Eu falando de meu livro no Programa Folhetim, da Rádio da Ufrgs

Eu falando de meu livro no Programa Folhetim, da Rádio da Ufrgs

Eu não ouvi, mas espero não ter sido tão burro. Sou muito melhor escrevendo do que falando. Na verdade, falando sou quase um idiota. Mas alguma coisinha do que disse deve prestar, sei lá. Acho que as pessoas me convidam para dar palestras porque vou sempre informado até os dentes a fim de que eles não vejam quão inábil sou.

O que o pessoal da Rádio da Ufrgs não sabe é de minha devoção pela emissora que ouço desde os anos 70. Eu amo esta rádio do mesmo modo que meu pai a amava. Ela a chamava sempre de Rádio da Universidade. Para ele e toda a minha família, só a Ufrgs existe. Nós quatro nos formamos lá.

O apresentador Pedro Palaoro introduz assim minha entrevista:

“Nesta semana o Folhetim recebe o escritor e livreiro Milton Ribeiro. Ele está lançando seu primeiro livro de contos Abra e Leia, obra que sai pela Editora Zouk. No volume ele reúne uma série de histórias escritas ao longo dos anos e que refletem a trajetória de um amante da comédia humana.”

O prédio da Rádio da Ufrgs | Foto: Ufrgs

A Bamboletras no programa Rádio-leitura da Rádio da Ufrgs

A Bamboletras no programa Rádio-leitura da Rádio da Ufrgs

Texto do post original:

O Rádio-Leitura de hoje [apresentado pelo ótimo jornalista Pedro Palaoro] traz o livreiro Milton Ribeiro, da Bamboletras, uma das mais tradicionais livrarias de rua de Porto Alegre. Ele comenta sobre a reinvenção do comércio nesses tempos de pandemia e reflete sobre os ensinamentos que o período de isolamento social podem trazer.

O livreiro também dá dicas de leituras e compartilha conosco um trecho de uma das grandes escritoras portuguesas contemporâneas.

Ouça o podcast na íntegra:

A Rádio da Universidade faz 60 anos amanhã

A Rádio da Universidade faz 60 anos amanhã

Amanhã, a Rádio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul completa 60 anos. Foi a primeira rádio universitária e pública do país. Comecei a ouvi-la diariamente desde os 15 anos e não imaginava que ela tivesse nascido no mesmo ano que eu. Antes desta idade, meu pai já nos fazia ouvi-la no carro e em casa. Naquela época, suas transmissões começavam às 8h e iam até a meia-noite. Tudo terminava num estranho “Boletim Astrônomico”. Assim que meu pai notou em mim alguma tendência para apaixonar-me pela música erudita, iniciou um jogo que durou até sua morte em 1993. Toda vez que ligava o rádio, nós tínhamos que adivinhar que obra estava sendo executada. O jogo era levado tão a sério que, logo após o final de cada música e do locutor anunciar o nome do compositor e título da obra – tínhamos que ouvir atentamente, porque era nossa conferência para saber quem tinha acertado — , o rádio era desligado a fim de que não ouvíssemos o nome da próxima. Deixávamos passar alguns minutos para só então religarmos o rádio e as tentativas de adivinhação.

Rádio da Ufrgs 60 anos

Isso me deu um treinamento incrível para reconhecer estilos e obras. Mas o que interessa hoje é que há mais de 45 anos ouço a rádio, a minha rádio que tantos problemas apresentava nos primeiros anos: sinal fraco, interrupções das transmissões, vinis com problemas (alguns arranhados, outros em tal estado que não deixavam a agulha avançar…), etc. Hoje, o maior problema é o fato de ela ser uma emissora AM. Melhor ouvi-la sempre na Internet. Quando virá o FM? Outro problema é que, antigamente, a escolha do repertório tinha mais lógica.

Os méritos da rádio ultrapassam em muito os seus problemas e foi ali, com o grande compositor e ex-diretor da emissora Flavio Oliveira e com Rubem Prates, que aprendi que uma programação não era mero sorteio ou livre-associação. É notável como eles conseguiam ligar inteligentemente cada música à próxima, fosse por seu tema, por sua evolução na história da música ou pela pura sensibilidade desses dois conhecedores, que viam parentescos em coisas aparentemente díspares. Com eles, aprendi que havia várias formas de se avançar na grande árvore da história de música. Por exemplo, pela manhã, a rádio iniciava por um compositor de música antiga ou barroco, depois ia para um clássico, daí para um romântico, e assim por diante, nos mostrando sempre os caminhos e os diálogos que um compositor travava com seu antecessor. Foi a maior das escolas. Com a Rádio da Ufrgs conheci o que cada compositor passou a seus sucessores e aquilo, após milhares (mesmo!) de dias como ouvinte, tornou natural a leitura das histórias da música que fiz depois. De forma misteriosa, estranha e certamente gloriosa, aqueles dois homens silenciosos já tinham me ensinado tudo, colocando as coisas na ordem certa para que meu ouvido entendesse. Hoje, a coisa está mais bagunçada, às vezes temos que reformatar o ouvido de uma obra para outra.

É claro que me emociono ao falar da Rádio da UFRGS, não há como ser diferente. Voltando a sua história, depois seu horário foi ampliado e já faz décadas que transmite 24 horas por dia como qualquer outra emissora. Conheci na rádio quase tudo o que ainda ouço hoje ou posto no PQP Bach. Lembro do dia em que ouvi a Oferenda Musical de Bach numa manhã intacta e perdida, no quarto já então pleno de futura saudade. Era uma gravação de Hermann Scherchen e, naquele momento, eu tive a certeza de que não existia nada que pudesse deixar aquele momento mais perfeito e importante, tal o modo como a música caiu sobre mim. Lembro do dia em que mandei uma carta — sim, pelo correio — para o programa de sábado à noite Atendendo o Ouvinte. Pedi a Sinfonia Nº 10 de Shostakovich. Fui atendido. Eu e uma namorada — eu devia ter entre 18 e 20 anos — deixamos de sair para ficar ouvindo aquela maravilha. Fora da música, talvez apenas os filhos, os momentos de amor ou a futura leitura do Fausto de Mann, de Tolstói, Dostoiévski, Bulgákov ou de Machado, além do enlouquecido Guimarães Rosa do Grande Sertão, me proporcionaram momentos em que novamente pareci ter saído de minha pequena natureza.

E, no grande último momento, dias atrás, ao ligar a rádio, dei de cara com a esquecida Sinfonia Turangalîla de Messiaen e permaneci – por sorte estava em minha cama, antes de dormir — por mais de uma hora, de olhos arregalados, cada vez mais acordado e eufórico. Ou ainda, anos atrás, quando atrasei-me para um encontro porque TINHA que saber qual era aquela música incrível que, afinal, era desconhecidíssima para mim na época: a Sinfonia Singular de Berwald.

É por viver com ela há mais de 45 anos, é por saber que só em Montevidéu, em Oslo e em Amsterdã (ouço pela internet) há emissoras de mesma categoria, é por ter receio de que a programação da rádio caia na vala comum — como tantos já desejaram –, que saúdo e fico feliz com os 60 anos, meus e de “minha rádio”.

Parabéns e longa vida!

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P.S. 1 — Tenho no computador de casa um excelente programa Música em Pessoa cuja entrevistada é minha Elena Romanov, que é violinista da Ospa. Ela foi entrevistada pela Ana Laura Freitas e é um baita programa.

P.S. 2 — Pedro Palaoro, funcionário da Rádio de Ufrgs, me informa: “O FM aparentemente virá em 2018. A banda será liberada no final de janeiro, quando caírem as TVs analógicas. Tem o tempo de aquisição de equipamento e tal, mas o planejamento é que isso ocorra logo”.

Ospa: a qualidade de Dimitri Cervo e o Rachmaninov de meu descontentamento

Dimitri Cervo em pose de herói: o justo vencedor do concerto de ontem.

O concerto de ontem da Ospa teve uma primeira parte bastante interessante. A primeira obra apresentada foi o famoso Adágio para Cordas de Samuel Barber. Se já era uma música conhecidinha, depois que se tornou trilha sonora de Platoon, filme de Oliver Stone, tornou-se parte do repertório de concerto. As cordas da Ospa estiveram impecáveis, mostrando-se translúcidas e leves na tristíssima melodia muito utilizada em velórios.

Depois veio Museu – Uma Canção de Vigília sobre um poema de Armindo Trevisan, do compositor e ex-diretor da Rádio da Ufrgs, Flávio Oliveira. O concerto era dedicado aos 55 anos da emissora, então os dois fatos devem ter alguma ligação. Ou não. Ao menos por mim, o belo poema de Trevisan (Museu, do livro A Serpente na Grama) não podia ser inteiramente compreendido na dicção dos cantores, porém, com o auxílio do programa, obtínhamos as legendas para o entendimento. Quando juntamos letra e composição, tudo cresce muito.

A primeira parte foi finalizada por Série Brasil 2000 nº 4 –Toronubá, excelente composição de Dimitri Cervo. É uma absoluta raridade a forma inteligente com que Cervo utiliza o minimalismo. Ele não torna suas composições meras proezas repetitivas. Há mudanças radicais de tons e ambientes, tanto que depois de um primeiro movimento, absolutamente furioso, há uma espécie de Réquiem onde todo o material temático é readequado e revisitado. Não, o que ouvimos não foi nada comum nem esquecível. Há intenções, conteúdo e significado na obra. Foi o ponto mais alto do concerto e merece um bis especial pela Orquestra Sinfônica de Sergipe:

O programa vinha coerente e certinho, mas então chegamos ao Rachmaninov de meu descontentamento, compositor homenageado “de fato” pela Ospa em 2012. Aqui, nada de conteúdo ou significado, é só beleza… Em Porto Alegre ouve-se mais Rach do que em qualquer outra cidade do mundo, incluindo as russas e americanas. O longuíssimo, vulgar e ornamental Concerto nº 3 para piano e orquestra — composto por Rachmaninov para ele mesmo aparecer — é um enfrentamento parecido com o clássico alagoano ASA de Arapiraca e CRB. Sim, os dois times não se marcam, pois o piano prefere tocar tão sozinho quanto os maiores craques do ASA em seus devaneios de cadenzas sem fim nem finalidade. Foram 42 minutos maçantes, mas que deixaram o público feliz. A pianista era muito boa e rápida, pena a música. Para tirar o gosto e melhorar o humor após a exibição de tantas vaidosas brilhaturas pessoais, passei a manhã ouvindo um CD do Dimitri Cervo e os três Concertos para Piano de Béla Bartók. Mas ainda estou em fase de recuperação.

P.S. — O CRB caiu para Série C do Brasileirão. O ASA ficou na B.

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Abaixo, Marilyn Monroe atenta a um daqueles prosaicômicos solos de Rachmaninov: