Sobre o goleiro especialista em pênaltis da Holanda, Tim Krul. Anteontem à noite, meu amigo Ricardo Branco aventara (gostaram?) a hipótese de que aquilo fosse apenas uma inteligente medida de ordem psicológica e intimidatória. Do tipo, “temos uma arma secreta”. Para piorar, o tal especialista era um armário. Hoje, sabe-se que o Branco tinha razão. Tratava-se de uma medida brilhante de Louis van Gaal a fim de deixar os jogadores da Costa Rica de cabelos em pé. “Quem é esse cara que entra só para os pênaltis? Deve ser o próprio monstro que pega todos”. A estratégia está na regra e a Holanda ganhou.
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Já que, nestes dias antes das semifinais, a Argentina tem mais cara de campeã do que o Brasil, meu amigo Jorge Lima sugere um bombardeio preventivo a Buenos Aires. Acho que nossa Marinha — temos mesmo isso?, como eles passam o tempo? — poderia atacar do Prata, destruindo os restaurantes de Puerto Madero. Pura profilaxia.
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Palpites para as semifinais:
Brasil x Alemanha (Belo Horizonte, 8 de julho, às 17h)
–> Passa a ALEMANHA, infelizmente
Argentina x Holanda (São Paulo, 9 de julho, às 17h)
–> Passa a ARGENTINA.
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Pena que não consegui ver o final do jogo no qual Novak Djokovic venceu Wimbledon e ainda retornou ao primeiro lugar no ranking. Vi só os 4 primeiros sets… Também, né, foram mais de 3h30 e eu tinha que ir ao cinema. Já tinha comprado os ingressos e tudo…
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Esse pessoal que fala em Copa comprada ou é ingênuo ou está fora da disputa. Argentina, Alemanha, Brasil e Holanda pagaram suas vagas? Conta outra. E, se quem comprou foi o Brasil, por que não providenciou adversários mais fáceis? Como disse o Sergio Bomfim, imagina a grana pra subornar 31 seleções. Deve ser o dobro do PIB.
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No ano passado, eu e Igor Natusch criamos informalmente o PJS — Partido da Justiça Social. Quem poderia ser contra nós?
Anteontem, Elena Romanov manifestou desejo de criar o PUM — Partido Utópico Moderado. Agora debato-me entre as duas siglas.
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Olha, o nível dessas eleições é de chorar. Nossa Assembleia Legislativa, hoje já não muito brilhante….
A gente aqui é muito chique. Como o titular do espaço resolver ver a peça Deus da Carnificina — uma de suas preferências absolutas — terceirizamos a resenha do Concerto da Ospa de ontem à noite com alguém que conhece muito mais. Não se acostumem, eu voltarei! Sim, o texto a seguir é de Dimitri Cervo, convidado por nós para escrever acerca de um concerto que, pelo visto (ou lido), foi ótimo. Agradeço ao Dimitri por ter concordado tão pronta e simpaticamente com nossa proposta. Aproveito também para me desculpar pela ligação que o tirou da cama, fato que só fui descobrir após lê-lo. Ah, a Ospa apresentará o mesmo programa de ontem na segunda-feira que vem, só que no Teatro Solis, em Montevidéu. Eu não disse que estamos chiques hoje? Com vocês, Dimitri Cervo:
Chego às 20h15 para o concerto da OSPA de ontem à noite, fila no pórtico da Assembléia Legislativa, ingressos esgotados. Após certa apreensão, pelas 20h30 as cerca de 70 pessoas que ficaram de fora são gentilmente convidadas a se acomodar “onde for possível.” Todos entram satisfeitos, com o aquele espírito de imagina-perder-esse-concerto-tchê! Olho ao redor, Assembléia Legislativa lotada, público animado e diversificado, alguns até com mate em punho e ainda consigo sentar bem no meio da sala, enquanto que a maioria se acomoda nas escadas laterais.
O concerto começa, música sublime de Carlos Gomes pairando no ar, José Maria Florêncio consegue extrair o máximo dessa obra prima: Alvorada, de Carlos Gomes. Logo entra Yamandu Costa, violão na mão, jeito “amandueiro”, um pouco levado, de alpargatas e bombacha. Ele é o solista da Fantasia Popular, obra sua em parceria com Paulo Aragão, que teve sua gênese em 2008 e desde então tem sido apresentada no Brasil e no exterior. Os três movimentos fluem maravilhosamente. No final, Yamandu, muito aplaudido, volta para um bis, com a excelente Bachbaridade, uma síntese musical e fonética e do espírito irreverente desse grande artista. Muito ovacionado, coloca o violão acima de sua cabeça, ofertando-o a platéia, simbolizando um “me coloco a serviço desse instrumento e da música”. Grandiosidade e humildade em um mesmo ser.
Falando com Aragão, soube que o processo criativo dessa obra representa o amadurecimento de uma relação artística de mais de uma década. Yamandu lhe passou em gravação inúmeras ideias musicais, e aos poucos elas foram sendo anotadas e modeladas em conjunto por esses dois vizinhos em Botafogo, tomando a forma final nessa excelente obra em três movimentos, em que a expressividade e virtuosidade do violão brasileiro de Yamandu são tão bem balanceadas com os recursos orquestrais.
Na segunda parte José Maria Florêncio voltou a demonstrar porque é um dos maestros brasileiros mais conceituados no mundo. Sua singular e precisa concepção da Bachianas Brasileiras nº 4, de Heitor Villa-Lobos e da contagiante Suíte Sinfônica nº 2 – Pernambucana, de César Guerra-Peixe fecharam a noite em grande estilo.
Após o concerto, ainda tive a honra de partilhar do jantar com Yamandu, Paulo, Florêncio, Tiago Flores e Elisa Cunha. Depois, a grande e boa armadilha do Yamandu, “vamos em algum lugar para uma saideira”. Foi um privilegio trocar ideias com Yamandu, Florêncio e Aragão madrugada adentro, as riquezas que brotaram desse encontro jamais poderá ser reproduzida em palavras. Para resumir, a saideira só terminou na hora de Yamandu ter que ir para o aeroporto, para outro compromisso sinfônico, agora com a Sinfônica Brasileira. E eu que esperava poder dormir um pouco mais hoje, fui despertado com o Milton Ribeiro ao fone. Já que ele não pode ir ao concerto me pediu essa resenha. Fiz o que pude, mas para capturar algo do essencial que aconteceu em música no concerto, e no palavreio do pós-concerto, só um escritor escrevendo um livro, ou um compositor criando música.
Foi um excelente concerto, pena a falta de um café no local, o Auditório Dante Barone, da Assembleia Legislativa. A noite começou com o bom gosto de não haver discursos. Foi uma surpreendente renúncia num dia em que a Ospa tinha assinado o contrato para o repasse das verbas necessárias para a construção de sua Sala Sinfônica. Já houvera discursos pela manhã no Palácio Piratini, claro, mas a gente sabe como alguns políticos gostam de falar e refalar. Acho que o Assis Brasil não aderiu 100% à classe, o que não deixa de ser um raro caso de belo conservadorismo. Outra surpresa foi o grande público. O que não faz um estacionamento próximo, não? Ali na UFRGS a coisa é duríssima para estacionar. Talvez o simples fato de estarmos na frente de uma praça, com todo seu entorno “estacionável”, tenha trazido um grande público. E havia um programa popular, equilibrado e de bom nível, mesmo que eu esteja de saco cheio de ouvir Quadros de uma Exposição.
O solista era o extraordinário Alejandro Drago que… bem… Já tocara o solo introdutório da Tzigane sábado em minha casa. Fazer o quê? E o regente era novamente o uruguaio Federico “Asterix” García Vigil. Ou seja, a margem de erro era mínima.
Não sou nada apaixonado pela Introdução e Rondó Caprichoso, Op. 28 de Camille Saint-Saëns, mas é claro que uma execução convincente mata muitas restrições. Já a Tzigane de Ravel é uma peça espetacular, cheia de virtuosismo, originalidade, liberdade e sensualidade. Se você estava nas redondezas e perdeu este concerto… Olha, só tenho a lamentar. É uma peça de aproximadamente dez minutos, talvez simples para a orquestra, mas o solista Drago e leitura compreensiva de Asterix fizeram toda a diferença. Foi um momento para se guardar bem na memória e confesso que meus olhos ficam marejados com a lembrança das retomadas rítmicas da peça que Ravel escreveu orginalmente para piano e violino, mas que cuja melhor versão é a ouvida ontem. Quem perdeu o concerto… E a entrada era franca, tchê!
Após o intervalo (e ainda sem café), veio Quadros de uma Exposição, de Mussorgsky, na versão orquestral de Ravel. É uma grande e exigente orquestração. A Ospa saiu-se maravilhosamente, com destaque para os metais — não sei o nome do trompetista que arrasou ontem. A obra ficou muito popular a partir dos anos 70, com dois discos best sellers: a versão algo abusiva do grupo de rock progressivo Emerson, Lake & Palmer e o disco da DG com Karajan e a Filarmônica de Berlim desta mesma versão dos Quadros e com um complemento igualmente matador — o Bolero de Ravel. Foi um dos discos mais vendidos da história da Deutsche Grammophon.
Agora, olhem esta foto e me digam que não é o Asterix:
“Se Deus não existe e a alma é mortal, tudo é permitido”, diz o personagem Ivan Karamázov em Os Irmãos Karamázovi, de Dostoiévski. O russo era cristão e foi um escritor genial. Tão genial que lograva transferir-se para a pele de seus personagens de tal maneira que é difícil supor as ideias do homem por trás do romancista. Pois Dostoiévski não parece projetar-se em ninguém; em seus romances não há uma voz onisciente que comande tudo. Desta forma, o ateu Ivan Karamázov era provocativo, principalmente com seu irmão mais moço, o beato Aliócha, e a célebre frase é um caso exemplar de descontextualização por ter sido pronunciada por Ivan para Aliócha e não de Dostoiévski para uma plateia, por exemplo.
A noção de entidades superiores que julgam os atos dos homens talvez preceda a própria noção de humanidade. Para a antiguidade, de forma mais indiscutível do que hoje, Deus criara não apenas a vida e a existência do mundo e do universo, mas encarnava os preceitos éticos do certo e do errado. Deparando-se com o caos da vida e com leis insuficientes, os homens precisavam de limites. Sem eles, talvez os homens roubassem e matassem uns aos outros, cada um pensando ter direito a tudo. Deus os olharia e julgaria, no papel de representante do bem, do correto e da retidão, enquanto o Diabo representaria o mal, o errado, a destruição, o roubo e a morte. O ser humano que estivesse em coesão com Deus estaria de acordo com sua justiça.
Depois — durante toda a Idade Média e além, houve longo predomínio da moral cristã no mundo ocidental — , Deus permaneceu identificado com o Bem, a Justiça e a Verdade. Santo Agostinho (354-430), bispo, teólogo e filósofo da Igreja Católica, fundamentou a moral cristã na busca pela felicidade e a felicidade suprema consistiria num encontro com Deus na imortalidade. Só assim o homem poderia ser verdadeiramente feliz. E, para sê-lo, bastaria obedecer às leis e aos preceitos de Deus.
Desta forma, a Justiça dos homens acostumou-se a invocar Deus a fim de julgar corretamente os problemas do mundo, pois o contexto impedia a existência de teorias éticas autônomas da doutrina da Igreja. Todas elas, de uma forma ou outra, teriam que estar de acordo com os princípios divinos. Quem não viu filmes onde a testemunha, antes de responder a qualquer coisa, jurava dizer a verdade, somente a verdade, nada mais do que a verdade, com a mão sobre a Bíblia?
Crucifixo que abençoa o plenário da Câmara Municipal de Porto Alegre | Foto: Ramiro Furquim/Sul21.com.br
Não surpreende, portanto, que até hoje haja símbolos católicos nos prédios da Justiça e de outros órgãos públicos. É contra isto que a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) e outras cinco entidades protocolaram pedidos. Desejavam a retirada dos símbolos religiosos das repartições do Executivo estadual, da Assembleia Legislativa, da Câmara dos Vereadores de Porto Alegre e do TJ-RS, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Em resposta, o juiz assessor Antonio Vinicius Amaro da Silveira utilizou o argumento de que, no preâmbulo da Constituição de 1988, consta a frase de que esta fora promulgada “sob a proteção de Deus” e isto garantiria que aqueles símbolos religiosos não deveriam ofender os ateus e os adeptos de outras crenças. Seriam esperados e “naturais”.
Naiara Malavolta, articuladora estadual (RS) da Liga Brasileira de Lésbicas, explica a ação na Justiça: “Primeiramente, há uma clara contradição na Constituição Federal. A constituição que declara o estado como laico foi escrita ‘sob a proteção de Deus’. O fato é que precisamos reagir contra a invasão do público pelo privado. Nas escolas, a história das religiões deveria ser ministrada por historiadores, não por religiosos. A consequência de toda esta presença é a desconstituição de direitos por parte de representantes da moral católica”. Sobre os símbolos, Naiara explica que os símbolos religiosos agridem boa parte dos homossexuais, pois simbolizam não apenas a fé como a tutela da instituição sob uma moral religiosa. “Muitos evangélicos, por exemplo, pouco sabem do que está escrito na Bíblia, mas ouvem o que é dito nas reuniões. E o que é dito é a posição majoritária evangélica: são homofóbicos, contra o aborto, propõem ‘curas gays’, etc. A oposição ao PLC122 (Projeto de lei que criminaliza a discriminação por orientação sexual) por parte da bancada evangélica diz tudo.
Monumento à Bíblia em praça de Paranavaí
O antropólogo Emerson Giumbelli, professor da UFRGS e coordenador do Núcleo de Estudos da Religião (NER) afirma que há, cada vez mais, iniciativas visando a retirada dos símbolos religiosos de locais públicos, mas que a resistência é forte. “As respostas costumam ser ou evasivas ou de clara recusa. Porém, se reconhecemos a sociedade como plural em termos religiosos, tais símbolos, tidos como naturais a quem professa a religião católica, deveriam ser retirados”. Perguntado sobre o fato dos símbolos serem católicos, Giumbelli respondeu que “o cruxifixo é uma imagem rigorosamente católica, os protestantes e muitos evangélicos usam as cruzes sem o Cristo. A novidade é que a Bíblia tem crescido como símbolo de religiosidade, principalmente entre os evangélicos, mas também em Câmaras de Vereadores, etc. Por exemplo, no interior do país, já há muitos Monumentos à Bíblia. Os crucifixos têm cada vez menor representatividade”.
Sobre o fato da iniciativa dos pedidos de retiradas serem basicamente dos movimentos LGBT, Giumbelli afirma: “É claro que tais movimentos são muito mais sensíveis à questão. Porém, e isto agora é uma opinião pessoal, penso que eles só conseguirão avançar quando um leque mais amplo da sociedade civil lhes der apoio. O fato é que não há mais símbolos consensuais. A extensão de cada um é limitada e há ainda que considerar as pessoas sem religião”.
O antropólogo da UFRGS faz questão de sublinhar um fato que vem ao encontro da manifestação do desembargador Túlio de Oliveira Martins, presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ-RS e finaliza: “Fico feliz que esta discussão exista. Discutir símbolos religiosos ou a retirada total deles é muito importante. Além da questão cultural e pessoal há o princípio do estado laico que não deve ser desrespeitado”.
E Dostoiévski? Melhor esquecê-lo? Não, de modo algum. Afinal, a frase deve ser limitada a uma inteligente provocação de Ivan Karamázov a seu irmão Aliócha. A quem duvidar disto, bastará ler o que diz Raskolnikov em Crime e Castigo e saber que Dostoiévski jamais assassinou velhinhas a machadadas. O personagem acaba antes do autor, assim como o privado antes do público.
Obs.: Essa entrevista foi feita por mim para o Sul21, mas como o assunto é cultura — um dos assuntos mais frequentes neste eclético blog — , deixo-a também aqui para meu 7 fiéis leitores.
Denise Viana Pereira é a Diretora de Economia da Cultura da Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul. Trabalha, pois, com o Secretário Luiz Antônio de Assis Brasil numa das secretarias mais pobres e de maior visibilidade do governo, vendo apenas 0,07% do orçamento estadual e sendo visitada por boa parte dos artistas e produtores do Rio Grande do Sul. Denise é formada em Comunicação Social pela Ufrgs, é especialista em Teoria de Jornalismo e em Economia da Cultura. De 1999 a 2001, integrou a equipe do Instituto Estadual de Música da Secretaria de Estado da Cultura do RS. Nos anos de 2003 e 2004, foi Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre e integrou a Representação Regional Sul do Ministério da Cultura entre 2006 e dezembro de 2010.
Em sua entrevista ao Sul21, Denise Viana Pereira fala sobre a nova lei que substitui a antiga LIC e sobre os planos nada modestos da Cultura do estado.
Sul21: Nos últimos dias, foram aprovados R$ 3,6 milhões em autorizações para captação de patrocínios via LIC. Associada a esta notícia, há a nova legislação de apoio e fomento à cultura, aprovada em dezembro de 2011.
Denise Viana Pereira: Sim, a LIC – Lei de Incentivo à Cultura – foi sancionada em 1996 e começou a funcionar em 1997, indo até agosto de 2010. Após esta data, ela foi suspensa até 7 de dezembro quando foi regulamentada a nova lei de fomento e apoio à Cultura, que se chama Pró-Cultura.
Sul21: A LIC não existe mais?
DVP: Não existe mais. Ela só permanece para os projetos que ainda estão em tramitação. Os novos processos não ingressam mais via LIC, mas sob o Pró-Cultura. O Pró-Cultura tem no seu bojo dois mecanismos: um mecanismo é o Fundo de Apoio à Cultura, grande conquista que nós aprovamos em 2001 na Assembleia Legislativa e que nunca tinha sido regulamentada, e um mecanismo de compensação fiscal semelhante à antiga LIC. O Pró-Cultura, então, engloba o fomento direto – pelo Fundo – e a compensação fiscal.
Sul21: Como funciona?
DVP: Na lei antiga, a empresa poderia se compensar de 75% do total do projeto descontando o valor de seu ICMS. Na nova lei, o desconto é de 100%. Porém, regra geral, para todo o projeto, o patrocinador fica obrigado a um depósito de 10% no Fundo de Apoio à Cultura, à exceção de projetos para Patrimônio Cultural e Construção de equipamentos culturais, para os quais o depósito é de 5%. Então, há a compensação, a isenção, mas há o incentivo propriamente dito, o qual é depositado no Fundo.
Sul21: Há um teto de isenção fiscal determinado pelo estado?
DVP: Sim, e este é muito baixo. O teto de isenção fiscal é de 28 milhões. Então, 10% são 2,8 milhões. É pouco para o Fundo. No ano passado, foi enviado um projeto de lei que prevê um aumento deste valor para R$ 35 milhões. A lei permite que este teto possa chegar ao máximo de 0,5% da receita líquida do estado. Trata-se de um valor variável, que hoje deve bater nos R$ 70 milhões.
Sul21: Resumidamente, poderia descrever o processo de aprovação do Pró-Cultura com a compensação fiscal?
DVP: O processo é (1) o proponente cadastra-se no site, (2) validação por parte da SEDAC, o que hoje demora 7 dias; (3) então, o proponente tem 15 dias para trazer documentos; (4) de posse dos documentos, fazemos a análise técnica detalhada onde normalmente questionamos coisas que não ficaram claras e então (5) o projeto é enviado para o Conselho Estadual de Cultura, que tem 60 dias para analisar. Após a aprovação, esta é publicada no Diário Oficial do Estado e o autor do projeto recebe uma carta que autoriza a captação, ou seja, o patrocínio por parte das empresas. O prazo mínimo total para a aprovação de um projeto é de 90 dias, por lei. Na prática, sabemos que este tempo não ocorre antes de 4 meses. O que desejamos é chegar cada vez mais próximos dos 90 dias. Estamos em contato com o Conselho para que eles analisem a possibilidade de diminuição de seus prazos. Tudo é muito moroso e há uma comparação inevitável: a Lei Federal é muito mais ágil. Não faz sentido. Temos que nos apropriar do sistema federal.
Sul21: Como é que o novo governo encontrou a SEDAC?
DVP: O secretário Assis Brasil sempre diz que não adianta a gente ficar olhando para o passado. O que a gente quer é que nossa marca seja o diálogo. Queremos manter as portas abertas e até retiramos algumas divisórias que haviam em nossa estrutura física… Queremos receber todos, ouvir todos os que nos procuram. Todos são atendidos. Acabamos inteiramente com certo tom policialesco da SEDAC. Nós éramos vistos pelos produtores culturais, de antemão, como oponentes, quando na verdade ambos são proponentes. Claramente, havia grande distância entre os produtores e o sistema de fomento e financiamento da cultura no estado. Nós queremos o oposto.
Sul21: Quais são objetivos factíveis dos quatro anos da gestão?
DVP: O primeiro objetivo é o de fazer a Casa de Cultura Mario Quintana funcionar a pleno. Resolvendo desde a obra de fixação da fachada até recheá-la de programação. O segundo é o de construir o Teatro da OSPA. Os outros estão associados ao plano de recuperação do orçamento da cultura do estado, que nos tirará deste “quase nada” de recursos que temos hoje. Hoje, temos 0,07% do orçamento do estado. Nossa intenção é a de chegar, ao final dos quatro anos do governo Tarso, a 1,5%. Queremos 0,5% no segundo ano de gestão, 0,75% no terceiro, 1% no quarto e 1,5% para a próxima gestão.
Sul21: Há outros?
DVP: Temos também projetos ligados à utilização do Fundo de Apoio à Cultura. Pretendemos criar editais a fim de selecionar projetos de Casas de Cultura, teatros, cinemas ou bibliotecas para o interior do estado. Queremos equipamentos culturais para o interior. Nós selecionaremos os projetos; desta forma, não seriam equipamentos de propriedade do estado. Nós apoiaremos projetos que permitam aos municípios se equiparem. Imaginamos valores de até R$ 500 mil. Muitas vezes há prédios que poderiam se transformar num teatro ou numa biblioteca. Nossa intenção é participar da reutilização destes espaços para fins culturais.
Sul21: Não há quase mais cinemas no interior.
DVP: Bem, neste sentido nós trabalhamos com a ideia dos cineclubes. Nosso plano de governo inclui a criação de 100 Cines mais Cultura ao longo dos quatro anos de gestão e envolve a criação de 500 Pontos de Cultura lato sensu. Nos Pontos de Cultura, o governo aporta recursos para iniciativas que já existem, dando apoio aos chamados Pontos de Cinema (cineclubes), aos Pontos de Brincar (brinquedotecas), aos Pontos de Leitura (pequenas bibliotecas) e aos Pontos de Memória (museus comunitários ou ações de memória). Estas são ações que o MinC desenvolve. Este ano, deveremos receber R$ 10 milhões para começarmos.
Sul21: E a OSPA? Sem sede, ensaiando no cais do porto, convivendo com falta de músicos, concursos… E o novo Teatro que não sai do papel?
DVP: Hoje temos boas perspectivas. O secretário Assis Brasil é um ex-membro da orquestra e está bastante compromissado com a OSPA. Foi elaborada uma emenda parlamentar de R$ 20 milhões para a construção – o custo do teatro é de R$ 32 milhões. Em um de seus primeiros pronunciamentos, a presidente Dilma Rousseff falou em necessidades de contenção e suspendeu todas as emendas. Algumas destas foram extintas, mas a da OSPA não. O governador Tarso já enviou correspondência para a Ministra da Cultura e para a Comissão de Educação e Cultura do Congresso. Há toda uma mobilização estadual pela manutenção da emenda parlamentar de R$ 20 milhões. Isto garantiria 2/3 da obra. De outra parte, o MinC, em reunião aqui conosco, com a presença do secretário Assis Brasil, comprometeu-se em colocar mais R$ 7,5 milhões ou R$ 10 milhões – dependendo da emenda deste ano – , à razão de 2,5 milhões por ano. Se a emenda de R$ 20 milhões entrar este ano, eles não repassariam a primeira parcela de R$ 2,5 milhões, ficando o primeiro pagamento para 2012. Em resumo, repito, temos boas perspectivas.
Sul21: Houve uma discussão sobre possíveis mudanças no projeto do Teatro a fim de que ele pudesse receber óperas. Propôs-se a criação de um fosso para a orquestra…
DVP: Falando de uma forma rasa, o secretário compreende as críticas – o IAB igualmente não está de acordo com a parte externa do projeto e há esta discussão sobre óperas – , mas sua ideia é a de que o Teatro da OSPA é uma sala sinfônica e não outra coisa. E mesmo que haja discussões — penso que sempre haverá — não podemos atrasar mais 20 anos uma construção que nos faz falta há décadas. Então, temos um projeto pronto, pago, e achamos que ele não deve mais ser alterado. Estamos em outra fase e, se retrocedermos a uma anterior, quando teremos o Teatro?
Sul21: Fomento é política cultural? E a distribuição, divulgação e venda?
DVP: De modo algum fomento é política cultural. O mecanismo de financiamento e fomento não pode ser nossa única atividade; isto é apenas um instrumento. É muito insuficiente e concentra a pouca verba disponível nas capitais e nos artistas conhecidos. Para isso é que agora temos o Fundo de Apoio à Cultura, temos que fortalecê-lo para poder diversificar o tipo de projeto a ser apoiado. Por outro lado, temos que nos preocupar não apenas com os projetos, mas com a criação de hábitos de consumo de toda produção cultural. Temos que apoiar a distribuição, o consumo e a formação de plateias. É um problema igual ou maior do que o de produção, que é o que a LIC fazia exclusivamente. As leis de incentivo fomentam a produção, mas não fomentam a distribuição, elas concorrem muito pouco para a absorção daquilo que criam. Veja o caso do blog da Maria Bethânia: Jorge Furtado foi brilhante ao dizer que se tivessem pedido três vezes o mesmo valor para um filme que ninguém fosse assistir, não iam reclamar de nada, mas como é um blog e há um preconceito com o meio virtual – criado pela grande mídia – ninguém diz que Bethânia estará divulgando uma porção de poetas que ficariam de outro modo inacessíveis. Sou totalmente favorável ao blog dela. Grande parte desta discussão é sufocada pelo desconhecimento que as pessoas têm do contexto da produção e das necessidades culturais.
Sul21: Teu cargo é o de Diretora de Economia da Cultura. O que significa exatamente?
DVP: Como tu disseste, não adianta a gente apenas fomentar a produção. O olhar da economia sobre a cultura nos dá uma noção de que existe uma cadeia produtiva inteira, que vai até o público.
Sul21: Normalmente os artistas não pensam na parte comercial…
DVP: Sim, há que pensar na divulgação, nas vendas, na infraestrutura. Mas o pensamento não pode também ser apenas mercantilista, pois há dois valores envolvidos: o valor econômico do produto cultural e o valor simbólico, que vai transformar a pessoa que assistirá uma orquestra pela primeira vez, que vai fazê-la pensar em coisas sobre as quais jamais tinha antes refletido. É preciso pensar na sustentabilidade da produção.
Sul21: Sim, o espectador sai melhor, mais rico de um filme, peça ou espetáculo, mas como medir a importância desta experiência, deste conhecimento?
DVP: Nós estamos num momento maravilhoso, porque o governador é sensível à cultura. Ele é completamente consciente deste valor simbólico e da importância de termos cidadãos capazes de serem reflexivos e críticos, em contraposição a cidadãos que vêm da classe D para a C apenas para comprar uma geladeira ou uma batedeira e continuar se matando na esquina ou atropelando ciclistas. Se a gente quer mexer na sociedade, temos que necessariamente passar por sua culturalização. E temos a nossa favor a tecnologia, que dá acesso a bens culturais com maior facilidade do que no passado. Antigamente, a montagem de um cineclube era coisa para heróis, hoje tu colocas um DVD debaixo do braço e sai mostrando os filmes. Hoje já temos óperas sendo apresentadas ao vivo em cinemas. O mundo é outro, temos que utilizá-lo.
Sul21: É difícil convencer alguém disso ou a arte ainda funciona do modo como Louis Armstrong definia o jazz: “If you gotta ask, you`ll never know”?
DVP: Sim, é difícil. Mas nós não devemos nos conformar com este corolário do “eu sei a importância que tem e se tu não sabes, nunca vais saber”. Desta forma, tu não convences o outro, tu não dás acesso à cultura. Imagina um professor dizendo ao aluno: “Tu nunca vais entender, meu filho!”. O ser humano muda, avança. Essa é a nossa missão fundamental.
Sul21: Pois é, estamos chegando à educação, não?
DVP: E chegamos… Por exemplo, o trabalhador da área da cultura ganha três vezes mais do que a média da indústria. Há um dado estarrecedor: na Bahia, 54% dos empregados ou são analfabetos ou tem primeiro grau incompleto. No setor cultural, este índice de analfabetismo cai para 34%. Não há estatística análoga para o RS, mas tenho certeza de que no RS o índice de 34% deve ser de gente que tem o terceiro grau incompleto e no entanto… O Acre, a Bahia e Pernambuco estão muito à frente do RS na área cultural. Há muito tempo eles trabalham com conceitos modernos e estão inseridos naquilo que o MinC criou em 2007: o Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura, que trabalha com todos esses conceitos de cadeia produtiva que expus.
Sul21:Para terminar, para que serve a SEDAC e a que veio?
DVP: A pergunta deve ser respondida fugindo das respostas que passam perto de expressões como “alimento da alma”, etc. A cultura deve ter as três dimensões que o MinC defende: o valor simbólico, o valor econômico e o valor de cidadania, de promotor de direitos. Esse é o nosso norte.
A Assembléia Legislativa aprovou hoje (28), por 26 votos a 20, a criação de uma Comissão de Representação Externa para investigar as denúncias de fraudes na prestação de contas de projetos beneficiados pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC). A proposta é de autoria do deputado Ronaldo Zulke (ecce homo, ao lado), do PT, com o apoio de mais 19 parlamentares. A comissão vai averiguar as denúncias de fraudes no sistema LIC, que geraram uma crise envolvendo a secretária estadual da Cultura, Mônica Leal, e a presidente do conselho estadual da área, Mariângela Grando. Segundo Zulke, o trabalho da comissão não se limitará aos problemas de gestão da LIC, mas também analisará os fatores que prejudicam atualmente a atividade cultural no Rio Grande do Sul. O governo Yeda saiu derrotado na votação. Não queria a instalação da comissão.
Finalmente vamos saber mais.
Mal posso esperar pelas explicações de Mônica. Gostaria de ver. Quando ela fala sobre cultura, dá-me frouxos de riso.
A 54ª Feira do Livro de Porto Alegre foi lançada oficialmente nesta terça-feira durante café da manhã para imprensa e convidados. Para o público, a feira será aberta na próxima sexta-feira.
O presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro, João Carneiro, falou da expectativa para a reunião do Conselho Estadual da Cultura, na quinta-feira, que decidirá sobre o repasse de R$ 700 mil referentes à Lei de Incentivo à Cultura.
— Não estou trabalhando com a hipótese de não recebermos a verba. Temos sim, um orçamento geral e um enxuto para a edição deste ano.
Inteligente o seu João, pode-se esperar qualquer coisa da sumidade (ou seria sumidouro?).