Tertúlia Virtual

Neste dia 15, o tema da Tertúlia Virtual é uma brincadeira:

“Você irá passar 10 anos numa pequena ilha deserta no Pacífico, e só poderá levar cinco coisas. Quais seriam? “.

A postagem pode apenas nomear as cinco coisas (pessoas inclusive), ou cinco imagens das coisas, ou ambos! Pensem bem, serão 10 anos. A ilha é deserta. Não tem energia elétrica, não recebe sinal de telemóvel ( celular ), TV, ou internet! Pensem bem!

Eu não levaria nenhuma pessoa porque pode ser perigoso. Tomaria alguns cuidados prévios: decoraria alguns manuais de sobrevivência em locais inóspitos, assim como quais as plantas que poderiam ser utilizadas para comer, para medicar-se, etc. Teria que aprender a fazer fogo como os caras fazem nos filmes americanos. Então, meu Manual de Sobrevivência iria instalado no cérebro. E eu levaria:

1. Uma barraca.
2. Um saco de sementes para recomeçar minha vida no Neolítico. Nego-me a ser um mero coletor paleolítico.
3. Um caniço.
4. Um saco com algumas mudas de roupas (vale, não?).
5. Uma foto da Bárbara, do Bernardo e da Elena.

Porém, tentaria enganar o Chefe da Alfândega Eduardo Lunardelli escondendo em meio às roupas algum material para escrever e o romance Doutor Fausto, de Thomas Mann, com a finalidade de minorar minha sede de leitura e música.

Ah, e em meio às sementes haveria um canivete suíço, claro. Sei que o Eduardo faria vistas grossas, ele é legal…

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Um jogo, o Marconi, outro jogo

Estava assistindo ao Sport martelar, martelar e martelar o Palmeiras quando me veio a idéia de ligar para Marconi Leal. Trata-se do mais famoso torcedor do Sport a morar abaixo das latidudes do Trópico de Capricórnio. Talvez o único. Pego o telefone e ligo para São Paulo. Atende Patrícia, sua mulher, uma gaúcha que tenta torná-lo mais razoável, isto é, colorado. Ela me cumprimenta alegremente enquanto me diz que está levando o telefone para o Marconi na cama. Rapidamente, visualizei o meu amigo em seu quarto vendo o jogo, dando tapas no colchão a cada gol perdido, desejando que Paulo Baier voltasse a capinar na roça. Ele atende:

— E aí, Ribas?

— Vem cá, esse teu time não para de perder gols?

— É? Estou ouvindo uns vizinhos gritarem…

— Não estás vendo o jogo?

— Não, é que estou passando por uns problemas de pressão e meu médico sugeriu que eu não me emocionasse muito.

— Ah, tá.

(Um pouco de hesitação de minha parte).

— Olha, o Sport está bem. O jogo está seguro. O Palmeiras nem ataca. O gol sai logo…

— Hahahahahahahaha, não te preocupa, basta não ver!

E seguimos conversando por algum tempo. Sobre outros assuntos, claro…

Tão verídica quanto a história acima é o fato do Sport ter marcado apenas um gol durante o jogo e só mais um na decisão por pênaltis, o que retirou o clube de meu amigo da Libertadores. Marcos esteve do tamanho da decisão; o restante do Palmeiras, não. Ganharam com muita, muita sorte; defenderam-se todo o tempo; tinham poucos contra-ataques e mínima posse de bola. Neste Palmeiras, não reconheço a assinatura de seu treinador: é um time pesado, sem criatividade, de constrangedora simplicidade. Mas foi uma bela partida, típica de Libertadores, nada a ver com os amistosos do Grêmio, que nada mais são do que coletivos. O São Paulo devia protestar por não fazer o seu!

E ontem vi o jogo do Inter. O Inter perdeu muito com esse posicionamento defensivo inventado pelo Tite. São os tais sete atrás da linha da bola. Ora, se é assim, D`Ale, Nilmar e Taison têm de armar e fazer os gols. O louco do Nilmar rende sob qualquer esquema, mas D`Alessandro e principalmente Taison sumiram, assim como o toque de bola. OK, não perdemos para Corinthians e Flamengo, mas apresentamos um futebolzinho pobre, feio e fedorento. O Flamengo merecia vencer o jogo, só que entrou com uma dupla caipira na frente (Éverton e Emerson) e depois botou Obina e Josiel… Assim fica difícil, né?

Não vi o coletivo do Grêmio, só sei que há mais dois programados para as próximas quartas-feiras, desta vez contra um time de beisebol.

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É tudo verdade

Ontem, passei o dia acompanhando o cerco a Yeda Crusius. Não acredito em impeachment e nem o desejo. A entrada em cena de seu vice — que sempre fez-lhe oposição — como uma espécie de salvador e reserva moral do estado teria consequências desastrosas. Em pouco mais de um ano de governo, Paulo Feijó poderia tornar-se herói e novo candidato preferencial da mídia gaúcha. Melhor deixar assim. É bonito ver a louca espernear. É bonito ver Serra preocupado com uma governadora do PSDB comprovadamente ladra.

Mas encontrei esta coisa entre meus e-mails. Trata-se de uma mui truculenta troca de e-mails entre este blogueiro e um candidato a deputado estadual carioca. É tudo verdade, nada foi alterado. Claro que vocês sabem que eu não sou do TRE gaúcho e nem meu sobrenome é Rabelo. Ah, alterei meu e-mail trocando algumas letrinhas e o nome do candidato fazendo o mesmo. Tudo começou com um spam emitido por ele.

From: cesar penha
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 11:18 AM
Subject: cesar penha

Há mais de 30 anos, desempenho um trabalho em busca da Justiça Social. Como advogado, vendo a sociedade ruir com a total falta de amparo. Empenhei-me em auxiliar aos que clamavam por ajuda. Vereador do Município do Rio de Janeiro – 88/92, fui 2º vice-presidente da Câmara Municipal. Participei de forma atuante, na elaboração da Lei Orgânica do Município. Criei projetos para dependêntes quimicos; Banheiros em praças públicas e orla marítima; Regulamentei a atividade de professor de Educação Física no Município; Doaroes de sangue não pagam inscrição para concurso público municipal; Disponibilizei vale transporte para presidentes de associação de moradores e o mais importante trabalho de minha vida, a “justiça gratuita”. Quero dar continuidade a esse trabalho e conto com seu voto. Para Deputado Estadual Dr. Cesar Penha 12 678

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 11:20 AM
Subject: Re: cesar penha

Notei que você tem dificuldades com a língua portuguesa. Quer auxílio? Presto consultoria!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 12:09 PM
Subject: Re: cesar penha

Va se fuder seu merda!!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 1:45 PM
Subject: Re: cesar penha

Amigo.

“Vá” tem acento; e revise seu texto, ele tem 6 erros!

O mesmo para você. Milton.

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 1:53 PM
Subject: Fw: cesar penha

Desculpe, tem 7 erros. Encontrei mais um. Você é “doutor” por ter feito um doutorado ou é apenas mais um bacharelzinho do PDT?

Milton Rabelo – TRE Porto Alegre

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 4:04 PM
Subject: Re: cesar penha

Desde quando vc eh do TRE ??
Pensa que me assuta ??
Mais uma vez,, Vá se fuder seu MERDA !!! Bacherelzinho é a pqp!!!

Meta seus acentos e aulas no rabo !!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Thursday, September 05, 2002 2:22 PM
Subject: RE: cesar penha

Meu caro analfabeto.

Você fez duas perguntas. Vamos a elas.

1. Trabalho na área de sistemas do TRE gaúcho. Isto significa que, se desejar, comerei seu cuzinho carioca.

2. Em sua ponderada resposta, você cometeu três erros: “Assuta” e letra maiúscula após as vírgulas. A propósito, aquelas duas vírgulas consecutivas que você acaba de inventar, significam uma pausa um pouco mais longa?
Se for o caso, sugiro a utilização de um sinal já existente em nossa gramática: o ponto e vírgula (;). E o que é “bacherelzinho”?

Milton Rabelo, sempre a seu dispor para uma aulinha.

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Igreja de São Pelegrino em Caxias do Sul e Antônio Prado

Viajamos durante o fim de semana. Minha mulher tinha algumas reuniões na serra. Eu fiquei vadiando. O exterior da Igreja de São Pelegrino, em Caxias do Sul, é uma verdadeira blasfêmia arquitetônica, uma inconcebível mistura de estilos. A remissão destes pecados inicia na porta, quando nos deparamos com a porta de bronze, obra de Augusto Murer.

O lado de dentro é deslumbrante, com obras de Aldo Locatelli por todos os lados.

Vejam o teto.

Ah, vocês acharam estranho este detalhe?

Pois é, se Michelangelo foi proibido de colocar demônios na Sistina, Locatelli desenhou-os em São Pelegrino. Notável.

Mas há uma coisa absurda. Nos quadros que descrevem a via sacra e que circundam a nave há vidros de proteção. E eles refletem a luz, óbvio. E há muita luz. Então a gente não consegue nenhum quadro por inteiro. Alguns detalhes tem que ser vistos dando uma voltinha para fazer com que os reflexos luminosos se movam. Há malucos que se quase se atiram no chão por uma foto.

E mesmo assim, observem, pegam o reflexo das janelas do outro lado da igreja. O quadro acima é belíssimo. Aquela lata caindo é a lata de tinta do pintor Locatelli, já quase sem forças para finalizar os afrescos de São Pelegrino, em razão do câncer que o mataria aos 47 anos. Algumas pessoas protestam, pois não havia latas na época de Cristo… Céus!

Depois, fomos à Antônio Prado.

Na cidade, há diversas obras tombadas pelo patrimônio histórico. Desconheço a história de Antônio Prado, mas chutaria algo semelhante à Parati. Provavelmente foi mantida do modo como a vemos por ter empobrecido muito.

A única forma de se preservar alguma coisa do passado do Brasil é através do desinteresse. Se há interesse, põe-se tudo abaixo. Voltem às fotos anteriores. Prestem atenção ao tamanho das tábuas. Cada uma tem metros e metros de madeira contínua.

Mesmo que entremeadas de construções modernas, mesmo que os pradenses passeiem na rua com os carros tocando a todo volume uma “música” com a “letra” que transcrevo abaixo: …

Ela já fez plástica,
ela faz ginástica,
ela faz dieta
é gostosa à beça,
ela ficou fantástica,
ela é transgênica,
ela é turbinada,
foi modificada
ela ficou fantástica.

Sobrou alguma coisa para a gente ver. Imagino meus amigos Leônidas Abbio e Daniela Pasetto pequenos, brincando no pátio do Colégio Ulisses Cabral.

Comprando carne num açougue pra lá de temático.

Mas olha, gostei mesmo foi da fantástica, perfeitíssima sopa de capeletti (ou agnolini) que tomamos no Clube União. Comemos maravilhosamente — depois foram servidas milhões de saladas e churrasco impecável. E pasmem, nós pagamos, O CASAL, R$ 28.

Inesquecível.

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Steve Reich: Music for pieces of wood

Se Gavin Bryars é o maior compositor minimalista, Steve Reich é o mais inventivo, surpreendente e matemático. Gosto muito. Com vocês, algumas de suas experiências: a Clapping Music, as Nagoya Marimbas e a Music for pieces of wood em versão “metal”, três estudos para percussão escritos por Reich.

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A privada metafórica e seus efeitos colaterais

Às vezes, uma voz feminina me sussurra ao ouvido: “ Faltam seis jogos para o Inter ser campeão da Copa do Brasil. Acho que vai dessa vez”. Mas logo vem outra voz, agora masculina, e responde: “ E sete para o Grêmio ser campeão da Libertadores”. Se eu pudesse ligar os dois fatos, fazendo um consequência do outro, se pudesse assinar um contrato garantindo as duas vitórias… Acho que não o assinaria.

Pois a Copa do Brasil é o meio, a Libertadores é o fim. A conquista de uma Libertadores é algo que marca e muda um clube e meu coloradismo seria cruelmente atacado com um terceiro título tricolor, enquanto que a Copa do Brasil, pfff… Acho que nem deveria dar vaga direto à Libertadores, mas aquela vaguinha que deve ser confirmada contra um sul-americano fraco. Então, já que rasgamos o contrato, separemos Grêmio e Inter. O Inter ganha a Copa do Brasil e o Grêmio perde a Libertadores. Brilhante! Mas quem fará o Grêmio perdê-la?

Ai, jisuis. Vamos combinar que o San Martín é uma piada. E o próximo adversário do Grêmio está entre Caracas e Cuenca. Vi todos jogarem. São zumbis. Todo o mundo sabe que o Grêmio já está nas semifinais e o que me desespera é que, antes das delas, o São Paulo brigará com o Cruzeiro, o Sport com o Palmeiras, o Boca com o Estudiantes; ou seja, o Grêmio chegará sem cansaço e luta para enfrentar apenas dois times. Como não creio que vá me matar, resta esperar que os melhores vençam.

O entusiasmo do São Paulo me parece o daquele cara que come a Scarlett Johansson e vê que a estagiária gorda e cheia de acne está a fim de “fazer amor”. Além do mais, o time do Morumbi só ganha em Porto Alegre quando traz o Atlético-PR (obrigado, Prestes). Contra o Grêmio, é galinha morta. O Cruzeiro é uma instituição bipolar e, de uma forma que deixaria muitos psiquiatras ruminativos, contratou Kléber, um centroavante com tantos desvios de comportamento que seria o pupilo ideal do Capitão Nascimento. O Boca Juniors tem fama e resultados, mas a formação atual se esforça, corre, berra, bate e sua um rio para parir algo como uma mosca, das pequenas. Sim, estou cagado.

Falam em mudar os cruzamentos. Ah, eu quero, mas não tirem o Cruzeiro do caminho!

A vida do Inter é parecida com a do Grêmio. Enfrenta o Flamengo, depois, se passar, diverte-se com Ponte Preta ou Coritiba – babas dignas de um San Martín da vida — e pega o Vitória do Franciel (dois links) ou o Corínthians do Mano Menezes ou o Fluminense do Fred. Eu prefiro enfrentar o Corínthians. Seria muito mais “temático” ganhar um campeonato deles depois que quase roubamos o Brasileiro de 2005, comprado por eles. Eles se tornariam bi-vices da competição. O Vitória é o time do Carpeggiani, não gostaria de torcer contra ele que foi meu ídolo e o Flu seria também legal, pois seria bi-vice para o Inter. Também seria divertido.

Mas olha, estou preocupado é com quem ganhará do Grêmio. Se apostasse, vocês já sabem, cravaria Cruzeiro. Todo cagado.

P.S. importante: o jornalista Jones Lopes da Silva está escrevendo uma biografia de Escurinho. Quem tiver boas histórias e curiosidades que não as usuais, marque um papo com ele pelo e-mail [email protected]. Falei longamente com ele e o livro sairá bonito e bom.

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Melhor programa cultural para hoje: Cineclubismo nos Anos de Chumbo

Recebi este e-mail:

Olá,

estou organizando uma sessão de cinema na Sala Redenção (UFRGS) no dia 07/05, em que será passado o filme Uma cidade sem passado. A proposta é de que a autora do livro “Cineclubismo – Memória dos anos de chumbo” – Rose Clair Matela – comente, após a sessão, a importância do movimento cineclubista no período da ditadura (não era ditabranda) não só como um espaço de resistência político-cultural, mas também de formação para os sujeitos que dele participaram. Rose Clair paricipou diretamente da organização dos cineclubes no Rio de Janeiro naquela época, viu e viveu de perto a repressão. No dia 08/05, a proposta é de realizar um debate entre ela e Luiz Alberto Cassol – que trabalha com o cineclubismo hoje – para que seja debatida a importância do cineclube naquela época e na atualidade, também como um espaço de resistência político-cultural e de formação para os sujeitos, mas em contextos diferentes. Gostaria de saber se é possível fazer a divulgação no blog quando a data se aproximar. Se puder contribuir de alguma forma, ficamos gratos. Desde já agradeço a atenção.

Att.,
Carla Hirt

Uma Cidade sem Passado (Das Schreckliche Mädchen), de Michael Verhoeven, é um dessas pequenas obras-primas muito pouco vistas. É um filme alemão de 1990. A história: na década de 70, Sonja, uma jovem estudante, inscreve-se num concurso “Minha Cidade Durante o Terceiro Reich“. Porém não são todos que querem colaborar para que ela tenha acesso aos antigos arquivos da cidade. Muita gente entra em pânico e então mais do que nunca Sonja quer descobrir a verdade sobre os que viveram sob o regime da época. Deliciosa mistura de comédia e drama, o filme é baseado em fatos reais. Ganhou vários prêmios e chegou a ser indicado para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Com inteira justiça. (Adaptado desta página).

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Uma abordagem pessoal ao Abecedário de Pound

Durante a adolescência, apaixonei-me tão perdidamente pela literatura, que tinha certeza de que o único destino possível para mim era o de tornar-me escritor. Era capaz de ler livros diariamente por mais de 6 horas. Na época não confessaria isto nem sob tortura, mas minha dedicação era uma meticulosa preparação para o futuro. Queria abordar o maior número possível de obras e fazia-o de maneira sistemática, a fim de alargar pouco a pouco meus conhecimentos. Minha família preocupava-se discretamente com aquele filho maluco que só queria saber de livros, mas como eu era manso, minha situação não lhes assustava muito. Kafka dizia que, fora da literatura, pouca coisa o interessava; a mim também, naquele tempo. Depois, muita coisa mudou, mas fiquemos em Pound.

Nunca me interessei muito por poesia, dedico-lhe um tempo ínfimo se comparado àquele que dou a prosa. Fiquei feliz quando soube que Dostoiévski, Balzac, Bellow, Thomas Mann e outros eram assim também. Porém, no âmbito daquela minha preparação para o futuro, li um ensaísta-poeta que foi fundamental para meu entendimento de literatura. Ele havia caído em desgraça nos meios universitários dos anos 70. Vivíamos sob ditadura militar, todos os intelectuais respeitados eram de esquerda; mas, apesar disto tudo, eu precisava conhecer Ezra Pound, um dos escritores que deram apoio ao fascismo durante a Segunda Guerra Mundial.

Seu ABC da Literatura (Cultrix, 1973), traduzido por Augusto de Campos e José Paulo Paes, foi adquirido e lido por mim em agosto de 1976. É um pequeno livro, escrito quase em forma de panfleto, onde Pound prova, através de teoria simples e de muitos exemplos, que a poesia é tanto melhor quanto mais significados contiver. O ABC comprova que a melhor poesia é a mais saturada de significados e nos explica sobre a sabedoria da língua alemã, onde dichten (condensar) é o verbo alemão correspondente ao substantivo Dichtung, que significa “poesia”. “Grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível”, escreve Pound. Após curtas explicações teóricas, Pound nos demonstra suas teses com excertos. Estes tomam metade do livro e são a prova cabal de que sua teoria foi criada sobre fatos literários, não sobre fatos imaginados.

Ezra Pound (1885-1972)

Os prosadores também tiraram vantagem da condensação. Alguns, além de utilizarem uma linguagem limpa, quase livre de adjetivações – como Kafka e Borges, por exemplo – se utilizam de situações que falam. Isto é, os personagens são colocados em determinadas situações que auxiliam a narrativa ou a contradizem. Este é mais um elemento a condensar significados, pois acrescenta mais informação àquela que nos chega através dos meios tradicionais: texto e diálogos. Este seria o máximo de condensação em prosa, pois além da linguagem enxuta e multi-significante tomada da poesia, há todo um contexto apoiando a narrativa. Também o cinema, a partir da nouvelle vague, passou a “treinar” o público para este tipo de abordagem, na verdade tão antiga quanto Shakespeare.

Condensar não é tão fácil quanto parece. “A incompetência se revela no uso de palavras demasiadas”, diz Pound. Parece fácil eliminar as excrescências de nossos textos, mas como fazer para que os significados se multipliquem? Pound não nos deixa à deriva e também investiga os modos através dos quais as palavras podem ser carregadas de significado.

Porém, a teoria de Pound tem limites. Se alguém censurasse Dostoiévski, Bernhard ou Stendhal pela incrível profusão de repetições e detalhes que seus livros contêm, poderia ser chamado tranqüilamente de doido. Nestes casos, as minúcias criam o ambiente da ação ou servem para caracterizar o pensamento de alguns personagens. Dostoiévski escreveu no plano de Crime e Castigo: encher a narrativa de detalhes e repetições! O mesmo vale para o ultra-verboso e barroco Saramago. Nestes autores, o excesso trabalha a favor da trama. Que bom que seja assim! Se a boa literatura fosse apenas aquela que melhor adere a cânones pré-definidos, tornar-se-ia uma simples competição entre virtuoses e morreríamos de tédio. É excelente que os bons autores insistam em agir como aquelas cozinheiras talentosas e corajosas que mudam as receitas durante a preparação dos pratos. Agindo assim, acabam por cometer tanto erros lamentáveis como gloriosos acertos.

Ou seja, sei lá. Cada um faz do seu jeito.

COMENTÁRIO EXPOSTO AO MILTON E AOS SEUS LEITORES (por Paulo José Miranda)

Bom, pensei demoradamente antes de escrever este comentário: pensei um minuto. Para mim, um minuto é muito para pensar, quando se trata da minha vida e não de filosofia, de poesia, de literatura ou de arte. Aí, sim, demoro-me a pensar. Julgo que a vida não foi feita pra pensar. Na vida age-se. Talvez por isso tenha vivido em tantas e tão estranhas partes deste mundo. Ao ponto de a minha casa ser a internet. Não é certo encontrarem-me em outro lugar. Por isso agradeço tudo quanto posso ao Senhor Tim Berners-Lee pela sua infinita generosidade, ao inventar ao WEB e não ter registado direitos, isto é, ter feito da WEB um espaço gratuito. Assim, devido a esse senhor, hoje todos me podem encontrar em meu e-mail e sites. De tal modo é assim que, aquando do meu projecto America-is, o senhor e fotógrafo Francisco Huguenin Uhlfelder anunciou os membros envolvidos no projecto e as suas localizações deste modo: A em Munique, B em Itália, C em Nova Iorque, D em Lisboa e E(u) num http://etc. Tudo isto por causa de não pensar mais de um minuto em relação à minha vida, aos acontecimentos da minha vida.

Depois desta explicação acerca do meu minuto, passo ao que verdadeiramente aqui me trouxe: o post do Milton. Não me parece que este post seja melhor do que alguns outros, mas é seguramente pertinente por várias razões: 1) apresenta um cânone poético-literário que se propõe, depois, não a destruir, mas a relativizar; invoca, sem medo, a filiação política de Pound, assumindo que isso nada interfere no seu juízo de gosto, pois se não gosta dos poemas é por razões estéticas, que não impedem de apreciar ao limite o seu ABC; por fim, mas não por último, mostra a angústia de um homem à beira de ser escritor (estamos sempre à beira quando o mundo não nos reconhece). Ninguém é escritor na sua rua, embora possa ser na gaveta. Contrariamente ao Milton, li muito pouco durante a minha infância e durante a minha adolescência. Li, mas li pouco. Nem sequer alguma vez tive alguma vez a ideia exotérica de querer ser escritor. Quis ser músico! Músico como o nosso (meu e do Milton e de muitos outros) muito apreciado Thomas Bernhard. Mais tarde, falhado o objectivo músico (o talento dava pra ser um razoável executante e um pouco menos razoável compositor) quis ser filósofo. Filósofo depois de falhado o projecto de músico, como já tinha acontecido com alguns filósofos. Depois falhei também neste projecto, embora tenha sido um aluno bastante acima da média, o que daria pra ser um professor mediano na faculdade, nunca como os mestres que tive: António C. Caeiro, Mário Jorge Silva Carvalho, Nuno Ferro, Maria Filomena Molder, José Gil. A poesia surgiu nos intervalos da filosofia. Quando acabei filosofia editei um livro de poesia, A Voz Que Nos Trai, que acabou por ser premiado com o Prémio Teixeira de Pascoaes. Por causa de uma mulher comecei ou recomecei ou comecei, não sei, a escrever prosa. Esse primeiro livro Um Prego No Coração acabou por despertar a atenção do melhor poeta português vivo, que me teceu os maiores elogios e que, por causa disso, me levou á publicação de outros livros de prosa. O segundo, Natureza Morta, levou-me a arrebatar o primeiro Prémio José Saramago que, para além do prestígio me concedeu também cerca de 25 mil euros. A partir daqui aceitei que era escritor. Acabei por ser escritor por ter falhado em tudo o que me havia proposto anteriormente. E não foi sem resistência que um dia, ao olhar para o espelho, disse a mim mesmo: “é assim, pá, és escritor, aceita!” E aceitei. Hoje, volvidos 6 ou 7 anos, sei por que sou escritor e não sou poeta, contrariamente ao que alguns amigos julgam. Nós somos qualificados por uma profissão ou um mister quando grande parte do nosso tempo é passado aí. Ora, eu passo quase tempo nenhum na poesia, quase nada, apenas um pouco mais do que passo a pensar na minha vida. Quanto à literatura, passo quase a minha vida toda. Desde que aceitei aquilo que era, escritor, quase não faço mais nada senão pensar, pensar, pensar, pensar. Não penso em escrever. Penso e escrevo. Penso e escrevo. Penso e escrevo. E assim vai.

Em Portugal temos uma expressão antiga que é: De Espanha nem bons ventos, nem bons casamentos. Poderia aplicar a mesma expressão a Pound. Nunca consegui apreciar-lhe os versos, nem a sua inteligência literária. E asseguro que não se trata de preconceito político, pois tal como o Milton também não misturo alhos com bugalhos, embora isto seja uma discussão enorme. Por outro lado, estou bastante longe de ser um intelectual de esquerda. Não há razões políticas a atrapalharem-me o juízo estético, pronto! Serei a última pessoa a pôr em causa o talento poético ou qualquer outro de Pound. Mas não é pra mim. Quanto à sua teoria, é tão ridícula quanto as teorias que orientavam Eça de Queirós quando escrevia os seus romances. As teorias eram ridículas, mas o talento de Eça, não. Eça é um escritor excelente, um escritor que aprecio imenso. Mas não as suas teorias, não aquilo em que literariamente ele acreditava. Provavelmente passa-se o mesmo com Pound, mas eu não sou permeável. Milton expõe sucinta e eficazmente a teoria do senhor Pound, no seu post, mas depois relativiza a sua verdade. O problema, para mim, é que a verdade não é relativizável, se me permitem o neologismo. À primeira leitura, parece que o Milton quer ficar bem com Deus e com o Diabo, com Pound e com Bernhard. Quem já leu Extinção, de Bernhard, sabe que isso não é sequer possível de ser pensado. Nesse livro, a páginas tantas, lá pras trezentas e muitas, pelo menos na minha edição inglesa, ele expõe, através do narrador, a sua teoria literária. Qual a grande diferença? Primeiro porque ela é teoria dentro de um livro de ficção, isto é, não pode ser lida independentemente desse facto. Não se trata de um ensaio, ou sequer de um artigo, trata-se de algo maior: o coração de Bernhard. E o coração do autor é exposto, mostrado em duas linhas: exagero e repetição. Mais: exagero de repetição. Podemos viver uma vida, ou várias, amando Pound e, depois, outras vidas amando Bernhard, mas não podemos amá-los em simultâneo. Peço desculpa a todos, mas não se pode gostar do Grémio e do Inter! Sei, a arte não é futebol. Pois não, pois não, mesmo. É muito mais vital. Jogamos a nossa vida nela. Eu, pelo menos, jogo a minha vida nela. Assim, amar um cânone e desprezar outro é muito mais vital para mim do que amar o Tremendo FC Porto e desprezar o Benfica. Quero que o Benfica perca todos os jogos, apenas isso. Mas quero muito menos ao cânone de Pound: quero que ele se escafede todo; quero que o cânone do senhor Pound não veja sequer a luz do dia; quero que morra (não a sua poesia, mas a sua teoria). Por outro lado, julgo que Milton não está a defender o “convívio” entre teorias irreconciliáveis. Milton está a dizer que não “reconhece” nenhum cânone. E isto, sim, é perigoso. Não há um escritor que seja que não escreva por causa de um cânone, ainda que o modifique, claro. Mas quem é que pode modificar uma receita (para usar o exemplo dado pelo Milton) senão quem sabe cozinhar, quem seguiu, até à modificação da receita, um determinado cânone? Suspeito que só se pode escrever bem contra Deus, contra a ciência, contra a vida, contra si mesmo. E para estarmos contra, temos que estar, erradamente ou não, certos de que há um caminho melhor do que todos os outros. Só assim Bernhard pôde escrever tão bem como escreveu.

Sou leitor assíduo das crónicas do Milton. Algumas são excelsas. Algumas são maçadoras. Mas todas são bem escritas. Se não julgasse assim, não o tinha convidado para fazer parte do Cidades Crónicas. Mas, para ser melhor ainda, aconselho-lhe, se posso, se ele me permite, que se assuma literariamente. Apetece-me dizer-lhe: “Milton, pá, escreve como se tivesses a dizer mal do Grémio!” E dizer mal do Grémio (que eu prefiro ao Inter) não implica não dizer bem. Pois acaba-se por dizer bem nem que seja desses tomatinhos de conserva do Inter. Eu, que nunca quis ser escritor, e que acabei por ser; foi o que restou pra eu ser, estou convicto de que é daqui que vem a força da minha escrita: escrever contra o que não foi a minha vida, isto, contra todos os meus falhanços, escrever contra mim. Eu sou eu mesmo o meu Benfica. Quero ouvir o Milton dizer: “Eu sou eu mesmo o meu Grémio.”

Abraço forte ao Milton e aos seus leitores,
Paulo José Miranda

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Galeria de Horrores: José Serra, Ariano Suassuna e católicos do Paraguai

Este é o ex-Ministro da Saúde (!?) José Serra tranquilizando o país sobre a gripe suína. Este homem é candidato à Presidência da República…

Se a imagem não aparecer, clique aqui para pasmar-se.

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É sabido por poucos que o Secretário de Cultura do Estado Ariano Suassuna é um fascistóide. Mas é. As pessoas insistem em achá-lo engraçadinho fora do estado de Pernambuco. Talvez ele até seja, desde que distante 3000 Km ou mais. Experimente viver com quem MANDA na cultura e pensa que Antonio Carlos Jobim, por exemplo, é um “compositor sem especial importância” e “José de Alencar é mais importante do que Joyce”. Ontem, Fernando Monteiro publicou o post abaixo na Kriterion:

“DIFERENTEMENTE DA MAIORIA”
Fernando Monteiro

Ariano Suassuna concedeu entrevista ao “Personalidade”, programa da TV Câmara. Participaram da entrevista a antropóloga da Universidade Federal de Pernambuco, Aparecida Nogueira, autora de vários textos sobre a obra do escritor paraibano, e os jornalistas Cláudio Ferreira, da TV Câmara, e Amneres Pereira, diretora do Jornal da Câmara. Entre outras “pérolas” recolhidas das respostas do atual secretário Ariano Vilar Suassuna, pincemos esta aqui, de uma franqueza (reconheçamos) que em nada disfarça – realmente – o pensamento “alinhado” que faz sucesso (?) não só entre os conservadores, como-nunca-antes-por-este-país afora:

“Sou um intelectual que, diferentemente da maioria, nunca falei mal das Forças Armadas. Apoiei, durante um tempo muito difícil, generais patriotas como Euler Bentes Monteiro e Antônio Carlos de Andrada Serpa, porque via neles uma preocupação de defender o País. Acho que nós, intelectuais, temos o dever de começar a relembrar que o Brasil precisa muito de uma aproximação nossa com as Forças Armadas e com o clero neste momento em que vivemos.”

Quem quiser conferir o resto, acesse este endereço.

É a ditabranda Versão Armorial.

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Para finalizar, começou no Paraguai a campanha anti-Lugo, o comedor de criancinhas. E a Justiça? Intervém acusando-o de algo ou o cara será incinerado pela imprensa?

É foda.

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Porque hoje é sábado, X

Às vezes a coisa não dá certo. O WordPress ficou irritado com as imagens deste sábado. Deve ser religioso, mas não como o Lugo, nosso hot bispo.

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Atenção, cinéfilos de Porto Alegre!

Hoje vou fazer uma propaganda gratuita do Cinema Guion de Porto Alegre. Um dos melhores negócios que fazemos anualmente eu e minha mulher é a assinatura anual do Guion. Quase todos os melhores filmes passam lá, raramente tenho que enfrentar um shopping com gente cheia de pipocas e com aquele cheiro nauseabundo de manteiga. Por quê? Ora, porque 90% do cinema relevante passa lá.

Deste modo, acabo indo no mínimo uma vez por semana a uma das oito salas do Guion. Entro gratuitamente. Bem, não é bem assim: pago R$ 180,00 e entro em todos os filmes que quero, quantas vezes quiser, por um ano. Façamos alguns cálculos:

Se eu for uma vez por semana pagando ingresso: R$ 12 x 52 = R$ 624,00
Se eu for uma vez a cada 15 dias: R$ 12 x 26 = R$ 312,00

Mas pago R$ 180,00. Querem saber a relação de filmes desta semana, por exemplo?

VALSA COM BASHIR, de Ari Folman
A JANELA, de Carlos Sorín
CHE – O ARGENTINO, de Steven Soderbergh
ENTRE OS MUROS DA ESCOLA, de Laurent Cantet
O CASAMENTO DE RACHEL, de Jonathan Demme
DUVIDA, de John Patrick Shanley
A BELA JUNIE, de Christophe Honoré
O LEITOR, de Stephen Daldry
FOI APENAS UM SONHO, de Sam Mendes
X-MEN ORIGENS: WOLVERIN, de Gavin Hood
ELE NÃO ESTA TÃO A FIM DE VOCÊ, de Ken Kwapis

Excetuando-se Gran Torino e ignorando os dois últimos da lista, todo o restante dos filmes “suportáveis” estão aí. Então deixe de ser burro, tá? Ah, e no AeroGuion o estacionamento é grátis!

Resposta a uma dúvida surgida nos comentários: São R$ 180,00 por pessoa. Obviamente, não há promoção para casais, essas coisas.

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