A última resistência cai e a mulher vai tomando definitivamente a batuta

A última resistência cai e a mulher vai tomando definitivamente a batuta

A nomeação de uma regente titular para a orquestra de Birmingham é sinal inequívoco de novos rumos.

No Dia Internacional da Mulher,
Para todas as mulheres que trabalham em orquestras medievais.

Mirga Grazinyte-Tyla
A regente lituana Mirga Grazinyte-Tyla

O último bastião sexista da música erudita está indo ao chão. A City of Birmingham Symphony Orchestra, mais conhecida como CBSO, uma das mais respeitadas do planeta, anunciou no início de fevereiro que seu maestro titular será uma maestrina: a lituana Mirga Grazinyte-Tyla (Vilnius, 1986). Seus dois antecessores no cargo foram gigantes: Simon Rattle e Andris Nelsons. Rattle de saiu de Birmingham em 2002 para o cobiçado posto na Filarmônica de Berlim e Nelsons recentemente foi para a Sinfônica de Boston e a Gewandhaus Leipzig.

Grazinyte-Tyla é, de certa forma, ligada a outro craque da regência, o venezuelano Gustavo Dudamel. Ela foi assistente dele Dudamel na Filarmônica de Los Angeles a partir de 2012. Dois anos depois, ela começou a dirigir seus próprios concertos matinais no Walt Disney Hall. E logo surgiu na cidade californiana o que um crítico do Los Angeles Times denominou de “Mirgamanía”. Adjetivos como “naturalidade”, “dinâmico” e “forte” costumam acompanhá-la. Trata-se de uma excelente maestrina, e esta é sua outra conexão com Dudamel.

A maestrina lituana Mirga Grazinyte-Tyla
Mirga mandando ver.

Tais fatos vão mexendo as peças do jogo. Grazinyte-Tyla não faz o estilo fora de moda do gerentão irritado. Carrega com leveza aquilo que Elias Canetti chamou de “a expressão mais óbvia de poder”. Dona de grande carisma, ela constrói um modelo diferente com base na cumplicidade e empatia com os músicos: “Reger é algo que fica entre a inspiração e a comunicação. Com os músicos, busco encontrar uma forma de soar e de interpretar. A sensação de compartilhamento deste milagre é fundamental”, disse em uma entrevista para o site da CBSO.

A escolha do Grazinyte-Tyla para o chefia da CBSO não é um fenômeno isolado. É parte de uma tendência que está se consolidando.

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Naturalidade

O feminino no pódio é um movimento ascendente. Para a mexicana-norte-americana Alondra de la Parra (Nova York, 1980), a chave reside na naturalidade do gestual: “Sou pianista e violoncelista, é claro que isto foi fundamental na minha formação, mas há que considerar como as mulheres são. Nós crescemos cantando, dançando e expressando-nos corporalmente”. De la Parra tem impressionado na Orquestra de Paris e na Filarmônica de Londres, o que lhe rendeu uma recente nomeação como chefe de uma das principais orquestras australianas. Já Karina Canellakis (Nova York, 1982) é uma violinista que trocou o arco pela batuta e trabalha em Dallas Symphony como assistente. Ela estreou na Europa em junho passado, substituindo Nikolaus Harnoncourt, já adoentado, na direção da Orquestra de Câmara da Europa. Outro caso de instrumentista transformada em maestrina é o da coreana Han-Na Chang (Suwon, 1982).

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“Se um chefe de orquestra sabe o que quer, se tem conhecimento técnico de cada instrumento, se tem uma visão clara, a orquestra o segue sem se importar se é homem ou mulher”. É o que diz a única mulher a ganhar o Prêmio Alemão de Maestros, a estoniana Kristiina Poska (Turi, 1978), atualmente trabalhando na Komische Oper Berlin: “As diferenças entre os diretores de orquestra vêm mais da personalidade e caráter do que sexo”.

As pioneiras

Houve muitos obstáculos para as mulheres que se tornarem regentes. A geração anterior sabe muito bem disso. A australiana Simone Young (1961) ou as norte-americana Marin Alsop (1956) e Anne Manson (1961), abriram brechas nas salas de concerto, auxiliadas por seus mestres Daniel Barenboim, Leonard Bernstein e Claudio Abbado. Mas usavam um figurino artificial, masculinizado. Foi ainda mais difícil para as pioneiras no passado, que enfrentaram condições ideológicas e culturais totalmente hostis, vindas de músicos, críticos, agentes ou público como Ethel Leginska e Antonia Brico, que atuaram no pódio das Filarmônicas de Nova Iorque e Berlim em 1925 e 1930. A célebre Nadia Boulanger — formadora de toda uma geração de músicos notáveis — evitou a batuta. Outras tiveram uma carreiras confinadas no poço de um teatro para não serem visíveis ou ficaram em seus instrumentos sem poderem orientar uma orquestra.

Antonia Brico
Antonia Brico

Mas a melhor notícia sobre uma mulher conduzindo orquestras será quando… Isto não for mais notícia.

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O movimento é ascendente mesmo, tanto que já tenho três maestrinas em minha timeline do Facebook: Alessandra Arrieche, Ligia Amadio e Valentina Peleggi.

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Tradução livre (e certamente traidora) deste blogueiro a partir do El Pais espanhol. Sugestão de Helen Osório.

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Londres, 18 de fevereiro: Wallace Collection e Maurizio Pollini

Londres, 18 de fevereiro: Wallace Collection e Maurizio Pollini

Para Gilberto Agostinho.

Será que este foi o melhor dia de nossa viagem? Acho que sim.

Quando nos dirigíamos para a Wallace Collection, caiu o maior toró e a bota Usaflex (conforto sem igual…) da Elena pegou-lhe uma peça nada engraçada. Apesar da boa aparência e da coisa ser “de marca”, entrava água por todos os lados. Eu pensava ouvir o som do chapinhar interno da bota. Tentamos nos esconder em vários lugares, mas a proximidade do pequeno museu fazia-nos avançar, mesmo na chuva. Quando chegamos lá, abriu o sol, claro.

Na minha opinião, The Wallace Collection é um dos melhores lugares do mundo. É uma casa linda e aconchegante que guarda uma coleção que pode não ser numerosa, mas de qualidade difícil de superar. Desta forma, não é cansativo como os grandes museus e a gente termina feliz a visita, no bar interno, comentando o que viu e falando apenas sobre arte, pois seria pouco respeitoso falar em coisas menores naquele ambiente. A Wallace está localizada na ex-residência — na verdade uma mansão nada humilde — de um colecionador que morreu no final do século XIX e cuja esposa transformou em museu e o estado encampou.

Vocês deveriam dar uma clicada no link da primeira linha a fim de ver tudo o que faz parte da Wallace. Tirei fotos de muitos quadros, mas vou colocar aqui apenas quatro. Dois estão aqui por sua beleza, o terceiro e quarto por serem curiosidades que mostram parte do espírito da coleção.

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The Music Party, de Jean-Antoine Watteau (1684-1721) é uma de minhas predileções desde sempre, assim como a pintura de que mais gosto de todo o museu:

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The Laughing Cavalier, de Frans Hals (1580-1666), certamente a pintura mais divulgada nos folders da Wallace. 

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Já a pintura acima está aqui pelo cômico. Aliás, várias obras da coleção de Sir Richard Wallace que contam histórias cotidianas. Há uma muito curiosa que resolvi agora mostrar para vocês:

Nicolaes Maes (1634-93)

The Listening Housewife, de Nicolaes Maes (1634-93), mostra o pecadilho de uma dona de casa que costumava ouvir as conversações amorosas de seus empregados. Não coloquei minha foto porque esta saiu escura, a do próprio museu é melhor… Ah, quando a gente vai ao banheiro, passa por uma “gravura” de Joseph Kosuth que contém somente uma citação, mas QUE citação:

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Depois, o bar. Igualmente localizado no centro do edifício, é um maravilhoso jardim coberto. E temos que registrar nossas caras alegres pós-Wallace. A Elena estava feliz, …

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… mais feliz …

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… e ainda mais feliz. (E não era só ela, vejam a gaitada da mulher que está na outra mesa, à esquerda da cabeça de Elena).

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Como a próxima atração seria o maior dos pianistas — Maurizio Pollini — começamos a falar sobre o estilo de diversos desses seres. A partir da foto em que estou “tocando” Bach, Elena corrigiu minha postura, arredondando meus dedos. Bem, então eu comecei a imitar os gestos delicados dos pianistas de tocam Schumann, …

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… o estilo grosseirão de quem vai atacar o percussivo Concerto N° 1 de Bartók, …

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… as singelas tentativas matemáticas de alguns quando tocam Bach, …

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e o jeitinho Glenn Gould de dialogar com Johann Sebastian:

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E então, ao final da tarde, fomos para o Southbank Center, localizado em mais um dos corações culturais de Londres. De um lado, o Parlamento e o Big Ben; de outro, o London Eye e o Southbank; no meio, o Tâmisa ao entardecer.

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O Tâmisa com Elena, ao entardecer.

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E às 19h, ele entrou no palco do Royal Festival Hall. Antes da sua entrada, o locutor do teatro anunciou que o repertório do recital — cuja primeira parte seria formada por obras de Chopin e a segunda por Debussy — fora ampliado por decisão de Pollini: era estava incluindo a Sonata N° 2 do compositor polonês na primeira parte. E completou dizendo que Maurizio dedicava pessoalmente o concerto à memória de Claudio Abbado. Aquilo fez com que um arrepio percorresse a espinha de todo o teatro, desde as primeiras e caras cadeiras até o lugar mais barato onde nos encontrávamos. Ato contínuo, enquanto o teatro com mais de mil pessoas mudava o tom da algaravia comum pré-concerto, traindo a emoção de todos, Pollini caminhou para o piano. Era o início de um dos maiores momentos de minha vida.

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Naquela noite, anotei no Facebook:

Hoje foi um dia especialíssimo e irrepetível — quem sabe? — em Londres. Eu e Elena assistimos ao concerto de Maurizio Pollini no Royal Festival Hall, sala principal do Southbank Center. O programa era vasto, mas centrado em peças de Chopin e Debussy. Ele tocou o primeiro livro dos prelúdios do francês e peças esparsas do primeiro. O concerto foi dedicado por Pollini à memória de Claudio Abbado. Talvez isso explique a recolocação no programa da Sonata nº 2 para piano, Op. 35, cujo terceiro movimento é a célebre Marcha Fúnebre.

Tudo isso contribuiu para que a eletricidade estivesse no ar. Mas talvez o melhor seja passar a palavra para a Elena, que não tivera muito contato com Pollini, enquanto que eu o conhecia de gravações desde os anos 70, chamando-o de deus no PQP Bach e considerando-o um dos maiores artistas vivos de nosso planeta, tão vulgar.

No intervalo, após uma série de Chopins, a Elena já me dizia: “Ele é um sábio. Tem altíssima cultura musical e concisão. Enquanto o ouvia, pensava em diversas formas de reciclagem: ecológica, emocional, psíquica… Sua interpretação é a de um asceta que pode tudo, mas demonstra humildade e grandeza em trabalhar apenas para a música. Pollini não fica jogando rubatos e efeitos fáceis para o próprio brilho, mas me fez rezar e chorar. Que humanidade, quanto conhecimento! Depois desse concerto, minha vida não será a mesma”.

Foi a primeira vez que vi Pollini em ação, após ouvir dúzias de seus discos. Acho que não vou esquecer da emoção puramente musical — pois ela existe, como não? — de ouvir meu pianista predileto. Já estava com pena dele, tantas foram as vezes que retornou ao palco para ser aplaudido. Para Pollini ser absolutamente fabuloso, só falta o que não quero que aconteça e que já ocorreu com Abbado.

Foi isso que nos aconteceu hoje.

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No intervalo, falávamos da facilidade telepática com que Pollini passava suas instruções ao piano, sobre a forma como ele depurara aquelas interpretações até chegar àquele ponto de limpidez e compreensão. E, inteiramente felizes e tranquilos, íamos registrando nossa presença.

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Pedimos que alguém tirasse uma rara foto de nós dois juntos.

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Ainda durante o intervalo, Elena mostra a cara de felicidade de quem está vendo algo especialíssimo. Aliás, o efeito Pollini foi duradouro e passou a atrapalhar os concertos seguintes. Tudo o que víamos era comparado a Pollini e sistematicamente derrotado….

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Depois, cometemos um jantar não previsto em nosso orçamento. Mas, digam-me, como evitar ficar bem locupletado após de tanta euforia e descobertas?

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Quase nada sobre rolezinhos, prefeitura, futebol, Abbado, etc.

Quase nada sobre rolezinhos, prefeitura, futebol, Abbado, etc.

Pouco tenho escrito para o blog. Gosto de postar ao menos um textinho por dia, mas por esses dias está difícil. Há muito, mas muito trabalho a fazer no Sul21 e minha impressão, há muito tempo, é a de estar sempre aquém, em falta. Por exemplo, gostaria de meter cuidadosamente meu bedelho na questão do preconceito (ou ódio) de classe envolvido na discussão a respeito dos rolezinhos — tão parente que é da rejeição sem argumentos à Lula, do nojo às classes ascendentes e aos médicos cubanos. (Uma coisa: os rolezinhos já não eram rotineiros e “tolerados” no Shopping Praia de Belas em Porto Alegre?).

Também acho que deveria fazer comentários acerca do rosário de erros e suspeitas sobre a prefeitura de Porto Alegre. Nosso prefeito, o qual, após um período muito notório, agora trata de fingir-se de Fogaça, ou seja, esconde-se para que ninguém fale dele, usando a lógica do juiz de futebol: se ninguém fala do árbitro é porque vai bem. Mas o aumento das passagens está aí, prefeito. Com ou sem calor, vamos ter dias duros pela frente.

Ah, meu outro blog vai igualmente se arrastando. E ontem — e o fato tem tudo a ver com aquele blog — perdemos o grande Claudio Abbado de tantas gravações de invulgar qualidade, inclusive aquela que foi a última obra que meu pai ouviu e que não está comigo por motivos nada claros.

E o futebol? Também acharia interessante fazer uma pergunta que não é feita: por que ninguém parece desconfiar daquele cidadão da Portuguesa — quem será? — que avalizou aquela substituição faltando dez minutos para acabar o campeonato? Parece que a Lusa é apenas vítima quando foi agente de um ato pra lá de suspeito… Coitadinha, né? Para mim é óbvio que tinha inimigo na trincheira.

Ainda no futebol, relaxei a pressão sobre nosso meigo presidente Luigi. Digo isso com alguma arrogância porque sei quem me lê lá dentro do Internacional. Entendo que ele queira reduzir os custos inchados por suas próprias contratações infelizes, mas por favor, mantenha um time para entregar o clube na primeira divisão em 2015, certo? Em 2012, Luigi teve receitas extras, gastou horrores e não obteve nada com elas dentro de campo. Talvez seja bom deixá-lo sem grana. Ao menos ele não aumenta as dívidas…

O problema, repito, é que há muita coisa para fazer no Sul21 e a correria só vai parar no dia 13 de fevereiro, quando devo entrar em férias, espero. Nunca fui desses caras que dizem que precisam de uns dias para se recuperarem, sempre gostei de trabalhar e é difícil me ouvir reclamar, mas 2013 foi um exagero de emoções e desta vez sou obrigado a dizer que já estou batendo biela, precisando de manutenção. Foi um ano vasto e complicado que acabou perfeito do ponto de vista sentimental, mas talvez despojado demais sob alguns outros pontos.

Nossa! São 8h27, já publiquei algumas colunas, mas já estou atrasado nas coisas daqui. Fui!

Foto: Robson Ventura / Folhapress
Foto: Robson Ventura / Folhapress

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Claudio Abbado (1933-2014)

Claudio Abbado (1933-2014)

O imenso regente Claudio Abbado morreu esta manhã em Bolonha. Tinha 80 anos. Ao longo da sua carreira, iniciada em 1958 na Filarmônica de Nova Iorque, Abbado, que não gostava que lhe chamassem maestro, foi diretor do Scala de Milão (1960-1986), da Ópera Estatal de Viena (1986-1989) e da Filarmônica de Berlim (1989-2002), tendo ainda regido as sinfônicas de Chicago e Londres e sido o catalisador do festival de Lucerna. Viveu durante vários anos com a violinista russa Viktoria Mullova, existindo um filho dessa ligação. Em 1997 atuou em Lisboa à frente da Filarmônica de Berlim. Em 2004 fundou em Bolonha a Orquestra Mozart, que dirigiu até morrer. A degradação do estado de saúde levou-o a cancelar concertos agendados para as próximas semanas, na Itália e fora do país. No verão do ano passado, a Itália fez dele senador vitalício.

Abbado em 2010
Abbado em 2010

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Três coisas que não têm nada a ver uma com a outra

Três coisas que não têm nada a ver uma com a outra
Renasceu. Abbado e músicos de Bologna | Foto:  Raffaello Raimondi
Renascido: Abbado e músicos de Bologna | Foto: Raffaello Raimondi

A Filarmônica de Berlim é atualmente um túmulo de maestros. Claudio Abbado, 80, depois que saiu de lá, tornou-se leve e criativo, deixando de lado o ser apocalíptico (e doente) da época berlinense. Criou a Orchestra Mozart em Bologna, onde nos brinda com luz, leveza e ousadia. Ouçam as gravações das sinfonias de Mozart para conferir. Já Simon Rattle, que era um monstro em Birmingham e foi para Berlim, lá tornou-se um regente crepuscular e rotineiro. O que fez? Ora, pediu demissão. Como o contrato é longo, retira-se em 2016, salvo engano. O próximo a adentrar a caixa mortuária de Berlim deverá ser Christian Thielemann. R.I.P. e depois saia correndo, Christian.

Na verdade, o que engessa a orquestra é o compromisso com um passado conservador, já enterrado. Se não mudar, ver a Berliner vai tornar-se mera atração turística.

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De Danielle Magno no Facebook:

Me deixa triste ver feministas pedindo censura à pornografia, dizendo que é objeto de submissão feminina e direito do homem sobre o corpo da mulher. Acho nada disso, que sociedade chata que regula nudez e sexo sob paradigmas tão autoritários.

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Mahler, Sinfonia Nº 1, Titã, 3º movimento

Para aquele advogado que (re)conheci quarta-feira
— deixei o cartão no escritório… era Herr Volkweiss? —
e que adora Mahler.

Mahler nunca teve problemas de autoestima, tanto que tinha certeza de que ficaria rico e famoso desde sua Sinfonia Nº 1. Mas algo deu errado. Este algo tem motivações que nossos ouvidos modernos não compreendem e que Sir Simon Rattle, atual regente da Orquestra Filarmônica de Berlim, tenta explicar abaixo. Os primeiros ouvintes julgaram inconcebível o trecho mais simples e melodioso da sinfonia, o 3º movimento baseado na antiquíssima canção de ninar francesa Frade Jacques (Frère Jacques). As ousadias do restante da obra passaram batidas, já a cançãozinha…

Abaixo, deixo-vos com a sempre tranquila explicação de Rattle e, após, com a interpretação do maestro anterior da Filarmônica de Berlim, Claudio Abbado, para a peça:

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Gustav Mahler e Jordi Savall

esta Wer hat dies Liedlein erdacht uma das canções do Des Knaben Wunderhorn, de Mahler. (Gosto de lavar a louça sob algo como Mahler ou Bruckner, a todo volume…) Era a gravação de Anne Sofie von Otter com Claudio Abbado, bem mais rápida do que esta da dupla Lucia Popp e Leonard Bernstein. Abaixo, com a zombeteira Lucia Popp e Bernstein uma versão um tantinho mais dura do que a de Abbado com von Otter. Mesmo assim dá para dançar. Ah, podemos afirmar tranquilamente que não bailamos com qualquer porcaria não… A canção é belíssima!

Ou clique aqui.

O grande mestre catalão Jordi Savall, mostra-nos seu instrumento, a viola da gamba, que se originou na Espanha no século XV e caiu em desuso no final do século XVIII, quando o aparecimento das grandes orquestras condenou a delicada gamba ao silêncio. Jordi Savall é um tremendo pesquisador e gambista que, a partir de documentos históricos, recupera o som de um dos mais incríveis instrumentos que conheço. O som da viola da gamba é mais impressionante, na minha opinião, do que o do violoncelo. No vídeo abaixo, ele toca um pouco, explica coisas sobre a gamba (perna, em italiano) e sobre a música em geral. Bom domingo para todos!

Ou clique aqui.

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Beethoven – Sinfonia Nº 7, Op.92, 4º mvto, Allegro con brio

Durante esta semana, escrevi que faltava elã à OSPA (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre), que a postura da orquestra era desidiosa e desmotivada, fato talvez causado por enormes e repetidos equívocos de repertório, os quais obrigam, por exemplo, a orquestra a comemorar repetidamente os 200 anos de Schumann e quase ignorar os 150 de Mahler, compositor, aliás, esquecido pela orquestra há anos… Coisa triste. Então, vamos ao outro extremo: o primeiro comentário a este vídeo do YouTube é They sure are having fun!! (…) Great Berlin Philharmoniker!!

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Shostakovich: Sinfonia Nº 10 (2º Mvto: Allegro, 3º Mvto: Fragmento do Allegretto )

A grande imprensa brasileira parece proibida de tecer observações elogiosas a quaisquer aspectos da Venezuela, mas tal preconceito não é de nenhuma forma seguido pelos europeus. Lá, Hugo Chávez é apenas eventualmente o outro nome de Satanás e a Orquestra Jovem Simón Bolivar da Venezuela tem recebido enorme atenção de alemães, ingleses e espanhóis. Por exemplo, a filmagem acima ocorreu no Royal Albert Hall de Londres, no exato dia em que eu completava 50 anos, em 19 de agosto de 2007.

Mas aí você me pergunta: o que é esta orquestra, quem é o rapaz que a rege? A Simón Bolivar é a orquestra líder de outras 120 orquestras de jovens venezuelanos. Trata-se de um programa chamado El Sistema, criado em 1975 pelo maestro José Antonio Abreu e que viabiliza a educação musical às crianças mais pobres do país. Ou seja, há milhares de jovens em torno dos 150 músicos da Simón Bolivar. Mais exatamente 250.000. São pessoas que nunca saberiam da música que trazem em si não fora o El Sistema apoiado pelo diabo. Atualmente, a orquestra grava para a Deutsche Grammophon e já há venezuelanos vencendo concursos na Orquestra Filarmônica de Berlim e em outros conjuntos europeus. E Gustavo Dudamel? É um espetacular talento de 27 anos que Claudio Abbado saúda como o novo Bernstein. Ele acaba de ser contratado como regente titular da Filarmônica de Los Angeles, mas não abandonará a Simón Bolivar.

Ontem, Zero Hora publicou um artigo em seu Caderno de Cultura, porém esqueceu-se de Chávez. É estranho, pois trata-se de um projeto importantíssimo de inclusão cultural que é inteiramente bancado pelo governo da Venezuela. Se é mais antigo que Chávez, este soube avaliá-lo e acelerá-lo. E pasmem: será copiado na Inglaterra. ZH diz que o será também no Rio Grande do Sul… Na Venezuela, ele salva crianças a um custo de 30 milhões de dólares anuais. Uma bagatela. São 120 dólares por criança ao ano, 10 ao mês. Apenas R$ 25,00 por criança.

A música. A Sinfonia Nº 10 é a primeira que Dmitri Shostakovich escreveu logo após a morte de Stálin. O Allegro acima seria um retrato da violência do grande desafeto do compositor. Shosta nunca negou. O furacão Dudamel sai-se maravilhosamente. Já o Alegretto que o sucede (tela abaixo) é gentil e apresenta pela primeira vez uma assinatura do autor. Aos 3min35, há um solo de trompa — que, se não me engano, é repetido mais três vezes — cujas notas, em notação alemã, são D-S-C-H… (em alemão, Dmitri Schostakovich). Ou seja, Stálin morreu, mas eu estou vivo. É música de primeiríssima linha, cheia de alusões e intenções, muito complexa e inteiramente inadequada a uma orquestra despreparada.

Sigam com o início do Allegretto, 3º movimento da décima de Shostakovich. É coisa de gênio. O resto pode-se encontrar no Youtube ou em mp3: aqui na versão de Kondrashin e aqui na de Mravinsky.

Obs.: Quem tiver browsers rebeldes deve clicar aqui para assistir a primeira parte e aqui para a segunda.

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