Simples anotações sobre a Ospa, em noite de metais e corais

Simples anotações sobre a Ospa, em noite de metais e corais

Ontem, na dureza das cadeiras da Igreja da Ressurreição do Colégio Anchieta, tivemos um concerto daqueles bem médios, onde o destaque ficou para o Coral da Ospa, que cantou, suingou e fez o diabo na Igreja.

Para mim, tudo começou com a correria para chegar. Está cada vez mais complicado fazer a apologia do democrático transporte coletivo. Esperamos mais de 20 minutos pelo T7 e acabamos recorrendo ao táxi para chegar no horário. Não entendo a planilha de horários dos ônibus. A gente chega numa parada da Osvaldo Aranha às 19h30 e espera, espera, espera. Mais uma nota zero para a Prefeitura. Então, esbaforidos, chegamos ao Anchieta e o concerto iniciou com

Earl Zindars — The Brass Square.

Olha, o que escrevo é muito pessoal, então vou logo dizendo que, normalmente, a música para metais me soa tão interessante quanto arremesso de atum. Sei que os metais da Ospa são excelentes e respeito todos os esportes, porém, como Zindars era também compositor de jazz, acho que faltou soltar mais os caras. A impressão foi a de que a obra era uma variação sem graça daquilo que fazia Gabrieli, uma variação com bigas romanas. Depois, pulamos para

John Rutter — Gloria para coro, metais e órgão.

A coisa melhorou muito aqui. Música em três movimentos, cantada em latim, sobre o texto tradicional da Missa. A obra inicia muito gregoriana. O segundo movimento, bem bonito, tem solos de órgão me lembraram a Green Lady que chamava o Dr. Smith para fora da nave de Perdidos no Espaço. Há também um solo de soprano que me lembraram os solos de Sarah Leonard na trilha sonora — escrita por Michael Nyman — de O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e seu Amante, filme de 1989 de Peter Greenaway. (Anotação feita de memória, sem conferência). Ritter finaliza sua Glória esquecendo o coral gregoriano. Investe fundo no contraponto e sai-se muito bem.

Dr. Smiiiiith!
Dr. Smiiiiith!

Ernani Aguiar — Te Deum

Conheço algumas obras de Ernani Aguiar. Aliás, amo a música erudita brasileira e sou colaborador de um blog em grande parte dedicado à música colonial e contemporânea de nosso país. Aguiar tem 4 obras no PQP Bach e já tinha ouvido sua música em um concerto que assisti no Rio de Janeiro há alguns anos. Trata-se de um bom compositor e esperava muito dele no concerto de ontem à noite. Mas algo não funciona em seu Te Deum, apresentado pela Ospa, reforçada pelas cordas, e seu Coral. A obra é cheia de boas ideias: é poliestilística; é cantada em latim e português; têm ritmos como samba, maracatu e frevo; deve ser divertida de tocar e cantar; mas… Bem, talvez seja melhor deixar a música popular para os compositores de música popular. Se os ritmos impressionam pelo colorido, faltava o molho da malemolência das melodias, que às vezes soavam como hinos de colégio, só que enlouquecidos pelo ritmo. No movimento lento, era inevitável pensar no jantar enquanto os monges do Monty Python caminhavam lentamente em minha cabeça.

Foi legal e surpreendente ver o coral batendo palmas. No final, tudo acaba em sambão. A obra finaliza com aquela “mola” que faz a gente levantar e aplaudir. Mas mesmo assim o público foi comedido na aclamação.

Debbie, you see how boring it is

Quase dormindo, Claude Debussy com seu grande amor, Emma Bardac
Quase dormindo, Debbie diz a seu grande amor, Emma Bardac: “Acho que vou compor uma peça para piano” (clique para ampliar)

É claro que se trata de gosto pessoal. Por exemplo, jamais colocaria Debussy no mesmo ofurô de vulgaridade onde sufoca Rachmaninov. Reconheço os méritos do francês apesar de seus efeitos sobre mim, pois, se há trabalho e suor para criar aquelas coisas, elas têm igualmente o condão de me fazer viajar. Pode acontecer de eu pensar em  coisas que podem ser boas como os planos para escrever uma resenha leve, informativa e agradável sobre a Sagração da Primavera. Mas pode me ocorrer fazer uma prosaica revisão dos compromissos de amanhã. Debbie, you see, convida ao sonho, convida a divagações bem longe dele. O concerto da última terça-feira da Ospa, continha um bonito concerto de Mozart (Concerto para Flauta, Harpa e Orquestra,  K. 299), um Ravel (Le Tombeau de Couperin), porém dois dramins debussyanos: os Noturnos, para orquestra e coro feminino, e as Danças Sacra e Profana, para harpa e orquestra. Read More