A estupidez triunfante: o ódio de Sartori e de certa direita à cultura e à ciência

A estupidez triunfante: o ódio de Sartori e de certa direita à cultura e à ciência

O Tribunal de Justiça Militar permanece. Só Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo têm tais maravilhas de notável utilidade. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já sinalizou que poderiam ser extintos para dar lugar à criação de câmaras especializadas nos Tribunais de Justiça dos estados para julgamento de processos de competência militar. O órgão gasta R$ 36 milhões ao ano, 26% de tudo o que o governo da anta Sartori pensa economizar com a extinção de fundações estaduais. Mas são milicos, não fazem pesquisa nem divulgam cultura. São gente boa.

Já a Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec), a Fundação Piratini (TVE e FM Cultura), a Fundação de Economia e Estatística (FEE), Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro), a Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (Fepps), a Fundação de Zoobotânica (FZB) e a Companhia Rio-grandense de Artes Gráficas (Corag) têm grande ligação com a produção científica e cultural do estado. Então devem ser extintas.

A burrice do governo olha apenas a despesa, sem buscar novas receitas. Não creio que nosso modelo federativo livre-se das isenções fiscais que somam R$ 9 bilhões por ano — pura e puta renúncia fiscal. Mas o governo recusa-se a ir atrás dos R$ 7 bilhões por ano de sonegação realizada basicamente por empresários. E quando vemos que a economia prevista com a extinção das empresas constantes no pacote de Sartori é de 137 milhões anuais — eu escrevi milhões, não bilhões –, só posso concluir que há um enorme ressentimento e ódio à ciência, à cultura e ao conhecimento.

Por outro lado, não temos uma imprensa plural. Os governos petistas nem tentaram alterar tal situação. Não houve a tão propalada democratização dos meios de comunicação, só o pagamento de alguns blogs. O monopólio da informação permanece e atrapalha qualquer reflexão crítica. A RBS, por exemplo, faz a assessoria de comunicação de todos os governos alinhados com o mercado, com a direita e com o senso comum evangélico. Servidor é vagabundo? Sim, é. Então vamos acabar com esses caras que só mamam na teta do estado.

Se as extinções ocorrerem como parece que vão, certamente haverá uma corrida de CCs vindos dos partidos aliados. Afinal, como ficar sem a FEE, por exemplo? Em substituição, vão contratar consultorias dos amigos, claro.

Eu não votei em Sartori, é claro. Não tenho grande visão política, mas o mundo me ensinou a avaliar pessoas e jamais votaria num cara flagrantemente mais ignorante, inepto e palerma do que eu. Ele está no posto para fazer um trabalho em benefício de grandes empresários. E só.

Fico deprimido de pensar que o local onde hoje está a TVE / FM Cultura talvez vire outra coisa. Fico fulo ao ver empresários e empresas sonegadoras protegidos. Fico desapontado com quem votou neste asno. Paralelamente, sorrio ironicamente com o ridículo discurso de fachada de que tais atos tirarão nosso Estado da situação de calamidade.

Sartori apontando sua falha.
Sartori apontando sua falha.

Sartori, em vez de extinguir Fundações, que tal ir atrás dos sonegadores ?

Sartori, em vez de extinguir Fundações, que tal ir atrás dos sonegadores ?
Foto: Guilherme Santos / Sul21
Foto: Guilherme Santos / Sul21

Anos atrás, eu prestava consultoria ao setor de TI da FEE. Gostava do ambiente e da criteriosa seriedade das pessoas de lá. Além disso, a utilidade e a qualidade do trabalho realizado também era clara. Era uma série de atividades voltadas para a geração de indicadores, tabulações, perfis econômicos, publicações, trabalhos acadêmicos, etc. Ficava tão feliz, a sensação de ser útil era tão grande que sempre ultrapassava o número de horas contratadas. A Fundação é de 1973. Tem, portanto, 43 anos de serviços prestados.

Como ouvinte, sou fã absoluto da FM Cultura 107.7, da Fundação Piratini. É a melhor rádio do dial do FM. O que dizer das horas e da cultura que ganhei no Sessão Jazz do Paulo Moreira, no Conversa de Botequim, na Manhã Popular Brasileira, no Contracultura, no Estação Cultura, no Cultura na Mesa e no pré-antigo As Músicas que Fizeram sua Cabeça?

Agora, Sartori pretende acabar com as duas Fundações e mais sete que conheço muito menos, quase nada. É o que diz a tabela que anexo abaixo, publicada hoje em ZH.

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Sem medo de errar, sei que a FEE será substituída por mil consultorias contratadas. E vocês sabem como são estas contratações. Eu sei. Lá por 2008, perdi uma empresa por me negar a pagar propina a um gestor federal. Ele ficou indignado pelo fato de eu ter escolhido ser correto. Procurando vingança, até nos processou por “maus serviços”. (Vejam só, a FEE nos contratara sem esquema no passado. Já esta outra…)

Seria irresponsável acusar alguém ou o governo de querer fazer o mesmo. Mas acho absurdo este descarte de importantes empresas. Ouço e leio o choro do governo do RS: “não temos dinheiro”, “são empresas desnecessárias”. Porém, curiosamente, o governo gasta milhões em propaganda para dizer que economiza muito. OK, na opinião deles há que chegar ao estado mínimo, só que não temos o mínimo de saúde e educação. E, quando fala em déficit, o governo olha principalmente as despesas, cuidando muito menos das receitas.

O que o Pezão Feltes, nosso Secretário Estadual da Fazenda faz contra a sonegação? Olha, não ouço falar nisso. É só mimimi sobre despesas com funcionalismo — que nem pode sonegar — e extinções.

Acho que lucro é igual a receita menos despesa. Então, tão importante quanto cortar despesas é aumentar a receita.

E Feltes, o Sindicato dos Técnicos Tributários da Receita Estadual do RS (Afocefe) e do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz) afirmou em 18 de agosto que a sonegação de ICMS no RS chegara a R$ 4,5 bilhões até aquela altura, considerando apenas o ano da graça de 2016.

Isso é dinheiro grosso, não? A FEE, por exemplo, gasta R$ 22 milhões com celetistas em um ano, ou seja, 204 vezes menos.

Por que não ir atrás? Por que é antipático? Por que incomoda os amigos que financiaram as campanhas? Que tal tentar resolver a coisa pelo outro lado? É mais gostoso chorar e assim justificar a inação?

A CPMF é um imposto justo… O aumento do ICMS não prejudica os pobres… Conta outra!

A CPMF é um imposto justo… O aumento do ICMS não prejudica os pobres… Conta outra!
Sartori aumenta o ICMS, Levy e Dilma o CPMF. No meio, estou eu.
Sartori aumenta o ICMS, Levy e Dilma o CPMF. No meio, estou eu.

Como disse o Charlles Campos, Charles Dickens é uma das razões pelas quais a vida merece ser vivida. O escritor inglês tinha uma receita de felicidade, nascida certamente do fato de, na Inglaterra vitoriana, haver uma lei que podia levar à prisão quem tivesse dívidas. Tal lei fez o pai de Dickens sofrer muito. A citação-receita é a que segue.:

Annual income twenty pounds, annual expenditure nineteen [pounds] nineteen [shillings] and six [pence], result happiness. Annual income twenty pounds, annual expenditure twenty pounds ought and six, result misery.
Mr. Micawber em David Copperfield, de Charles Dickens

Esta citação está enorme numa das paredes do Charles Dickens Museum. Ela é o maior argumento de que a CPMF — imposto que de “contribuição” não tem nada –, é desigual e injusta. Na citação, o cara ganha 20 pounds por ano. Se gasta menos no período, é feliz; se gasta mais, é miserável. É verdade. Posso comprovar, afinal, sou jornalista. Se gasto mais do que ganho, posso passar meses recuperando a perda. Meus ganhos me obrigam a ser financeiramente contido. Deste modo, gasto o estritamente necessário. Tenho uma planilha do Excel onde anoto cada centavo que entra e sai. Sei que se deixasse a coisa se descontrolar, teria graves problemas. A CPMF virá para mexer um pouco neste equilíbrio, pois a inflação que gerará vai atingir a todos.

Ela pode ser maravilhosa na opinião de quem está singrando os mares num transatlântico ou num iate, porém para nós, que vamos num barco a remo, qualquer marolinha pode nos deixar de cabeça para baixo.

A inflação oficial dos últimos 12 meses é de menos de 10%. O IBGE fala em 9,88%. Mas a Inflação-Milton, por exemplo, é de mais de 20% no mesmo período. A faculdade da filha, o supermercado e os serviços de autônomos — ah, os vazamentos… — garantem o aumento. E a CPMF virá só para piorar a situação. Aposto que os comerciantes vão meter a mão em muito mais do que os 0,20% anunciados.

Seria até boa uma CPMF bem pequena, com muitos zeros após a vírgula. Não pela arrecadação, mas como mecanismo para monitorar as movimentações financeiras com a finalidade de combater a sonegação.

Hoje pela manhã, o “Sonegômetro”, do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, batia em R$ 374,5 bilhões desde janeiro de 2015. Como o “Impostômetro”, mantido pela da Associação Comercial de São Paulo está em 1,439 trilhão, temos que a sonegação corresponde a mais de 25% do que é arrecadado e é sete vezes mais do que a corrupção calculada no país. Mas só se fala em corrupção. A sonegação é coisa de quem ganha muito, coisa de empresas, coisa de quem paga publicidade, então é melhor ficar quieto.

Correr atrás da sonegação cansa nossos governantes. Então, eles preferem aumentar os impostos. É chato brigar com quem financiou a campanha… Nossos impostos aumentam para pagar o que devem os sonegadores, mas ninguém protesta contra eles.

Amanhã, será votado o aumento do ICMS aqui no RS. Vai passar, claro, e vai aumentar tudo, os impostos dos bens rurais e industriais. E tudo virá sobre a nossa cabeça. A sonegação de ICMS no estado é enorme, basta ver a quantidade de vendas sem nota — uma comprovação bobinha e visual –, só com o ticket do Cartão de Crédito, como tentaram fazer comigo na semana passada.

Nesta onda de aumentar impostos, Dilma e Sartori querem ver minhas planilhas pintadas de vermelho. E eu fodido. Ir atrás da sonegação, ah, isso ninguém quer.