Atea denuncia Colégio Estadual gaúcho que teria tornado obrigatório o ensino religioso

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(Atualização das 19h25 de 19/03: a desmatrícula de Ensino Religioso foi finalmente autorizada, mas a diretora está ameaçando levar o garoto ao juiz para processá-lo, civil e criminalmente, por causa de uma gravação que ele teria feito. Não a ouvi, não procurei, nem quero que me mostrem).

A Associação de Ateus e Agnósticos do Brasil (Atea) enviou ofício ao Colégio Estadual Augusto Meyer, de Esteio (RS). A atitude deve-se ao fato de um aluno afirmar que o Ensino Religioso tornou-se disciplina obrigatória do currículo do Colégio. A denúncia partiu deste mesmo aluno do 1° grau, ateu, que informou que tanto a professora de Ensino Religioso, como a diretora e vice-diretora do Augusto Meyer, defenderam a obrigatoriedade da matéria.

A alegada obrigatoriedade do ensino religioso deu origem a incidente em uma dessas aulas, em que o aluno afirma que a professora riu dele por sua descrença, assim como os demais colegas, com a anuência dela, o que constituiria um caso de bullying.

A Constituição Federal tem como cláusula pétrea o Art. 5º, que estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

De acordo com o artigo 210 da Constituição Federal e a lei de Diretrizes e Bases da educação, o Ensino Religioso não é obrigatório, mas de matrícula facultativa.

O documento abaixo foi entregue na secretaria da Escola pelo aluno. Curiosamente, a secretaria recusou-se a dar o visto de “Entregue” na cópia que ficou com o menino.

OFÍCIO n.002 – 2013

A Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, entidade sem fins lucrativos sediada na cidade de São Paulo (SP) e registrada na Receita Federal (CNPJ) sob o número 10.480.171/0001-19, vem respeitosamente oficiar a sra. Nara Machado, diretora do Colégio Estadual Augusto Meyer, situado à R Rio Pardo, 1187, em Esteio (RS), tendo em vista o seguinte:

1. DOS FATOS

Informa-nos o adolescente X., ateu, regularmente matriculado na turma 104 do 1º ano do ensino médio do turno vespertino do dito estabelecimento desde o dia 07/03/2013, que a sua professora de Ensino Religioso, assim como a diretora e vice-diretora, alegam que o Ensino Religioso é disciplina obrigatória do currículo escolar que assim o obrigam a frequentar as aulas dessa disciplina

2. DO DIREITO

a) A Constituição Federal tem como cláusula pétrea o Art. 5º, que estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
b) O art. 3 da CF afirma que “constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil… IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
c) Em consonância com esse dispositivo, o ensino religioso estabelecido no § 1º do art. 210 da Constituição Federal se estabelece da seguinte maneira:
O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
d) A lei de Diretrizes e Bases da educação (Lei Nº 9.394, de 20/12/1996) repete e reforça a CF, lendo-se
“O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão”

e) um dos reflexos do princípio constitucional da igualdade é o princípio da impessoalidade da administração pública, expresso no art. 37 da Constituição Federal, que assegura que a neutralidade tem que prevalecer em todos os comportamentos da administração pública e veda a adoção de comportamento administrativo motivado pelo partidarismo. Custeada com dinheiro público, a atividade da Administração Pública jamais poderá ser apropriada, para quaisquer fins, por aquele que, em decorrência do exercício funcional, se viu na condição de executá-la. Cabe aos servidores públicos, portanto, informar a população de maneira correta a respeito da legislação vigente, sob pena de incorrerem em falta administrativa grave, além de violarem direitos fundamentais dos alunos e de seus pais.

f) Ainda que a maioria dos pais, alunos e/ou professores se identifique e esteja de acordo com a obrigatoriedade do ensino religioso, a lei não lhes faculta criar uma obrigação como se da lei viesse. Os direitos fundamentais são indisponíveis e portanto não estão sujeitos a voto.

3. DO PEDIDO

a) A alegada obrigatoriedade do ensino religioso deu origem a incidente que reputamos grave durante uma dessas aulas, em que o citado aluno alega que a professora riu dele por sua descrença, assim como os demais colegas, com anuência dela – o que constitui claro caso de bullying, envolvendo comportamentos extremamente inapropriados de alunos e de uma professora, o que em tese pode até configurar ilícito penal. A cessação da alegação de obrigatoriedade fará com que eventos desse tipo não mais se repitam com os alunos atuais ou futuros.
b) Caso a diretoria continue impedindo a desmatrícula do citado aluno, ou de qualquer outro, da disciplina de ensino religioso ao fim do prazo de 5 dias úteis a partir do recebimento desta, isso implicará nas medidas administrativas e judiciais cabíveis junto à Secretaria de Educação, ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público Estadual para garantir os direitos constitucionais dos alunos da instituição.
c) Para atestar a conformidade da instituição com a lei e informar corretamente os cidadãos, o colégio deve entregar uma circular a cada um dos alunos regularmente matriculados, e afixar uma cópia dela nos murais de cada uma das salas de aula, em que conste claramente que, segundo o art. 210 da Constituição Federal e a lei de Diretrizes e Bases da educação (Lei Nº 9.394, de 20/12/1996), o Ensino Religioso não é obrigatório, mas de matrícula facultativa, e que portanto a diretoria receberá e prontamente aprovará todos os pedidos de desmatrícula de Ensino Religioso dos interessados, nos termos da lei.
d) E para que fique plenamente documentada a posição da instituição, o colégio deve enviar uma cópia da circular e fotos dos avisos afixados nos murais do colégio através do email da Atea ([email protected]).

São Paulo, 18 de março de 2013

Daniel Sottomaior
Presidente
Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos