Borodin, Alexander (1833 – 1887): Danças Polovetsianas (ópera “Príncipe Igor”)
E lá vamos nós explicar mais um título! Quem diabos são os polovetsianos? O povo Cuman era também conhecido como Polovetsiano nos paises estavos orientais e pelos poloneses. Polovtsy significa “pálido, amarelo claro, loiro”. Eles eram um povo nômade turco. Após a invasão mongol em 1237, muitos buscaram asilo no Reino da Hungria. Eles habitavam uma área instável ao norte do Mar Negro e ao longo do rio Volga, mais conhecida como Cumânia. Eram guerreiros nômades ferozes, numerosos, culturalmente sofisticados e militarmente poderosos. A língua cumana é uma das que deu origem à atual língua turca.
Príncipe Igor é uma ópera de Aleksandr Borodin, escrita em quatro atos. O libreto foi adaptado pelo compositor a partir de uma epopeia do séc. XII (cuja autenticidade não tem consenso no meio acadêmico) – Canção da Campanha de Igor – que relata as lutas entre um príncipe russo e os polovetsianos, em 1185. A ópera foi deixada inacabada em razão da morte prematura do compositor em 1887 e foi concluída por Nikolai Rimsky-Korsakov e Alexander Glazunov. A estreia (póstuma) teve lugar em São Petersburgo, no teatro Mariinsky, em 4 de novembro de 1890.
Químico de reputação internacional, professor da Academia Militar de São Petersburgo, Alexander Borodin é hoje mais conhecido como compositor, apesar de esta atividade ter sido afetada pela sua carreira acadêmica.
As Danças Polovetsianas são uma das seções mais conhecidas de O Príncipe Igor, e encerram o 2º ato. A composição desta seção ocorreu em 1875 e ela foi estreada isoladamente em 1879. As Danças ocorrem num momento da ópera em que o protagonista, o Príncipe Igor, está preso no acampamento do chefe dos polovtsianos, Khan Kontchak, que o presenteia com um espetáculo em admiração pela sua valentia. O filho de Igor, Vladimir, também prisioneiro, está apaixonado pela filha de Kontchak, e este sentimento está subjacente no clima sensual da música inicial. Tal sensualidade ecoou na Broadway. O musical Kismet (1953), mais exatamente na canção Stranger in Paradise, usa a melodia de Borodin. Aliás, a música fez enorme sucesso na voz de Tony Bennet.
Borodin não utiliza a palavra sensual na partitura, mas manda a orquestra tocar de forma deslizante… Sim, a palavra deslizante está escrita na partitura logo no início, na Dança das Donzelas. Já a Dança dos Homens é caracterizada como ‘selvagem’ na partitura, seguindo-se a Dança Geral e a Dança dos Meninos. Todas estas seções vão sendo depois alternadas e revisitadas, num crescendo de energia que desemboca no clímax final.
As “Danças Polovetsianas” são o principal destaque principal da ópera e ocorrem ao final do segundo ato. Este trecho costuma ser apresentado em forma de concerto ou como balé por diversos teatros do mundo. O libreto é tipicamente de ópera, cheio de reviravoltas e situações difíceis de explicar. Conta que o Príncipe Igor e seu filho Vladimir lideraram um ataque aos Polovetsianos no século XII, tomaram uma tunda e acabaram prisioneiros. Porém, são tratados como nobres, com luxos e belas mulheres. Em admiração à coragem dos prisioneiros, o chefe Khan Kontchak resolve dar uma demo da cultura polovestsiana. Igor e Vladimir assistem boquiabertos às “Danças Polovetsianas”. Na ópera, depois, Igor arma uma confusão e consegue fugir, votando para a Rússia enquanto o filho fica por lá, casado com a bela filha do líder polovestsiano. Nada como o amor.
Apresentação: Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA)
Quando: 01/10/2022 às 17h
Regência: Manfredo Schmiedt
Solistas: Leonardo Winter (flauta piccolo)
Direção Artística: Evandro Matté
Participação Especial: Coro Sinfônico da OSPA
Abaixo, uma apresentação das Danças, no Mariinsky, com a orquestra do teatro e Gergiev no comando:
Aguiar, Ernani (1950 –): Concertino para Piccolo e Cordas 1 Allegro ma non troppo 2 Calmo 3 Choro
Se na Patética temos profundidade e variações de humores, aqui predomina a alegria e o popular, o que não é sinônimo de superficialidade, mas é outra coisa. Ernani Aguiar é um compositor carioca que vive em Ouro Preto e este seu Concertino já ganhou diversas gravações internacionais. Aliás, o compositor Ernani tem mais de 70 CDs gravados com obras suas, além de suas obras já terem sido interpretadas em mais de 64 países. O Salmo 150 é a peça mais famosa e ele se orgulha de ser o maestro campeão de Música Colonial Brasileira.
Ernani Aguiar também é pesquisador e professor de regência orquestral na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Estudou com Guerra-Peixe.
Abaixo, copio um texto do solista Leonardo Winter sobre o Concertino para flautim (piccolo) e orquestra de cordas (2008) de Ernani Aguiar que nos foi enviado:
Composto em 2008, o Concertino para flautim e orquestra de cordas foi dedicado para o virtuose flautista italiano Raffaele Trevisani. O flautim (piccolo, flauta piccolo, kleine flöte, ou ottavino), com sua sonoridade característica e inconfundível, é o menor instrumento da orquestra e apresenta a tessitura mais aguda dos instrumentos de sopro. Graças à sua sonoridade ímpar e diferenciada, o instrumento tem sido muito utilizado em orquestras e em música de câmara bem como em peças solos. Atualmente o instrumento tem sido redescoberto, explorando sua característica expressiva e timbres marcantes através numerosas composições.
Com três movimentos seguindo a forma concerto tradicional (rápido- lento -rápido), o Concertino do compositor carioca Ernani Aguiar tem duração de aproximadamente treze minutos. O primeiro movimento, em forma ABA’BA, é um movimento vivaz, rítmico e com grande virtuosidade instrumental: o solista apresenta um motivo gerador com duas semi-colcheias e semínima pontuada em trinados que perpassa o movimento através modificações rítmicas e melódicas. O segundo tema, de caráter contrastante, apresenta diálogos entre o solista e os violoncelos em colcheias e em dinâmica piano.
O segundo movimento é um movimento lento e cantábile com atmosfera seresteira e onde o flautim demonstra toda sua expressividade em longas linhas melódicas.
O terceiro movimento é um Choro, um dos gêneros musicais mais populares do Brasil. De caráter leve e galhofeiro, é um movimento divertido e rítmico onde o solista dialoga com uma linha melódica descendente nos baixos que remetem ao violão de sete cordas, (realizados pelos violoncelos e contrabaixos). O final é rápido e virtuosístico, encerrando o Concertino de forma brilhante.
Abaixo, o Concertino com o solista Leonardo Winter e a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) com regência de Ubiratã Rodrigues. Gravado ao vivo na Igreja da Reconciliação em Porto Alegre, em novembro de 2017. Sim, aquele bebê devia ser um amor, mas não precisava, né?
Apresentação: Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA)
Quando: 01/10/2022 às 17h
Regência: Manfredo Schmiedt
Solistas: Leonardo Winter (flauta piccolo)
Direção Artística: Evandro Matté
Participação Especial: Coro Sinfônico da OSPA
Tchaikovsky, Pyotr Ilyich (1840 – 1893): Sinfonia Nº 6, Op. 74 em Si menor “Patética” I. Adagio – Allegro non troppo II. Allegro con grazia III. Allegro molto vivace IV. Finale – Adagio lamentoso
A Sinfonia N° 6 de Tchaikovsky, Op. 74, também conhecida como Pathétique ou Patética, foi composta em 1893, tendo sido a última obra do compositor. Também foi a última obra que ele regeu, precisamente na estreia da mesma em São Petersburgo em dia 28 de outubro de 1893, poucos dias antes da sua morte. Por influência da língua inglesa, hoje, no Brasil, a palavra Patético significa digno de pena, mas não pensem que isto sirva à Sinfonia Nº 6 de Tchaikovsky. Ele chamou a obra de Pathétique, em francês. Só que, em francês, pathétique significa comovente, tocante, pungente, perturbador, emocionante, eloquente, trágico, dramático. O título da sinfonia em língua russa, Патетическая (Pateticheskaya) significa também “apaixonado” ou “emocional”, mas é uma palavra que também refletiria um toque de sofrimento. Tchaikovsky considerou chamar a sinfonia de Программная (Programmanaya ou “Uma Sinfonia Programática”), mas concluiu que isso encorajaria a curiosidade sobre o programa, que ele não queria revelar.
O que é uma música programática? Música programática, música de programa ou música descritiva é aquele tipo de música que tem por objetivo evocar ideias ou imagens extra-musicais na mente do ouvinte, representando musicalmente uma cena, imagem ou estado de ânimo. Pelo contrário, entende-se por música absoluta aquela que se aprecia por si mesma, sem nenhuma referência particular ao mundo exterior à própria música. Exemplos de música programática? Ora, as mais famosas talvez sejam As Quatro Estações de Vivaldi e a Sinfonia Pastoral de Beethoven.
Mas voltemos à questão do título da Sinfonia. A lenda diz que ela se chamou de Vida por alguns dias. Na manhã seguinte à estreia, Tchaikovsky encontrou seu irmão mais novo, Modest, sentado a mesa do café matinal, tendo em sua frente a partitura da Sinfonia. Eles queriam remetê-la ao editor Jurgenson, em Moscou, naquele mesmo dia, mas o compositor ainda não encontrara um título. Não queria designá-la apenas como N° 6 e, como disse, havia abandonado a intenção de intitulá-la como Sinfonia Programática.
— Por que “programática” se não pretendo explicar nenhum significado?
Ele pensou em “Sinfonia Trágica”, porém, este também não o agradava.
Seu irmão acabou indo embora, enquanto Piotr Ilitch permanecia indeciso. De repente, no meio da escada, ocorreu a Modest a palavra em francês Pathétique, e ele retornou para fazer a sugestão. E Tchaikovsky aprovou. Ficou Pathétique!
Imediatamente, Tchai escreveu na partitura o título pelo qual a Sinfonia ficou sendo conhecida.
Intermezzo. Minha relação com a Patética iniciou nos anos 70, quando eu tinha uns 13 anos e conheci o álbum Elegy, do Nice, grupo que Keith Emerson teve antes do Emerson, Lake & Palmer (ELP). Neste disco, eles tocaram todo o terceiro movimento da Patética numa versão para teclado, baixo e bateria. Naquela época, eu era um ouvinte contumaz da Rádio da Ufrgs, que até hoje tem programação de música erudita (ainda bem). Então, quando ouvi a Sinfonia pela primeira vez na Rádio da Ufrgs, logo pensei: “Olha só, isto é do Nice”… Tá bom.
Fim do intermezzo.
Há muitas lendas na música erudita, mas podemos quase garantir que o programa da Patética fazia referência à própria vida do compositor, que não foi muito fácil. Na verdade, Tchaikovsky se inspirou na ideia de criar uma obra com um conceito de programa que permaneceria um mistério para os ouvintes. O compositor insinuou que o programa seria subjetivo, ou seja, carregaria um código de experiências pessoais. Na mesma direção, um site russo diz que o primeiro título que Tchaikovsky deu à Sinfonia seria Vida, com 4 divisões:
Parte I – Reflexão sobre a vida e a morte.
Parte II – O mundo poético do herói lírico.
Parte III – O Scherzo do Mal, uma zombaria do destino ou uma celebração da vida, na qual uma pessoa é um elo extra.
IV – o desfecho trágico.
O primeiro movimento é um paroxismo de dor, de esperança, de alegria, de sofrimento. Tudo tem a intensidade das paixões da adolescência. Hoje, chamaríamos este movimento de bipolar… É tudo insegurança e instabilidade emocional. A valsa do segundo movimento é feliz e otimista, como se pudéssemos escapar ao destino. Sim, é uma valsa que soa como valsa, mas que possui tempo irregular (5 em vez de 3). Então, se você tentar dançá-la ou mesmo imaginar-se dançando, identificará certo desconforto por trás de toda aquela alegria. O explosivo terceiro movimento chega como uma marcha desenfreada para nos levar à euforia. A força rítmica e a orquestração brilhante convidam o público a aplaudir antes do final da Sinfonia. Ele tem aquela mola que nos faz levantar para aplaudir, só que a Sinfonia segue. E segue com tons de morte, como se Tchaikovsky antecipasse o copo de cólera que o matou dali a dias. Assim como no início da Sinfonia, o timbre do fagote domina o cenário. Como um coração, a pulsação feita pelos contrabaixos propõe a inevitabilidade da morte.
Ouvindo a Sinfonia, a mudança constante e bastante acentuada de humor, tanto entre as partes quanto dentro delas, permite-nos experimentar vários estados psicológicos, desde um sentimento absoluto de inspiração até um colapso completo. e confusão.
Se a Sinfonia Patética foi estreada em 28 de outubro de 1893, Tchaikovsky morreu em 6 de novembro, isto é, 9 dias depois. Morreu depois de beber água não fervida durante uma epidemia de cólera. Alguns falam em descuido, outros em suicídio.
Apresentação: Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA)
Quando: 01/10/2022 às 17h
Regência: Manfredo Schmiedt
Solistas: Leonardo Winter (flauta piccolo)
Direção Artística: Evandro Matté
Participação Especial: Coro Sinfônico da OSPA
Abaixo, a Patética completa com a hr-Sinfonieorchester (Frankfurt Radio Symphony Orchestra) sob a regência de Lionel Bringuier. A gravação é de um concerto realizado em 15 de novembro de 2013 na Alte Oper Frankfurt.
Ontem, fui ver um concerto que tinha tudo para ser chato. Sim, sou desses que quer uma orquestra tocando sempre música destinada a orquestras, ora.
Mas ontem era Beatles e foi muito bom. Os cantores foram magníficos e a Orquestra de Câmara do Theatro São Pedro tem um dos melhores fermentos da cidade. Não sei se é empatia, confiança ou mero entrosamento, mas o fato é que a cada concerto ela cresce mais, está mais redonda, junta, com som bonito.
Todo mundo saiu feliz do velho Theatro. Tudo funcionou e quando funciona parece fácil. Mas não é. Já participei de pequenos grupos de trabalho que degringolaram. Tenho até medo deles. Mas o Evandro Matté leva o barco devagar e bem, como o marinheiro da música do Paulinho da Viola (Argumento).
Faça como um velho marinheiro
Que durante o nevoeiro
Leva o barco devagar
E que nevoeiro!
Enormes parabéns aos músicos todos, em especial ao pianista Daniel Benitz e aos crooners de hoje, a brilhante Elisa Conceição Machado e o sensacional Daniel Germano.
Realmente muito bonita a versão da Ospa para Orfeu e Eurídice, de Gluck, sob a regência de Evandro Matté. Destaque também para a bela direção cênica e cenografia de William Pereira. O que víamos refletia a música. Eu fiquei encantado com que vi e ouvi. O trio de cantoras arrasou. Denise de Freitas, Carla Cottini e Raquel Helen Fortes deram um banho. O coral também foi demais, né, Loren Hofsetz? Todo mundo saiu feliz do TSP. Mas quem foi brilhante mesmo foi a minha Elena Romanov, invisível lá no fosso! Bem, muita gente está a merecer parabéns hoje. Foi um trabalhão que deu certo, apesar do prazo exíguo e dos apertos de sempre. Parabéns, tudo está bem quando acaba bem, já dizia o velho Shake!
Loren Hofsetz completa, em comentário feito no meu perfil do Facebook: Foi muito bom vivenciar tudo isso. Temos muita sorte de ter o maestro Manfredo Schmiedt que esteve com a gente em todos os momentos para estarmos à altura do que a obra pedia. Foi incansável. Em todos os intervalos esteve conosco. Devemos muito a ele. A Elisa Machado que nos preparou vocalmente, a todos os envolvidos na produção que desde as amadas maquiadoras, o pessoal do cabelo, do figurino e, sobretudo à orquestra, em especial Elena Romanov que foi uma das que demonstrou apoio e torcida para que tudo desse certo. Trabalhamos juntos. Bravo também ao Evandro Matté! Obrigada pela tua presença, é um privilégio ter alguém como tu nos apoiando e que, por ser tão apaixonado por música, só agrega e eleva o nível quando se trata de falar sobre ela. Muito obrigada!
(Pena que a Dança das Fúrias tenha sido cortada).
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Os camarotes laterais do Theatro São Pedro são o próprio inferno. Na segunda fila, não via o palco. Deveriam doar estes ingressos. Sempre. Fui salvo por amigos.
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Pelo visto, Odair vai escalar Sóbis contra o Flamengo, deixando de fora Nico López e Wellington Silva. Não desejo isto, mas será uma eliminação bem ridícula, com substituições pré-definidas, pois Sóbis não tem velocidade nenhuma nesta época da vida e só pode jogar de centro-avante. Espero estar errado. Vai sair aos 5 do segundo tempo, quando estivermos desesperados.
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Perdemos para o Goiás. Nico López não poderia fazer isso, mas fez. Não está se esforçando nada no time alternativo após perder a posição para Sóbis. Aliás, esta foi a atuação mais podre do time de Odair em 20 meses. Algo jamais visto. Jogando com um a mais desde o início do jogo e ganhando de 1 x 0 acabaram perdendo por 2 x 1.
Até o diretor de futebol Roberto Melo reconheceu o ridículo da atuação.
Convidado pela TVE logo após a inauguração da Casa da Música da Ospa, acho que fizemos um programa cheio de conteúdo. Coloco abaixo a íntegra do mesmo.
No último sábado, fui assistir ao concerto inaugural da Casa da Música da Ospa. Fiquei muito impressionado com o belo resultado obtido em tão pouco tempo. O que nos salta aos olhos e aos ouvidos de cara: a sala é muito bonita, o local é adequado, as cadeiras e o colorido das madeiras lembram a Sala São Paulo e o teto baixo parece ter sido bem resolvido do ponto de vista acústico. Talvez apenas os instrumentos de madeira tenham sofrido um pouco com a cortina de cordas logo à frente.
É claro que era uma noite especial, nervosa e muito emocionante. Afinal, após várias décadas difíceis de nomadismo, a orquestra finalmente teria uma sede própria. A sequência de discursos e leituras foi massacrante — duraram mais de uma hora –, houve muito estresse nos últimos dias e horas a fim de finalizar a obra, chovia forte lá fora, o público de Marchezan City chegava lentamente, tudo atrasou, a orquestra esfriou e o concerto não foi lá essas coisas, mas jamais deixaria de dar todos os descontos citados.
Imaginem que não havia ingressos disponíveis, só que a chuva era tal que muita gente optou por permanecer em casa. Creio que a lotação não ultrapassou os 80% da capacidade do teatro de 1100 pessoas. Soube que o segundo concerto (o de domingo) teve resultado artístico muito melhor, além de um público mais entusiasmado e afeito à música, diferente das autoridades, jornalistas e penetras indiferentes de sábado.
O programa não era do meu agrado, apesar de coerente. Uma obra de Arthur Barbosa, Mba’epu Porã, cujo tema era a formação musical do sul da América, a ultra norte-americana Rhapsody in Blue, de George Gershwincom o excelente pianista Cristian Budu, e a Sinfonia Nº 9, Novo Mundo de Dvořák, mistura de música checa com uma tentativa de fazer música norte-americana em 1893. Ou seja, não era uma coisa de louco, mas tem gente que ama este repertório.
Só que ontem nada disso interessava. Afinal, estávamos dentro de uma raríssima construção de nosso estado feita exclusivamente para a cultura. Há quantos anos não se fazia uma obra dessas para o setor patinho feio do Estado? Além da sala de concertos, haverá camarins, café, salas de estudos, saguão, entre outros espaços. Tudo para a música. É claro que faltam ainda algumas coisas, porém a sala já é superior a tudo o que há disponível para a orquestra em Porto Alegre. E para o público também.
A Ospa, o diretor artístico (e herói) Evandro Matté — principal líder desta odisseia –, o superintendente da Ospa Rogério Beidacki e o engenheiro acústico Marcos Abreu estão de merecidíssimos parabéns. Nós também.
A construção, que é a primeira Sala Sinfônica de Porto Alegre, produzirá muita felicidade. A Casa está de pé e será um dos principais pontos de cultura de nosso combalido Rio Grande.
No último sábado, vimos a barbárie dar um passo atrás.
Seria um exagero chamar a noite de ontem, no Salão de Atos da UFRGS, de escandinava. Estava até quente. Logo na entrada, fui chamado para uma conversa com o Diretor Artístico da Ospa, Evandro Matté. Acho que faremos entrevista com esclarecimentos e notícias mais amplas até o fim de semana de 11 e 12 de julho. Foi um bom diálogo do qual participou o superintendente Araquém Idiart Gomes.
O programa do concerto era formado apenas por obras lá do norte: afinal, Alfvén foi sueco; Grieg, norueguês e Sibelius, finlandês. O maestro Henrik Schaefer é alemão e já foi o mais jovem membro da Orquestra Filarmônica de Berlim, tendo assumido uma das violas aos 22 anos. Já o pianista Alexandre Dossin é brasileiro, gaúcho de Porto Alegre. Sejamos mais específicos:
Programa
Hugo Alfvén: Midsommarvaka Edvard Grieg: Concerto para piano, op. 16 Jean Sibelius: Sinfonia nº 2, op. 43
Regente: Henrik Schaefer Solista: Alexandre Dossin (piano)
Vivem muito esses escandinavos e Hugo Alfvén morreu aos 88 anos. Tendo por base a bagunça aprontada ontem, devia ser um sujeito alegre, amante da bebida e de outros prazeres. Tocava violino na Royal Opera de Estocolmo e — calma — sua Midsommarvaka não representa nenhuma ofensa, é apenas uma encantadora Vigília da meia-noite (Rapsódia sueca n° 1, op. 19). Certamente inédita em nossa cidade, foi a melhor abertura de concerto de 2015. Uma música feliz, mesmo com alguns episódios lentos. Alfvén foi também pintor e escritor (dos bons).
Ai, o Concerto para piano, Op. 16, de Grieg. De novo! Em 22 de agosto de 2014, a Osesp apresentou este Concerto no Theatro São Pedro com o pianista Dmitry Mayboroda sob a regência de Marin Alsop. No dia 11 de novembro do ano passado, a Ospa voltou a apresentar o mesmo concerto com a pianista Hyejin Kim e o maestro Shinik Hahm.
Grieg foi tio de Glenn Gould e viveu menos do que Alfvén e Sibelius. Ficou 64 anos entre nós, deixando-nos uma obra romântica de excelente qualidade. Seu Concerto para Piano está entre os mais populares do gênero. Acho-o muito parecido com o de Schumann. O de Grieg era um grande sucesso na casa de meus pais, ambos dentistas e pianistas amadores. Conheço cada notinha dele. A interpretação de Dossin-Schaefer talvez tenha sido a melhor das três que tivemos em Griegópolis no último ano. O primeiro movimento, tocado em andamento mais rápido e menos derramado, tornou-se digno e adequado a meu desamor pelo ciclamato. Mas, meus caros, de vez em quando o piano desaparecia sob a orquestra e creio que não adianta culpar a acústica por isso. Ninguém mais cai nessa. É mesma coisa que os violinos não tocarem juntos e culparem o teatro. Nada a ver. Mas curti muito a interpretação da trilha sonora de Intermezzo, mesmo sem a presença de Ingrid Bergman.
O bis de Dossin foi o Noturno Nº 1 de Chopin. Foi uma interpretação perfeita — contida, sem exaltações nem demasiados tremeliques líricos. Dossin é um desses santos de casa que fazem milagres, a exemplo de Lavard Skou-Larsen e Tobias Volkmann.
Creio que a segunda é a mais popular das sinfonias de Sibelius, apesar de que a melhor, disparada, seja a sétima, que será apresentada pela Ospa na próxima terça-feira. A segunda é uma bela e difícil sinfonia. Houve desencontros e erros muito claros em vários solos. Aqui, tivemos efetivamente algum prejuízo pela má acústica da Ufrgs. O som dos baixos, por exemplo, caía como pedras aos nossos pés. Escrita na Itália logo após a composição do poema sinfônico Finlândia e estreada em Helsinque em 1902, esta sinfonia foi um acontecimento nacional. Numa época de invasão e opressão russas, ela foi ouvida como representação sonora do nacionalismo finlandês. Quando de sua estreia, foi tocada quatro vezes em oito dias. Mas não se precisa saber de tudo isso para gostar dela, a música sobrevive tranquilamente sem o contexto de sua origem..
Seu formato é aparentemente tradicional — são quatro movimentos com os dois últimos tocados sem interrupção, como a Quinta de Beethoven. Nela, Sibelius abusa das repetições e de fragmentar melodias. É estranho como ela lembra Bruckner ao mesmo tempo que trai o carolão austríaco. Se Bruckner busca e alcança a divindade, Sibelius é muito mais realista, mostrando-nos quão vasto é o frio de seu pais. Aliás, esqueci de dizer que Sibelius viveu 92 anos, foi alcoolista e deprimido por boa parte de sua vida, desistiu de compor ali pelos 50 anos e isto foi lamentável, pois era um sujeito original e de grande talento. Fazer o quê?
Em um conjunto com alguns destaques negativos facilmente identificáveis — de uma forma geral, havia muitos solos neste concerto — o clarinetista Samuel de Oliveira e o trombonista José Milton Vieira deram um banho de bola. Aliás, espero que o Miltinho esmerilhe na Sinfonia Nº 7 de Sibelius na semana que vem. Há belíssimos solos de trombone na sétima. E que o deixem se sobrepor à orquestra, tocando em altíssimo volume, como fez o trombonista da Filarmônica de Leningrado sob as ordens de Mravinsky. Cumpra-se!
O concerto começou muito bem. Na plateia do Theatro São Pedro, duas mulheres me pediram para que lhes tirasse uma foto. Tirei bem mais de uma. Elas estavam felizes, ornamentadas pelo velho edifício e pelos músicos que se preparavam para o concerto no palco. Ao verem o resultado, voltaram para falar comigo. Estavam encantadas. Disseram que eu lhes dera a coisa mais bonita que elas tinham. Fiquei comovido. A noite prometia.
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Mas começo por um fato de antes do concerto: a entrevista que o Diretor Artístico da Ospa concedeu recentemente à ZH. Não entendi porque Evandro Matté irá convidar apenas nomes inéditos para reger a orquestra nos próximos meses. Ele disse que deseja “oxigenar a lista dos maestros convidados e dos solistas”, evitando aqueles que tenham se apresentado com a orquestra nos últimos três anos. Tento interpretar e não consigo entender porque Lavard, Rauss, Teraoka, Volkman, Nakata, Hahm, Levin ou Vigil não possam retornar em futuro próximo. São excelentes regentes que fizeram bons trabalhos. A opção pelo novo, nestes casos, não me parece a melhor.
Pior: é um crime que gaúchos que estão se consagrando no exterior — como Lavard Skou-Larsen, que acaba de arrasar com a Royal Flemish Philharmonic, de Antuérpia, e Tobias Volkman, que fez o mesmo na semana passada com a Sinfônica de Brandemburgo — não possam ser reconvidados. É gente talentosa, nascida aqui, com parentes na cidade, que conquista o mundo, mas que não pode mostrar-se em sua cidade. (OK, sei que o Tobias é de NH ou de São Leo).
Isso é tanto mais ilógico quando se pensa que o concurso da Ospa parecia beneficiar os locais…
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O programa de ontem:
Jean Sibelius – Finlândia, op.26 Camille Saint-Saëns – Concerto para violino nº 3 em Si menor, op.61 Maurice Ravel – Pavana para uma Princesa Defunta Nikolai Rimsky-Korsakov – Capricho espanhol, op. 34
Regente: Evandro Matté
Solista: Yang Liu, violinista
Sibelius completa 150 anos de nascimento neste ano. Nada mais natural que a Ospa iniciasse sua temporada com ele. Finlândia é um poema sinfônico escrito em 1899 e revisado no ano seguinte. Foi composto como um protesto contra a crescente censura do Império Russo. Era comum, na época, trocar o nome da obra nos concertos com a finalidade de iludir a censura russa. Isso adquiriu ares de piada. Os títulos com os quais a peça foi mascarada foram muitos: um deles foi Sentimentos Felizes ao Amanhecer da Primavera Finlandesa. A peça traz melodias crescentes e agitadas, evocando a luta nacional do povo finlandês. À medida que vai chegando ao final, a melodia serena do hino da Finlândia é ouvida. O careca alcoolista foi bem representado pela Ospa, mas senti saudades da execução redonda que Nicolas Rauss criou com a mesma Ospa no Colégio Anchieta, se não me engano.
Bá, eu estava com fome. Enquanto isso, pensava que Camille Saint-Saëns fora um sujeito feliz. Foi organista, pianista, caricaturista, cientista amador, apaixonado por matemática e astronomia, comediante amador, folhetinista, crítico, viajante e arqueólogo. Também gostava de viajar. Movido por impulsos súbitos, fazia excursões repentinas às partes mais distantes do planeta. Visitou a Espanha, as Canárias, o Sri Lanka (Ceilão), a Vietnã (Cochinchina), o Egito, e esteve várias vezes na América. Deu concertos em lugares exóticos como o Rio de Janeiro e São Paulo em 1899. A morte pegou-o numa cama de hotel em Argel.
O Concerto n° 3 para Violino e Orquestra foi escrito em 1880 especialmente para o célebre Pablo de Sarasate, para quem Saint-Saëns já havia escrito seu Primeiro Concerto. O primeiro movimento me pareceu de execução tediosa. Quando terminou esta parte da música, o governador Sartori e o Secretário de Cultura Victor Hugo prorromperam em aplausos, no que foram seguidos por boa parte da plateia. Sorridente, o Secretário batia delicadamente no próprio peito, como se tivesse sido atingido no coração. Bem, deixa pra lá, o governador certamente não sabe que não se aplaude entre os movimentos. Yang Liu e o regente Matté ficaram duros, esperando o entusiasmo arrefecer.
Tenho para mim que Sartori, que fala em parcelar os salários do funcionalismo público estadual, resolver parcelar o Concerto para Violino. Se ele insistir nesta ideia de pagar aos poucos, sugiro que a Ospa toque seus concertos também de forma parcelada.
Mas o fato é que o Concerto de Saint-Saëns melhora a partir do segundo movimento. E Yang Liu deu-nos uma magnífica interpretação do movimento central e do final. Saint-Saëns tem outros concertos cujos movimentos finais são superiores ao inicial. Mereceria revisão.
O intervalo foi penoso com a fome apertando. O melhor momento foi quando a Elena saiu do palco e veio me fazer um carinho. Minha vizinha de cadeira disse: “Como a sua esposa é linda!”. Ninguém duvida.
A impressionista Pavane pour une infante defunte (Pavana para uma Princesa Defunta) foi composta em 1900, quando Ravel tinha vinte e cinco anos. Devido à origem basca, Ravel tinha uma predileção especial pela música espanhola. A pavana é uma tradicional e lenta dança espanhola, que gozou de popularidade entre os séculos XVI e XVII. A peça foi escrita em 1899 para piano, durante os estudos do compositor no Conservatório de Paris. Ele a orquestrou em 1910. Segundo ele, ela não evoca nenhum momento histórico. É apenas a dança de uma jovem princesa imaginária na corte espanhola. Também, segundo o compositor, a música não deve levar o ouvinte a pensamentos funéreos. Ravel afirmou que o motivo do título da peça era porque gostava do som da combinação das palavras “infante défunte”… É uma música levada pelos sopros e o trompista viking Alexandre Ostrovski esteve nostálgico e parisiense como devia.
O esparramado Capricho Espanhol, Op . 34, foi composto em 1887 por Nikolai Rimsky-Korsakov. Como título demonstra, é baseado em melodias espanholas. Dã. O título original russo é ainda mais claro: Capricho sobre temas espanhóis. Como Rimsky-Korsakov era oficial da marinha russa, costumava viajar um bocado — ainda mais do que Saint-Saëns. Entre 1862 e 1865, o cara revirou o mundo. Na Espanha, passou algumas semanas em Cádiz, fascinado pela cultura e pelas mulheres locais (isso é invenção minha). Assim como Sheherazade, a peça tem um importante e belo solo de violino. Aliás, o Capricho foi inicialmente concebido como uma fantasia para violino e orquestra.
Em alguns momentos do Capricho, as cordas da Ospa foram cada uma para um lado para reunir-se novamente ali na esquina. Mas nada de assustar. Há muitos solos na obra. Augusto Maurer (clarinete), Omar Aguirre (primeiro violino), Paulo Calloni (corne inglês), o viking (trompa), Artur Elias (flauta) e Wenceslau Moreyra (violoncelo) estiveram muito bem. Talvez apenas o solo de Aguirre merecesse uma cintura mais solta. Mas a alegria e luminosidade de peça de Korsakov estavam lá. Acho que Evandro Matté estava tão feliz com o bom final do concerto que se esqueceu de pedir para Artur Elias erguer-se a fim de receber seus aplausos. Estou certo?
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Adendo: sou totalmente favorável à nomeação dos concursados da Ospa. Reclamei muito do Concurso realizado no ano passado, mas, já que este foi válido, penso que as vagas devam ser preenchidas o mais rapidamente possível. Aliás, de minha perspectiva pessoal, o concurso teve momentos que se inscreveram entre os mais patéticos de minha vida, como aquele em que um membro da Associação de Funcionários da orquestra ligou para o Sul21dizendo que eu estava atacando a Ospa, a Secretaria de Cultura e, consequentemente, atrapalhando a reeleição de Tarso Genro. Muita loucura, né? Imagina se eu, com meu pequeno blog, tenho o poder de intervir numa eleição para o Governo do Estado. Ao final, o cara pedia a retirada dos posts e minha cabeça. Algo me diz que fui chamado de psolento…
Gosto e preciso de meu emprego. E não tenho estabilidade. Minha chefe ouviu tudo aquilo, me chamou e disse que tinha mais o que fazer do que ouvir aquele tipo de coisas. Eu que desse um jeito de o cara não telefonar mais. Não fiz nada, mas o cidadão não voltou a ligar. Foi uma ação maldosa e inexplicável, inspirada, pirada e repirada sei lá por quem ou o quê.
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Milton Ribeiro foi ao concerto às suas próprias expensas.