No último sábado, fui assistir ao concerto inaugural da Casa da Música da Ospa. Fiquei muito impressionado com o belo resultado obtido em tão pouco tempo. O que nos salta aos olhos e aos ouvidos de cara: a sala é muito bonita, o local é adequado, as cadeiras e o colorido das madeiras lembram a Sala São Paulo e o teto baixo parece ter sido bem resolvido do ponto de vista acústico. Talvez apenas os instrumentos de madeira tenham sofrido um pouco com a cortina de cordas logo à frente.
É claro que era uma noite especial, nervosa e muito emocionante. Afinal, após várias décadas difíceis de nomadismo, a orquestra finalmente teria uma sede própria. A sequência de discursos e leituras foi massacrante — duraram mais de uma hora –, houve muito estresse nos últimos dias e horas a fim de finalizar a obra, chovia forte lá fora, o público de Marchezan City chegava lentamente, tudo atrasou, a orquestra esfriou e o concerto não foi lá essas coisas, mas jamais deixaria de dar todos os descontos citados.
Foto: Maí Yandara / Ospa
Imaginem que não havia ingressos disponíveis, só que a chuva era tal que muita gente optou por permanecer em casa. Creio que a lotação não ultrapassou os 80% da capacidade do teatro de 1100 pessoas. Soube que o segundo concerto (o de domingo) teve resultado artístico muito melhor, além de um público mais entusiasmado e afeito à música, diferente das autoridades, jornalistas e penetras indiferentes de sábado.
O programa não era do meu agrado, apesar de coerente. Uma obra de Arthur Barbosa, Mba’epu Porã, cujo tema era a formação musical do sul da América, a ultra norte-americana Rhapsody in Blue, de George Gershwincom o excelente pianista Cristian Budu, e a Sinfonia Nº 9, Novo Mundo de Dvořák, mistura de música checa com uma tentativa de fazer música norte-americana em 1893. Ou seja, não era uma coisa de louco, mas tem gente que ama este repertório.
Foto: Maí Yandara / Ospa
Só que ontem nada disso interessava. Afinal, estávamos dentro de uma raríssima construção de nosso estado feita exclusivamente para a cultura. Há quantos anos não se fazia uma obra dessas para o setor patinho feio do Estado? Além da sala de concertos, haverá camarins, café, salas de estudos, saguão, entre outros espaços. Tudo para a música. É claro que faltam ainda algumas coisas, porém a sala já é superior a tudo o que há disponível para a orquestra em Porto Alegre. E para o público também.
A Ospa, o diretor artístico (e herói) Evandro Matté — principal líder desta odisseia –, o superintendente da Ospa Rogério Beidacki e o engenheiro acústico Marcos Abreu estão de merecidíssimos parabéns. Nós também.
A construção, que é a primeira Sala Sinfônica de Porto Alegre, produzirá muita felicidade. A Casa está de pé e será um dos principais pontos de cultura de nosso combalido Rio Grande.
No último sábado, vimos a barbárie dar um passo atrás.
As cadeiras | Foto: Augusto MaurerO teto | Foto: Augusto Maurer
Evandro Matté já era o Diretor Artístico da Orquestra Unisinos Anchieta quando assumiu a mesma função na Ospa. Chegou ao novo cargo no início do governo Sartori e é uma exceção no enorme leque de críticas que o governo recebe, principalmente em Porto Alegre.
A entrevista sobre o novo momento que vive a Ospa foi feita no último sábado no Agridoce Café. Acreditamos que o caráter da conversa — muito informativa — foi descansado, ainda mais se considerarmos a folga que tivemos do calor.
Os assuntos foram muitos. Afinal, após mais de uma década, a Ospa voltará a ter um mesmo local para ensaios e concertos, o Conservatório Pablo Komlós irá para o Palacinho e será ampliado, a orquestra voltará a excursionar, novos músicos foram nomeados em troca do enxugamento do setor administrativo, o tradicional dia de concertos será mudado, entrando num padrão que é internacional, etc. Ou seja, assunto não faltou.
Em apoio, contamos não somente com os cafés e o tiramisù do Agridoce, mas também com as excelentes fotos de Guilherme Santos. Ao final de entrevista, notei que tanto Evandro quando Guilherme têm seus instrumentos de trabalho tatuados no antebraço direito.
Impossível não notar uma tatuagem no braço de um descendente de italianos que usa muito as mãos para falar e ainda é regente de orquestra, imaginem. Mas vamos à entrevista:
O antebraço direito do diretor artistico e regente titular da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, Evandro Matté. Foto: Guilherme Santos/Sul21
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Guia21 — Mesmo com a crise financeira, com o Governo do Estado cortando tudo, com a Cultura eternamente na linha de frente para os cortes, a Ospa conseguiu um bom ano, com crescimento, planos de nova sede, nomeações, etc. Qual é o segredo?
Evandro — Esses 27 anos que estou na Ospa foram uma grande escola. Além de trompetista e regente, fui presidente da Associação de Músicos da orquestra. Sei como se sentem os músicos. Sei que quem administra não deve ficar apenas focado na programação, mas também na estrutura da Fundação. Houve períodos em que nos tocávamos em cadeiras de plástico amarelas, as estantes eram complicadas de usar, eram totalmente inadequadas. Então, se algum dia eu assumisse a Ospa — algo para o qual me preparei –, eu queria não somente olhar a parte artística, mas também a estrutural. Quando fui convidado pelo secretário Victor Hugo, em razão do trabalho que eu fazia com a Unisinos e nos Festivais do Sesc, elaborei uma série de metas ou objetivos. Minha lista de prioridades está quase toda cumprida. A ideia prioritária era de resolver as questões estruturais que atrapalhavam a orquestra para que a Ospa pudesse dar um salto. Precisávamos de estabilidade no trabalho e no fluxo financeiro, apesar da crise. No último quesito, usamos nossa rede de relacionamentos, mas não podemos jamais reclamar do governo, que nos apoiou inclusive com suplementação orçamentária em alguns momentos.
Guia21 — Conta um pouco da tua vida como músico antes de chegar ao cargo de Diretor Artístico da Ospa?
Evandro — É uma longa história. Eu conheço muito bem a instituição. Na verdade, se somar tudo, minha história na Ospa tem 30 anos. Eu tenho 47. Fui assistir pela primeira vez a uma orquestra sinfônica em Gramado quando tinha 13 anos. A banda marcial onde eu tocava foi a um concerto em Gramado e, para minha sorte, a Ospa ia tocar a 9ª Sinfonia de Beethoven regida por Eleazar de Carvalho. Foi a primeira vez que estive frente a frente com uma orquestra. Eu sou filho de um mecânico e de uma dona de casa e a cultura não era algo muito presente dentro de casa. Aquilo me impressionou muito. Ao final do concerto, subi no palco e perguntei para os trompetistas como se fazia para entrar na Ospa… Eu tocava desde os 7. Eles riram, mas ficou aquele desejo. Aos 17 anos, eu vim para Porto Alegre. Trabalhava no Banco do Brasil como boy (menor auxiliar). Para enganar a família, fiz vestibular para Engenharia Civil. E, no mesmo ano, na verdade no mesmo dia em que entrei na Engenharia — acabei fazendo todas as cadeiras do curso, faltou só o estágio — entrei também na Escola de Música da Ospa. E, quando terminei a Engenharia, passei no Concurso da Ospa como trompetista. Então desisti do estágio e do título de engenheiro para ser músico. Quando comecei na Ospa, fiz vestibular para Música na Ufrgs, me formei aqui e fora, segui toda a carreira de trompetista. Então eu estou vinculado a Ospa faz 30 anos, 27 como músico da orquestra. Eu vivenciei períodos muito difíceis, quando todos reclamavam de uma orquestra que, na verdade, não tinha as mínimas condições de trabalho e pouco respaldo. Passamos por diversos governos e diretores artísticos, alguns muito bons.
Evandro Matté: “Ficamos sem empresas para fazer as obras. Teríamos que fazer novas licitações e isso demora”. | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Guia21 — Neste semestre deve ser inaugurada a Casa da Música da Ospa, como estão as obras e de onde surgiu este nome?
Evandro — Devido a vários problemas, a construção da Sala Sinfônica da Ospa foi suspensa e substituída pela Casa da Música. Hoje, é onde ensaiamos. Nós mudamos o nome para não haver confusão entre o plano antigo e o novo. O nome foi inspirado pela magnífica Casa da Música na Cidade do Porto (Portugal). Nossa sala de ensaios irá se transformar numa sala sinfônica e em outras coisas que falarei a seguir. Por vários motivos, eu defendia esse espaço para a Ospa há 15 anos. É um espaço que está dentro do complexo administrativo do Governo do Estado, era um local que já estava semi-pronto, pois, no plano diretor, era para ser um Centro de Convenções com um Teatro. A Secretaria de Educação ocupava o espaço que deveria ser o Centro de Convenções e a estrutura do Teatro estava fechada com tapumes há 48 anos… Imagina que ele tem um ângulo de plateia, que cabem 1100 pessoas, que tem um estacionamento embaixo para 300 vagas e mais 1000 fora. Então, como o projeto anterior foi ficando cada vez mais inviável em razão de questões financeiras e burocráticas, além do fato de que, das duas empresas que venceram a licitação, uma não era séria e a outra quebrou… Ficamos sem empresas para fazer as obras. Teríamos que fazer novas licitações e isso demora. Além do mais, precisaríamos buscar um dinheiro do governo federal que, sabemos, dificilmente seria liberado com agilidade. Mas o mais importante é o seguinte. Qual seria o custo de manutenção do novo espaço? Seria absurdo. Para nós mantermos o novo prédio, seríamos obrigados a baixar o nível artístico para pagar contas de manutenção, o que já ocorrera no passado com antigo teatro Leopoldina. Então chegamos ao projeto no Caff (Centro Administrativo Fernando Ferrari).
Guia21 — O que é este projeto?
Evandro — Uma Sala de Concertos para 1100 lugares, com mezaninos, saguão e memorial com fotos de todos os músicos e regentes da orquestra desde a fundação, mais bilheteria, chapelaria, depósito, arquivo de partituras — pela primeira vez teremos isso em nosso local de ensaio –, salas de estudo, camarins, cafeteria, restaurante e sala híbrida para recitais e eventos. Nesta sala, pensamos em fazer um programa chamado Minha Primeira Vez, destinado a quem nunca foi a um concerto, para aprender noções. Isso gera uma vinculação, é o que desejamos. Temos uma LIC aprovada e as empresas estão vindo. Talvez a gente não consiga deixar a sala disponível para o dia 10 de março, que era a nossa intenção. Mas esperamos abri-la no final de março.
Evandro Matté: “Luz, IPTU, segurança, tudo está dentro do complexo do Centro Administrativo”. | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Guia21 — Quais serão as vantagens do novo espaço?
Evandro — Primeiramente, os 1100 lugares, que é um número muito bom para a Ospa e Porto Alegre. Já falei no arquivo de partituras. Também há o ponto, a localização é ótima e nós vamos ter um custeio muito baixo. Ou seja, o novo espaço só vai nos gerar receitas. Luz, IPTU, segurança, tudo está dentro do complexo do Centro Administrativo. E a Ospa ainda poderá explorar o estacionamento coberto, bar e restaurante. Vamos poder locar a Sala quando a Ospa não a estiver utilizando. Ou seja, será um grande salto para a orquestra. Mas o mais importante mesmo é o salto artístico. Depois de muitos anos, vamos ensaiar no local do concerto.
Guia21 — E a acústica da Sala?
Evandro — Neste primeiro momento, estamos apenas ensaiando lá. Somos bastante conscientes dos atuais problemas de acústica, mas eles estão sendo sanados pelos especialistas que contratamos. Nós temos casos em Nova Iorque e Paris em que salas foram fechadas para acertos. Depois, houve a retomada. São muitas pequenas variáveis que influenciam. É claro que a aplicação dos conceitos básicos já deve melhorar muito nossa condição atual. Vamos chegar certamente a um ponto ótimo. Agora, estamos nos dedicando a reduzir a reverberação e seguir um processo de melhoria contínua.
Guia21 — Vocês têm um crowdfunding em andamento, não?
Evandro — Sim, mas isso é para pagamento de parte do projeto, não do projeto completo. Há um esforço para a venda de poltronas que receberão o nome de quem contribuiu. Temos uma LIC especial, porque é para patrimônio público, que dá 95% de abatimento. Estamos visitando empresas com excelente retorno. Isso visa a obra civil para finalizar a Sala de Concertos e o saguão, o que permitirá que a gente abra a Sala para o público. E a segunda etapa é o restante.
Guia21 — Há a ideia de endowment?
Evandro — Isso seria um sonho. Está na minha lista. É algo que nos daria sustentabilidade a longo prazo. Porém, no Brasil não há a tradição de retornar à sociedade aquilo que ela deu a alguém. Não há quase mecenato. É muito complicado, mas seria o ideal pela longevidade que daria à Fundação. O endowment é perfeito para uma fundação como a nossa porque o principal nunca pode ser mexido, apenas o rendimento. Mas o fundo demora a ser criado, ainda mais no Brasil. Imagina que Harvard tem um fundo de endowment de 4 bilhões de dólares. Eles mantém toda a pesquisa da Universidade só a partir destes rendimentos. Quem investe em um endowment tem a segurança de que o dinheiro doado não será “torrado”, mas dará frutos contínuos. Eu gostaria de criar o endowment da Ospa, mas hoje não há nem segurança jurídica para fazê-lo.
Evandro Matté: “Eu ganhei três jantares em apostas. Ninguém acreditava na possibilidade de haver nomeações. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Guia21 — Como fica o antigo projeto de Sala Sinfônica? Quais são os planos para ela? Ficará no papel?
Evandro — Aquele terreno é nosso e localiza-se em local nobre. Houve investimento em fundações e não podemos ignorar que 6 milhões de reais foram investidos ali. Nós vamos chamar um concurso pelo IAB para reestruturar o projeto, aproveitando o investimento feito nas fundações que lá estão. Nós vamos criar uma concha acústica no local. Eu não gosto deste termo, prefiro falar em Teatro Aberto. Ao lado deste teatro, haverá dois pequenos prédios: um para a Escola da Ospa — para aqueles que vão ter sua iniciação no instrumento, não falo do Conservatório — e outro para o Museu da Ospa. O primeiro seria um projeto social mesmo. O Teatro Aberto nos permitiria concertos de verão e locações para shows. Seria mais uma forma de receita.
Guia21 — Poderia nos falar sobre o milagre das nomeações?
Evandro — (risadas) Eu ganhei três jantares em apostas. Ninguém acreditava na possibilidade de haver nomeações. O que aconteceu foi que nós enxugamos num ponto para sobrar do outro. Nós tratamos de mostrar ao governo a importância da Fundação Ospa, tudo o que ela dá de retorno para a sociedade. Paralelamente, nós pegamos o quadro que foi criado em 2014 no governo Tarso pelo secretário Assis Brasil e pelo ex-Diretor Artístico Tiago Flores. Esse quadro trazia um setor administrativo muito grande. Havia mais cargos do que o necessário. Então, uma das contrapartidas que nós oferecemos foi uma redução da estrutura administrativa para priorizar a contratação de músicos. Isto gerou também uma redução na contratação de músicos extras. Além do mais, nós tivemos boas receitas durante este período. Acabamos conseguindo.
Guia21 — Quais são os ganhos sociais e culturais que a Ospa dá?
Evandro — Os ganhos são claros. Há o trabalho social feito pela Escola da Ospa. Nós ampliamos muito o número de alunos que na Escola não pagam pelo aprendizado. É um trabalho social onde os professores são os músicos da orquestra. Ampliamos as atividades do coro e da Ospa jovem. Houve também uma ampliação de público. Nós estamos com 30% a mais de público do que na gestão anterior. Criamos os concertos no Margs. Com a diversificação das séries de concertos, estamos em muitos locais. Temos os concertos no interior, no Araújo Vianna, na Ufrgs, nas igrejas, no Theatro São Pedro, etc. Isso nos deu um crescimento do público dos concertos. Temos também muita mídia. Hoje a Ospa aparece muito graças a vocês da imprensa. E há o reconhecimento da sociedade como um todo, porque aumentamos a captação em 400%.
Evandro Matté: “A gente ensaiava quinta, sexta e sábado pela manhã, parava no domingo, tínhamos mais ensaios na segunda e terça, dia também do concerto. Nunca vi outra orquestra que trabalhasse assim” | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Guia21 — A Ospa vai viajar bastante em 2018, não?
Evandro — Nem tanto. As idas ao interior permanecem na mesma base, mas é natural que, neste quarto ano de gestão, comemoremos o que se obteve. Vamos mostrar a Ospa que está em excelente nível artístico. Vamos a Campos do Jordão, à Sala São Paulo, ao Sodre em Montevidéu e ao CCK em Buenos Aires. Gravaremos também um CD em maio.
Guia21 — Outra mudança histórica, e esta envolve o público, é a mudança de horário e do dia dos concertos após 67 anos.
Evandro — Desde o tempo em que eu era músico, achava absurdo nosso esquema de ensaios com um fim de semana no meio. A gente ensaiava quinta, sexta e sábado pela manhã, parava no domingo, tínhamos mais ensaios na segunda e terça, dia também do concerto. Nunca vi outra orquestra que trabalhasse assim. Todas as orquestras fazem o trabalho dentro da semana, e apresentando o concerto no final da mesma. Outro problema são os regentes convidados. Quando eles são de determinado padrão, têm agendas mais lotadas, sempre com trabalhos de ensaio e apresentação dentro de uma única semana. É claro que, para vir à Ospa, eles tinham que reservar duas semanas. O padrão é a semana. Qualquer regente nos pergunta: “Qual é a semana?”. Outro fator é o público. Tenho feito levantamentos de como trabalham Osesp, OSB, Minas e orquestras do exterior que tenho regido ou não. As quintas-feiras têm o menor público, nas sextas já é maior e nos sábados lota. Não há sentido em manter os concertos às terças à noite. Pior: as pessoas de mais idade, com a violência e a insegurança, não vão aos concertos às 20h30 das terças. O horário de sábado, às 17h, permitirá que as pessoas saiam de casa mais tranquilas. Por exemplo, a série de música de câmara que eu criei no Margs — nos dois primeiros meses, o horário era o das 18h30 e o público era médio. Quando passamos para às 16h30, passou a lotar.
Guia21 — As atrações deste ano?
Evandro — Para confirmar, eu preciso ter a data em que inauguraremos a Casa da Música da Ospa. Mas traremos o balé do Colón de Buenos Aires, a ópera A Viúva Alegre e uma turma de regentes muito boa, como têm sido nos últimos anos.
Evandro Matté: “A gente tem que saber o que está fazendo na frente de orquestra porque senão os músicos te engolem…” | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Guia21 — Nós passamos por cima de outra novidade, a utilização do Palacinho pela Escola de Música da Ospa.
Evandro — Sim, é um local impressionante, muito bonito, de 2500 m². Lá há vitrais e escadarias belíssimas. Foi-nos cedido por 30 anos. Nesta primeira fase, começaremos com o mesmo nível de conforto da atual escola, mas com muito mais salas. Num segundo momento, já temos aprovada uma Lei Rouanet de restauro na casa de 4 milhões de reais. Ainda vamos tentar recuperar algo do valor que seria destinado para a Sala Sinfônica do Parque da Harmonia para o Palacinho. A outra parte seria para a Concha Acústica (Teatro Aberto). A mudança para o Palacinho está prevista para entre os meses de abril e maio. Passaremos de nossas atuais 7 salas de aula para 22 e levaremos a administração da Ospa junto para lá. Isso é mais economia, porque a administração na 24 de Outubro, zona nobre próxima ao Parcão, é muito onerosa. Só o condomínio já é absurdo. E vamos aumentar o número de instrutorias no Palacinho, claro.
Guia21 — Para finalizar. Sei que tu também administras a Orquestra da Unisinos, os Festivais do Sesc e os concertos Zaffari. Como é que tu consegues fazer tudo isso? Como convivem o gestor, o regente e o trompetista?
Evandro — O trompetista está parado, mas pode ter que voltar. O cargo que ocupo é de confiança e as administrações mudam. Hoje eu toco muito pouco. Quanto às outras atividades, posso dizer que sempre fui acostumado a trabalhar muito. Deve ter vindo no DNA, porque meu pai é também assim. Durmo pouco e trabalho muito. Minha vida sempre tem três turnos, mas o terceiro eu considero prazer. Corro e resolvo coisas durante o dia e, no terceiro turno, à noite, estudo. A gente tem que saber o que está fazendo na frente de orquestra porque senão os músicos te engolem… (risadas). Mas, na verdade, eu tenho pouco lazer e preciso mudar isso em minha vida.
Gosto dos algarismos, porque não são de meias medidas nem de metáforas. Eles dizem as coisas pelo seu nome, às vezes um nome feio, mas não havendo outro, não o escolhem. São sinceros, francos, ingênuos. As letras fizeram-se para frases: o algarismo não tem frases, nem retórica.
Assim, por exemplo, um homem, o leitor ou eu, querendo falar do nosso país dirá:
– Quando uma constituição livre pôs nas mãos de um povo o seu destino, força é que este povo caminhe para o futuro com as bandeiras do progresso desfraldadas. A soberania nacional reside nas Câmaras; as Câmaras são a representação nacional. A opinião pública deste país é o magistrado último, o supremo tribunal dos homens e das coisas. Peço à nação que decida entre mim e o Sr. Fidélis Teles de Meireles Queles; ela possui nas mãos o direito a todos superior a todos os direitos.
A isto responderá o algarismo com a maior simplicidade:
– A nação não sabe ler. Há 30% dos indivíduos residentes neste país que podem ler; desses uns 9% não lêem letra de mão. 70% jazem em profunda ignorância. Não saber ler é ignorar o Sr. Meireles Queles: é não saber o que ele vale, o que ele pensa, o que ele quer; nem se realmente pode querer ou pensar. 70% dos cidadãos votam do mesmo modo que respiram: sem saber por que nem o quê. Votam como vão à festa da Penha, – por divertimento. A constituição é para eles uma coisa inteiramente desconhecida. Estão prontos para tudo: uma revolução ou um golpe de Estado.
Maurits Cornelis Escher (1898-1972)
Replico eu:
– Mas, Sr. Algarismo, creio que as instituições …
– As instituições existem, mas por e para 30% dos cidadãos. Proponho uma reforma no estilo político. Não se deve dizer: “consultar a nação, representantes da nação, os poderes da nação”; mas – “consultar os 30%, representantes dos 30%, poderes dos 30%”. A opinião pública é uma metáfora sem base: há só a opinião dos 30%. Um deputado que disser na Câmara: “Sr. Presidente, falo deste modo porque os 30% nos ouvem…” dirá uma coisa extremamente sensata.
E eu não sei que se possa dizer ao algarismo, se ele falar desse modo, porque nós não temos base segura para os nossos discursos, e ele tem o recenseamento.
Gustavo Melo Czekster é um homem que escreve. Passa seus dias escrevendo petições, recursos e ações e, ao chegar em casa, segue escrevendo contos, ensaios, romances. Como revelou aqui, escreve até dormindo. Teve que afastar o celular de si porque respondia dormindo às perguntas que lhe faziam nas redes sociais e, ao acordar, não lembrava de nada. Chegou a revisar textos dos quais não sabia uma palavra ao acordar.
Publicou dois livros de contos muito elogiados: O Homem Despedaçado, em 2011, e Não há amanhã, em março deste ano. Suas obras completas estão em computadores e em oito caixas de papelão que, segundo ele, estão cheias de insetos e ignomínias. Já prepara seu primeiro romance, que será sobre a grande violoncelista inglesa Jacqueline du Pré, cuja carreira foi tragicamente abreviada em razão da esclerose múltipla que a forçou deixar os palcos aos vinte e oito anos de idade.
Na entrevista que ele concedeu ao Guia21 no Bar Chopp Tuim, falou sobre seu segundo livro, sobre os dias que correm, a posição da literatura e da cultura no Brasil e sobre o pintou na conversa.
Gustavo Melo Czekster | Foto: Maia Rubim/Sul21
Guia21 — Comecemos pelo teu livro Não há amanhã. Há quanto tempo foi lançado e como tem sido a recepção?
Gustavo Melo Czekster — O livro foi lançado há seis meses e a recepção tem me surpreendido favoravelmente. As pessoas reclamam da fuga dos leitores, mas talvez o que esteja faltando seja escritores contando boas histórias. Tento fazer isso em meu livro. Também me surpreende a forma com que as pessoas têm interagido comigo. Muitos mandam mensagens com impressões e comentários. As redes sociais ajudam nisso, claro. Da minha perspectiva, a melhor parte de escrever é ver que nosso trabalho não é lido com indiferença. Vi exemplares do Não há amanhã bastante anotados. Claro que fiquei feliz.
Guia21 — Não há amanhã não é um livro fácil.
Gustavo Melo Czekster — Não, não é fácil e as pessoas parecem desafiadas a apresentarem interpretações para algumas das histórias. É muito interessante porque algumas vezes o que é comentado não passou pela minha cabeça, mas deve estar ali de alguma forma. Posso dizer que recebi leituras atentas.
Guia21 — São 30 contos no Não há amanhã. Apesar da variedade de temas há uma grande unidade. Como foi escrito?
Gustavo Melo Czekster — Quando eu planejei o livro, logo pensei: meu tema será o sentido. “O Homem Despedaçado” fora sobre a fragmentação humana — ou seja, sobre quantas pessoas existem dentro de nós mesmos — e agora meu tema será o sentido, que é um conceito com vários usos e significados. Aliás, o nome do livro era “O Sentido”. Quando fui pesquisar na filosofia, vi que o sentido é sempre associado a algo, o sentido da vida, da morte, etc. O único autor que chegou mais perto do sentido como conceito puro foi Camus em O Mito de Sísifo. É o homem em busca de sentido diante de um mundo ininteligível, sem Deus e eternidade. Ele fala sobre o absurdo de pensar que a vida teria um sentido e que a única decisão efetivamente livre seria a dar cabo da própria vida. Mas o nome do livro foi alterado porque vários colegas acharam o título ridículo. Me avacalharam. Disseram que parecia autoajuda e que não era marcante. Então, voltei para casa, folheei Camus e encontrei a frase que diz que “O absurdo me esclarece o seguinte ponto: não há amanhã.” E então escolhi Não há amanhã. Ficou meio Sidney Sheldon, “Se houvesse amanhã”.
“Outra coisa que tem prejudicado a produção atual é a autocensura. A originalidade da história entra pelo ralo porque o escritor tem medo do que o pai e a mãe vão pensar…” | Foto: Maia Rubim/Sul21
Guia21 — Gostei também de “O Sentido”, mas voltemos a um ponto inicial. Tu disseste que as pessoas têm lido Não há amanhã porque há poucas pessoas contando histórias.
Gustavo Melo Czekster — Sim, o que te leva a ler um livro de ficção? Ora, tu compra porque quer ler uma boa história. Afinal de contas, é isso que atrai na literatura em prosa desde que começamos a ler, só que hoje há uma curiosa massificação. Parece que os 6 ou 7 principais editores do país se reúnem periodicamente e decidem o que as leitores desejam ler. E então todos os livros saem mais ou menos iguais. Hoje, na minha opinião, a literatura mais excitante é aquela que está sendo publicada fora das grandes editoras. Porém, como as grandes se impõem junto ao público, as boas histórias, as coisas realmente diferentes, as coisas que prendem o leitor, estão fazendo falta. Há livros contemporâneos que a gente lê e depois pensa: o que eu acabei de ler? Que sentido tem isso? E o resultado é que a gente esquece logo. Quando alguém vai contar sobre o que leu, tem dificuldade para fazer um resumo em poucas frases… Normalmente as capas são maravilhosas, na maioria das vezes são livros bem escritos, mas que não nos dão a sensação de estarmos melhores ou piores com o livro, é puro entretenimento, falta interiorização. Alguns escritores querem o preto e o branco, certo e errado, sem ver que a realidade é nebulosa, que há uma zona cinza escura e outra cinza mais clara. Outra coisa que tem prejudicado a produção atual é a autocensura. A originalidade da história entra pelo ralo porque o escritor tem medo do que o pai e a mãe vão pensar, do que as feministas vão pensar, do que os deficientes e os políticos de todos os gêneros vão pensar. Isso é um crime contra a criatividade. Eu acho que temos que ser fiéis às nossas histórias mesmo que elas possam ofender alguém, mesmo que ninguém a leia. Acho que a voz autêntica é a única que pode devolver algo ao autor.
Guia21 — Falta sentido ou falta contar histórias?
Gustavo Melo Czekster — As duas coisas. Falta a sensação de imanência da arte. Por exemplo, Balzac nos envolve pela humanidade, sinceridade, pela história. Veja Anna Kariênina. Há uma certa perversidade na história que, bem, poderia acontecer conosco… O livro verbaliza coisas que talvez alguns de nós tenham vergonha de verbalizar. Eu poderia ser Kariênina em outras circunstâncias, em outro mundo. Hoje é difícil construir esta empatia com os personagens que são criados. Há uma postura blasé que diz que o autor não deve se envolver tanto com o personagem. Parece que os autores têm receio de mostrar muito de si em suas criações. Não há o pensamento de que o personagem é outra vida.
“Detetives, dragões e senhoras de 50 anos descobrindo o sexo…” | Foto: Maia Rubim/Sul21
Guia21 — E temos boa literatura sendo produzida?
Gustavo Melo Czekster — Certamente, mas como disse, a boa literatura está correndo por fora, à margem. Por exemplo, os romances que são premiados não refletem a diversidade e a qualidade da literatura atual. É curioso: os grandes editores querem romances, dando absoluta preferência aos de detetive, aos de dragões ou aos de senhoras de 50 anos que descobrem o sexo. Um editor me disse isso uma vez e eu brinquei com a ideia de escrever um romance com detetives, dragões e senhoras recém liberadas. Seria um arraso. (risadas)
Guia21 — Com todas esta limitações…
Gustavo Melo Czekster — Sim, o patrulhamento. O pior patrulhamento nem é o da sociedade, mas o que é autoimposto ou que tenta se agregar a modas. A história pede um personagem X, mas o escritor usa um transsexual porque quer ser atual. Há também uma coisa forçada que impede vilões negros ou vilãs, por exemplo. O autor receia críticas do tipo “Quem tu pensa que é para dizer isso?” Não há desligamento do autor destes arquétipos, ele os procura para ser melhor aceito. Li recentemente um livro onde havia um relacionamento de 5 páginas entre duas mulheres. Não há problema nisso, só que não se sabe porque chegamos ali nem porque foi abandonado subitamente. Ou seja, o escritor forçou a barra e a excrescência não contribuiu para o que interessa, que é contar uma história, que é o motivo pelo qual o leitor está na frente do livro.
Guia21 — Os escritores também têm medo de outras coisas, como de não serem chamados para eventos…
Gustavo Melo Czekster — Certa vez, contestei a forma de organização de um concurso. Vieram pessoas inbox me parabenizar pela coragem, mas dizendo que eu não esperasse ganhar prêmios… Bem, eu não escrevo pela possibilidade de prêmios. Até me sentiria tolhido se tivesse uma meta dessas. E, ademais, as pessoas simplesmente esquecem de quem ganhou. Tu lembra quem ganhou o Açorianos no ano passado?
“Eu não preciso me comportar, não preciso colocar a última e mais atual pregação ideológica na obra para vender — não que isso funcione… | Foto: Maia Rubim/Sul21
Guia21 — Não. Sei que eu ganhei em 2012 ou 13 um e ninguém sabe dele.
Gustavo Melo Czekster —(Risadas) Noto que pouca gente reclama, pouca gente protesta. Todos querem ser bonzinhos. Isso é muito de nossa época. Quase todos querem convites para feiras, para financiamento de livros, quase todos querem ver o governo comprando seus livros infantis, etc. E então o escritor não pode isso nem aquilo. Isto limita a literatura. Eu tenho a sorte de não viver da literatura. É uma sorte. Eu não preciso me comportar, não preciso colocar a última e mais atual pregação ideológica na obra para vender — não que isso funcione… Hoje, por exemplo, é muito difícil escolher um livro infantil. Dia desses fui dar um presente para uma criança e conferi o fato de que há muitos livros que, em resumo, eram a manipulação de uma história para agregar posicionamentos e não para contar uma história autêntica. Acabei nos clássicos.
Guia21 — Depois de Roald Dahl tem pouca coisa efetivamente interessante. Os personagens são ruins porque são ruins em razão de um trauma, coitados. Ninguém é ruim quis fazer uma maldade. Há medo da história?
Gustavo Melo Czekster — Sim, é como o cavalo que refuga um salto numa competição de hipismo. Muitas vezes estou lendo uma história e sinto que tal coisa vai acontecer. Então vem um balde de água fria. Há o medo de desagradar, o escritor passa a evitar sutilmente certas palavras. Já vi discussões de casal onde ambos evitavam palavras pesadas… Às vezes sabemos que o personagem deve se encaminhar para um destino, que aquilo vai acontecer, que ele vai descobrir algo, vai abrir uma porta, mas o autor segura e decide ficar no comando. Ele pensa “isso é muito sombrio para meu personagem”. O sistema de causa e efeito é quebrado. Voltemos à Anna Kariênina: se ela quisesse ser boazinha o livro não seria a obra-prima que é. Mas ela é apaixonante, vai se afundando e afundando. Imagina se Tolstói resolvesse que Anna voltasse atrás para ser uma boa mãe?
Guia21 — Por falar em censura e autocensura, o que tu achaste sobre o episódio do Queermuseu?
Gustavo Melo Czekster — Eu fui na exposição. Não tinha quase ninguém, nem seguranças em torno. Ela não me cativou nem escandalizou. Acho Caravaggio mais ousado. Também não encontrei pedofilia, nada. As pessoas veem o que querem ver. Eu não vou procurar obras de arte como comprovações de minhas teses. Quem viu escândalo estava procurando escândalo. Como é que as pessoas procuram isso? Por quê? O que eu vi foi uma desconstrução de várias imagens, mas jamais zoofilia, pedofilia, etc. Há duas semanas fui denunciado por pornografia pelo administrador de uma rede social porque postei uma pintura de Cézanne onde uma mulher amamentava seu filho. O outro seio aparecia nu. Ou seja, há o crescimento de um conservadorismo torto que é inclusive auxiliado pelas redes sociais. Nós já temos censura. E isso pode invadir a literatura. Por outro lado, chocar por chocar, escandalizar por escandalizar, envolvendo às vezes gratuitamente poder, sexo ou religião, é inútil. A arte tem que ter um objetivo. Por exemplo, Caravaggio usava prostitutas e mendigos para mostrar que aquilo existia. Acho que falta uma ideia além da provocação. Voltando à pergunta. acho que o Santander teve uma reação desproporcional e eu gostaria que os quadros fossem apresentados em outro espaços. Mas a mentalidade conservadora está se inserindo entre as pessoas mais jovens e vem subindo. A nova geração está chegando mais engessada, certinha, contida, sem ironia e isso gera conservadorismo.
“A nova geração está chegando mais engessada, certinha, contida, sem ironia…” | Foto: Maia Rubim/Sul21
Guia21 — Na época do lançamento de Tristram Shandy, os jovens eram mais conservadores que os velhos.
Gustavo Melo Czekster —Tristram Shandy é um livraço! Na época de Sterne, na Inglaterra, o mundo não estava, digamos, evoluindo. É o que ocorre também agora, estamos voltando no tempo. A pessoas estão usando palavras bélicas, ferozes, que buscam o confronto. São raros os ponderados, os que evitam as meras dualidades, buscando entender a complexidade do que acontece. Ninguém respeita professores, intelectuais, artistas, escritores, ninguém, é tudo no grito. O pessoal simplesmente não quer saber. Fico pasmo quando leio notícias de professores sendo agredidos — para mim, o professor não tem pele e osso para ser agredido.
Guia21 — Indo para o lado pessoal, qual é a tua formação?
Gustavo Melo Czekster — Eu sou advogado, mas meu mestrado foi em Letras, o que foi uma confusão porque existem termos comuns ao Direito e à área de Letras, com significados diferentes. Na época da dissertação, eu fiz uma lista de palavras que não poderia dizer de modo nenhum. Por exemplo, no Direito, a palavra “representação” tem um significado bem simples, porém, se eu utilizasse a palavra na área da Literatura, cairia num buraco negro teórico. No Direito, eu represento a parte X, eu a defendo, estou lado a lado, nas Letras eu substituo a parte. E, pior, desde Aristóteles se discute este segundo conceito de representação.
Guia21 — Tu dormes muito pouco, né?
Gustavo Melo Czekster — Eu tenho dificuldade crônica para dormir. Consigo descansar, repouso e passo bem o dia, mas acordo muito cedo. Às 3h30, 4h, eu já estou acordando. Vou ler, escrever, vejo filmes, às vezes quero sair, mas aí tenho receio não porque a noite está chegando, mas porque ela ainda não acabou. E devo ter um leve sonambulismo. Já respondi dormindo e por escrito coisas no celular. Ainda bem que com coerência e sentido. Hoje durmo com ele bem longe. Às vezes, as pessoas me agradeciam por respostas a coisas que não lembrava de ter lido e muito menos respondido. Era sempre um susto, mas vi que respondo educadamente, com sujeito, verbo e predicado. Parece até ser eu escrevendo… Provavelmente, ouço o sinal do celular e respondo dormindo. Tive que afastá-lo da cama. Esses dias cheguei a revisar um texto que me mandaram, dormindo. Bem, mas acordo muito cedo e às vezes vou para o Parque da Redenção quase de madrugada. Conheço os mendigos de lá, eles acham que sou um deles. Já tomei quentão de madrugada com eles. Eles têm grandes histórias para contar. Gosto muito de ouvi-los.
Guia21 — E os próximos planos?
Gustavo Melo Czekster — Estou escrevendo um romance sobre a violoncelista Jacqueline du Pré e o Concerto de Elgar. Sou fascinado pelo concerto e pela biografia de du Pré, além da ironia macabra da esclerose múltipla. Estou estudando um pouco mais de música para enfrentar o tema. O livro se passa durante uma execução do concerto de Elgar.
O anunciado fim da Ipanema FM e o verdadeiro muro das lamentações que se tornou a caixa de comentários da brevíssima matéria era o pretexto óbvio para uma entrevista com Katia Suman. Porém, a ex-coordenadora e principal apresentadora da legendária emissora não é apenas seus quase 20 anos de Ipanema, é também os 16 anos de Sarau Elétrico, e os 5 de rádio Elétrica, além tocar vários projetos paralelos como o do Cais Mauá de Todos.
Katia, que se autodenomina uma “sub celebridade porto-alegrense” é a filha do zagueirão gaúcho Gago. O motivo no apelido é que ele gaguejava na hora das entrevistas, problema que ela não herdou. Ela nasceu em Salvador quando seu pai jogava no Vitória (BA) e agora está escrevendo um livro sobre seus anos na famosa 94.9. Mas sua entrevista ao Sul21 não se limita à nostalgia, focando também o modo como se faz o rádio tradicional, as novas formas e a série de projetos que Katia leva em frente. Tudo isso acompanhado das boas histórias de quem pode dar consultoria de como viver e trabalhar sem dinheiro.
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Sul21: Como começou a tua história na Ipanema FM?
Katia Suman: Eu tinha voltado de uma temporada de 7 anos em São Paulo, tinha decidido não mais trabalhar com publicidade (fui redatora) e estava tentando achar meu rumo. Nesse processo havia sempre um rádio ligado, porque eu sempre gostei de ouvir. Descobri a rádio Bandeirantes, que era muito melhor do que qualquer emissora paulista, com um excelente repertório musical. E uma fala tão coloquial, tão verdadeira, tão fora dos padrões radiofônicos, fiquei realmente muito impressionada. Pensei que eu poderia fazer um programa nesta rádio. Elaborei um roteiro, levei para o Nilton Fernando e ele me recebeu, gostou da ideia, gostou do meu perfil. Pouco tempo depois, quando a rádio passou a se chamar Ipanema, eu comecei, ancorando o horário da noite, das 20h à meia-noite.
Esse negócio de “música de trabalho” que a indústria fonográfica inventou, não colava com a gente.
Sul21: Como a equipe (principais apresentadores) foi formada? Como o pessoal chegava?
Katia Suman: Quando eu cheguei o grupo era formado pelo Nilton, diretor, Mauro Borba, locutor da tarde, a Mary Mezzari, redatora. Tinha também o Ricardo Barão que fazia o Central Rock. A interação da rádio com os ouvintes sempre foi muito forte, muito antes da internet os ouvintes realmente tinham voz na Ipanema: eles participavam, opinavam, davam dicas, levavam discos e nos mantinham informados de tudo o que estava rolando pela cidade. Era já uma rede. Pois bem, em 85 eu criei o Clube do Ouvinte, programa que, como o nome diz, os ouvintes faziam. Eu explicava como fazer o roteiro e eles iam lá apresentar. Houve programas memoráveis, muita gente legal se dispôs a ir ao estúdio, compartilhar seus discos e artistas preferidos. Alguns que apresentaram esse programa acabaram entrando para a equipe da rádio: a Nara Sarmento, por exemplo, o Porã, o Cagê e o Cláudio Cunha. O Alemão Vitor Hugo começou como redator e depois virou locutor.
Sul21: Como se deu o crescimento da rádio?
Katia Suman: Era a rádio certa na hora certa. O país vivia o processo de redemocratização, estava saindo do período tenebroso da ditadura militar. Havia no ar um desejo de liberdade, de exorcizar toda aquela opressão. É nesse momento que surge a famosa cena dos anos 80: Barão Vermelho, Paralamas, Titãs, Blitz, Ultraje, Camisa de Vênus e tantas outras. E aqui TNT, DeFalla, Replicantes, Engenheiros, Taranatiriça, Cascavelettes e tantas outras. A sintonia entre o público e nós, que fazíamos a rádio, era total. Falávamos a mesma língua, tínhamos os mesmos interesses, íamos aos mesmos shows, assistíamos aos mesmos filmes, frequentávamos os mesmos bares, líamos os mesmos livros. Era uma comunicação muito horizontal, éramos, sem saber, já um coletivo. Não era uma relação “rádio aqui e público lá”, como costuma ser. A rádio falava de tudo: política, ecologia, economia, artes, drogas, religiões, tudo! Nunca subestimamos a inteligência da nossa audiência. Num contexto em que as outras rádios voltadas ao público jovem tinham aquele discurso padrão, aquela locução alegre, acelerada e superficial, aquele listão de músicas reduzido e predominantemente internacional, a diferença era gritante. Com o tempo, as outras rádios passaram a dar atenção também a essa nova cena que surgia e a incorporar algumas das nossas sacadas.
Sul21: Havia jabá ou a liberdade era total?
Katia Suman: Liberdade total. Nunca nos submetemos. Inclusive uma das características da rádio era rodar praticamente todas as faixas (era no tempo das faixas) de um disco. Esse negócio de “música de trabalho” que a indústria fonográfica inventou, não colava com a gente. E a gente se esmerava em oferecer o que havia de melhor na música. Não havia internet, as gravadoras deixavam de lançar muita coisa aqui no Brasil. Então era a “caça ao tesouro”: alguém viajava e trazia de fora, ou conseguíamos em lojas de discos importados, ou os ouvintes nos levavam e a gente gravava. Enfim, era uma batalha. E a gente rolava de tudo: rock, funk, blues, jazz, mpb, bossa nova, música erudita, rap, hip hop. Sobre jabá, quem se interessar, minha dissertação de mestrado é sobre o tema e está disponível aqui.
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Naquele momento a nossa voz era mais forte que a da RBS.
Sul21: Qual foi o papel da emissora em relação ao rock gaúcho?
Katia Suman: Foi muito importante. O fato de a rádio rodar os artistas, dar visibilidade a eles, ajudou a criar público. Começaram a surgir várias bandas, vários estúdios de ensaio, estúdios de gravação, casas noturnas com espaço para shows, um circuito de shows pelo estado, enfim, uma cena. As bandas gaúchas num dado momento, lotavam o Gigantinho.
Sul21: Tu te tornaste uma rara celebridade porto-alegrense fora do mainstream da RBS.
Katia Suman: Sub celebridade, né? Mas sim, todos nós ficamos muito conhecidos. Naquele momento a nossa voz era mais forte que a da RBS.
Sul21: O resultado financeiro da Ipanema FM era aceitável ou ficava abaixo do esperado?
Katia Suman: Olha, não só era aceitável como chegou a ser excelente em alguns momentos. Nos anos 80 e 90 a rádio cresceu muito em audiência e faturamento. Todo mundo que tinha como alvo o público jovem, anunciava na Ipanema.
Sul21: E a tua primeira demissão na Ipanema? Foi mesmo por “contenção de custos”?
Katia Suman: Foi o que me disseram. Deve ter sido mesmo. Se foi outro o motivo, nunca soube e acho que nunca saberei.
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Sou entusiasta de primeira hora da internet e de toda essa revolução que está em curso.
Sul21: O teu período de madrugadão — programa das 2h às 6h — na Atlântida equivaleu a uma temporada na Sibéria?
Katia Suman: Mais ou menos. Mas por outro lado aprendi a operar uma mesa de áudio, aprendi a falar no ar, inventei um jeito de me comunicar. Valeu. Esse estágio foi antes de eu entrar efetivamente para a Ipanema.
Sul21: É mesmo? Saíste de lá por ignorar o set list programado para tocar na rádio, fazendo a tua própria seleção musical?
Katia Suman: Sim. Eu ficava falando a noite inteira, lia e comentava notícias e rodava a programação musical que me deixavam. Acho que os porteiros de prédios, seguranças e taxistas que ficavam acordados de madrugada, gostavam. Eu comecei a enjoar da programação que era sempre a mesma, só alterava a ordem das músicas. E comecei a dar uma incrementada. Claro que o programador musical não gostou.
Me orgulho da rádio Ipanema ter sido a primeira emissora gaúcha a ter um site (e a segunda do país) e isso aconteceu na minha gestão.
Sul21: Antes de voltar à Ipanema, durante tua época na TV Com, criaste a rádio Elétrica na web. Durante um período, as duas rádios foram concomitantes, correto? Qual é o caráter deste projeto?
Katia Suman: A rádio Elétrica surgiu da minha necessidade de compartilhar o que eu leio, descubro e aprendo. É um lance meu, uma necessidade. Desde o tempo em que eu fazia a madrugada da Atlântida, eu tinha um caderno em que, durante o dia, anotava notícias e reportagens e trechos de livros e coisas do gênero para falar no ar. Então, quando eu fiquei sem rádio — nessa época eu estava na TV Com –, criei a Elétrica. Em dezembro de 2010. No começo eu fazia sozinha, 2 horas por dia, ao vivo, rolando música e falando. Aos poucos foram entrando pessoas, vários programas foram criados e transmitidos. Algumas pessoas saem, outras entram e assim segue. Eu fiz a escolha de uma a uma das milhares de músicas que rodam. E hoje apresento o Talk Radio mais ou menos ao meio-dia, de segunda a sexta, cada dia conversando com uma das pessoas de um grupo muito legal, de diversas formações e profissões. Participam comigo, ao meio-dia, a psicanalista Christiane Ganzo, o produtor cultural Fernando Zugno, a médica Cinthya Verri, o escritor e professor Diego Grando e a especialista em sustentabilidade, Fabíola Pecce.
Sul21: A rádio Elétrica dá alguma grana ou tu pagas para tê-la? Essa migração já faz parte de uma percepção tua de que não dá mais nas FMs e AMs da vida?
Katia Suman: Até agora eu paguei o custo da rádio que inclui serviço de streaming, hospedagem de dados e equipamento. Agora comecei uma parceria com um apoiador (obrigada, Newkeepers) e esses custos serão bancados. Sou entusiasta de primeira hora da internet e de toda essa revolução que está em curso. Me orgulho da rádio Ipanema ter sido a primeira emissora gaúcha a ter um site (e a segunda do país) e isso aconteceu na minha gestão. Em 1997, tínhamos uma webcam transmitindo do estúdio da rádio. Quase ninguém assistia, pois eram poucos os que já estavam conectados. Mas nós já estávamos lá. Portanto a rádio web é quase um caminho natural para mim. Me agrada muito esse espírito do it yourself da internet.
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Há uma diferença primordial da web para o FM, que é a possibilidade de ouvir o conteúdo a qualquer momento.
Sul21: Há também o Sarau Elétrico, de longa vida para um projeto literário. Como surgiu e ganhou consistência?
Katia Suman: O Sarau Elétrico também está dentro daquela lógica de compartilhar informações, no caso, informações de alta cultura, de intelectuais como os professores Luís Augusto Fischer e Cláudio Moreno. Atualmente, enquanto o Fischer está fora, o professor Sergius Gonzaga entrou para a trupe, que tem ainda o poeta e professor Diego Grando e a querida Claudia Tajes. Ainda nos primórdios da Ipanema, eu tinha por hábito ler trechos de livros. Sempre li bastante e cheguei a cursar Letras, embora não tenha concluído. Eu pensei em fazer um evento aberto, público, para leituras e conversas. Convidei o Fischer e o Frank Jorge. Eles toparam e começamos. E lá se vão 16 anos. No decorrer do período fomos criando uma dinâmica, um jeito, um borogodó qualquer que funciona. A atividade é muito prazerosa, aprendo muito. E nos divertimos também.
Sul21: Como potencializar audiências em tempos de narrowcasting? Pois uma radioweb é radicalmente diferente das tradicionais AMs e FMs (broadcasting).
Katia Suman: Ah, pois é. Eu não sei como potencializar audiência e nem chego a pensar muito sobre isso. Talvez devesse. Sim, rádio web é bem diferente. Não vejo sentido em botar só música, por exemplo, já que com esses serviços tipo spotify e deezer é possível ouvir música da melhor qualidade de qualquer gênero. Sem falar nas milhares de rádios espalhadas pelo mundo todo. Por outro lado, quem ouve a rádio Elétrica deve gostar da minha curadoria musical, porque tudo o que roda foi escolhido a dedo por mim. Estou constantemente atualizando o repertório. Mas o que faz mais sentido pra mim é compartilhar ideias, trazendo pessoas interessantes para juntos pensarmos o mundo que construímos. Eu acho também que há uma diferença primordial da web para o FM, que é a possibilidade de ouvir o conteúdo a qualquer momento. Por isso, os programas da rádio são todos arquivados em podcast.
Parece que a faixa FM já está virando uma imensa AM
Sul21: Que futuro tu vês para as atuais FM e seus modelos?
Katia Suman: A migração das AMs para a faixa de FM está acontecendo antes mesmo do prazo estabelecido pelo governo. E de uma maneira meio esquisita, que é duplicar o sinal, ou seja, transmitir o mesmo conteúdo nas duas frequências. Com o mesmo custo, o empresário tem duas fontes de faturamento. Então parece que a faixa FM já está virando uma imensa AM, ou seja, notícias, futebol e comunicação bem popular. Rádio FM para público jovem, acho que já era. Adolescentes nem conhecem o objeto rádio, não sabem como ligar (não é touch) nem para que serve. Tudo o que eles precisam em termos de informação e música está na internet.
Sul21: Tu tens te envolvido em projetos e tomado posições claras em relação à cidade. Há a Festa da Leitura e o coletivo Cais Mauá de Todos, por exemplo.
Katia Suman: Na Festa da Leitura eu participei muito discretamente, sugerindo algumas atrações para a programação e fazendo assessoria de imprensa.
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Daqui a pouco vou dar consultoria de como viver, trabalhar e produzir sem dinheiro.
Sul21: E o resto?
Katia Suman: Atualmente eu estou fazendo um doutorado em Letras e o meu trabalho final será um livro sobre a Ipanema, feito a partir de relatos feitos à época, por todos os integrantes da rádio. Eram cadernos que ficavam no estúdio e ali anotávamos tudo o que acontecia, nos comunicávamos internamente. Era o nosso e-mail. Eu tenho cadernos de 1984 a 1997. É um belo documento. Também quero finalizar um documentário que comecei em 2013, quando tomei contato com uma cena de festas que acontecem nas ruas de Porto Alegre. São ocupações do espaço público, bonitas, com arte, alegria. Gente jovem reunida. Durante 2013 e 2014 captamos mais de 40 horas de imagens dessas festas, entrevistei um monte de gente. Estou buscando formas de finalizar. Tentei o Fumproarte, mas não rolou. Estou esperando agora o resultado de um edital nacional. Se não rolar vou fazer sem dinheiro mesmo, como tudo foi feito até aqui. Eu daqui a pouco vou dar consultoria de como viver, trabalhar e produzir sem dinheiro.
Sul21: Como surgiu a necessidade de te envolveres com as questões da cidade e da orla? O fato de seres bastante conhecida facilita e dá maior visibilidade às causas?
Katia Suman: Eu era daquelas pessoas que andava sempre de carro. Fazia todos os meus trajetos de carro. Mas, à medida que o trânsito começou a ficar muito denso e travado, eu passei a me sentir tão incomodada que fui mudando a maneira de me locomover pela cidade. Passei a caminhar muito mais do que antes, a usar mais transporte público e a andar de bicicleta. A partir desse contato mais próximo com as ruas da cidade — no carro, a gente está numa bolha –, eu comecei a tomar consciência da realidade da cidade, do estado de abandono das ruas, da deterioração dos espaços públicos, da humilhação a que os pedestres são submetidos quando esperam longos minutos para terem direito a alguns poucos segundos para vencer ao menos uma faixa de uma avenida. Paralelo a isso, comecei a fazer um programa chamado Cidade Elétrica com a escritora Carol Bensimon e o arquiteto João Marcelo Osório. (Na rádio Elétrica, claro – tem os podcasts lá). Entrevistamos muitas pessoas envolvidas com urbanismo, eu passei a pesquisar o assunto, li livros, vi palestras, fui me informado. E quando a gente se informa e cai na real, não tem como não se envolver. A gente vive hoje uma situação inédita na história do planeta terra: pela primeira vez a população que vive em cidades é superior a que vive no campo. E os problemas que a gente costuma encarar como “globais”, como mudanças climáticas (80% da emissão de gases que causam o aquecimento global vem das cidades) ou crise energética (75% do consumo global de energia acontece nas cidades), são em muitos aspectos, problemas urbanos, problemas das cidades. Eles não serão resolvidos se as pessoas que vivem nas cidades não se envolverem ou se responsabilizarem.
Nós precisamos de uma revolução de participação. E rápido!
Sul21: E Porto Alegre, neste contexto.
Katia Suman: Pois é. Vou dar um exemplo dessa falta de envolvimento: Porto Alegre foi a primeira cidade brasileira a ter coleta seletiva de lixo. Desde 1990 há esse tipo de coleta e hoje toda a cidade está contemplada. 100%. Mas qual a porcentagem da população que efetivamente separa os seus resíduos? Apenas 25%!!!!! O que acontece com os outros 75%? Eles não se responsabilizam, eles não se envolvem. Eles não se interessam pelo assunto. Nós precisamos de uma revolução de participação. E rápido!
Sul21: E o movimento Cais Mauá de Todos?
Katia Suman: Aproveitando o espaço, eu convido o distinto leitor a conferir a página facebook.com/caismauadetodos e participar da discussão que nós estamos propondo. Somos um grupo de pessoas que, a exemplo de mobilizações passadas — como a que evitou que o Parcão virasse um lote de 40 prédios nos anos 50 e a que evitou a derrubada do Mercado Público nos anos 70 –, está lutando para que não se desfigure uma área de imensa importância histórica da cidade. Seguramente a mais importante. Porto Alegre só existe por causa do porto, que aliás dá nome à cidade. Se não fosse o porto, a capital seria Viamão, como de fato foi. Obviamente que nós não queremos que aquela área continue abandonada e degradada. Nós queremos sim progresso e desenvolvimento, geração de empregos, tudo isso. Mas não aceitamos shopping e torres naquela área da cidade. Queremos envolver a população nessa discussão.
A revista Cult publicou um estudo no mínimo surpreendente. A ficção do século XIX teria maior presença feminina do que a do século XX. Tudo culpa de uma excepcional geração que inclui as meninas da montagem abaixo: Emily Dickinson, Emily Brontë, Jane Austen, George Eliot, Mary Shelley e outras. Mas não seria apenas isso.
O estudo foi matemático. Por meio de um algoritmo, pesquisadores das universidades de Illinois e Berkeley, nos Estados Unidos, descobriram que, em um século, a proporção de autoras caiu pela metade – dado que, a princípio, acreditaram estar incorreto, já que esperavam encontrar na literatura algum tipo de efeito da primeira onda do feminismo.
Ou seja, em 1850, romances escritos por mulheres representavam 50% das publicações do gênero e em 1950 eles mal chegavam a 25%. Antes de 1840, pelo menos metade dos romancistas era do sexo feminino, mas já em 1917 a maior parte dos romancistas considerados de “alta cultura” era homem.
O estudo chuta que houve uma gentrificação na literatura. No século XIX, escrever não era tão valorizado. Quando escrever passou a dar status, vieram os homens. Também pensa-se que a crítica literária, feita majoritariamente por homens ajudou a prejudicar as mulheres.
O cenário só voltou a ficar igual no final do século XX.
Depende do que você chama “jogar bem”. Se criar chances e mais chances, sempre desperdiçando-as, é jogar bem, então o Inter massacrou. Porém, se as conclusões a gol entrarem no “jogar bem”, o Inter fracassou. Pois…
É incrível a dedicação, o amor, o cuidado, o esmero que o Inter tem em perder gols. Um atrás do outro, em fila. Eram 30 min do primeiro tempo e perdêramos três gols feitos, feitíssimos. O mesmo já ocorrera contra o Remo, pela mesma Copa do Brasil, no meio da semana passada. Então, o time tirou o pé do acelerador até o final do primeiro tempo. Afinal, criar inutilmente situações cansa. Cansa, começa-se a errar passes, a torcida passa e emitir sons estranhos, enerva.
Roger e a bola: uma relação difícil | Foto: Ricardo Duarte
É difícil até falar mal de nossa equipe. Há segurança defensiva, há armação, há Iago mandando ver na lateral esquerda, são criadas boas situações e… nada. Os dois gols perdidos por Roger, por exemplo, foram de gênero diversos ambos ridículos. No primeiro ele entrou livre, cara a cara, e se atrapalhou todo antes de chutar para fora. Depois, D`Alessandro cruzou e a coisa era ainda mais fácil — era só empurrar de cabeça para as redes a bola perfeita do gringo. Roger furou incrivelmente. Patrick também perdeu os dele, mas ao menos pareceu ter mais intimidade com esse negócio de bola.
Uma boa tentativa para a segunda etapa seria a retirada de Dudu para a entrada de Juan Alano, mas ousadia não é a tua praia, né, Odair? Mas algo mudou.
Iago é um personagem da peça Otelo, o Mouro de Veneza, escrita por William Shakespeare. É considerado um dos maiores vilões da literatura mundial e, com certeza, é o mais bem elaborado pelo dramaturgo. Na peça, Iago arma uma trama para que Otelo acredite que sua esposa o traiu, entre várias outras armadilhas. Já o Iago do Inter é a boa surpresa de 2018. Joga muito. É o melhor lateral esquerdo dos últimos anos e até acabou de fazendo um gol no início do segundo tempo, já que os atacantes não faziam.
O grande e shakespeareano lateral esquerdo do Inter | Foto: Ricardo Duarte
Eu sou contra os jogadores ingerirem álcool no intervalo. Digo isso porque Patrick retornou bêbado para o segundo tempo, errando passes que ninguém erra quando está sóbrio.
Depois o volante Edenílson fez o segundo, comprovando a inapetência de nossos atacantes. O jogo seguiu assim até seu final. Wellington Silva entrou para também mostrar que sabe perder gols.
Com o jogo ganho, já nos descontos, mostramos rara inteligência emociona, como bem lembrou um amigo: recebemos três cartões amarelos… Sim, nos descontos.
Marcinho, que nem jogou tanto, deu o passe para os dois gols e acabou como destaque.
Agora, folga até a próxima quarta-feira, quando enfrentaremos o Cruzeiro-RS fora de casa pelo Campeonato Gaúcho.
Ontem foi o dia de nossa estreia na Copa Libertadores da América de 2018. Sob as bênçãos do pôr-do-sol no Rio da Prata, adentramos o campo do simpático estádio Luis Franzini em busca pela glória continental – pela quarta vez. Mais do que um candidato, somos os defensores do título. E foi contra o Defensor o nosso primeiro desafio, Renato – com o perdão do trocadilho besta.
Como tu sabes melhor do que eu, Renato, na partida inicial da Copa sempre rola aquele misto de despretensão com a ansiedade da expectativa. Geralmente, o time chega em meio a um período de formação e testes, visto que o calendário da temporada recém começa a ser percorrido.
gremio.net
Confesso, Renato, que acabei dividindo a atenção do jogo com minha família. Como tinha um compromisso profissional em Caxias do Sul, aproveitei a viagem para visitar meu povo e jantar com eles, enquanto a bola rolava no atraente Parque Rodó, Montevideo, na imagem projetada na televisão da sala. Mas isso não impediu que meu PARCO conhecimento sobre o LUDOPÉDIO pudesse analisar (ou sentir) um pouco o time.
De pontos positivos, pudemos ver um Grêmio que busca manter o trabalho de bola conquistado nos últimos anos, que tanta alegria nos deu. Sem dúvidas o time entrou com muita vontade de vencer, não pensando em se contentar com um empate fora de casa. Claro que a aparente limitação dos uruguaios não é parâmetro para medir forças, mas ver Everton Cebolinha ENDIABRADO e ávido por penetrar a retranca adversária foi um belo símbolo da postura Tricolor.
Por outro lado, parece que ainda não encontramos o esquema ideal, denotando certa bagunça no time. Como eu não assisto os treinos (somente por falta de tempo, juro!), o futebol jogado nas partidas ainda não me permitiu entender a insistência de Ciro como titular – inicialmente como falso-nove, para depois ser recuado na armação. Edilson faz muita falta na lateral direita, porque Madson ainda não provou ser o jogador que precisamos e queremos para disputar títulos. Mas demos-lhe tempo para provar que estamos errados.
O fato é que não foi uma atuação ruim, embora também não tenha chegado a empolgar. O que é sempre bom, né, Renato?! Digo desde que pintei por essas bandas que a euforia não combina conosco. Mesmo assim, somos gremistas de corpo e alma, queremos vencer sempre. E parece que os bons ventos nos brindariam com uma boa vitória logo na estreia da Libertadores, construída do jeito que gostamos – na base da persistência, do bom e velho ABAFA, uma boa jogada construída lá pelo final da segunda etapa.
Luan e Maicon, de boas atuações, apareceram bem no lance que seria fundamental, coordenando a orquestrada troca de passes do Tricolor. No lançamento de nosso capitão para Jael, nosso centroavante com mais títulos do que gols meio que foi empurrado, meio que tentou cavar um pênalti. A bola sobrou para o faminto Cebolinha, que faria um belo e inteligente gol, não fosse a precisão do zagueiro para tirar quase em cima da linha. Foi quando o próprio Maicon, que havia começado a jogada, chegou para concluir bem, pelo alto, e marcar o tento que parecia definir o nosso triunfo. Parecia.
Eis que os uruguaios, que haviam passado aqueles 80 minutos amarrando o jogo, numa aula da boa e velha CATIMBA SUDACA, passaram a correr atrás do prejuízo. A pressão que tentaram nos impor até estava bem controlada. Mas, quatro minutos depois de abrirmos o placar, numa cobrança de escanteio pelo lado direito, os uruguaios chegaram ao empate.
A nossa marcação falhou, deixando Matías Maulella SOLITO para cabecear sem tirar os pés do chão, numa bola que pareceu ter tanto veneno que desviou em 18 jogadores antes de entrar. Renato, a bola aérea é algo que precisa ser corrigido, pois já apresentou falhas nesses primeiros jogos do ano. Um jogador não pode cabecear uma bola completamente sozinho aos 40 do segundo tempo e ponto.
O setor defensivo é justamente nosso ponto mais forte, o que tem dado solidez ao time, não podendo ter esse tipo de brecha. Ainda que nenhum dos dois zagueiros tenha falhado, claro, vale sempre esse registro – mesmo que o Grêmio venha a levar uns 9 gols nos próximos cinco jogos por culpa exclusiva de Kannemann e Geromel, ainda assim não teremos direito de reclamar deles, e a ovação é OBRIGATÓRIA.
De toda maneira, voltamos a buscar a vitória no pouco tempo que nos restava. Mesmo sendo visível a necessidade de ajustes, é muito ver uma equipe que quer vencer e se impor sempre, visto que um ponto trazido do Uruguai sempre seria visto como bom resultado (não que tenha sido ruim também). Infelizmente, não conseguimos furar novamente a meta montevideana, terminando a partida em 1 a 1.
A vitória era para ter sido azul, preta e branca. Dois dos três pontos escaparam entre os dedos exclusivamente por nossa culpa. Mesmo assim, também não é motivo para lamentos. É até bom para o time ficar ligado, para não entrar de salto-alto – como eu já disse, não combina conosco. Ao final, foi o primeiro de seis confrontos da fase de grupos. Agora voltaremos a campo pela Copa somente no início de abril, quando espero que o time já esteja num ritmo mais competitivo.
Enfim, caiu a noite sobre a hermosa Playa Ramirez. O pequeno toque de decepção que pairou sobre nós certamente não foi maior do que a motivação que bateu nos jogadores para encarar os próximos confrontos. E menos ainda do que os românticos ares da noite montevideana, onde as parrillas de Punta Carretas e o Casino Parque Hotel aguardam para que lá nossos jogadores degustem um suculento entrecot, acompanhado de um bom Tannat, umas fichas na roleta e algumas companhias agradáveis.
Tu sabes melhor do que ninguém, Renato, do que os nossos atletas precisam para seguir na trilha das glórias. Eles merecem! Como merecem um bom vinho. Porque é importante que, mesmo após um insólito empate copeiro, ergam algumas taças. Como bons campeões que são!
Em Portugal, a pequena vila de Monsanto é chamada de “a mais portuguesa de Portugal”. Não entendo. Monsanto certamente não é representativa de todo o país. A final, a maioria das casas portuguesas não estão construídas entre pedras gigantes.
Monsanto localiza-se numa montanha com vista para quilômetros de campo. A aldeia quase não mudou nos últimos séculos e goza da fama de ser um museu a céu aberto. É claro que está tombada como patrimônio da humanidade, o que mantém seu charme.
Suas ruas minúsculas serpenteiam pedras. Suas calçadas são estreitas e íngremes. Várias casas têm paredes que acabam em imensas pedras lá fora cobertas de musgo. Algumas destas receberam com portas, dando entrada à aposentos esculpidos diretamente na rocha.
É uma cidade montanhosa muito pouco ortodoxa. Fica quase na fronteira com a Espanha, na mesma latitude de Coimbra, aproximadamente.
Vô Carlito conta histórias para seus netinhos em O Capital Para Crianças, livro dos catalães Joan Riera e Liliana Fortuny. O lançamento é da Boitatá, selo infantil da Boitempo. A obra faz parte de uma série de lançamentos da editora que celebram os 200 anos de nascimento de Karl Marx (Trier, 5 de maio de 1818 — Londres, 14 de março de 1883). Pois é, Karl Marx, vô Carlito… Sim, claro, o livrinho é baseado em O Capital, de Marx, e o desenho não deixa dúvidas.
A simetria é clara. Frederico fica pasmo ao ver que as meias — que produz e pelas quais recebe 25 cents — custam 2 libras no comércio. Daí a coisa parte, como no livro original. É claro que sem a incrível riqueza de detalhes de O Capital. Dia desses, vi o Ulysses de Joyce em quadrinhos. Ninguém reclamou, apesar de que lá tem sexo de todo tipo. Mas agora a editora Ivana Jinkings está sendo ofendida nas redes sociais pela ousadia de lançar tal obra infantil. Imaginem que a obra fala em “mais-valia” e greve, o que educaria toda uma perigosa geração de militantes de esquerda!
A mera notícia do lançamento do livro já foi suficiente para atiçar à loucura a mais parte estúpida da direita. Ivana está se defendendo das ameaças de alguns surtados. Não vamos reproduzir as ofensas aqui porque este é o blog da família brasileira e nossos sete leitores detestam baixaria.
Por outro lado, O Capital, célebre obra de Karl Marx está à venda, disponível a todos e sua leitura é recomendada a todos que estudam Economia, Ciências Sociais, etc. Não se trata de um livro apenas ideológico. É bibliografia essencial ao estudo e debate.
A editora planeja lançar dez livros relativos ao Ano Marx. Karl Marx e o Nascimento da Sociedade Moderna, de Michael Heinrich, e Karl Marx: Uma Biografia, de José Paulo Netto. Diferença Entre a Filosofia da Natureza de Demócrito e a de Epicuro, a tese de doutorado de Marx, também será editada em livro. David Harvey lança Marx, Capital e a Loucura da Razão Econômica; e Domenico Losurdo, O Marxismo Ocidental. E mais: O Último Marx, de Marcello Musto; Escorpião e Félix, de Marx; A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, de Engels; e Estrela da Manhã: Marxismo e Surrealismo, de Michael Löwy.
O décimo é outro livro infantil: O Deus Dinheiro, de Karl Marx e Maguma.
Esta é uma tese meio frouxa, mas como (aparentemente) acertei em cheio, lá vai.
Um dia, um amigo que trabalha na GloboNews me contou que não havia um Grande Irmão determinando que este ou aquele posicionamento devesse ser tomado, que as pessoas sabiam como se posicionar e o faziam automaticamente. Este meu amigo dizia mais, dizia que a postura tomada pelos jornalistas da emissora era certamente mais radical que o desejado pelos chefes. Revelou que, em algumas (poucas) reuniões com os deuses, eles pediam para os jornalistas não exagerarem.
Vejo isso em vários lugares. Há muitos empregados que interpretam as vontades e entram de sola tentando representar o patrão. O esporte da RBS, empresa cujos diretores são “imortais”, é assim. Lá, para o Grêmio tudo é festa, para o Inter, desconfiança. Basta uma simples análise de manchetes para comprovar. Como muitos já fizeram isto, nem vou perder tempo procurando.
Então, quando o presidente da Federação Gaúcha diz que o Grêmio não vai cair, é óbvio que vai aparecer alguém para deixá-lo feliz. Ele nem precisará mandar fazer. Acontecerá naturalmente.
Sim, o Gauchão é secundário, mas agora ficou secundário e desonesto. Ontem à tarde, houve o mais claro dos pênaltis. Foi algo constrangedor, mas o apitador — nem sei seu nome — simplesmente mandou seguir. A equipe de esportes da Guaíba, em atitude surpreendente, falou que nem precisava do revisar o replay, que fora um pênalti óbvio. Eu acho que não foi casual e, se não estava dando grande importância ao regional, agora larguei de mão mesmo.
Quando a gente chega a prever favorecimentos é muito mau sinal.
Não foi pênalti.
Posso ser viciado em futebol, mas ontem foi o primeiro jogo que não assisti. Faço apenas duas observações: (1) o Inter perdeu 100 % de aproveitamento em casa por causa da omissão da diretoria. Se este jogo fosse no Beira-Rio, provavelmente venceríamos. E (2), vendo os melhores lances, digo que Lomba está jogando muito mais do que Danilo Fernandes.
Barbara Hannigan é uma conhecida personagem deste blog. Já a mostramos escrevendo, regendo, cantando e atuando. Já postamos três de seus discos no PQP Bach, mas o que ela fez anteontem em Lyon foi algo novamente digno do furacão de afinação, timbre, presença e talento que ela é. Dá vontade de gritar “Parem as máquinas!” a fim de que todos possam vê-la em ação. Ela regeu e cantou Girl Crazy Suite (sobre I Got Rhythm, de George Gershwin) e tudo foi registrado em vídeo. Este foi visto mais de 370 mil vezes e está no ar há pouco mais de 24h. Com vocês, Barbara Hannigan:
Mas temos mais. Neste Tiny Desk Concert, promovido pela npr music, ela canta primeiro Empfängnis (Concepção), de Alexander Zemlinsky, depois a belíssima Licht in der Nacht (Luz na Noite), de Alma Mahler, Nur wer die Sehnsucht kennt (Apenas um sabe dos anseios), de Hugo Wolf, e finaliza com Schenk mir deinen goldenen Kamm (Dê-me seu pente dourado (?)), de Arnold Schoenberg. O pianista é seu velho — em todos os sentidos — colaborador Reinbert de Leeuw.
Infatigável na divulgação da música erudita e óperas dos séculos XX e XXI, Hannigan emprestou sua voz a estreias mundiais de mais de 80 peças. A voz é simplesmente linda — cintilante e amanteigada em todos os registros, com notas altas cristalinas que emergem do ar carregadas de emoção. Não acreditam? É só ouvir.
o sol brilha para você ele me disse no dia em que estávamos deitados entre os rododendros no cabo de Howth com seu terno de tweed cinza e seu chapéu de palha no dia em que eu o levei a se declarar sim primeiro eu lhe dei um pedacinho de doce de amêndoa que tinha em minha boca e era ano bissexto como agora sim há 16 anos meu Deus depois daquele longo beijo quase perdi o fôlego sim ele disse que eu era uma flor da montanha sim certo somos flores todo o corpo da mulher sim foi a única coisa verdadeira que ele me disse em sua vida e o sol está brilhando para você hoje sim por isso ele me agradava vi que ele sabia ou sentia o que era uma mulher e tive a certeza de que poderia sempre fazer dele o que eu quisesse e dei-lhe todo prazer que pude para levá-lo a me pedir o sim e eu não quis responder logo só fiquei olhando para o mar e para o céu pensando em tantas coisas que ele não sabia em Mulvey e no Sr. Stanhope e Hester e papai e no velho capitão Groves e nos marinheiros que brincavam de boca-de-forno de cabra-cega de mão-na-mula como eles diziam no molhe e a sentinela defronte à casa do governador com a coisa em redor de seu capacete branco pobre diabo meio assado e as moças espanholas rindo com seus xales e seus pentes enormes e os pregões na manhã os gregos judeus árabes e não sei que diabo de gente ainda de todos os cantos da Europa e na rua Duke e o mercado de aves cheio de cacarejos em frente a casa de Lalaby Sharon e os pobres burricos tropicando meio adormecidos e os vagabundos encapotados dormindo na sombra das escadas e as enormes rodas dos carros de boi e o velho castelo velho de milênios sim e aqueles belos mouros todos de branco e de turbante como reis pedindo a você que se sente em suas minúsculas barracas e Ronda janelas velhas de pousadas olhos espiando por detrás de rótulas para que seu amante beije as grades de ferro e as tabernas semicerradas à noite e as castanholas e a noite que perdemos o barco em Algeciras o vigia rondando sereno com sua lanterna e Oh aquela terrível torrente profundofluente Oh e o mar carmim às vezes como fogo e os poentes gloriosos e as figueiras nos jardins da Alameda sim todas as estranhas vielas e casas rosa e azul e laranja e os rosais e os jasmins e os gerânios e os cáctus e Gibraltar quando eu era jovem uma Flor da montanha sim quando eu pus a rosa em meus cabelos como as moças andaluzas ou de certo uma vermelha sim e como ele me beijou sob o muro mourisco e eu pensei bem tanto faz ele como outro e então convidei-o com os olhos a perguntar-me de novo sim ele perguntou-me se eu queria sim dizer sim minha flor da montanha e primeiro enlacei-o com meus braços sim e puxei-o para mim para que pudesse sentir meus seios só perfume sim e seu coração disparando como louco e sim eu disse sim eu quero Sim.
A matéria abaixo é ótima, mas não fala no livro de Anthony Burgess, A Sinfonia Napoleão, que foi escrito para o filme de Kubrick que nunca foi produzido. O livro tem quatro “movimentos”, seguindo à risca a Sinfonia Eroica de Beethoven. O romance existe, pode ser lido inclusive em português, e é dedicado a Stanley Kubrick, que havia dirigido a adaptação cinematográfica de um romance anterior de Burgess, A Clockwork Orange (A Laranja Mecânica). Kubrick tinha a intenção de fazer um filme biográfico sobre Bonaparte, mas estava insatisfeito com seu próprio roteiro. Os dois trocaram cartas e, em seguida, reuniram-se em dezembro de 1971. Burgess sugeriu a Kubrick que a estrutura do filme poderia se basear na Sinfonia Eroica, e Kubrick pediu para que Burgess escrevesse uma novela baseada nesse conceito para servir de base para um roteiro. Usando seu próprio conhecimento da estrutura sinfônica, Burgess baseou sua escrita muito próxima da Sinfonia. Em junho de 1972, ele enviou o primeiro “movimento” a Kubrick, que respondeu que, lamentavelmente, o tratamento não era adequado para um filme. “Este manuscrito não me ajuda a fazer um filme sobre a vida de Napoleão “.
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Stanley Kubrick passou dois anos preparando um filme sobre Napoleão Bonaparte, mas isso acabou nunca acontecendor. A Taschen vai agora juntar num só volume a caixa de edição limitada que lançou em 2009 sobre o projeto e dar acesso à quase totalidade da pesquisa do realizador.
Quando estava na pós-produção de 2001: Odisseia no Espaço, Stanley Kubrick (1928-1999) começou a preparar aquele que, achava, seria o seu projeto seguinte: um épico sobre Napoleão Bonaparte. Napoleon acabou por nunca ser feito, tendo sido rejeitado primeiro pela MGM e depois pela United Artists por acharem que o orçamento elevado que seria necessário para a reconstituição de época não iria compensar nas bilheteiras. Mas o obsessivo Kubrick passou dois anos a preparar o filme, a pesquisar e reunir material sobre a época e o imperador e a escrever o roteiro.
Em 2005, a Taschen editou The Stanley Kubrick Archives Book, com orientação de Alison Castle, que reunia parte do arquivo do realizador, para ilustrar a forma meticulosa como o cineasta de Barry Lyndon e Dr. Strangelove trabalhava. Na altura, houve muito que ficou de fora sobre a intensa preparação do filme.
O capítulo do livro a ele dedicado só representava uma parte ínfima do material que Castle reuniu e, logo na altura de publicação, já se noticiava haver planos para um livro exclusivamente dedicado a esse projeto. Em 2009, saiu Stanley Kubrick’s Napoleon: The Greatest Movie Never Made, caixa de edição limitada com dez livros a detalhar todo o processo. Em Março, será lançada uma nova edição que reúne todo esse material num só livro. Quem o comprar – o custo será à volta de 50€ – terá também direito ao acesso online à totalidade dos arquivos reunidos sobre o filme.
Este arquivo inclui as 15 mil fotografias de cenários e 17 mil imagens napoleônicas que Kubrick juntou. O livro publica rascunhos do guião que Kubrick escreveu, entrevistas a Kubrick pelo professor universitário Felix Markham, estudos para o guarda-roupa – os uniformes militares iriam ser feitos em papel para manter os custos baixos, por exemplo –, entre muitos outros elementos.
Esta nova edição não é a única novidade kubrickiana de 2018. De 18 de Outubro até ao final de Março do próximo ano, o Centre de Cultura Contemporânea de Barcelona (CCCB) vai ter uma exposição dedicada ao realizador, que procurará traçar paralelos entre a sua obra e o mundo atual.
E bom dia a todos os Bicampeões da Recopa Sul-Americana!
Não foi nada fácil, né, Renato?! Como tu mesmo já tinhas anunciado lá naquela coletiva de imprensa de depois do jogo de ida. O Independiente é um grande clube, todos sabemos. Tínhamos certeza de que a partida de volta seria tão ou mais pegada do que a contenda em Avellaneda.
Rey de Copas lá, Rei de Copas cá, levamos a melhor neste duelo de clubes orgulhosos de seus feitos. Não sei se 1984 ainda te dói, Renato, mas 1996 e 2018 estão encravados na história, para, além de derrubar o mito do time Sudaca que não perde finais continentais, encravar na história do confronto a superioridade Tricolor (7 vitórias nossas, 3 derrotas e 4 empates), além de dois títulos em cima deles.
Quando entramos em campo ontem, Renato, a Arena estava mais uma vez numa linda festa. Como sou um bom brasileiro, deixei para depois a compra do ingresso, o que me conduziu a assistir a partida no meu boteco da sorte (mais do que nunca, precisamos dele ontem!). A Nação Tricolor esteve presente com a força habitual nas arquibancadas (apesar de alguns ARREGÕES, por conta da chuva) e em todos os cantos. No estádio, a hinchada roja também se fez presente, engrandecendo ainda mais a disputa.
Bola rolando, e, como eu tinha falado na última vez, ainda vejo o time do Grêmio de 2018 numa fase experimental, ajustando-se aos poucos. Afinal, foi apenas o quarto jogo da equipe titular no ano. Mas ontem começamos bem melhor do que no jogo de ida. Desde logo, conseguimos imprimir nosso jogo, ainda que sem o ritmo e a força do ano passado.
Logo cedo, Everton teve a chance de marcar, após receber grande passe de Alysson e driblar o goleiro, tendo a zaga argentina salvado em cima da linha. Esse lance simbolizaria o jogo: foram várias oportunidades criadas ao longo do Grêmio, sem que tivessem sido aproveitadas – melhorar a finalização já demonstra ser um dos pontos de reparo da equipe.
A metade inicial do primeiro tempo mostrou um Grêmio que inspirou confiança. Mas, na parte final, aconteceu alguma coisa no campo que não futebol. O Independiente soube amarrar o jogo, valer-se da velha catimba argentina e frear o ímpeto do Imortal. Entramos na cena deles, e daí a disputa passou a ser em qualquer canto, a cada oportunidade – e a bola, um mero detalhe.
Foi quando Amorebieta resolveu TATUAR as marcas das travas de suas chuteiras no peito de Luan que o jogo ganhou novos contornos. Tal qual no jogo passado, o recurso do vídeo foi utilizado para a expulsão de um jogador da equipe roja. Olha, Renato, fico com a impressão de que, se existisse o VAR há 50 anos, os uruguaios e os argentinos não teriam levantado tantos troféus nesse período. Mas divago.
Apesar da vantagem numérica em campo, o Independiente soube se fechar muito bem atrás. Duas linhas de quatro bem compactadas na frente da área (uma frase que os analistas contemporâneos gostam de usar), e a criação ficou ainda mais difícil para o Grêmio. Quando Jael entrou em cena, Cícero deixou de exercer a função do “Falso 9” e apareceu mais em campo, pela articulação.
E a partida seguiu tocando a mesma nota: Grêmio, mesmo com dificuldade de penetrar na defesa adversária, conseguindo criar chances boas, mas não aproveitando; Independiente procurando explorar os contra-ataques, pelos pés rápidos de Benítez. Ao final dos 90 minutos, nada de gols, e fomos para a prorrogação.
Tempo extra que é sempre de nervosismo e superação, né, Renato?! Se temos orgulho e apego à nossa tradição de futebol aguerrido, isso com certeza também não falta do lado do Independiente. Foi na prorrogação que chegamos mais perto do gol, com Jael cabeceando na trave, mas também foi o momento em que tomamos o maior susto. O placar seguiu zerado e fomos para os pênaltis.
Daí, Renato, que o coração palpitou a ponto de pensar em marcar o cardiologista. Porque tu sabes da nossa sina com as penalidades. Tuas duas únicas derrotas em mata-mata desde 2016 tinham sido justamente por meio delas. É um trauma Tricolor. Decisão em casa, Campaña inspirado pegando tudo do outro lado, penalidades. “Que cenário para uma tragédia!”, pensamos eu e certamente milhares de outros gremistas. Mas ontem não!
Pelo visto, tu pensaste bastante na possibilidade de a Recopa ser decidida nos pênaltis e mandou os jogadores treinarem bastante as cobranças. Foram cinco penalidades muito bem batidas. Inclusive o de Luan, nosso Rei da América outrora tão criticado por perder pênaltis decisivos, mas que ontem não fugiu da responsabilidade (como nunca foge, na verdade) de realizar a quinta cobrança.
Do outro lado, os argentinos também tiveram bom aproveitamento nas penalidades. Grêmio convertia, eles iam lá e igualavam. Uma típica disputa bastante tensa. Como eu detesto pênaltis quando é com meu time! Até que Benítez foi para a bola, titubeando na quinta cobrança.
Ave, Grohe! Soube esperar, cair para o lado certo e ainda contar com a sorte de bater na trave e sair. É um goleiro com marca de campeão, não adianta. Foi um dos grandes nomes dos títulos da Copa do Brasil e da Libertadores. Merecido que essa taça viesse com a decisão terminando justamente nas mãos deles. Antes muitas vezes criticado (inclusive por este que te escreve), agora um ídolo imortalizado.
Dois empates tensos, peleados e emocionantes, uma decisão por pênaltis. E não adianta: essa geração gremista é vencedora! Agora estamos entre os brasileiros que mais ganharam a Recopa, assim como dividimos o posto de tricampeões da Libertadores e de pentacampeões da Copa do Brasil. Mas só o Grêmio está lá no topo dentre os brasileiros em todos esses casos. Não adianta: é o REI DE COPAS!
E olha, Renato, em quase um ano e meio, já são três taças no armários, três grandes títulos. Mais uma copa erguida na Arena. Mais uma volta olímpica. Obrigado por tudo sempre, ídolo eterno! É Bi da Recopa! 2018 começou, e que venham as próximas taças!
É claro que é engraçado ver os gremistas c@gados a esta altura do campeonato com a perspectiva de uma segundona gaúcha, mas eles não caem nem que o Noveletto não ajude — conforme prometeu antecipadamente neste findi. É só o Grêmio tirar de campo este time podre de rebotalhos e colocar os titulares. O que se sabe agora é que eles têm somente uns 15 jogadores confiáveis. Mas não apenas vão se classificar para as quartas-de-final como entrarão como favoritos para levar o título gaúcho. Hoje quem se diverte somos nós, ouvindo um vestiário embasbacado… O Grêmio é o 12º entre 12, após 7 rodadas, num campeonato onde 2/3 dos times são muito ruins. O imortal é LANTERNA. O próximo jogo do tricolor é contra o Novo Hamburgo no sábado. Incrivelmente, são adversários diretos e o Grêmio pode sair da Zona com uma vitória simples. Cairia lá por 9º, então. Bem, não somos nenhum Lanús, mas os reservas do Inter fizeram 3 x 0 no Noia, dia desses. Se quiser, o Grêmio faz oito.
Para secar, mesmo que inutilmente, eles ainda tem quatro jogos nesta fase: NH (c), Juventude (f), São Paulo (c) e Inter (f).
P.S. — Além do mais, a Divisão de Acesso é jogada durante o Brasileiro. O Noveletto daria um canetaço e manteria o Grêmio na Primeira Divisão, acho. Seria lindo, mas eles vão se livrar deste vexame.
Este texto foi “causado” por dois fatos: o recebimento do mapa abaixo, que julgo chocante e também deste link, que descreve o único trem de passageiros diário do Brasil, ligando Vitória, no Espírito Santo, a Belo Horizonte, em Minas. A linha atende 42 municípios e a um milhão de passageiros por ano. Por que jogaram fora a malha ferroviária gaúcha?
Washington Luís foi o primeiro presidente a dizer tolamente que “Governar é abrir estradas”. Foi um de seus bordões de campanha, isso lá em 1928. Ele inaugurou, por exemplo, a Rio-Petrópolis, primeira rodovia asfaltada do país. Mas a estratégia só veio a acentuar-se de forma contundente no final dos anos 50, durante a presidência de Juscelino Kubitschek. A intenção era integrar o Brasil, principalmente com a transferência da capital para Brasília, além de industrializar o país por meio de montadoras de carros. Logo após a inauguração de Brasília foram construídas as rodovias Belém-Brasília, Brasília-Rio Branco e Cuiabá-Porto Velho, no intuito de estabelecer relações comerciais e proporcionar o povoamento em áreas mais afastadas do Centro-Oeste e da região Norte.
Foi naquela época que o sistema ferroviário e hidroviário começaram a ser jogados no lixo em favor de transportadoras e montadoras. Hoje, no Brasil, só temos uma opção para a distribuição de produtos — nossas rodovias em mau estado — e nenhum governo posterior pensou em alterar a situação. As ferrovias têm uma ínfima participação na logística de transportes nacional, sem falar no irrisório número de passageiros transportados sobre trilhos. É bom esse pessoal da gasolina, do asfalto e dos caminhões!
Foi um erro clamoroso abandonar por completo as ferrovias. Erro que chegou ao máximo durante a ditadura militar, que fez enormes investimentos incompreensíveis, como a rodovia Transamazônica. É interessante dizer que o Brasil é o único país de grande área geográfica que promoveu tal processo de desmantelamento. Há inúmeras vantagens no transporte ferroviário — trens de carga, de passageiros, maior segurança, facilidade de manutenção, etc. — sobre o rodoviário.
Em 1992, durante o Governo Collor, a RFFSA (Rede Ferroviária Federal S. A.) foi incluída no Programa Nacional de Desestatização e, em 1999, durante o governo FHC, foi extinta, sendo criada a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), que ainda hoje é o órgão que fiscaliza e controla o pouco que sobrou do transporte ferroviário no país.
Revejam acima o que tínhamos no Rio Grande do Sul em 1939. Era uma respeitável malha ferroviária.
Pronto, pronto, eu faço. Dá um trabalhão
mas faço. Corto madeira, arranjo pregos,
gasto o martelo. E o pior também:
correr o mundo a recolher os bichos,
coisas de nada como formigas magras,
e os outros, os grandes, os que mordem
e rugem. E sei lá quanto são!
Em que assados me pões. Tu
gastaste seis dias, e eu nunca mais cabo.
Andar por esse mundo, a pé enxuto ainda,
a escolher os melhores, os de melhor saúde,
que o mundo que tu queres não há-de nascer torto.
Um por um, e por uma, é claro, é aos pares
— o espaço que isso ocupa.
Mas não é ser carpinteiro,
não é ser caminheiro,
não é ser marinheiro o que mais me inquieta.
Nem é poder esquecer
a pulga, o ornitorrinco.
O que mais me inquieta, Senhor,
é não ter a certeza,
ou mais ter a certeza de não valer a pena,
é partir já vencido para outro mundo igual.
‘Noah’s ark on the Mount Ararat’ de Simon de Myle (1570)
Muita gente ficou confusa ontem. O Sport empatou em 3 x 3 em casa e teve cobrança de pênaltis — os pernambucanos foram eliminados pelo Ferroviário (CE). Então, contra o Remo, vamos ter que ganhar no jogo ou nos pênaltis. Não tem essa de empate. E não haverá nunca o gol qualificado. Veja o que está em negrito abaixo.
Escher, Relatividade
DO SISTEMA DE DISPUTA
Art. 8º – Resumo do sistema: a Copa será disputada em 8 (oito) fases, no sistema de eliminatória simples (“mata-mata”), sendo que nas duas primeiras fases os confrontos serão disputados em jogo único, e nas fases restantes em partidas de ida e volta.
Art. 9º – Os clubes serão distribuídos em grupos de dois, em cada fase, sempre classificando-se um clube para a próxima fase, observada a seguinte sequência de fases:
I – Primeira Fase: 80 clubes distribuídos em 40 grupos de dois clubes cada;
II – Segunda Fase: 40 clubes distribuídos em 20 grupos de dois clubes cada;
III – Terceira Fase: 20 clubes distribuídos em 10 grupos de dois clubes cada;
IV – Quarta Fase: 10 clubes, distribuídos em cinco grupos de dois clubes cada;
V – Quinta Fase: 16 clubes (cinco oriundos da Quarta Fase, mais 11 clubes, conforme critério 1 do Art. 2º) distribuídos em oito grupos de dois clubes cada;
VI – Sexta Fase: oito clubes distribuídos em quatro grupos de dois clubes cada;
VII – Sétima Fase (Semifinal): quatro clubes distribuídos em dois grupos de dois clubes cada;
VIII – Oitava Fase (Final): dois clubes em um grupo.
§ 1º – Os confrontos da Primeira Fase envolverão necessariamente um clube do Bloco I (clubes de 1 a 40 no RNC) enfrentando um clube do Bloco II (clubes de 41 a 80 no RNC) aqui considerado o RNC retificado para os 80 clubes disputantes da Primeira Fase da Copa.
§ 2º – Na Primeira Fase, a ser disputada em partida única, os clubes do Bloco II atuarão como mandantes contra os clubes do Bloco I.
§ 3º – A identificação dos quarenta confrontos da Primeira Fase será definida através de sorteio público a ser realizado pela CBF, segundo critérios técnicos divulgados pela DCO.
§ 4º – Os confrontos da Quarta Fase serão definidos através de sorteio público, envolvendo 10 clubes, sendo que cada clube poderá enfrentar qualquer um dos demais nove classificados na fase anterior.
§ 5º – Os confrontos da Quinta Fase (Oitavas-de-Final) ocorrerão necessariamente entre um clube do Bloco A e um clube do Bloco B: o Bloco A contempla os oito clubes participantes da Copa Libertadores da América de 2018 e o Bloco B terá os cinco clubes classificados na Quarta Fase mais os três clubes que também acessarão a Copa na Quinta Fase: o campeão da Copa do Nordeste/2017, o campeão da Copa Verde/2017 e o campeão do Campeonato Brasileiro da Série B/2017.
§ 6º – Se o total de participantes brasileiros na Copa Libertadores for nove, o pior colocado na Série A de 2017 dentre os clubes que obtiverem vaga via Campeonato Brasileiro passará a figurar no Bloco B. Isto não se aplica ao campeão da Copa do Brasil de 2017, da Copa Libertadores de 2017 e da Copa Sul-Americana de 2017. Com esta configuração o Bloco B terá este clube citado acima, além dos cinco clubes classificados na Quarta Fase e os campeões das copas do Nordeste e Verde. Assim, o campeão do Campeonato Brasileiro da Série B deixa de acessar a Copa nas Oitavas de Final e passa a iniciar a Copa a partir da sua Primeira Fase, caso tenha obtido classificação (vide Art. 2º).
§ 7º – A identificação dos oito confrontos da Quinta Fase (Oitavas de Final) será definida através de sorteio público promovido pela CBF, segundo critérios técnicos divulgados oportunamente.
§ 8º – Para a Sexta Fase (Quartas-de-Final) haverá um novo sorteio público para definição dos confrontos, com os oito clubes formando o Bloco C (vide Anexo B), sendo que cada clube poderá enfrentar qualquer um dos demais sete classificados na fase anterior.
§ 9º – Em todas as fases, os clubes as iniciarão com zero ponto (ganhos e perdidos).
Art. 10 – A composição dos grupos para todas as fases da Copa estará identificada no Anexo B, que será publicado na Revisão deste REC, em 14/12, após o encerramentos das competições da Temporada 2017.
Art. 11 – O clube que somar o maior número de pontos ganhos ao final da partida única (nas duas primeiras fases) ou das duas partidas em disputa dentro do seu grupo, da Terceira a Sétima fases, estará classificado para as fases seguintes; na Oitava Fase (Final), o clube será proclamado campeão da Copa.
Art. 12 – Os critérios de desempate para indicar o clube vencedor de cada confronto, são os seguintes:
a) Na Primeira Fase, o vencedor do jogo único estará classificado para a próxima fase; em caso de empate classifica-se o clube melhor posicionado no RNC entre os dois competidores de cada confronto; b) Na Segunda Fase, também em jogo único, o vencedor estará classificado para a próxima fase, em caso de empate a definição do clube classificado será através da cobrança de pênaltis, de acordo com os critérios adotados pela International Board. c) A partir da Terceira Fase quando houver igualdade em pontos ganhos ao final das duas partidas de cada grupo, os critérios serão os seguintes, aplicáveis à fase e nesta ordem:
1º) maior saldo de gols;
2º) cobrança de pênaltis, de acordo com os critérios adotados pela International
Board.
Parágrafo Único – A disputa de pênaltis, quando aplicável, deverá ser iniciada em até 10 minutos após o término da partida de volta.
Art. 13 – Em cada confronto eliminatório, em quaisquer das seis últimas fases, a definição do estádio da segunda partida deverá ocorrer antes da realização da partida de ida, não podendo mais sofrer alteração, salvo em caso de comprovado motivo de força maior, mediante avaliação e concordância da DCO.
Art. 14 – O mando de campo de todas as partidas pertencerá ao clube colocado à
esquerda da tabela elaborada pela DCO.
§ 1º – Para a Primeira Fase o mando de campo da partida única pertencerá ao clube de posição inferior no RNC entre os dois competidores de cada confronto.
§ 2º – Caso os dois clubes envolvidos no confronto da Primeira Fase tenham o mesmo posicionamento no RNC será considerado o RNF e, persistindo a igualdade, o mando será definido por sorteio.
§ 3º – Para as demais fases (inclusive a Segunda Fase, que será disputada em partida única) os mandos de campo serão conhecidos através de sorteio público a ser realizado pela DCO, não sendo permitido acordo entre clubes para a não realização do sorteio.