A um Escritor que Amo

Quando o li pela primeira vez, foi por exigência do colégio. Tinha 14 anos e foi uma revelação. Nunca antes me deparara com nenhuma atividade que me interessasse de verdade. Não queria ser médico ou engenheiro – tinha eu 14 anos de idade… – mas poderia ser aquilo. Escreveria livros! A partir daquele, comecei a procurar outros do mesmo autor e notei como ele frequentemente citava músicas. Ora, meu pai era um homem de muitos discos, então era fácil conhecer as coisas de Beethoven, Mozart, Brahms e Bach de que ele falava. Depois, conheci Herbert Caro, que — amigo de Erico — fez-me uma relação verbal das músicas que ele ouvia repetidamente em casa, enquanto escrevia ou nos intervalos. Sabe-se hoje que Erico Verissimo deixou por escrito a recomendação de que, se quisessem lembrá-lo no futuro, não precisariam fazer grandes homenagens e discursos, bastaria reunir seus amigos e leitores “numa noite, qualquer noite” e tocar um “dos últimos quartetos de Beethoven, algumas sonatas de Mozart e qualquer coisa do velho Bach. E o resto – que diabo! – o resto é silêncio.”

Ontem à noite, fui a um concerto em homenagem aos 100 anos de nascimento de Erico Verissimo – ele nasceu em 17 de dezembro de 1905. Executou-se um quarteto de Mozart, outro de Beethoven e o esplêndido Op. 25 de Brahms. Foram apresentados por membros do Salzburg Chamber Soloists Ensemble. O fundador e regente desta orquestra é um portoalegrense chamado Lavard Skou-Larsen. Lavard é um violinista filho de mãe brasileira e pai dinamarquês e, mesmo morando desde os 4 anos em Viena, conhece a obra de Erico por influência de sua mãe. O concerto foi espetacular, com destaque para a violoncelista – e mulher de Lavard – Adriane Savytzky, para a pianista israelense Revital Hachamoff e para o entusiasmo, tesão e alegria de todos. Não houve discursos. Com fotos de Erico por todo o lado, ouvimos música. A empresa patrocinadora fez das suas apresentando um vídeo institucional, mas sabemos que sem patrocínio não tem concerto. Se todas as homenagens a Erico forem deste porte, teremos um grande final de ano em Porto Alegre.

Erico viajava muito ao exterior e costumava dizer aos que não conheciam Porto Alegre: “Moro numa cidade que tem Orquestra Sinfônica”. Para ele, isto demonstraria inequivocamente nosso tamanho, civilidade e humanismo. Tinha razão. Espero que a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre não esqueça dele.

P.S.- Esta pequena crônica foi escrita em abril de 2005. Sim, a Ospa homenageou Erico no concerto do dia 13 de setembro de 2005. O programa não foi um horror, mas também não incluiu nada que o escritor especialmente admirasse: começou com a Abertura da ópera “Fosca” de Carlos Gomes, depois veio o Concerto para Piano e Orquestra em lá menor de Schumann e finalizou com a Sinfonia nº 4 em ré menor, também de Schumann. Poderiam ter lido trechos de seus livros, apresentando as músicas depois, mas como são uns béocios, perderam a oportunidade. Uma pena.

7 comments / Add your comment below

  1. Conheço pouco o Érico Veríssimo. Li Incidente em Antares e não gostei; depois disso, cataloguei-o entre o realismo fantástico (detesto) e o regionalismo (que pode ser bom, mas de acesso difícil ao citadino provinciano que se quer cosmopolita, mas permanece mais afim aos costumes de Paris do que os de Juazeiro do Norte).

    Me indique outro livro dele para uma segunda chance,

    Gosto de Schumann e do concerto para piano citado. Tem todos os clichês do romantismo. Creio que o melhor (e o pior) que restou do romantismo os clichês. Aí a gente escolhe o melhor deles (Schumann) e o pior (Jean-Paul, o cultuado – por Schumann – poeta).

    Podem tocá-lo no meu centenário. Não estarei aqui para ouvi-lo.

  2. Milton, por ironia antes de entrar no seu blog, estava lendo no “Recordar, Repetir e Elaborar” e nesse blog ateaquitudobem.blogspot.com, uma discussão a respeito da tal “escrita feminina”, (rótulo que abomino, pois o que existe é boa literatura ou não) e imediatamente lembrei do Érico Verissimo, que injustamente também sofre com um rótulo idiota, de escritor regionalista. O Érico também é o meu escritor predileto. Assim como tu, comecei a lê-lo por indicação do colégio, deveria ler “O Continente”. Mas gostei tanto que após ler “O Continente”, fui imediatamente à biblioteca do colégio para ler os livros restantes de “O Tempo e o Vento”. Tenho 27 anos e essa passagem marcou a minha adolescência.

  3. Eu só li Incidente em Antares e gostei. Parei por aí sem motivo. Também espero alguma indicação pra me reaproximar.

    Poxa, não falem assim do Schu-Schu. Eu gosto dele. Não tanto como Chopin, e sem dúvida menos do que Lizst (meu preferido), mas gosto.

  4. Bem, eu indicaria O Tempo e o Vento completo, com destaque para O Arquipélago. Gosto de alguns romances menores como O Resto é Silêncio e O Senhor Embaixador, e dos maravilhosos livros de memórias Solo de Clarineta, Vols. 1 e 2.

    Gosto também do humor de Incidente em Antares, um livro talvez superestimado.

    Li tudo isso antes dos 20 anos… Poderia ter outras opiniões hoje.

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