Um ano de Bamboletras

Hoje, 12 de março, faz um ano de uma de minhas maiores loucuras, a de me tornar livreiro aos 60 anos. Se era um sonho antigo, também era um daqueles que todo mundo tem em devaneios irrealizáveis. Às vezes pensava em me tornar um velhinho de óculos vivendo em meio aos livros… E ia fazer outra coisa. Neste último ano, várias pessoas me cumprimentaram pela coragem. Não me acho corajoso. Apenas corri atrás quando soube que a Lu queria repassar a livraria a quem a mantivesse. E larguei a atividade de jornalista sem olhar para trás. A Elena ri, diz que eu garanti uma terapia ocupacional vitalícia, o ideal para quem nunca pensou em se aposentar. Ela está certa. Mas olha, jamais pensei que desse tanto trabalho. É claro que há uma maioria esmagadora de bonitos momentos atrás do balcão, mas há também um intenso trabalho de retaguarda que aprendi do zero.

Auden escreveu que “Quando o processo histórico se interrompe, quando a necessidade se associa ao horror e a liberdade ao tédio, a hora é boa para se abrir um bar”. Talvez por não haver tédio nem horror, apenas necessidade e liberdade, virei livreiro e não dono de bar, sei lá.

A Livraria Bamboletras é um ícone de Porto Alegre. A Livraria Bamboletras é um ícone de Porto Alegre criado com extremo cuidado e carinho pela Lu Vilella. Digo-lhes claramente que virei um livreiro por herança. Tentei preservar o estilo ao máximo, mas inevitavelmente uma nova cara deve ter aparecido.

Sim, nosso acervo é escolhido criteriosamente e não apenas recebido; sim, ficamos felizes quando um cliente retorna e diz que nossa última sugestão foi fantástica e que o livro era ótimo (conhecemos o que vendemos); sim, há muita tensão em razão do mercado instável; sim, as distribuidoras querem nos enfiar best sellers; sim, vocês pedem e a gente vai atrás e muitas vezes dá certo (a gente se orgulha), outras vezes não (contrariedade); sim, estamos com todas as contas em dia mas não pensem que sobra muita coisa (a gente realmente quer ver vocês nos visitando mais, sabe?); sim, coloquei a herança da minha mãe na compra da livraria; sim, ainda estamos pagando a citada ex-dona que deixou a Bamboletras assim tão linda (fazemos isso direitinho); sim, fizemos e fazemos parcerias com escritores, instituições, artistas e bares; sim, vamos atrás dos melhores lançamentos às vezes enchendo o saco de meio mundo (às vezes, receber uma reposição ou livros para um evento mais parece um thriller); sim, visitamos as distribuidoras para escolher as obras uma a uma e… Não, não pretendemos ser menos exigentes.

A Bamboletras não sou eu, é uma equipe. Tem a Bárbara, a Cacá, a Eliane, o Gustavo, a Zair. E durante o ano ainda tivemos a Ana, a Josi e a Vitória. É uma baita equipe e falo da qualidade. Agradeço a todos.

Só não pensem que é fácil. Aliás, qual é o trabalho sério que é fácil? Porém é também divertido, estou muito feliz.

Ah, dia 24 de abril faremos 24 anos sempre independentes e agora, devido à circunstâncias que não vamos citar para não emporcalhar este texto pobre mas limpinho, também resistentes.

Particularmente, agradeço à Elena, à Bárbara, ao Bernardo e à Iracema pelo apoio neste ano e nos que virão.

E também a todos os que nos visitam e que apreciam nosso trabalho.

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