Recebendo o Dr. Cláudio Costa

Publicado em 10 de outubro de 2007

Tenho uma história muito feliz de encontros com blogueiros. Boa convivência, gentileza, piadas, amizades. Conheci muitos, dentre quais posso citar de memória Mônica, Tiago, Gejfin, Afonso, Biajoni, Olivia, Sandra Pontes, Marcão, Laura RJ, Mauro Castro, Stella, Rafael Reinehr, Sílvia Chueire, Donizetti, Inagaki, Nelson Moraes, Cynthia Feitosa, Gabriela Franco, Ticcia, Ane Aguirre, Fábio Danesi, Viva, Francisco Viegas, Nora Borges, Flavio Prada, Allan Robert, Fabrício Carpinejar, Nelson Natalino, Alê Felix, Adalberto Queiróz, Helenir Queiróz, Vanessa Lampert, Claudia Letti, Marcos Caiado, Fal, Manoel Carlos, Adelaide Amorim, Doce Maior, Thomaz Magalhães… e certamente muitos outros que esqueci e que ficarão irritados comigo.

Por falar em comportamentos limítrofes, minha mulher fica maluca quando vai receber alguém em casa. Casa? A casa se transforma. Não se sabe de onde nem como surgem toalhas novas, tudo vai para o seu lugar (ou para lugar um inédito, no caso daquelas coisas que nunca encontraram um paradeiro para chamar de seu), os sabonetes deixam de ser arredondados para adquirir sequinhos formatos de paralelepípedos, há fartura de papéis higiênicos nos banheiros — ninguém precisará gritar desesperadamente por ajuda — , fica tudo florido, as roupas DELA somem magicamente de seus habituais lugares para finalmente conhecerem o armário e eu tenho, além de organizar tudo o que é meu, que caminhar mui cuidadosamente pelo apartamento, lentamente, revisando se meus sapatos não trouxeram muito pó da rua e observando bem a nova disposição das coisas para não derrubar nada.

Como já me acostumei, não me incomodou muito a necessidade de levar o armário de CDs de um canto a outro da sala. Seu peso é mais ou menos o de um automóvel americano dos anos 60, porém, como preciso mesmo emagrecer, nem me preocupei com a ausência das rodas nem com o fato de ter alçado a cama de casal do meu filho para o quarto de cima. (Aqui há um interessante detalhe. Quando comprei a cama para o Bernardo, disse-lhe que havia três modelos na loja: No Sex, Stop Fucking e Penis Paralisator. Por profilaxia paterna, escolhi o Penis Paralisator; afinal, ele tem 16 anos, namora uma menina da mesma idade e eu não desvio um centímetro daquilo que está prescrito no Manual do Perfeito Católico: a Castidade é a Pérola das Virtudes.) Bom, então o fato é que nossos convidados, o Professor Doutor Psiquiatra e o escambal Claudio Costa e sua esposa, repousarão sobre o Penis Paralisator. Será um período imaculado na vida de nosso querido doutor. A imobilidade, dizem, além de tornar as pessoas mais espirituais, garante algumas reputações. A dele certamente não será diminuída pela falta dessas efêmeras dilatações. Ou… sei lá.

Algo que é normal lá em casa e que continuará acontecendo durante a estadia do mineiro casal é a comilança perpétua. E olha, é impossível resistir, a gente engorda pacas. Sou cobaia e beneficiário das artes de Claudia Antonini. Devido a ela, expando-me como o universo. Talvez os filhos do Claudio — eliminemos logo o “doutor” de alguém tão amável e sem frescuras –, não o reconheçam na volta, tal o incremento que sua barriga e outras partes expandíveis do corpo humano poderá receber. Mas deixo de lado qualquer possibilidade de incremento sobre o membro discutido no parágrafo anterior. Não há chances. E ele, coitado, fala sobre uma nova lua de mel em Porto Alegre…

Infelizmente, ficarão apenas de hoje até sábado. Quatro quilos? Não sei, se a Ana Letícia pedir muito, a gente pode piorar a comida… Filhos são assim: aposto que ela ficará satisfeita com o Penis Paralisator — pai, vai devagar, na tua idade… — e quererá seus papais comendo de forma equilibrada. Mas nós, que gostamos deles por serem divertidos e legais — não que ela não os ame pelo mesmo motivo — , pretendemos submergi-los em vinhos, massas, carnes e que tais. A vida é assim meio tola mesmo, né, Ana?

Há uns três meses, encontramos o Claudio aqui em Porto Alegre e posso garantir que contraí por ele uma paixão avassaladora — ainda que platônica, bem entendido. Conversamos como velhos amigos, dissemos coisa séria e muita bobagem e, quando soubemos do Congresso de Psiquiatria que ocorreria em outubro, o convite para que ficasse em nossa casa saiu-nos fácil. Ainda bem que ele aceitou nos incomodar. Era, exata e minuciosamente, o que desejávamos.

Comentários do blog anterior:

Ramiro Conceição: Dois comentários: 1) Milton, gostei muito da cinética, da fluidez do texto. 2) Agora sobre esse tal utensílio, denominado de “Pênis Paralizator”, Doutor Cláudio, cuidado!; pois o senhor e a sua senhora talvez estejam adentrado na trama mágica da teia do terrível Periquito da Genitália Grande, sob um surto da “Síndrome de Milton”. Explicando melhor. Como sabemos, quando casais se visitam, sempre, em alguma ocasião, as mulheres ficam com as mulheres e os homens com os homens. Aí, Doutor Cláudio, mora o perigo! O terrível Periquito, em milhares de subterfúgios colorados, tentará atraí-lo para o utensílio da devassidão. Mas, caro Doutor, já será tarde. O senhor ainda tentará o derradeiro argumento: Pera aí: isso não é o “Pênis Paralizator”? Mas aquela voz sedenta e cavernosa, babando de prazer dirá: “Não, querido Cláudio, aqui é o lugar do “Pênis pra Alisador”. Querido Doutor, aí — nem Freud explica!

Meg: Milton será que me colocaste no Index Prohibitorum? Nenhum comentário meu entra. Tamos maus;-) Beijos ao Cladio que deve dizer “Paralisator? antes ele do que o meu” hohoho Estou fazendo graça porque sei que não vai entrar o bendito do comentário Putz! Feliz dia das Crinaças. A começar por ti. M

M: Milton dá um beijo ou manda dar;-) um beijão especial no Claudio e na família dele. E diz que espero ele em Belém do Pará. Ele , como bom psi lacaniano, deve conhecer o inconsciente do Oiapoque ao Chuí, no caso o Oiapoque fica em Belém, mas só neste caso, especialmente para ele. beijos para ti, para a Claudia, tua mulher de verdade;-) e todas as crianças da casa Meg

Viva: Milton, tua crônica está deliciosa, como devem ser os pratos da Cláudia e a prosa do Cláudio. PS: se no domingo você amanhecer com um olho roxo, não vou estranhar. Essa função “casa organizada para as visitas” todo mundo faz. Só que não se conta!!!

Nina – Fenômenos: uhauhauahauhauh passei mal com a cama “penis paralizator”. aqui em casa nao e diferente. qdo tem visita e uma loucura. minha mae só falta nos pedir pra nao respirar. sem falar nos objetos novos que aparecem: talheres do faqueiro que herdou de nao sei quem, copos que eu nunca vi na vida, toalha de mesa bordada a mao (made in ceara). parece que estou em outro lugar!!! sem falar nas comidas. tenho um primo que se diverte qdo a familia inteira esta reunida. ele tira fotos da galera comendo. e so isso que se faz na familia buscape…comer!!! 150 mastigacoes por minuto!! impressionante!!! beijos

Gugala: Pelo jeito vais conseguir que o Dr. participe, solteiro, dos próximos Congressos . ahaha abraços

Cláudio Costa: Olhacá, vamos precisar de algumas laudas para falar de nossa alegria e emoção ao sermos recebidos com tanta fidalguia! Por ora, caríssimos Milton, Cláudia, Bê e Babi, deixamos aqui nosso agradecimento. Depois conto os “podres”, hehehe

Lord Broken Pottery: Milton, Boa companhia e comida farta. “Fartou” alguma coisa? Grande abraço

Flavio Prada: A raridade do encontro somada à raridade dos personagens, faz de tudo isso um momento precioso. Gente da melhor qualidade, e digo isso sem um minimo de confete, é sentido. Beijos a todos.

Ana Letícia: uahahahahaha Amei isso de “penis paralizator”!!! Tadinhos dos pombinhos enamorados, tentando comemorar longe dos “filhotinhos” os vinte e alguns anos de casamento… Crentes que teriam uma lua de mel digna dos “velhos” tempos… hehehe Milton, será que a Cláudia não é parente da minha mãe? Conversem aí e depois me contem, pois aqui em casa quando tem visita é a mesmíssima coisa! 😉 Beijos, obrigada por recebê-los, e adorei o post!

Eduardo: Milton, desejo que tudo corra à contento. Comam bem! Abraços!

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Uma polêmica suscitada pela Zero Hora

No sábado retrasado (07/03), o jornalista Gustavo Brigatti, meu amigo, deu novamente mostras de que não é nada tolo. Com sua cara de Gary Oldman bonzinho, escreveu o artigo de capa do Segundo Caderno — chamado Ópera? Só no cinema — sabendo que expunha dois corpos a leões barulhentos, irônicos e domiciliados fora do Rio Grande do Sul. (Conclusão minha, não falei com Gustavo). Não é responsabilidade dele se Fernando Mattos, compositor, violonista e professor do Departamento de Música da UFRGS, decidiu ter seu momento de tolice bem na frente do jornalista. E muito menos se Mônica Leal disse mais uma de suas bobagens, até porque é incapaz de outra coisa.

O fato é que pensei em mandar o artigo para dois outros amigos meus: o pianista Carlos Morejano e o tenor Flávio Leite. Eles saberiam destroçar os pobres argumentos de Mattos e, bem, não precisariam preocupar-se com Mônica Leal pois ela parece programada para apenas emitir destroços. É fato óbvio que o Rio Grande do Sul dá uma contribuição fundamental para a cena operística. Ele exporta — ou melhor seria dizer deporta, desterra, elimina, proscreve ou, quem sabe, expatria? — os muitos talentos que produz.

A declaração de Fernando Mattos …

— Aqui no Rio Grande do Sul não há gente especializada, principalmente solistas. E isso diminui muito o repertório, obrigando a usar um ou dois profissionais locais e trazer o resto de fora até do país.

… comprova sua dedicação exclusivíssima à UFRGS e à vida acadêmica, pois de cada 20 escolhidos para o Guaíra, dez são a metade (vide artigo abaixo).

E a declaração de Mônica Leal…

— Ocorre que o patrocinador, ao investir em determinado projeto, avalia o mercado e as suas demandas. Se há público em Porto Alegre interessado, certamente haverá patrocínio. Mas não cabe ao Estado promover estes eventos. Cabe, isso sim, incentivá-los.

… é mais um atestado de que o Rio Grande irá contrariar as expectativas de todos. Sim, nosso estado se tornará um deserto, mas primeiro virá o deserto cultural, só depois vindo o outro, o da Aracruz.

Contudo, eu não mandei e-mail nem para o Flávio nem para o Morejano. Fico feliz por saber que não precisava, pois Flávio conseguiu espaço no Caderno de Cultura de ZH do último sábado a fim de reduzir a pó os argumentos do re-putado professor e da putativa filha do coronel. Respondam a isso. Quero ver.

Por uma ópera não só no cinema

O tenor Flávio Leite critica a falta de uma temporada lírica regular no Estado, lembra que temos bons profissionais especializados e cobra uma reflexão mais séria sobre o tema.

A inserção de Porto Alegre no circuito internacional de transmissões nos cinemas das produções de óperas gravadas no Metropolitan de Nova York é um fato histórico na vida cultural da nossa cidade. Com um passado lírico glorioso, onde ouviu-se La Bohème de Puccini antes aqui do que em Viena ou no próprio Metropolitan, nossa capital vive em uma espécie de vácuo lírico há muitos anos por vários motivos – salvo heróicas iniciativas mesmo lutando contra as adversidades citadas na reportagem de sábado passado no Segundo Caderno (“Ópera? Só no Cinema”, de Gustavo Brigatti), não permitiram que o gênero que está lotando as salas de cinema em nossa cidade morresse.

Dentre essas adversidades citou-se a falta de apoio público no fomento e promoção da arte lírica. Lembremos que os casos nacionais de maior profissionalismo, sucesso e relevância internacional do gênero como o Festival Amazonas de Ópera, que atrai turistas do mundo todo a Manaus com uma temporada invejável e a temporada do Teatro Municipal de São Paulo, acompanhada pelas principais revistas especializadas da Europa, para citar somente dois exemplos, são iniciativas da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas e da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, respectivamente, contrariando a afirmação da filha do Coronel Pedro Américo Leal, atual Secretária da Cultura, que não cabe ao Estado promover estes eventos. Triste a má sorte dos gaúchos amantes de música, pois foi em um governo do mesmo partido de nossa governadora que São Paulo ganhou a revitalização e transformação da Osesp em uma das principais orquestras da atualidade.

Outro depoimento que me causou estranheza no mesmo artigo foi o do respeitado acadêmico Fernando Mattos, quando afirma que um dos motivos da impossibilidade de uma temporada lírica no Estado seria a falta de profissionais especializados, principalmente solistas, forçando a importação de tais profissionais encarecendo e impossibilitando o processo. Tal afirmação surpreendeu-me duplamente, pois na vida profissional ocorre exatamente o inverso. Somos muitos gaúchos em carreira pelo resto do país e exterior justamente porque aqui não temos um mercado profissional de atuação.

O número de cantores líricos gaúchos altamente especializados em carreira profissional no resto do país e no Exterior é mais do que significativo. Além de presença nas temporadas do Rio, São Paulo, Manaus, Belo Horizonte e Belém, citemos por exemplo a última montagem de L’Elisir D’Amore, de Donizetti, em Florianópolis, onde quatro dos principais solistas, escolhidos por concurso público, eram gaúchos. O soprano Cláudia Azevedo, que se alternava no papel de protagonista com a também gaúcha Carla Domingues, é detentora de feitos importantes, como seu título de especialista em ópera pelo Conservatorio Superior del Liceu em Barcelona, sua premiação no Concurso Internacional de Canto Bidu Sayão, sua atuação no mais importante festival de verão da Europa, Rossini Opera Festival de Pesaro na Itália e seu debut agendado ainda para este ano no mítico Teatro Colón de Buenos Aires.

Outra prova da qualidade dos artistas líricos gaúchos está ocorrendo no Teatro Guaíra, em Curitiba, onde está acontecendo o segundo módulo de um Ópera Estúdio, um curso de aprimoramento de alto nível para jovens cantores profissionais, inédito no país, com professores vindos da Itália, oriundos de teatros como alla Scala e La Fenice, onde das 20 vagas oferecidas para todo o país 10 dos participantes aceitos, também via concurso público, são gaúchos. Isso para citarmos alguns nomes da nova geração, sem mencionar profissionais gabaritados e com ampla experiência internacional da geração anterior, como o soprano Laura de Souza, os tenores Martin Mühle e Juremir Vieira e o baixo Luiz Molz, alguns não ouvidos aqui desde os tempos de estudante.

O outro motivo que cabe salientar é o fato de que em nenhuma casa de ópera importante do mundo se faz uma temporada somente com artistas locais, pois nem em Viena, Paris ou Londres existem especialistas locais para todos os papéis do repertório. Podemos não ter uma Lucia de Lammermoor de primeiro calibre em Porto Alegre, mas mesmo no Met, com os seus US$ 300 milhões de orçamento e sua centenária tradição, a estrela Anna Netrebko deixou a desejar em sua conhecida ária da loucura quando deixou de cantar um de seus esperados mi bemóis superagudos na performance conferida pelos porto-alegrenses no último domingo no cinema.

Cobrar a perfeição existente somente no Walhalla acadêmico e tachar as parcas tentativas de sobrevivência do gênero em Porto Alegre, de beirar o ridículo, não preenchem a lacuna deixada pela falta de regularidade de produções operísticas em nosso Estado. É necessária uma reflexão séria por parte de artistas, produtores, autoridades, patrocinadores, acadêmicos e público para que os gaúchos que superlotaram as salas de cinema e controlaram seu impulso de aplaudir uma ópera gravada, possam honrar o seu passado e voltar a se emocionar com o fenômeno da voz ao vivo.

FLÁVIO LEITE
Tenor gaúcho

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!