Seu Hélio

Sabem assim tipo melhor amigo? Eu tenho uns quatro ou cinco desses. Como disse um deles, a vida não deixa que a gente se fale tanto quanto gostaria, mas quando fala é muito bom, e logo emenda onde parou na véspera, que foi na semana, mês ou ano retrasado. E um de meus mais antigos melhores amigos é o Augusto Maurer, que conheci nos anos 70 e cujo pai, Hélio Maurer, faleceu hoje.

Talvez o Augusto nem imagine o que o Hélio representava para mim e para os que frequentaram a casa da Bela Vista lá nos anos 70. O Hélio tinha uma sofisticação que, mesmo com todo o preconceito dos jovens, fazia com que a gente parasse para conversar com ele. Ele era atencioso, bom papo, irônico, inteligente e educadíssimo — um verdadeiro senhor, disse uma vez uma amiga — e, mesmo durante o velório de sua esposa, ocorrido neste segundo semestre de 2012, fez questão de vir a mim para agradecer o fato de eu ter recebido várias vezes o Augusto em minha casa quando ele estava recém separado. Ele disse que aquilo fora uma terapia para seu filho. Ele chegava aqui em casa lotado de coisas do super-mercado e jantávamos. Soube que o Hélio incentivava o esquema, de todo excelente.

O seu Hélio parecia seguir toda uma ideologia de bem-receber os amigos, principalmente em torno de uma mesa. Certamente o Augusto herdou de seu pai o gosto pela boa comida. A despensa da casa da Bela Vista era algo que, para mim, filho de uma família espartana, era como entrar no país de Alice. Era uma salinha ao lado da cozinha com as paredes recheadas de maravilhas. A gente podia chegar na casa deles a hora que quisesse e sempre teria um baita jantar a cargo do próprio Augusto ou da Dina, a auxiliar que ainda trabalha para a família e que deve estar arrasada com a perda dos dois patrões em tão curto período. (A vida da Dina foi passada com os Maurer e o seu Hélio ia com ela, até semanas atrás, a seus restaurantes preferidos).

Quando adquiri algum conhecimento gastronômico, passei a encontrar o Hélio nas seções de vinhos, importados e especiarias dos super-mercados. Uma ou duas vezes encontrei-o no mercado público. Sempre tínhamos assunto. Em nosso último almoço, ele quis que ela sentasse com ele a fim de descrever nossos jantares aqui em casa. Para quê? Ora, ele queria imaginar a coisa. “Não estou me convidando, estou muito velho e saio pouco de casa, só quero refazer os pratos na imaginação”, dizia. A Astrid, mulher do Augusto e que também é outra maluca na cozinha — viram?, estou cercado deles, como posso emagrecer? — refazia depois os jantares para ele. Tudo com menos sal, pois o Hélio tinha pressão alta há mais de vinte anos e a coisa tinha que ser cuidada.

Enquanto escrevo esta improvisação, sei que o Augusto deve estar esperando alguma notícia do Crematório São José sobre a liberação do corpo de Hélio Maurer. É um momento horrível em que um familiar morreu e ficamos sem fazer nada. No caso de minha mãe, liberaram só duas horas antes. Muito triste, muito tenso. Meus sentimentos, Augusto. Estarei lá antes das 18h.

Uma amiga acaba de escrever no Facebook, faleceu hoje uma pessoa encantadora, estou muito triste.

P.S. — Saí para correr logo depois de escrever este post e só lembrava do seu Hélio dizendo, já passado dos 80 anos de idade, que seu único sonho era o de acariciar, apenas acariciar, a atriz Helena Ranaldi. Um gentleman até nas fantasias.

O Augusto Maurer avisa que a legenda desta foto deve ser “Não exagera, Hélio”, advertência rotineira de Dona Carmen, sua esposa.
Acho que me enganei. A legenda “Não exagera, Hélio” não deveria estar aqui?

Francisco Marshall é Cidadão Emérito de Porto Alegre

Em cerimônia realizada ontem na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, sob as bênçãos e proteção de Deus, meu amigo Francisco Marshall — cujos títulos evito citar porque poderia me confundir — recebeu mais um: o de Cidadão Emérito de nossa cidade. A honraria é merecidíssima a quem tanto faz pela cultura em nossa cidade. Trata-se de uma pessoa multifacetada. Não conheço o acadêmico da Ufrgs, mas, espreitando os fatos do cara ser do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, do Instituto de Artes da Universidade e ainda membro da Academia Nacional de Ciências de Buenos Aires, fico meio pensativo. Conheço melhor seu trabalho no StudioClio, um autêntico um oásis cultural numa cidade retraída como a nossa. Um oásis que, diga-se de passagem, não lhe dá nenhuma contrapartida financeira, até pelo contrário — o que não estou autorizado a comentar, mas não consigo deixar de opinar: trata-se de um espetacular absurdo e uma comprovação de que Porto Alegre não deve jactar-se com muita minúcia. E conheço ainda melhor o amigo que frequenta nossa casa e que frequento. Legítimo representante de Dioniso, sua atividade como divertido e gentil interlocutor, amante da boa mesa, da cerveja, dos vinhos e dos charutos, entre outras coisas, é sem dúvida a faceta com a qual mais convivo. Vou deixar passar as facetas do pianista e compositor, tá?

A honraria foi entregue, coincidentemente, na data de seu aniversário, o qual costuma ser referido por ele como a Data Máxima do Paganismo Meridional. E foi.

Parabéns, Chico!

Festim Diabólico CCXIV

(Por isso é que mantenho a categoria “Amigos, tudo”).

Acho que ainda não chegamos à edição de nº 214, mas certamente já passamos fácil das 50 edições. Os Festins Diabólicos são as festas aqui de casa, sempre com 20 pessoas para fora. Sábado, foram 36. O motivo do nome do encontro é o filme de Hitchcock, que tinha um baú no meio da sala. Já sabem o que temos no meio da nossa, mas sem um morto dentro, se lembro bem. Ultimamente, após o jantar, quase sempre alguém senta em nosso combalido piano ou pega seu instrumento e a música acontece. São amigos, músicos profissionais, que tocam aqui em casa por pura amizade. Poderiam deixar seus instrumentos e partituras em casa. Poderiam dizer que não estavam a fim, poderiam alegar uma tendinite ou simular um desmaio, qualquer coisa que todo mundo compreenderia, mas não, eles tocam pra nós.

No grupo, há o núcleo duro, os que sempre são convidados. Dentre eles, há gente como a Nikelen e o Guto que viajam incondicionalmente por quatro horas com um filho pequeno e o deixa com a avó num hotel. E viajam mais quatro horas de volta, tudo por quatro horas de festa. É maravilhoso isso. Lamentavelmente, alguns dos habituais participantes acabaram ficando de fora no último sábado porque a casa poderia explodir de tanta gente. Fazer o quê? Bem, os dois últimos Festins foram muito particulares, mas o de ontem foi invulgar para mim. Era meu aniversário e houve algumas manifestações que realmente me tocaram.

A Claudia, minha mulher, sempre faz a comida e a bebida é trazida pelos comensais. A “chef” que fica mais próxima dela é a Astrid. Pois ontem ela veio com um exército de canapés. Dizendo assim, parece pouco. Parece até que ela comprou ali na esquina. Nada disso, ela, que está super estressada com uma série de coisas, fez um por um para quase quarenta pessoas. E eram ab-so-lu-ta-men-te geniais. Assim como os músicos que tocam aqui expressam seu carinho através de seu trabalho, há pessoas que o fazem através da comida. É o caso da Claudia e da Astrid. Agora cheguei a um impasse em meu texto porque sou bom para comer mas péssimo para descrever comida. Talvez consiga algumas fotos depois… Para que meus sete leitores tenham uma ideia, no dia seguinte, domingo, quando acordou, o meu concunhado Bruno ligou aqui pra casa perguntando se tinha sobrado canapés. Das centenas, tinha sobrado um (1) e a primeira coisa que fiz ao acordar foi zerar a conta. Peço desculpas a ele.

A música. Deve ter sido ideia da Elena Romanov. De repente, logo após o jantar, ela, que é violinista e seu marido, o violista Vladimir Romanov, prepararam as estantes. Até aí, tudo normal. O pianista Alexandre Constantino estava sentado ao meu lado com uma partitura e me informou vou tocar com eles e eu disse que estava ótimo, ora. Tudo normal. Então, o Alexandre juntou-se ao casal e eles começaram o Andante da Sinfonia Concertante para Violino, Viola e Orquestra de Mozart. A Elena sabe de amor que tenho por esta música, protagonista de minha novelinha O Violista. Foi a coisa mais linda e só pensei que aquilo era endereçado a mim quando estavam terminando. Queria até que repetissem… Eles tocaram uma redução onde o acompanhamento é feito pelo piano. Abaixo, o original.

Tchê, foi lindo. Depois o professor doutor Luís Augusto Farinatti, o Guto, fez mais um de seus tradicionais e irresistíveis stand-ups. A Carmen Crochemore me disse hoje que nunca tinha rido tanto. O curioso é que o Farinatti acha que a gente se incomoda com as repetições. Negativo, rapaz.

E depois para terminar. O Marcelo Delacroix deu um show completo aqui em casa com mais dois músicos seus amigos — o Rodrigo Calveyra e Manuel de Olaso. Confesso que tinha pedido pra ele como presente. A afinação, seu bom gosto e senso de estilo são um verdadeiro absurdo e às vezes tenho que olhar para a sala refletindo que recebi tudo o que ele desempenhou de presente, somado ao Farinatti, ao Mozart do trio e à gastronomia da Astrid e da Claudia. É óbvio que nenhum dos não citados deixam de ser extraordinários; todos são inquilinos de meu ventrículo esquerdo — que é onde o coração bate mais forte (minha irmã me ensinou) — , só que a amizade + a música ou o riso ou a gastronomia tornam tudo mais memorável, não? Ou, melhor dizendo, a amizade mais a arte acaba sendo superior, o que não significa que esta não esteja assentada naquela. Bem, ao menos aqui em casa, sempre está.

A seguir, fotos. Não sei se todos estão nelas, não contei.

Vladimir Romanov e Lia Zanini aguardando o vinho que o Augusto Maurer abre lá atrás.
Astrid Müller e Rovena Marshall: brinde e risadas para alguém fora do quadro.
Augusto Maurer e Marcelo Delacroix em primeira leitura do primeiro.
Meus filhos Bárbara e Bernardo estremecendo a foto.
Os mesmos da foto acima, mas agora absolutamente enfeitiçados pelo Farinatti. Olhem as caras.
Batatas.
Gente falando bobagem, gente ouvindo bobagem. Eu, Dario Bestetti e Luís Augusto Farinatti.
Cadê?
Antônio Castro num impasse: como pegar o garfo? Carmen Crochemore o orienta.
Igor fica aliviado quando Castro logra libertar as mãos. Com Igor Natusch, Bruno Zortea, Nikelen Witter, Farinatti, Carmen, eu e as mãos.
Mãos muito, extremamente bobas. Com Anderson Larentis, Rachel Duarte e Igor.
Claudia Guglieri ensina Vladimir como se bebe o suco.
Credo, como esse cara come (e mente). Nikelen e Farinatti.
Magro de ruim.
Grande momento. Marcelo Delacroix solo.
Uma toca violino, todos tocam piano. Com Elena Romanov, Alexandre Constantino e Liana Bozzetto.
Preparação para o Andante. Com Elena e Vladimir. Adorei.
Credo, se tu soubesses como eu te odeio, Chico Marshall! Com Farinatti , o odioso e Nikelen.
E o impossível acontece. Farinatti para de movimentar os braços.
Sei lá, acho que alguém já bebera um ribeiro de vinho. Com Chico e Astrid.
Aspecto singular da sala dos Antonini Ribeiro.
Todos ouvindo Elena, Vladimir e Alexandre. Em primeiro plano eu a Claudia.
Ah, não. Me sujei de novo! Com Rovena Marshall.
O pé da Bárbara, meu cunhado Sylvio e minha irmã Iracema. Ao fundo, no espelho, o casal Rovena e Chico.
Alexandre, o Cavaleiro das Trevas.
Tão bonita, só que ninguém queria fotografar a Bianca! Lá à direita. Com Claudia Antonini e Bruno.
Apagando a (1) velinha com la Guglieri.

Obs.: Fotos de Liana Bozzetto, Lia Zanini e Augusto Maurer.

Um dos presentes que recebi…

… fez intensa referência a este blog e a outro. Era uma bela caneca ornamentada com a imagem abaixo. Clique na imagem para ampliar, vale muito a pena. A concepção foi de Francisco Marshall e a produção foi dele e de sua filha Heloísa, que andaram muitos quilômetros de bicicleta ontem pela manhã a fim de conseguir alguém que entregasse a caneca a tempo. O périplo foi realmente imenso. Durante o dia ou à noite de hoje, maiores detalhes sobre a modesta festa para quase 40 aqui em casa.

Mais um Festim Diabólico

Foi a comemoração atrasada do aniversário da Claudia. Vamos a algumas fotos. Fico sempre achando que ficou gente de fora das imagens. E pode ter acontecido, sim.

A comida estava demais… Nunca tinha provado o tal do locro.

Como consequência, houve gente que dormiu em pé (Augusto Maurer e Astrid Müller).

Que dormiu deitada (Heloísa Marshall).

Que chorou (Claudia Antonini com Augusto ao fundo).

Que fez arte (Vladimir Romanov).

Que trouxe arte de presente (escultura trazida pela Caminhante).

Que se dedicou apenas à arte. (Minha experiência mostra que todas as mães têm um pouco de vergonha do que seus filhos são capazes. Besteira pura.). Estrelando Nikelen Witter e Miguel Witter Farinatti.

Que teve os olhos vazados para que não dançassem (Astrid e Caminhante).

Que ficou feliz apesar das trevas (Caminhante com Elena Romanov ao fundo).

Que conversou (muitos).

Que ficou esperando beijo (Claudia e um bobão).

Que não parava de mentir (Milton e Guto “Antes faça mal que vá fora” Farinatti).

Que deixou a gente muito feliz (Vladimir e Elena Romanov). Destaque para os sorridentes Chico e Rovena Marshall.

Que também tocou demais (Alexandre Constantino).

Que comeu pra caralho (Dario Bestetti).

Que riu, ora (Helen Osório). Olhem a hora.

Que disputou sobremesa (Lia Zanini e Marcelo Delacroix).

Intermezzo (ou Serenata de Haydn): ufa, cansei de iniciar frases com quê.

Mais uma foto dos autenticamente queridíssimos Vladi e Elena.

Augusto, Astrid e a Caminhante conversam.

Laura Marshall com a Claudia ao fundo.

Helen e minha irmã Iracema.

Alexandre Constantino dá enorme atenção à Liana Bozzetto.

Laura, Sylvio e Cláudia Guglieri — a última prepara-se para dormir, como sempre.

O presente da Helen era lindo, parecia algo não vivo, sei lá. Cardamomos?

Augusto Maurer, já emburrecido pelos excessos, toma seu chá de boldo com Alexandre Constantino.

A foto de Sóbis

Foi um final de semana totalmente satisfatório com as visitas da Caminhante, da Nikelen e do Farinatti. Houve também um festim diabólico de aniversário, que teve como destaques não apenas o grupo reunido e a excepcional gastronomia, mas o belo e inesperado recital da Elena e do Vladimir Romanov, tocando uma Serenata de Haydn para a aniversariante — as lojas estavam fechadas, então a gente resolveu dar música de presente (obrigado, Elena e Vladimir) — e várias músicas brasileiras em arranjos que nos deixaram (muito) embasbacados. Era a noite do pessoal da música erudita tocar popular. O Alexandre Constantino também sentou-se ao piano para esmerilhar a bossa nova (obrigadíssimo, Alexandre!).

Porém, não adianta. A gente sempre lembra mais daquilo que não gostou. Ou daquilo que gostou menos, porque na história que vou contar há muito de gratidão, amor e respeito. Eu e o Farinatti fomos ao jogo do Inter e eu, com minha boca grande e boba, resolvi me referir antes do jogo ao fato de Gamarra, Fernandão, Iarley, Alex e muitos outros ex-jogadores do Inter terem ido ao Beira-Rio jogar, alguns marcando gols — como todos os citados — , mas sempre demonstrando seus sentimentos à torcida, pois nunca vibraram ao balançar as redes do ex-clube.

Como é característico meu, não pude deixar de dizer: “Os gremistas devem ficar loucos com isso, os caras vêm aqui e demonstram gratidão, coisa raríssima de a gente ver no outro lado”.

Então ontem, no mais importante jogo para o Internacional neste Brasileiro, Rafael Sóbis nos fez o mais doloroso dos gols, o da vitória do Fluminense. Sua reação — para demonstrar a todo o estádio que não vibraria — foi a mais cabal possível. Juntos as mãos como se rezasse, num pedido desajeitado de desculpas (vejam abaixo a foto de Alexandro Auler publicada no Impedimento). Depois, do jogo, confessou que seus filhos foram ao estádio ver papai jogar, ambos com camisas vermelhas. Dizer o quê? Triste consolo para um time de 7 milhões mensais, que joga pouco e que não irá à Libertadores 2012.

Só espero não ter que gostar de tomar gols.

E, após o jogo, Sóbis falou:

— Peço desculpas à torcida. Podem ter certeza de que estou com uma dor enorme no coração por vencer o meu time e distanciá-lo de um objetivo. Queria que esse gol fosse de outro.

Tubular Bells e a Caminhante

Por motivos semiprofissionais tenho que ler rapidamente As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, e Ficções, de Jorge Luis Borges. O Calvino já foi lido e hoje comecei o argentino. Li-o há tanto tempo que — bem, pensava lembrar-me de tudo, mas não é exatamente assim. O curioso é que quando indagorinha comecei a ler o livro de Borges, veio-me à cabeça o disco Tubular Bells (1973) de Mike Oldfield. Nossa, faz mais de trinta anos que não ouço esse vinil! Pensei nos anos de leitura de um e de audição do outro e soube o que vocês, meus sete espertos leitores, já descobriram. Sim, tudo da mesma época.

Acabo de baixar o CD e o ouço neste momento. É mais ou menos um pastiche de coisas que tem tanto a ver uma com a outra como o livro de Borges tem com o de Calvino. Não, Borges e Calvino têm mais a ver, certamente. São narrativas curtas, cheias de fantasia (acepção antiga da palavra) e nas páginas há mundos sendo permanentemente construídos como em poucos livros. Reli os dois primeiros contos — Pierre Menard, autor do Quixote é enlouquecedoramente belo em sua concisão e Tlön, Uqbar, Orbis Tertius é excelente — o que não é perfeito neste livro? — , mas os contos seguintes me agradam ainda mais, sei disso.

Amanhã, vou buscar a Caminhante (2 links) no aeroporto. Depois, sábado à tarde, chegam a Nikelen e o Farinatti. São uns chatos, vão ficar dando voltinhas pela cidade antes de virem para cá, os putos. Encontro de blogueiros é algo tão démodé quanto Mike Oldfield, então chamemos de um encontro entre amigos que se conheceram por via virtual. Hã? Nem isso, pois apenas vale para a Caminhante, porque os outros foram (re)conhecidos pelas vias convencionais.

Já ouço o lado 2 do disco. Bem ruinzinho…

Civilidade (a respeito do câncer de Lula)

De Ricardo Ramos Filho, no Facebook:

Tenho lido com muito incômodo algumas manifestações sobre a saúde do ex-presidente Lula. Gente que sugere que se trate pelo SUS. Aqueles que me conhecem sabem que não votei nele e que sou muito crítico às suas posições, mas embrulha-me o estômago perceber todo esse ódio. Política para mim é debate de ideias e nunca desejo de morte. Por trás dessas manifestações existe um comportamento mau, insensível e pouco ético. Como seres humanos, eu e ele, torço para que se recupere bem.

Ricardo Ramos Filho é neto de Graciliano. Não surpreende, né?

Os festins diabólicos

Festim Diabólico foi a forma que o tradutor brasileiro encontrou para deixar Rope (Corda), de Alfred Hitchcock, com um título mais sedutor ao público nacional. O novo nome ficou ridículo, em minha opinião, mas sempre que me convidam para uma festa me vem o termo à cabeça: “Um festim diabólico!”. O filme foi feito em 1948 e é uma proeza técnica do diretor inglês, enquanto a única proeza técnica de nossas festas é o (chato, chato, chato e que atrapalha nossa vida nos dias seguintes) deslocamento de um baú. A vantagem é que ele nunca passou por cima do pé de ninguém, como fez a pesadíssima câmara durante as filmagens de Rope, que destruiu o pé de um operador. Mas não é este meu assunto. Apesar de possuirmos um baú onde caberiam vários corpos, meu assunto são os festins lá de casa.

Pois há uma frequência quase mensal deles. O número de pessoas varia entre quinze e quarenta. As festas lá de casa não costumam ter pretextos aparentes, servem apenas para que a gente se divirta. Porém… Deixem eu dizer uma coisa: acho que as festas valem principalmente por seu efeito posterior, pois elas se fazem sentir nas horas e nos dias seguintes. As festas seguem na minha cabeça e na dos outros, tenho certeza. Cumprimentos, lembranças, esquecimentos de celulares, piadas repetidas, telefonemas de agradecimento, ecos de diálogos, casais que se convidam para voltar lá a fim de terminar com a comida do dia anterior, mas nada, nada mesmo que não sejam efusões. O melhor são as horas logo após os festins diabólicos.

Porque as festas — penso eu — são a celebração da pouca e insuficiente alegria que a vida nos dá, é uma forma de amplificá-la através de outras pessoas que valorizam nossa existência. Funcionam como a arte, quem sabe, e a qualidade da comida e da bebida — estas têm de ser excelentes — não faz somente parte do afeto distribuído por quem a faz, nem também servem só para assuntar antes, para nos alegrar durante e para planejar depois. Eu não saberia dizer da forma mais brilhante, mas me parece que a qualidade dela deve combinar com a qualidade das pessoas e das conversas. Se fosse ruim, a troca seria menor, tudo seria pior. Como na Festa de Babette de Karen Blixen, a comida e a bebida — e julgo de forma polêmica que a primeira é mais importante — não funcionam só no sentido de doação de quem a faz, mas em todas as trocas que depois acontecem.

Mas vou pensar mais no assunto.

(A gente conhece muita gente, né? Dava para fazer três festas para 40 pessoas sem repetir ninguém…)

Beto Chedid — que fez importantes revelações — , Andréa e Claudia.
Eu e a Claudia. O árabe que se vê no espelho é Francisco Marshall.
Já que a comida era árabe, o Augusto arranjou uma “dança do ventre” para a festa. A aparição da moça foi meteórica, mas deixou saudades.
A última turma quase completa.
Lia, Elena Romanov, Arthur Maurer e muita comida.
Simone Rasslan, Álvaro RosaCosta, Beto Chedid e Andréa Soares Costa dão risadas.
Lia Zanini demonstra no ar o tamanho do pênis de seu namorado. Marcelo Delacroix lamenta.
Vladimir e Elena Romanov com Vivian Virissimo

Aniversário em 25 fotos

Reunir um grupo de amigos como o que reunimos lá em casa no último sábado é motivo de orgulho para este que vos escreve. O pretexto, meu aniversário, era francamente secundário; os amigos que foram à festa, não. Foi uma bela noite com boa comida e pessoas que se conheciam ou que se conheceram e se entrosaram. Éramos quase 40 e fiquei com vontade de convidar mais outro tanto. Selecionei algumas fotos abaixo, mas há gente que some delas. fazer o quê? Muito obrigado pela presença de todos! Foi uma baita festa.

Começamos por uma geral. À esquerda, sentada, a única foto em que aparece Rachel Duarte e, no primeiro plano, Benedito Tadeu César e minha irmã Iracema Gonçalves. Atrás, iluminado por uma aura como se fosse uma espécie de santo agnóstico, Ricardo Branco conversa com Alejandro Borche Casalas. Ao lado, Helen Osório de papo com Jussara Musse.
Claudia explica alguma coisa a Vladimir Romanov. Igor Natusch (esquerda) faz o mesmo, assim como o Felipe Prestes (meia esquerda). Eu (direita) confiro o placar de Brasil x Portugal.
Eu faço o que sei fazer e, em sentido anti-horário, temos Alejandro, Elena Romavov, Rovena Gobbato Marshall, Vladimir Romanov, Francisco Marshall, Jussara e o  Branco.
Animação contagiante: Igor, Prestes, Gabriela Bordini, Adroaldo Mesquita da Costa e Benedito: todos olhando a repetição do segundo gol de Portugal. Depois, ao ouvir o início de Abbey Road em vinil, Igor disse: “Ouvir um som de baixo vindo de um bom disco de vinil me dá vontade de chorar. É lindo.”
Meus filhos Bernardo e Bárbara, esta em momento garçonete. À direita, meu cunhado Sylvio Gonçalves.
Sylvio faz alongamento ao lado de Gabriela, enquanto Claudia traz os doces sob o olhar faminto de Marshall.
Claudia, Augusto Maurer e Vladimir fofocam. Eu explico ao Marshall o funcionamento de nossa mesa. Adoro explicar isso.
Iracema dá uma gaitada de galpão reagindo a algum absurdo dito pelo Augusto.
Elena Romanov troca o violino pelas batatas. Depois até tocou um pouquinho de piano.
Laura Luz e Filipe Gonçalves fazem tudo rapidamente para não perderem a festa do Guilherme Carravetta.
Da série “Paixão de Casais com Menos de 5 anos”: Astrid Müller e Augusto.
Adroaldo, Benedito e eu observamos alguma coisa sob os olhares desatantos de Bergman, Antonioni e Fellini na parede.
Mais um para a série: Dario Bestetti e Cláudia Guglieri.
Mais um: Bruno Zortea e Bianca Antonini casarão em outubro. Fui escalado para padrinho. Gostaria de saber qual é minha função.
Come, Astrid, come.
Bebe, Dario.
Vladimir mostra seu sorriso “Daniel Craig” ao lado do Alejandro.
Arthur Maurer faz cara de doido varrido antes de atacar um prato preparado especialmente. Conversa entre ele e a Bárbara:  “Tu gosta do teu pai?”, “Claro, gosto.” “É, não tem como não gostar dele”. Pô, obrigado, Arthur!
Augusto com seu filho Pedro Maurer. Quem ficou brincando come atrasado.
Rovena e Claudia na hora do chá. Claudia já estava altamente alcoolizada, mas mantinha a dignidade.
Bernardo acerta as pontas com Lia Zanini (autora da maioria das fotos) antes de “chupar” do narguilé.
O último da série “Paixão”: Marcelo Delacroix (Cury) e Lia fotografam-se no espelho, tendo como ornamento uma fogueira de Jussara.
Mais um casal, desta vez mais velho, de irmãos.
Marshall exercita ritual pagão em Vladimir Romanov. Aliás, frase dita pelo Vladimir: “Podem nos convidar sempre para vir aqui. A gente vem”.
O trio russo conta para Rovena como funcionava o Gulag. Ah, as fotos que são não da Lia, são da Elena.

Idelber voltou

O Ramiro Conceição me avisou e tudo indica que é verdade: o Idelber voltou, está bem aqui. Mas acho que mudou. Agora o formato é o do ensaio ou da revista cultural. Ou seja, ele não precisará mais apresentar sua participação (ou opinião) inteligente no (sobre o) bloqueio a Cuba, nem opinar acerca da crise do MinC. É um blog, mas não é. Chuto que vai escrever apenas sobre o que gosta, sem grande pressão dos fatos externos. Muito bom.

Eu, Alexandre (filho do Idelber) e o próprio num jogo do Inter

To the Solar da Gaurama

Nesta data, em 1927, o marido de Virginia Woolf publicava To the Lighthouse (Ao Farol ou Passeio ao Farol ou ainda Rumo ao Farol) por sua Hogarth Press. Dizem que as primeiras resenhas foram mornas, pricipalmente se as compararmos com a visão moderna de que o romance é um dos melhores do século. Lembro de tê-lo lido em Tramandaí no início dos anos 80. Está no mesmo nível e gaurad semalhanças com Mrs. Dalloway e Orlando.

Olha, nada aconteceu naquela estranha casa cheia de gente legal, mas ainda assim tudo parece ocorrer: a futilidade trágica, o absurdo, a beleza patética da vida que vivemos — tudo isso nas sete horas da existência desperdiçada ou não pela Sra. Ramsay. Vemos a vida e o mundo através das letras do romance.

Enquanto o escrevia, Virginia experimentava grande agitação e euforia, tanto que o produziu com grande rapidez. “Nunca, nunca tinha escrito nada com tamanha facilidade, nunca imaginei tão profusamente”. Apesar de ser uma revisora ultra minuciosa — tanto que Leonard Woolf costumava “roubar-lhe” os originais quando achava que a revisão já fora excessiva… — , ela sempre achou que estava produzindo “simplesmente o melhor dos meus livros” e anos depois ainda dizia: “Meu Deus, quão boas algumas partes do farol são!”. Mas Virginia tinha receio de ser julgada como suave, rasa, insípida ou sentimental”.  Nunca vi medos mais bobos.

Grande parte do livro é autobiográfico. Sua irmã Vanessa foi profundamente tocada por “um retrato da mãe, que é mais parecida com ela do que qualquer coisa que eu jamais poderia ter imaginado possível. É quase doloroso tê-la assim ressuscitada dentre os mortos”. (Só falta alguém vir corrigir Nessa, dizendo que todos os ressuscitados estavam mortos). Mais tarde, Virginia Woolf escreveu que a escrita foi um ato terapêutico de efeito oposto: “Deixei de estar obcecada com a minha mãe. Já não ouço a voz dela, não mais a vejo”.

E o excelente Ao Farol completa 84 anos hoje.

~o~

É mais do que a idade que atribuí ao Guto (ou Luís Augusto Farinatti) e a Nikelen (Witter), que estiveram lá em casa na última segunda-feira, para profundo desespero desta aqui e menos desta aqui, muito mais racional… Foram 3 encontros em nossa casa, muitas mensagens trocadas, e pronto, parece que nos conhecemos há anos.

Há a pose de encomenda para a Caminhante, dona dos dois últimos links:

Atenção, Curitiba: os comensais em pose especial para Fernanda (Foto: Bárbara Ribeiro)

E há mais. Poucas, porque queríamos comer e conversar, conversar e comer. E beber vinho.

Com galhardia,a intelectual suporta a exposição enquanto sonha com a comida (Foto: Milton Ribeiro)
Com as mãos contraídas e o superego em alerta a fim de não atacar o prato antes das fotos, Guto sorri (Foto: Milton Ribeiro)
Na tentativa de fotografar o repasto e os convidados, o fotógrafo pega o copo da filha Bárbara, a desorganização dos livros lá atrás e o Guto já ligeiramente alcoolizado (Foto: Milton Ribeiro)

Preparação para a recepção ao Casal Witter-Farinatti

Eu, um intelectual (putz!) inteiramente voltado para o pensamento, para a vida espiritual e o hedonismo, costumo ter minha postura criticada por minha esposa, a qual pede que eu arrume uma coisinha aqui e ali, pinte uma paredezinha, pense numa reforminha, mas nada sai de mim além de uma limpeza de pátio e do banho nos cães, atividades a meu ver prazerosas.

Porém, ontem, arrumei um chuveiro, montei uma cama, uma mesa e “instalei uma cortina de banheiro”, tudo em honra ao casal Nikelen Witter, 64, Luís Augusto Farinatti, 71. Ao meio-dia, já me sentia um verdadeiro homem.

Como não sabia onde estavam as ferramentas — falta de hábito — minha mulher trouxe seu ferramental pessoal para pequenos serviços. Vejam o alicate que usei na montagem da cama:

Alicate de minha esposa. Não pensem que é uma peça pequena. Ele tem tamanho normal. Foto: Milton Ribeiro, daltônico.

Abaixo, mostramos a aspecto exterior da Edícula Real a ser utilizada pelo ínclito casal de professores do Departamento de História da UFSM desde nossa sacada panorâmica noroeste.

Edícula Real (aspecto exterior). Foto: Milton Ribeiro

Agora, aproveitamos para apresentar a estimulante cortina do box da Edícula Real.

Espero que eles entendam. Afinal, são professores! Foto: Milton Ribeiro

O modelo da cortina é chamado de Kama Sutra. Bem, após todo o meu trabalho matutino de sábado, mostro, para aprovação do casal e de nossos outros 5 (cinco) leitores, como ficou a Suíte Real.

Suíte Real. 

Sugestões de leitura para uma manhã pré-feriadão

Muito boas as leituras matinais do pré-feriado. Sugiro que meus sete queridos e fieis leitores comecem por Roberto Carlos não morreu (ele não morreu assado como uma galinha na estrada de Santos). Depois podem visitar Um mundo carente de terapia. Os que gostarem de futebol, pode ler minha crônica para Inter x Emelec — que incluo nas “boas leituras” apenas para me unir aos dois primeiros. Se quiser enojar-se vá ao amigo Mário Marcos e, se quiser rir, informe-se sobre como o Rio Grande do Sul se protegerá dos termos estrangeiros.

No mais, devo passar o feriado em Porto Alegre pondo alguma coisa em dia. Pois, apesar de curta, êta semaninha de merda que foi essa!

Consolo? Ah, esta foto de puro deboche pascoal que minha filha tirou no colégio:

Garanto que exportei para a Bárbara grande parte do meu espírito zombeteiro. E sou vítima dele, não pensem que não.

Ode ao Biscoito

Eu lamentei muito o fim do Biscoito. É uma baita perda num país em que a imprensa tradicional é uma coisa cujo bom senso manda ignorar. Eu concordo com tudo o que a Fal escreveu abaixo, mas, sabem?, eu não discordava tanto do Idelber quanto ela. Talvez ele me seduzisse de tal forma com a qualidade de seus textos que já vinha louco prara concordar. Das muitas pessoas que conheci através da rede, o Idelber e seus filhos — que passaram 3 ou 4 dias hospedados lá em casa — foram dos mais especiais. Porém, cá pra nós, duvido que ele suma assim, quase totalmente. Ele não iria nos deixar sem seus textos, maravilhosos textos. Pois como escreve o animal! E também, a seu modo, a Fal, que apenas vi uma vez.

Por Fal Azevedo, roubado do Amálgama

Era 14 de março, estava de trabalho até a raiz dos cabelos, tinha não um, mas dois livros do Dani olhando feio pra mim ali da estante e exigindo resenha e tive que parar tudo pra processar essa novidade: o Idelber fechou o blog. Não, dessa vez ele não botou o blog pra nanar. Ele fechou o blog. Baubau.

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Quer dizer, de novo vem o Idelber me tirar do sério.

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Master Idelber. Então, que ele fazia esse blog, o Biscoito Fino e a Massa. Uns textos sobre futebol. Pra mim, chatíssimos, né, que acho futebol chatíssimo. Quem ama futebol, venerava os textos do Idelber. E eu lia cada um daqueles textos, do começo ao fim, detestando o futebol, não dando a mínima pra que diabo fez o Guarani, mas amando aquele entusiasmo desvairado. E os textos, claro. Lindos textos, tremendamente bem escritos. Sobre futebol, valha-me, mas lindos. Uns textos cacete sobre política, porque, ahhhww, política partidária neste porto tropical me torra o saco. E sabe o quê? Eu lia aqueles textos sobre política do começo ao fim. Concordando, não concordando, dizendo baixinho que ele era um gênio, gritando pra minha mãe “Ouve o que esse cretino disse agora, mã!”, eu lia. Porque o Idelber tem isso: você lê. Puta da cara ou amando loucamente, você lê aquele texto bem construído, bem ligadinho, bonito, fluido e fica passada. Você não concordou com uma linha dos 400 parágrafos, mas o texto arrebata você. Ou você concorda com tudo e quer mandar tatuar na testa e ainda assim, no meio da crise de paixonite, o texto é tão bem feito, que permite a você distanciamento suficiente para dizer: que puta texto.

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Mas vai daí que não são uns textos flutuando no espaço, né, os textos eram o Idelber. Era ele ali. E concordando ou não, você tinha que dizer: esse cara tem coragem. A coragem das próprias convicções. Gosto de gente assim, sempre gostei. Gostei de ler o Biscoito desde o começo, por isso, sempre foi assim. Se o Idelber acha que é azul, ele acha que é azul e sai da frente.

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Ele vai fazer falta, ele, os muitos eles que são o Idelber, fazem falta na minha tela mesmo quando estão lá. Imagine quando não estão. O Idelber cego pelas causas. O Idelber resmungão (meu favorito). O Idelber noveleiro, o Idelber boboca.

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Mais do que o boleiro ou adorador do PT, tem o Idelber crítico literário. Tremendo, tremendo. O Idelber escritor. Sensacional (Alegorias da Derrota é meu livro-totem há tantos anos). O Idelber queridinho.

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Quando fui falar num bendito encontro literário em Beagá, Idelber e Ana foram ouro sobre o azul comigo. Eu estava apavorada. Apavorada tipo, tendo crise de choro no banheiro, e eles não foram nada menos que uns amores. Quando meu marido morreu, Ana disse as coisas mais lindas, Idelber disse as coisas mais lindas. Sempre senti falta desse Idelber no blog. Sempre. Não é o estilo dele e meu marido adorava o Biscoito exatamente por isso (‘Bi, isso é blog de macho’, dizia meu doce Alexandre), mas eu sempre senti falta do Idelber-Idelber no Biscoito. Me fazia falta ler sobre o Idelber. Compras no supermercado, se os filhos tinham ligado, que-que ele usa no cabelo. Porque eu sou esse tipo de leitor. Quero saber a marca do chá do cara e se ele tem medo de trovão.

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O que mais lamento não é a perda do blog. É de saber do Idelber. Ele é o blog. Já mandei e-mail dando dura, mas qual, ninguém me obedece nessa blogosfera.

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Nunca tive saco pros discursos, pras brigas e pras intrigas palacianas do Biscoito Fino e, caras, aquilo era um vendaval de emoções. O pau tava sempre cantando. Nunca tive saco nenhum pros comentaristas-salvadores-do-mundo que apareciam por lá, aqueles seres superiores que não peidam, e acho a educação do Idelber com a grande maioria, por si só, uma demonstração de educação que vi poucas vezes na vida. Por outro lado fiz grandes, grandes amigos ali na meiuca dos comentaristas do blog dele, pessoas parecidas comigo, pessoas diferentes de mim, pessoas queridas, que Idelber me deu de presente.

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Nunca li um texto do Idelber sem concordar e discordar, às vezes no mesmo parágrafo, às vezes na mesma frase. Nunca.

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Já fiz parte duma mesa literária com ele (com muito orgulho), duma mesa de bar (mais orgulho ainda), já abracei o Idelber, ri das piadas dele e sempre admirei a construção do pensar dele, a forma como ele concatena as ideias, a fúria com que ele defende as coisas que defende (já me apavorei também, com essa mesma fúria, e dei um passo para trás, e é assim mesmo, quando a gente ama).

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Sinto e sentirei falta do amor adulto que o Idelber desperta em mim. Esse tipo tão raro de admiração de parte a parte, que diz: “Nós não concordamos o tempo todo e se na mesma cidade estivéssemos, capaz que eu desse com o cardápio na sua testa depois da batatada que você disse, mas nós nos gostamos e está tudo bem”. Tipo estranho de gostar esse, porque é seu primeiro e mais infantil gostar: seu irmão. É só pro seu irmão que você pode dizer as coisas mais terríveis e ouvir as coisas mais assombrosas e seguir amando e sendo amado. E descobri agora, velhinha, que é também o amor da maturidade.

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Meses depois de o Alexandre morrer (ou anos depois, vivo num mundo completamente a parte, meu tempo é diferente do tempo do planeta), empacotei uns livros dele pro Idelber. Todos os livros de futebol do Alê. E o livro que ele tinha no criado-mudo, bem ao lado da cabeça dele, no momento em que morreu. Uma edição capenga de Moby Dick, nosso livro preferido. Pareceu tão, tão correto, que os livros do Alê, os livros que ele mais gostava, fossem parar nas mãos do Idelber. Ainda parece.

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E se vocês querem saber, assisti muita sessão da tarde, li muito livro da Alcott e, por isso, carrego aquela esperança tola no coração, aquela fantasia adolescente, de que o Idelber vai aparecer a qualquer momento aqui no umbral do meu Apart Hotel do Conde Drácula, com uma rosa entre os dentes, usando uma daquelas batas malucas, blogando de novo, prontinho pra me irritar. Se ele lesse esse treco, riria das minhas fantasias burguesas decadentes, claro, mas não ligo. Sou grata a todas as vezes que tive que espanar o pó dos neurônios pra concordar com ele ou que tive que dar todinho pros meus pobres neurônios pra discordar dele. Sou grata a toda a leitura à qual ele me obrigou, dele, dos textos de referência, dos comentaristas, de outros blogs. Amar o Idelber foi, e é, um exercício de inteligência (no meu caso da pouca inteligência que tenho), todos os dias. E a gente ama. Simplesmente.

Voltei do tratamento

Inhotim, Congonhas, São João del-Rei (segundo o site da prefeitura é assim que se escreve…), Tiradentes, Lavras Novas, Ouro Preto. Um belo tratamento com o Dr. Claudio Costa e sua Amélia — ele, psicanalista; ela, psicóloga. Fiquei encantado com os resultados. A foto abaixo registra um momento especialmente difícil. Estávamos na Pousada e Restaurante Pimenta Rosa, em Lavras Novas. Encontro-me entre centenas de fotos repletas de amizade e carinho.

Abaixo, nossos amigos.

E aqui, a reafirmação de que Claudio Costa é mais um atleticano simpático à causa colorada. O que fazer, né?

Duas coisonas e duas coisinhas

Taí o seu presente, Milton. Espero que você goste. Um abração!

Quando recebi esta mensagem pelo Facebook, pensei que fosse mais uma composição que o Gilberto Agostinho desejava me mostrar. Gosto muito de ouvi-las e, bem, de dar meus pitacos. O Gilberto é um compositor brasileiro que estuda em Praga e suas obras são efetivamente muito boas, tanto que ele acaba de classifcar-se em primeiro lugar na principal Academia de Música de Praga. Ouvi a tal música e gostei muito. (Vocês podem baixá-la aqui, vale a pena). Chamava-se Suite for Cello and Harpsichord, in Old Style. E escrevi-lhe de volta:

Rapaz, consegui ouvir apenas ontem. Gostei muito. Achei ADMIRÁVEL e deixo a palavra em caixa alta para demonstrar que este é um elogio repleto, onde a palavra deve receber significado pleno. É claro que notei a Courant e sua citação. Me diverti com o final perfeitamente bachiano da abertura, e — mesmo com a séria sarabanda — o efeito geral sobre mim foi de felicidade. Ouvi tudo com um sorriso. Achei o final da Giga um tanto inesperado, talvez brusco, mas eu jamais o alteraria, pois aquilo parece uma frase tua dizendo “gente, é bem feito, bem escrito, mas é uma paródia, claro”.

Cara, nós já temos material para outra postagem naquele blog, não? Esse teu sw de agora é melhor do que aquele outro. Até o pizzicato funciona bem. O cravo tem som de cravo, etc. Poderíamos montar uma postagem assim que eu voltar de uma viagem que farei de quinta a terça? Volto em 22/02. Tu poderias ir escrevendo os textos de apresentação, certo?

Inclua o que quiser, mas não retire essa Suíte, pelamor.

Grande abraço!

P.S.– Acredito que estejas passando por um período feliz em Praga. A Suíte, além de excelente, é feliz.

Tudo normal até aqui. Mas então ele escreveu de volta:

Oi Milton,

Muitíssimo obrigado pelos elogios! Já fazia tempo que eu estava querendo dedicar uma obra minha pra você, e eu achei que esta cairia muito bem, já que você é outro fanático pelo período barroco. Você pegou bem o espírito desta peça, e eu fico feliz que o final tenha sido bem entendido. Eu me considero um contrapontista acima de tudo, então eu escrevi esta obra como uma espécie de desafio para mim mesmo. Será que eu ainda conseguiria escrever algo tonal, respeitando todas as regras do período barroco? Pois bem, eis o resultado.

Umas das questões que me ocorreram enquanto eu escrevia esta obra foi sobre liberdade de escrita. Eu tentei escrever algo que fosse “histórico”, mas ao mesmo tempo eu tentei ao máximo me expressar neste idioma. Só que acontece que nós já não temos o direito de “quebrar regras”, como Bach fazia. Quando você ouve uma obra como a minha fuga favorita, aquela em si menor do primeiro livro do cravo, você tem um tema quase dodecafônico, e isto deve ter sido um choque na sua época (ainda hoje muita gente não gosta desta fuga, fazer o quê?). Só que seria incoerente se eu me propusesse escrever algo barroco, e então saísse quebrando as regras. Quebrando para aonde? Para atonalidade? Felizmente perdemos este direito, pois com isto ganhamos outros, mas é uma questão interessante que me apareceu. Então eu ousei mais na forma das composições, não no conteúdo tonal.

E sim, eu tenho muitas composições para postar no blog sim! Eu vou separar algumas delas, e vou escrever o texto e depois te mando. Quando você voltar de viagem, você me diz o que achou. E a maioria das composições que eu gostaria de incluir serão aquelas outras que eu te mandei, mas não sei se você já teve tempo para dar uma ouvida. Depois me diga o que você achou, eu estou bem curioso com suas opiniões (mas sem pressão para ouvir logo). E esta suite será inclusa sim, pódexá!

Sobre Praga, eu estou muitíssimo feliz com a minha vida musical. Eu estou me sentindo bem seguro e produzindo muito, o que é ótimo.

(…)

Um grande abraço, meu caro!
Gilberto Agostinho

Ou seja… Ou seja.. A obra é dedicada a mim, como aliás estava escrito na partitura e eu, boca-aberta, não tinha visto.

Eu realmente não sei como agradecer. Estou explodindo de tão orgulhoso e feliz. Muito obrigado, Gilberto.

~o~

Hoje viajamos em visita ao Dr. Cláudio Costa! Passaremos 4 dias em sua companhia e de sua mulher Amélia. Já estiveram aqui em casa e foi indiscutivelmente maravilhoso, ao menos para nós. Ele ligou várias vezes convidando e já viram, vou ter que fazer meu tratamento psiquiátrico nas cidades históricas de Minas em meio àquela baita gastronomia. (suspiro) Volto terça-feira durante o dia. Mais um motivo para comemorar. Mas nem tudo pode ser perfeito, senão não seria a vida.

~o~

Mônica Leal me processou. Já retirei o post causador da pendenga, se o deixasse teria de pagar um salário mínimo por dia… Não entendo, mas, enfim, é a nossa justiça. Ela insiste numa indenização. Se soubesse de minhas posses e de minha conta bancária, não perderia tempo. Acho que se esqueceu de averiguar. Ela deveria ser incentivada a fazer uma devassa em minha vida. E a vida segue.

~o~

E segue com Celso Roth, que recebeu um timaço e insiste em jogar retrancado dentro de seu esquema chama-derrota. O Mazembe não serviu de lição; acho que a diretoria espera algo mais grave como um enorme fiasco da Libertadores 2011 e um grupo de jogadores descontentes. Deram um carro de Fórmula 1 para um motorista de taxi.

Uma visita

Estava em meu trabalho de editar matérias e escolher posts quando me avisam:

— Índio Vargas está na recepção.

Índio Brum Vargas, escritor, advogado e ex-militante da luta armada, havia chegado para uma entrevista. O único detalhe é que chegara nove horas antes. Desci para falar com homem. Um pouco mais baixo do que eu, de fala tranquila e enorme sorriso, aquele senhor estava achando muito estranha uma entrevista às 19h. Expliquei para ele que nossa ideia era a de uma longa conversa regada a vinho e salgadinhos, que haveria uns três ou quatro, talvez cinco, jornalistas, e que desejávamos saber tudo.

— Tudo?

— Sim, tudo. Nossa intenção é arrancar tudo — , respondi, apesar de ele não estar com cara de quem tivesse intenção de esconder alguma coisa.

Revelei que viria um jornalista de São Sepé — Ah, dos Cassol de lá? Boa gente! — , que o Prestes tinha lido seu livro Guerra é guerra, dizia o torturador como preparação e que a Nubia não apenas lera seus livros como nos informara que havia um inteiro na internet. Ele simplesmente adorou. Disse-me que seu artigo publicado no Sul21 tivera grande repercussão e que ele deveria ter cuidado mais o texto. Fomos até a porta, combinamos o combinado e então veio a surpresa.

Índio Vargas, feliz da vida, atravessou a calçada de um salto e correu pela rua como se não fosse um septuagenário, mas o guri de São Sepé. Saí porta afora para ver bem visto aquilo. Ele corria mesmo e, olha, o calor era sufocante.