mais tarde.

Como ele sabia que estava escrevendo para o futuro é algo que consigo mais ou menos entender observando a evolução de sua música. Outro fato que chama a atenção é que, estética e conceitualmente, estes quartetos parecem projetar-se na evolução da história da música para colocarem-se quase 100 anos sua época, talvez logo antes dos grandes quartetos de Schoenberg e Bartók. É um mundo à parte. ISTO é Beethoven, e não seus concertos ou sonatinhas iniciais. Ela refere-se aos últimos quartetos, às últimas sonatas para piano, às Diabeli e certamente à Nona Sinfonia. O restante seria grandioso, mas menos pessoal e significativo. Lembro que quando era adolescente, nós tínhamos que nos aproximar destes quartetos respeitosamente e o Dr. Herbert Caro dizia que talvez fosse necessária maior maturidade para que um jovem pudesse entendê-los. Discordo postumamente do grande Dr. Caro, meu amigo e tradutor de Doutor Fausto, da Montanha Mágica, de Auto-de-Fé e outras tantas obras-primas; acho que sempre ouvi o Op.132 e 130 (o último acompanhado de sua Grande Fuga) da mesma forma e o respeito que sempre tive por estes quartetos emanava deles e não de minha atitude. O fato é que o Op. 132 é uma música que passou a fazer parte de mim muito cedo. Eu, um adolescente na casa de meus pais, costumava ficar deitado, antes de dormir, tentando reproduzir nota a nota o terceiro movimento. Cronometrava para ver se chegava perto de seus 15 minutos… Às vezes, pensava conseguir reproduzi-lo por inteiro. Mas nunca ninguém pode comprovar, nem eu.

Dizer mais o quê?

E, aqui, o movimento que minha filha Bárbara dançou por puro prazer numa noite fantasmagórica:

Sugestões de leitura para uma manhã pré-feriadão

Muito boas as leituras matinais do pré-feriado. Sugiro que meus sete queridos e fieis leitores comecem por Roberto Carlos não morreu (ele não morreu assado como uma galinha na estrada de Santos). Depois podem visitar Um mundo carente de terapia. Os que gostarem de futebol, pode ler minha crônica para Inter x Emelec — que incluo nas “boas leituras” apenas para me unir aos dois primeiros. Se quiser enojar-se vá ao amigo Mário Marcos e, se quiser rir, informe-se sobre como o Rio Grande do Sul se protegerá dos termos estrangeiros.

No mais, devo passar o feriado em Porto Alegre pondo alguma coisa em dia. Pois, apesar de curta, êta semaninha de merda que foi essa!

Consolo? Ah, esta foto de puro deboche pascoal que minha filha tirou no colégio:

Garanto que exportei para a Bárbara grande parte do meu espírito zombeteiro. E sou vítima dele, não pensem que não.

A sósia da Bárbara

Ela se chama Tal Wilkenfeld, nasceu em Sydney, em 1986, é uma virtuose do baixo e é a cara da minha filha Bárbara, de 15 anos. Quinta-feira, seu irmão Bernardo entrou aqui em casa e disse que tinha que me mostrar um vídeo. Fiquei besta. Parecia a irmã dele. Deixo com vocês dois vídeos da moça, sempre muito bem acompanhada por Jeff Beck. O primeiro vídeo começa com o célebre tema Good-bye Pork Pie Hat, visceral homenagem de Charlie Mingus à Lester Young, e depois envereda para Brush With The Blues. O segundo é uma brincadeira entre Wilkenfeld e Beck, que tocam o mesmo baixo ao mesmo tempo. E, finalizando, duas fotinhos da minha Babi. Esclarecimento importante: ela é quem aparece do lado direito…

Fotos: Bernardo Ribeiro

25 de setembro de 1994, 19h40, Bárbara

Te vi poucos segundos depois de apareceres
a médica passou a toda velocidade, estava sorrindo
o teu grito era imenso, um bocão de 2,5 Kg
ela te limpava, dizendo nossa ela é forte
e aí te peguei, tu estavas toda rígida,
ainda berrando, embrulhada em panos,
quem eras?

Cuidei muito de ti, tu eras pequena
e me enxergavas imenso
o que sempre me diminuía;
te acostumaste com minha falta de jeito
sempre bem escondida
sob a torrencial chuva de bobagens
das quais sou refém

A infância foi uma infância
e tu nem lembras mais que me pedias, rindo sedutora
na porta da creche
pai, me entrega daquele jeito?
e eu te entregava na porta, segura por um pé, de ponta cabeça
dizendo pelo amor de deus
fiquem com esta porcaria

E aí houve a separação
e deixei tudo para o dado e para ti

mas querias vir
eu cá dizendo que deixara tudo para ti lá
tu dizendo não
e vieste para cá
para mim
para nós

Confesso sem vontade nenhuma de dizer, que tua decisão me (nos) assustou
imaginava anos de despojamento vendo de longe tua formação
quando pediste e pediste e pediste por meses para vir
e, bobo que sou, quando quis ajustar a vida cá
recuperando algo que deixará lá
vi só egoísmo, ódio e cus-
tas

Mas
como foi bom;
quando penso no futuro
quando estou infeliz de dar dó
ou alegre porque houve alguma coisa legal
e a vida voltou a ser uma aventura boa e estamos os
três rindo na cama ou na mesa, penso em ti e o resto vira
lenda e o medo da vida vira medo do dia em que tudo acabará
— pois acabará, querendo ou não —
e que seja numa noite após um desses dias em que mal nos suportamos,
de tão debilóides