O 33º Festival Fayr de Música Internacional do Irã está em andamento na capital do país, Teerã. Enquanto a cidade hospeda mais de 30 orquestras de todo o mundo, a primeira e única regente mulher do Irã subiu ao palco deixando o público atônito.
Nozhat Amiri tornou-se a primeira mulher a liderar a Orquestra Nacional do Irã, executando peças compostas por importantes músicos do país, como Hossein Dehlavi, Homayun Khorram e Morteza Hannaneh.
Nozhat Amiri diz que deve tudo ao apoio que recebeu do marido e aos amigos que acreditavam na sua capacidade. Amiri é mestre em música e regência pela Universidade de Teerã e aguardou 10 anos por este momento. É a única iraniana com tal formação.
Dedico a tradução a minhas sete leitoras, e, em especial, à Elena e a minha Bárbara com acento.
Quem disse que as mulheres não podem ser regentes? Bem, um monte de homens. Então, o que a famosa soprano Barbara Hannigan aprendeu desde que ela pegou a batuta e começou a brandi-la em um — choque! — vestido sem mangas?
Por Barbara Hannigan
Quando eu tinha 10 anos, decidi que ia ser uma musicista. Eu não tinha certeza de que tipo, mas a regência não era algo que eu sequer considerasse. Crescendo em uma pequena vila na costa leste do Canadá nos anos 70 e 80, eu pensei que as mulheres só podiam reger coros ou, na melhor das hipóteses, orquestras escolares. Eu não sabia o que significava o sexismo. Além disso, eu adorava cantar e logo percebi que era isso o que ia fazer na vida.
Passei grande parte da minha carreira com o foco na música erudita contemporânea, trabalhando com os compositores em novas criações e explorando as obras do século 20. Um dos meus papéis favoritos é o de Lulu, de Alban Berg. Para mim, ela não é uma femme fatale nem a vítima que alguns dizem ser. Ela é uma mulher infinitamente fascinante, deliciosamente contraditória e que desafia os rótulos. E é sempre fiel a si mesma. Se ela usa salto alto e vestido ou uma roupa de ginástica vermelha e sexy, ela permanece confortável em sua própria pele até o final da ópera, quando, forçada à prostituição, organiza seu próprio assassinato a fim de escapar de um futuro que ela não poderá suportar. Ela é uma mulher extremamente poderosa. Incorporá-la em minha vida teve um enorme impacto sobre mim.
Chegar aos 40 anos foi doloroso para mim. Eu tinha ideias sobre o meu valor e lugar como performer e estes estavam relacionados com a minha idade. Comecei a evitar-me no espelho. Eu queria manter minha idade em segredo. Gastei depois muito dinheiro em cremes inúteis para o rosto. Em parte, isso tinha a ver com a minha vida de prateleira como cantora. Muitos de nós sentimos que temos uma data de validade estampada em nossas testas. Quando passamos dos 50, as vozes, especialmente os registros mais agudos e leves, perdem elasticidade, flexibilidade e beleza de tom. Eu estava sentindo a pressão do tempo.
Mas Lulu me ajudou a crescer. Cantei-a aos 41. Ela me fez perceber que eu não poderia estar mais preparada para cantá-la até exatamente essa idade — os meus anos de investimento, a experiência, as 20.000 horas de prática realmente faziam diferença. Eu tinha tudo o que precisava. Senti a confiança sobrevivendo à experiência.
Pouco antes, quando me aproximei dos 40 anos, eu também tinha começado a reger. Fiz minha estreia como maestrina no Châtelet em Paris com a ópera de câmara de Stravinsky Renard e com Mistérios do Macabro de Ligeti, onde cantava e regia. Foi uma experiência avassaladora, uma lição de humildade. O maestro é em parte servo, em parte líder e, na maioria das vezes, tem que apenas ficar fora do caminho. Ofertas para conduzir e cantar com grandes orquestras começaram a chegar. Sir Simon Rattle me pediu para executar Façade, de William Walton, com ele e os membros da Filarmônica de Berlim, em 2012, dividindo as tarefas de regência e narração entre nós.
É claro que o soprano é um campo só para mulheres. Com a regência, vi expandir-se para mim um campo dominado por homens. Eu realmente não penso em mim como uma pioneira — era simplesmente algo que eu precisava explorar como musicista. Mas, à medida que o tempo passava, percebia que o “feminino” estava agora ligado ao rótulo de “maestro”. Eu nunca tivera este rótulo como cantora.
Para Façade, eu usava roupas apropriadas para a teatralidade da peça — um vestido de noite sem alças. Um amigo comentou sobre a expressividade dos meus braços, e pareceu-me que isso era parte da minha força como maestrina. Quando eu fiz a minha estreia no Châtelet, que eu tinha usado um terno: muitas mulheres regentes usam roupas ou de gênero neutro ou algo parecido com um terno de um homem. Pensei que calça e jaqueta eram o “traje correto”. E usei também. No entanto, eu nunca uso terno na vida real! Desde Façade, passei a usar um vestido sem mangas para reger. É algo onde eu posso me mover e que cabe na música… Eu também não amarro meu cabelo para trás, a menos que ele esteja num mau dia. Tive feedbacks positivos sobre isso vindo de orquestras e audiências. Ninguém vê problema em eu não estar sobriamente vestida com um terno escuro. Porém, os críticos sempre observam minha roupa, o que não é algo que eles costumem fazer com regentes homens.
A discussão pública de questões de gênero é muito carregada. Pegajosa. Eu hesitei aqui e quase comecei a me censurar. Vasily Petrenko, o maestro Real Liverpool Philharmonic, e Bruno Mantovani, diretor do Conservatório de Paris, fizeram comentários depreciativos com o foco no feminino. Mesmo o professor Jorma Panula, fez comentários depreciativos na TV um ou dois dias antes de eu reger o Concertgebouw de Amsterdam. Mesmo que seus comentários não fossem pessoais, eu me senti terrivelmente ferida. Eu tinha recém trabalhado intensamente em conjunto com os músicos da orquestra em obras de Stravinsky, Schoenberg e Ligeti, e eles vieram criticar minha musicalidade e habilidade para reger com base no sexo, alegando que mulheres só deviam conduzir “música de mulheres”, como Debussy e Fauré. “Não é um problema”, disse Panula, “se as regentes escolherem obras mais femininas. Bruckner ou Stravinsky elas não devem fazer, mas Debussy é OK. Isto é puramente uma questão de biologia “.
Eu me pergunto se eles lamentam o que disseram.
Sempre que sou questionada sobre o assunto em entrevistas, eu aproveito para combater essas ideias. No início deste ano, a caminho de um concerto, eu li no New York Times que dois alpinistas finalmente alcançaram o topo do Dawn Wall. “Espero que [nossa conquista] inspire as pessoas a escalarem seus Dawn Walls secretos”, disse um deles. Eu subi no palco naquela noite energizada por essa citação. Eu a carregava comigo: reger tornou-se o meu próprio e nem tão secreto Dawn Wall. É uma daquelas poucas fronteiras finais em que há escassez de mulheres. Para mim, porém, a questão é muito mais complicada do que uma chamada de “Precisamos de mais mulheres regentes!” Reger é ter a musicalidade, a psicologia e a habilidade técnica reunidas em um raro tipo de liderança que é indescritível. E ela não é nem de homem nem de mulher. A convenção manteve o campo dominado por homens. Convenção e, é claro, algum sexismo cotidiano — porque antes de uma mulher ficar no pódio, ela precisa entrar em uma aula de regência na universidade, e antes disso, mesmo, ela precisa ver a carreira como uma opção viável, algo que eu não tive quando criança.
A jovem filha de um amigo me viu regendo na TV outro dia, e disse: “Mamãe, eu não sabia que deixavam as mulheres serem maestros”.
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Abaixo, aos 6min39, Hannigan empurra Rattle e regê parte de Mysteries of the Macabre, de Ligeti. Divirtam-se com esta enorme artista.