A cusparada de Jean Wyllys

A cusparada de Jean Wyllys

Samir Machado de Machado escreveu em seu perfil no Facebook e eu assino embaixo:

Bolsonaro, esse buraco negro da decência humana, que já disse que “nenhum pai tem orgulho de filho gay”, que “gay é falta de porrada”, que acaba de elogiar um torturador de mulheres e crianças e a própria ditadura em pleno regime democrático, recebeu uma cusparada que errou e acertou no deputado Heinze, aquele que declarou que “indios, quilombolas e gays são tudo o que não presta”.

Mas as pessoas estão indignadas com a cusparada.

wyllys-bolsonaro

Um Congresso que soma ignorância e analfabetismo político

Um Congresso que soma ignorância e analfabetismo político

O que vimos ontem foi simplesmente a Democracia Brasileira atuar. Não foi um atentado à democracia porque aqueles caras ali foram colocados lá por nosso povo ignorante. No espetáculo deprimente e despudorado de ontem à noite, ficou claro como este Congresso eleito caga para a sociedade. Era todo mundo pensando apenas em si, num nível impar de vulgaridade e deselegância. O que era aquele “Tchau, querida”? Lá no Congresso, não chegou o feminismo e nem nada que seja moderno, com raras e honrosas exceções.

Impeachment 6

Há anos eu digo que o maior e mais nefasto dos movimentos sociais é o das igrejas neopentecostais. Acostumadas à corrupção de pastores hábeis em extirpar dinheiro da ignorância, tendo o conservadorismo e o (falso) moralismo no DNA e adubadas pelos governos — inclusive por este — vão levar esse país a um retrocesso abissal. Pobre Brasil, na mão desses caras.

Um país que não educa acaba somando ignorância a analfabetismo político, como bem disse Jean Wyllys. Infelizmente, o Congresso é a nossa cara. A cara de um país de baixo nível educacional. E estamos entregando o país a uma quadrilha chefiada pelo pilantra Eduardo Cunha. Qual é a primeira coisa que deve ser destruída pelo novo governo? Teus direitos trabalhistas, meu amigo. Sim, estes mesmo que foram conquistados palmo a palmo durante anos.

Alguém fez uma busca no registro escrito da sessão da Câmara dos Deputados de ontem, levando em consideração apenas as falas durante a votação. Foram encontrados os seguintes termos:

Deus: 61 citações
Família: 307 citações
Crime de responsabilidade: 29 citações
Pedaladas: 6 citações
Lei de Responsabilidade Fiscal: 1 ocorrência

Pois é. É hora de respirar, tentar manter a calma e pensar em como ir organizadamente para a rua, pois o Congresso está dominado por um bando de hipócritas que só falam em Deus e na família. E não pensem que amo o Governo Dilma, por favor.

Um belo e novo junho para todos!

Os gatinhos da Ospa e a ascensão do conservadorismo pela via religiosa

Os gatinhos da Ospa e a ascensão do conservadorismo pela via religiosa
Volo 1
O volume 1 da numerosa série

Com a ajuda dos amigos FM e MPN.

Não tem nada a ver? Pois tem sim.

Prelúdio

Lembram aquelas seleções de clássicos dos anos 70 e 80 que tinham gatinhos na capa? Ali, o Aleluia de Handel podia vir antes de Rhapsody in Blue, a qual era seguida da Abertura 1812, por exemplo. Salada semelhante foi servida  na noite de ontem. A Ospa estava cheia de gatinhos, óin… Claro que isto não cria público. Este gênero de programa é válido apenas em séries de concertos para escolas ou como eram os velhos “Concertos para a Juventude”, mas, enfim. O apelido “Disco de Gatinhos” ou “Concerto de Gatinhos” é de autoria do Júlio e da D. Cristina lá da King`s Discos, esplêndida loja que ficava na Galeria Chaves. Eles não gostavam muito daquelas seleções… Nem eu.

Allegro politico

Eduardo Cunha, o homem que está tentando — e que provavelmente conseguirá — acabar com direitos trabalhistas conquistados em décadas de lutas, é fiel da Assembleia de Deus. Faz parte da bancada religiosa que infestou o Congresso Nacional. É um lutador, um fundamentalista encarniçado, um homem perigoso.

Vitória em Cristo...
Retrocesso e maior sofrimento para os trabalhadores em Cristo

Já eu e todos os que estão em greve hoje acham que ele é um criminoso. Afinal, ele está jogando nossos direitos trabalhistas fora em nome do pagamento do lobby dos empresários que financiaram a campanha eleitoral dele e de outros. Foi isso que os deputados fizeram quando aprovaram o projeto que beneficiava os empresários. Nós, é claro, ficamos apanhando do lado de fora do Congresso, sem poder entrar.

Enquanto a bancada religiosa acaba conosco, nós paricipamos de um um festim fora do Congresso
Enquanto a bancada religiosa nos fodia no Congresso, um flagrante da festa lá fora

Eduardo Cunha — como costuma ocorrer com os evangélicos — também é um conservador. Ele representa uma oligarquia política oportunista que se aproveita de um governo fraco e desestabilizado para fazer o Brasil retroceder para aquém das mínimas conquistas de melhoria da qualidade de vida, tudo sob a lógica do “melhor um trabalho péssimo que nenhum”, chantagem canalha que apresenta apenas duas alternativas quando existem múltiplas.

Eduardo Cunha é do PMDB e é um sujeito que usa as palavras gay e feminismo como se fossem palavrões. E diz coisas incríveis: “Eu não acho que o homossexualismo deva ser imposto à sociedade”. Eduardo Cunha é do PMDB. O governador Sartori é do PMDB. E a Ospa é do Governo do Estado.

Desculpem o mau gosto da foto | Foto: Guilherme Santos / Sul21
Cunha e Sartori ouvindo Temer: desculpem o mau gosto da foto | Foto: Guilherme Santos / Sul21

Adagio difficili da uccidere

Tal orquestra seminômade criou o projeto OSPA nas Igrejas. Os espaços que o projeto ocupava eram restritos às mais tradicionais instituições religiosas, mas é legítimo que outros espaços de culto reivindiquem concertos, não? Antes dos terreiros de umbanda, dos budistas e do candomblé, os evangélicos saltaram à frente na disputa, pois o momento é de ofensiva social e política deles. Quando eles tomarem o poder em Brasília — pois é essa sua intenção — teremos o maior espetáculo de incultura, burrice, arrogância, intolerância e estupidez de todos os tempos. Nosso país sem educação permitirá tudo a eles. E ontem o concerto (de gatinhos) foi no Templo da Assembleia de Deus da General Neto. Os admiradores da boa música em salas adequadas e humanistas que não têm simpatias pelas relações entre instituições públicas e templos religiosos lastimam e se afastam. Este projeto, ruim na origem, torna-se cada dia pior. No momento político atual do Brasil e do mundo, é um temerário apoio ao furor teocrático dos neopentecostais que são adulados por quase todos os políticos com a exceção de poucos partidos..

Vão me dizer que a orquestra precisa de locais para dar seus concertos, mimimi que justifica o afago feito ontem ao poder mesmo que este esteja no arcabouço de uma tendência que nos empurra mais para perto da tragédia do fundamentalismo. Todos querem ficar bem com a(s) igreja(s). Elas dão votos agora e problemas logo depois, se quisermos voltar a Eduardo Cunha e à famigerada bancada religiosa.

A nova sala de concertos
A nova sala de concertos na General Neto, em Porto Alegre

Presto breve

Nem deveria ter escrito isso. A maioria dos cristãos odeia demais e vou ter que moderar os comentários furibundos deles. A pessoa que tem fé deveria procurar só fazer coisas dignas dela, não? Afinal, acho que não desejam perder a salvação assim no mais, ofendendo um ateu bobão como eu.. Só que “Narciso acha feio o que não é espelho” e eles são odiadores profissionais. Prova de que religião não define caráter.

Coda

Não fui ao concerto de ontem.

Notinha sobre a politização da justiça ou a judicialização da política

Já vou me defendendo, garantindo que sou pela democracia. Obviamente, não sou a favor do fechamento do Congresso como fizeram o AI-5 de dezembro de 1968 e o Marechal Deodoro em 1891. Aliás, no mesmo ano, Júlio de Castilhos impunha uma Constituição no RS que eliminava a divisão dos três poderes… Porém, o que vemos hoje é um auto-fechamento, em que o Congresso vai lentamente pedindo demissão das grandes questões, deixando cada vez mais espaço para o Judiciário. Afinal, o mundo segue girando e alguém fatalmente teria que tomar os passos ao encontro de questões como o aborto de anencéfalos, o casamento gay, as cotas, as marchas da maconha, o uso do twitter, etc.

Pois é evidente que, invertendo joyceana e artificiosamente as palavras, a judicialização da política leva à politização da justiça, o que é mesma coisa, mas muito mais claro.

Enquanto isso, em nosso Congresso Nacional, tivemos na última quinta-feira um debate sobre a Cura Gay. O deputado homofóbico João Campos (PSDB-GO) queria sustar a tardia resolução do Conselho Federal de Psicologia que definiu apenas em 1999, que os profissionais da área não patologizariam práticas homoeróticas e não colaborariam com serviços e eventos que proponham tratamento e cura da homossexualidade.

Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados.

Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.

Estas tímidas linhas, perfeitamente razoáveis, foram alvo dos ataques de João Campos, o qual obteve tempo no Congresso para encher o saco. Ou seja, o Congresso fica alheio aos mais importantes debates nacionais, ficando nas mãos de uma bancada religiosa que é tratada com atenção até pela presidenta, uma ex-pagã. E há outras judicializações, a da saúde, por exemplo, da qual nem vou tratar.

A nomeação de um novo aiatolá para o STF é um fato fundamental para o país. Afinal, aqueles guardiões da Constituição tornaram-se legisladores num país onde o Congresso parece cada vez mais incapaz de criar leis, engessado pela bancada religiosa, pela governabilidade. Este ano, dois aiatolás serão aposentados — Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso. Resta pedir a Dilma Rousseff que coloque alguém a favor do aborto, da laicidade do estado, do fim da imunidade tributária religiosa, dessas coisas que nos farão evoluir.

(Porém, na esfera gaúcha, a excessiva judicialização já começa a fazer água. O MP tentou interditar o Beira-Rio — questão menor, talvez ligada à grenalização do estado — e se deu mal. Cômico.)

Toda a beleza homofóbica de João Campos (PSDB-GO).