Notas de Concerto — 23 de setembro de 2023

Notas de Concerto — 23 de setembro de 2023

O concerto de hoje reúne três notáveis exemplos do período romântico do século XIX. As três obras foram escritas num período que compreende menos de 30 anos.

Giuseppe Verdi | Abertura “A Força do Destino”

Como primeira peça, temos a Abertura da ópera A Força do Destino (1862), de Verdi. A ópera – que é excelente — é bem típica da época e atualmente poderia ser um drama televisivo daqueles bem SBT. Aliás, esse título não costuma dar muito certo. Só deu certo na grande obra de Verdi.

A Força do Destino já foi novela mexicana…

Já foi novela turca…

Já foi filme norte-americano…

Mas o título original deste último era An Officer and a Gentleman.

E é uma grande obra de arte de Verdi.

Leonora, ou Dona Leonora, ama e é correspondida por Dom Álvaro, um jovem de origem nobre mas de sangue mestiço. Provavelmente trata-se de um peruano… Então, tal amor puro é desfeito pela família da moça, pois o pai e o irmão dela não admitem o casamento. Em determinada cena do primeiro ato, durante uma discussão onde as partes sacam suas armas, uma arma dispara quando o apaixonado atira seu revólver longe em sinal de rendição, acertando o pai de Leonora, que a amaldiçoa e morre. A moça vai para um convento. Pensa que Don Alvaro morreu ou voltou para a América. Donna Leonora pede asilo num convento que, segundo a regra, não podia acolher uma mulher. Há um lindo coral de frades aceitando Leonora no mosteiro. Por ordem do Padre guardião, os frades terão de protegê-la porque a sua vida está em perigo, já que seu irmão Don Carlo está determinado a matá-la para lavar a honra. A mulher ficará hospedada no convento e isso deve ser mantido em segredo.

Tudo é extremo: além do irmão que deseja vingar o pai, há personagens mudando de nome, homens disfarçados, há o irmão de Leonora encontrando-se com um Dom Alvaro disfarçado no exército, e os dois se tornando amigos sem saber quem é quem. Um se fere numa batalha e outro o salva, há mulheres escondidas sob trajes masculinos e final trágico, acabando tudo em sangue.

Acham que eu ridicularizei Verdi?

Não!

Quando recebeu o convite para escrever uma ópera para São Petersburgo, Verdi começou por propor como tema “Ruy Blas” de Victor Hugo, o que não agradou à censura do czar Alexandre II que o considerou pouco respeitoso para com a monarquia. O compositor então foi fazer o de sempre, foi buscar um melodrama de 1835 de Angelo Perez de Saavedra que obtivera algum sucesso quando da estreia em Teatro. A qualidade do enredo era medíocre, mas estava recheado de situações dramáticas, o que agradou ao compositor. Aliás, em 1861, Verdi já era um homem com grande experiência do ofício, e sabia que nem sempre as melhores peças de teatro davam uma boa ópera, já que, em princípio, as grandes obras teatrais se bastam a si próprias, e que o elemento “música” se revela frequentemente como um elemento redutor. Saavedra iria funcionar. Entre junho e novembro, Verdi escreveu a música. A estreia teve lugar um ano mais tarde, no dia 10 de novembro, no Teatro Imperial de São Petersburgo.

Hitchcock também criava seus filmes da literatura popular, nunca de grandes livros. Não esqueçam disso. Ele fazia questão que os livros fossem bem ruins. Sério!

Bem, a Ospa tocará hoje a Abertura de A Força do Destino. Como é habitualmente uma Abertura de ópera romântica?

Ora, a Abertura de A Força do Destino, por exemplo, está perfeitamente identificada com o clima psicológico daquilo que preludia. É uma abertura fortemente dramática, formando o famoso pot-pourri, ou seja, é uma peça musical onde se condensam os principais temas da ópera, como o do Destino, o de amor de Leonor, etc. É uma espécie de síntese prévia da obra que virá. Desse gênero são as aberturas de Wagner, de Carlos Gomes e, é claro, de Verdi.

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Franz Liszt | Concerto para Piano nº 1, S. 124
I – Allegro maestoso
II – Quasi adagio
III – Allegretto vivace
IV – Allegro marziale animato

Já o Concerto para Piano Nº 1, de Liszt, foi apresentado pela primeira vez em 1855. Franz Liszt compôs seu Concerto ao longo de um período de 26 anos. O concerto é estruturado em quatro movimentos e tem uma duração de aproximadamente 20 minutos. Estreou em Weimar no dia 17 de fevereiro de 1855, com Liszt ao piano e Hector Berlioz regendo.

Liszt foi o primeiro artista a ser recebido aos gritos de admiradora(e)s à beira de desmaiarem. Era um ídolo e os fãs colecionavam lembranças suas a qualquer custo, valendo desde autógrafos até cabelos, lenços, luvas, pontas de charuto, etc. Mas não era apenas carisma, sobrava talento ao compositor, como este concerto demonstrará. Lisztomania ou febre de Liszt foi o intenso frenesi motivado pelo compositor húngaro durante suas apresentações. A primeira vez em que se registrou tal frenesi ocorreu em Berlim em 1841, tendo o termo sido criado mais tarde por Heinrich Heine num folhetim escrito por ele em 25 de abril de 1844, ao discutir a temporada de concertos daquele ano em Paris. A Lisztomania foi caracterizada por níveis elevados de histeria de fãs, comparável ao tratamento dado às celebridades da música na atualidade – mas em um tempo não conhecido por tal agitação musical.

O Concerto para Piano Nº 1 de Liszt, é descendente direto do Concerto Imperador, o Nº 5 de Beethoven, no que diz respeito à maneira como o piano-solista se relaciona com a orquestra, com muita bravura. Aparenta-se com Paganini pelo brilho de super-virtuosismo da parte solo. Mas Liszt propõe, com esta obra, uma maneira totalmente inovadora de Concerto. Ele afasta-se totalmente da forma clássica mozartiana (dos três movimentos) e cria uma espécie de Poema Sinfônico — sua especialidade — ininterrupto tendo o piano como líder a conduzir seus 4 movimentos. Foi moderníssimo para a época, tanto na parte do piano quanto na orquestra. Vocês vão notar a pouca participação da orquestra nesta peça. Ela troveja e abre espaço aos solos do piano, apenas o acompanhando discretamente. Depois, troveja novamente. Se pensamos que, mais tardiamente no século XIX, um Brahms e um Tchaikovsky continuaram adotando o esquema clássico vivo-lento-vivo, chegaremos à conclusão de que Liszt fora de tal forma original que seus dois Concertos permanecem como caso único na literatura pianística do Romantismo.

Como disse, temos 4 movimentos encadeados sem interrupção, como uma grande Fantasia ou Rapsódia — lembrem da Rhapsody in blue — ou um Poema Sinfônico.

Henri Lehmann (1814-1882). “Franz Liszt (1811-1886), compositor e pianista húngaro (1839)”. Paris, musée Carnavalet.

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Felix Mendelssohn | Sinfonia nº 4 em Lá Maior, “Italiana”, Op. 90
I – Allegro vivace
II – Andante con moto
III – Con moto moderato
IV – Saltarello. Presto

O que há em comum entre Goethe, Thomas Mann, Hesse, Mozart, Keats, Byron, Hemingway, Stendhal e, bem, Mendelssohn? Ora, eles foram à Itália e ficaram boquiabertos com tanta arte, luminosidade e alegria.

A estreia da Sinfonia Nº 4, “Italiana”, de Mendelssohn, ocorreu em 1833 e nasceu a partir do encanto de uma viagem do alemão ao sul ensolarado, conhecendo as obras de arte, a beleza natural e a contagiante alegria dos italianos. Aliás, nos séculos XVIII e XIX existia o Grand Tour, um percurso pela Europa – com a Itália como destino prioritário – que constituía uma viagem ao coração da história através do patrimônio cultural e artístico da bota. Tudo nasceu com Goethe em seu livro Viagem à Itália. Segundo ele, essa fora a etapa mais estimulante e feliz da sua vida. Stendhal foi outro que se disse esmagado por tamanha beleza. Isto chegou ao século XX. Hesse falava com inveja do sul ensolarado, assim como Thomas Mann.

Nos primeiros meses do ano de 1831, Mendelssohn faz menção, em várias cartas, à sinfonia que estava compondo e que desejava fosse uma obra alegre. Mas ele sentia que só conseguiria terminá-la após visitar Nápoles, cidade onde seria capaz de absorver, por completo, o espírito italiano. Ao que tudo indica, ele não conseguiu terminá-la na Itália, porque, em uma carta à irmã, de 21 de janeiro de 1832, de Paris, deixa claro haver abandonado a composição da Sinfonia Italiana para terminar a abertura da cantata Die erste Walpurgisnacht, op. 60. Constantemente insatisfeito com a obra, Mendelssohn fez correções até abril de 1833, quando a levou consigo para a estreia, em Londres, no dia 13 de maio, com a Sociedade Filarmônica de Londres, sob sua direção. Embora a Sinfonia tenha sido recebida com grande entusiasmo, Mendelssohn, alguns anos mais tarde, tirou-a de circulação para revisões e nunca se viu satisfeito com o resultado. A obra só foi editada após a sua morte.

O primeiro movimento é extremamente alegre. Sua natureza festiva é apresentada logo no início. O segundo movimento, de acordo com as cartas de Mendelssohn à irmã, foi o último a ser composto. Seu caráter introspectivo contrasta com a atmosfera brilhante do primeiro movimento. O terceiro movimento é uma espécie de minueto. Doce e bucólico, carrega certa nostalgia da época em que essa dança figurava nas sinfonias vienenses. O quarto movimento é um saltarello, dança leve e alegre, típica da Itália, dançada por casais, de mãos dadas, realizando uma série de pequenos saltos (do italiano saltare). O saltarello da Sinfonia Nº 4, extremamente dinâmico, é de uma energia incrível, do início ao fim.

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Apresentação: Orquestra Sinfônica de Porto Alegre
Direção Artística: Evandro Matté
Regente: Manuel Coves (ESP)
Solista: Valentin Magyar (piano – HUN)

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Fontes:
Resumo da Ópera
Guia dos Clássicos
Querido Clássico
Orquestra Filarmônica de Minas Gerais

 

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A Ospa e o Grêmio

Para mim foi surpreendente; afinal, o Teatro do Sesi estava quase cheio. Havia um jogo pela Libertadores — o divertido Caracas 2 x 1 Grêmio — e, como se não bastasse, tinha o show Thick as a Brick, do Jethro Tull, no Araújo Vianna. Mas o pessoal deslocou-se até o “interior” para chegar ao Sesi e ver o concerto inaugural de 2013. Era uma cortina lírica com aberturas, árias e cenas de Giuseppe Verdi e Richard Wagner. Em 2013, ambos completam 200 anos de nascimento e devem ser figurinhas fáceis antes do ano da Copa.

Não tenho muito a dizer sobre o concerto, não sou afeiçoado ao gênero, porém é absolutamente obrigatório citar o espetacular tenor Martin Muehle. Trata-se de um cantor que não apenas é excelente, mas que também está no auge. Mesmo na ‘Cena 3 do primeiro ato da ópera “Die Walküre”’ — uma longa cena que consiste em aproximadamente 15 minutos de clímax, algo que no início é parecido com o sexo tântrico mas que logo dá sono — , o cara deu um banho. Perto do final da cena, olhei para o lado esquerdo, uma pessoa dormia; olhei para o outro lado, duas. O Martin não merecia Wagner. Será que em Bayreuth é também assim?

Eu estava sentado na poltrona A13 / 9.

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Em Caracas, falava-se em outra poltrona…

Quando saí do Concerto e liguei o celular, o Dario Bestetti já estava em chamas, mandando torpedos de “Chávez Vive!”. Logo vi que algo muito legal estava rolando em Caracas. Liguei pra ele e soube que Cris era o Bolívar careca. Caraca, vi os gols agora! A definição é mais do que exata. Claro, não assisti o jogo e tenho convicção de que o Grêmio irá se classificar em primeiro lugar em seu grupo — o Flu está muito mal e o Grêmio poderia vender saldo gols e ainda assim permanecer em vantagem — , mas perder pontos é sempre legal. O porteiro do prédio do Sul21 não me recebeu com o olho tapado em referência ao pirata Barcos, prova de que o golpe deixou-o abalado. Não lhe disse nada. Nem precisava. Todo mundo sabe da derrota e da faixa.

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As 100 obras essenciais da música erudita segundo a Bravo! ou Vendendo ignorância

Sou um sujeito que está sempre rindo. Morro um pouco a cada dia, mas abstraio-me autenticamente do fato. Então, às vezes quero escrever uma coisa bem alegre ou criativa, esquecendo a Mônica Leal e a Pâmela, mas não dá. Me chamam de volta para que eu meta o pau.

A lista de cem obras essenciais da música erudita da revista Bravo! parece ter sido feita… Sei lá, quem sabe por ocorrências no Google? Proponho um acerto com você, caro leitor. Acho que você concorda que é fácil fazer listas e, quanto mais longas forem, mais fácil fica, certo? Se a lista contiver alguns absurdos, você diz que é questão de gosto e fim. Pois a Bravo! conseguiu fazer a lista errada, aquela que demonstra claramente que seus autores não têm a menor vivência na audição de obras do gênero erudito. Essa lista não é questão de gosto, é questão de polícia.

Moacy Cirne, neste post, já havia destruído a relação da e com a Bravo! utilizando como arma apenas uma obra ausente, as Vésperas da Virgem, de Claudio Monteverdi. Bastou. Trata-se de uma omissão que realmente desqualifica toda a lista. Tem razão a maior autoridade brasileira das histórias em quadrinhos, uma lista de uma centena sem as Vésperas é como deixar de fora Grande Sertão: Veredas ou Cidadão Kane em listas análogas de romances brasileiros ou cinematográfica. Mas não apenas o Moacy merece divertir-se, eu também! Analisarei uma poucas coisinhas… HÁ absurdos inacreditáveis na lista.

82º) Concerto para Oboé, de Mozart: é óbvio que o autor da lista não fez teste de bafômetro. Por favor, meu caro ouvinte, ouça este concerto e depois a Sinfonia Concertante para Violino e Viola, ou quaisquer dos Concertos para Piano de 23 a 27 do mesmo Mozart. Um bêbado, sem dúvida.

71º) Tocata e fuga em ré menor: aqui, tenho a primeira convulsão séria. Obra menor de Bach, o alcoolizado autor da lista deixou de FORA TODOS OS SEIS CONCERTOS DE BRANDENBURGO!!!

57º e 83º) A Morte e a Donzela e Trio Op. 100, de Schubert: são obras excelentes, mas esquecer o Quinteto de Schubert é embriaguez de cair deitado.

49º) Missa em Si Menor, de Bach: aqui, a piada foi a de colocá-la atrás da Sinfonia Fantástica de Berlioz. Não, a piada foi muito maior. Há certo consenso que a Missa seria uma espécie de Cidadão Kane da história da música, ou seja, que seria estaria no topo de todas as listas, mas o chumbeado autor coloca-a lá no meio…

11º) Dichterliebe, de Schumann: HAHAHAHAHA, os lieder de Schubert ficaram de fora — exceção feita aos Winterreise — e o Quarteto e Quinteto de Schumann também, mas essas cançõeszinhas de Schumann, simplesinhas e humildes, quase chegaram ao Top 10 do borracho.

4º) O cachaceiro botou a Sagração da Primavera, de Stravinski, em quarto lugar. Será necessário um alongamento muito severo para que alguém razoável admita que a obra esteja colocada no Top 10. Muuuuuito alongamento.

13º) Mais risadas, um único quarteto de cordas de Beethoven está na lista e não é o 130, nem o 132, nem a Grosse Fugue, Op. 133. Estranhamente o pinguço acertou bem onde não devia: no meio. O Op. 131 é belo com seus sete movimentos e um Andante avassalador, mas convenhamos.

84º) Questão de gosto: a Pastoral não poderia estar nesta lista. Mas o bebum a trouxe.

58º) O que faz Dvorak aqui? Hein, beberrão?

38º) Sinfonia “Inacabada”, de Schubert: essa entrou no carteiraço. E a Nona, conhecida como “A Grande”, biriteiro? Em que ela é menor? É por ter sido “Acabada”?

22º) Quadros de uma Exposição, de Mussorgski, é a vigésima-segunda obra essencial de todos os tempos do ébrio…

48º) Réquiem, de Verdi: é uma surpresa encontrá-lo aqui, mas já que o gambá o conhecia, por que deixou-o apenas em 48º? Merecia o Top 20!

95º) 4`33, de Cage: bem, se A Sagração estava em quarto pela importância histórica, esta obra de Cage deveria estar nas imediações, junto de algo de Stockhausen, um dos grandes ausentes da lista, pau d`água.

93º) Intermezzo, Op. 118, de Brahms: a imensa música de câmara — sonatas para violoncelo e clarinete, trios, septetos — de Brahms está inteiramente ausente da lista… Por quê, meu Deus, o esponja escolheu isto?

76º) Carmina Burana, de Orff: sem comentários. Viu, chupa-rolha?

É absolutamente necessário rir de uma publicação dessas, senão vêm as dores de cabeça, úlceras, etc. E citei apenas os primeiros absurdos que me ocorreram, nem explorei os despautérios cometidos ao barroco. Não me perguntem onde vai parar um jornalismo cultural que orienta assim os jovens e inexperientes. O cara que fez esta lista estava desnorteado, aturdido. Menos mal que o blog P.Q.P. Bach recebe 60.000 visitas por mês. E está à distância de um clique. E não custa nada.

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