Publicado ontem no Sul21
Vinte e seis anos após Eu sei que vou te amar, Arnaldo Jabor volta às lides cinematográficas com o nostálgico e autobiográfico A Suprema Felicidade. Neste ínterim, Jabor trabalhou como colunista de O Globo e como comentarista do Jornal Nacional, Jornal da Globo, Bom Dia Brasil, Jornal Hoje, Fantástico e da Rádio CBN. Escreveu também dois best-sellers: Amor é prosa, sexo é poesia (Editora Objetiva, 2004) e Pornopolítica (Editora Objetiva, 2006). Se seus textos e suas intervenções na televisão renderam-lhe admiração e críticas, seus antigos filmes sempre foram respeitados.
Porém o mesmo certamente não ocorrerá com A Suprema Felicidade. Chamá-lo de ruim é insuficiente, seria apenas colocá-lo na vala comum dos projetos fracassados. Para caracterizar o filme com maior exatidão, talvez o melhor seja utilizar a palavra pavoroso. Na partida, a ideia não é má: a trama ocorreria no Rio de Janeiro do pós-guerra, buscando fazer uma crônica nostálgica dos anos de formação de um menino – certamente o próprio Jabor. O filme iria desde a infância até a adolescência de Paulo, da guerra ao amor, de Deus ao sexo, das convenções à família, só que o roteiro e seu cantor revelaram-se muito inferiores aos temas.
Em poucos minutos, toda a ideia inicial torna-se rarefeita e Jabor passa a dar atenção apenas ao sexo, realizando uma paródia involuntária de A Primeira Noite de um Homem. O adolescente Paulo perde-se em cenas de gosto duvidoso sob a orientação de um avô boêmio e de um pai cheio de repressão e concupiscência, respectivamente dentro e fora de casa. Aqui, Jabor consegue o impossível: fazer Marco Nanini, o avô materno, realizar uma atuação forçada, fora do tom. Aliás, tudo é acompanhado pelo avô, que despeja boemia pelos poros e pérolas de sabedoria em suas falas. Nada mais clichê. A única personagem que se salva do naufrágio geral é a da mãe (Mariana Lima). Melhor seria tornar o avô narrador do filme — ele funcionaria como elemento unificador, meu caro Jabor.
Os problemas do filme começam pelo roteiro interminável, repetitivo e verborrágico, e seguem pela direção de arte tosca, pela falta de estrutura, pelas alegorias deselegantes, pela má direção de atores e, para terminar, pela pieguice e inverossimilhança – por exemplo, o personagem do protagonista é dividido entre três garotos de idades diferentes e nada em comum, inclusive a cor dos olhos varia!
O filme começa com o anúncio do final da Segunda Guerra Mundial e passa a acompanhar a em flash-backs a história dos pais de Paulo (Dan Stulbach e Mariana Lima), mostrando como se apaixonaram e passaram a se detestar. As cenas da infância de Paulo num colégio católico são ainda boas, apesar da onipresente e lastimável direção de arte.
O estilo também não se decide. Em alguns momentos é uma história adolescente, noutros é a crônica da crise de um casal, noutros é uma chanchada dos anos 70, noutros o único humor são os trocadilhos chulos, ainda noutros é um musical e tudo isso sem um elemento unificador que justifique as alterações de estilo.
Saudades de um Rio antigo? Saudades de um (mau) cinema? Saudades de um avô querido? Da mãe? Nostalgia de si mesmo? Impossível responder qual foi a intenção de Jabor à beira de seus 70 anos.
O melhor do filme é a epígrafe de mineiro-carioca Drummond:
As coisas findas
Muito mais que lindas
Essas ficarão