Exorcizar os demônios internos e dizer menos palavrões.
Ter mais empatia. (Retrato de Adão, Arcimboldo, 1578)
Ser adequado à mesa. (Bosch?)
Largar os vícios. (Hieronymus Bosch, O Jardim das Delícias).
Ser carinhoso.
Andar mais de Uber e Cabify. (A puta da Babilônia, século XV).
Jamais esquecer de dar recados. (Hieronymus Bosch, A Tentação de Santo Antônio).
Não perder tanto tempo no Facebook
Um 2018 com excelente música, grandes filmes, livros ótimos e paixões intensas. E, naturalmente, com uma outra realidade política. (A última frase foi roubada de Enéas de Souza).
Ah, se esta plateia assistisse a um filme de Tarkovski ou Bergman…
Uma cena especifica está gerando controvérsias e diversos cinemas pelo mundo estão colocando avisos alertando que a tomada não é um erro da projeção, mas sim uma opção do diretor. É que são 10 segundos em silêncio!!! 10 segundos sem som. Imaginem! Sem bombas, explosões ou música!
É um sinal claro de incompreensão e de decadência do público vedor (gostaram?) de filmes. Houve um cineasta — quem terá sido? — que disse que, a partir do começo dos anos 80, os grandes estúdios, em busca de agradar o maior número possível de espectadores de todas as faixas etárias, passaram a privilegiar roteiros que não ultrapassassem a capacidade mental de alguém com 12 anos de idade. Então, criaram seu público. Parabéns.
Parte da esquerda — trincheira à qual pertenço — adora o Islã, que dá guarida para a misoginia, a homofobia, o assassinato de apóstatas e as pseudociências. Não entendo. Entendo é a ucraniana Anna Muzychuk, bicampeã do mundo de xadrez. Ela não irá defender seus títulos no campeonato mundial feminino que tem lugar na Arábia Saudita.
Em publicação na sua página de Facebook, Anna escreveu que prefere defender a igualdade de gênero e ser fiel aos seus princípios: “Não quero jogar pelas regras de outros, não quero usar abaya [veste islâmica para as mulheres que na Arábia Saudita é obrigatória], não quero ter de andar acompanhada para sair e, no geral, não quero me sentir uma criatura secundária”.
“Estou preparada para me erguer pelos meus princípios e não ir a um evento onde, em cinco dias, deveria ganhar mais do que ganho numa dezena de eventos juntos”, explicou Muzychuk, acrescentando que “tudo isto é irritante, mas o mais perturbador é que quase ninguém se preocupa”, acrescentou.
Em fevereiro deste ano, a campeã norte-americana Nazi Paikidze recusou-se a participar no mundial feminino no Irã, devido à obrigatoriedade do uso de um véu na cabeça. Nessa competição, Anna Muzychuk participou e aceitou utilizar o véu, algo que considerou “mais do que suficiente”.
Numa outra publicação na sua página pessoal, em novembro, Anna Muzychuk justificou a decisão: “Primeiro o Irã, depois a Arábia Saudita. Pergunto-me onde será organizado o próximo campeonato mundial feminino. Apesar do prêmio recorde, não irei jogar em Riad. Usar abaya o tempo todo? Tudo tem o seu limite”, escreveu.
Para os de ateus e agnósticos, ver o Natal como um simples feriado seria apenas mais uma alteração num evento que já foi pagão, que depois tornou-se religioso por obra da Igreja Católica, que recebeu um Papai Noel chamado Nicolau – um bispo nascido na Turquia em 284 d.C que deixava saquinhos com moedas próximos às chaminés das casas – e que ganhou o vermelho e branco da Coca Cola em 1931, durante uma bem-sucedida campanha publicitária. Segundo o IBGE, o número brasileiros que declararam não ter religião no último censo, incluindo os ateus, cresceu de 1% nos anos 70 para 7,3% em 2010. O fenômeno é mundial. A American Physical Society fez uma pesquisa na Austrália, Áustria, Canadá, Finlândia, Irlanda, Holanda, Nova Zelândia, Suíça e República Tcheca. Destes, os tchecos revelaram-se os mais religiosos, com 60%. O menor número foi encontrado na Holanda. A entidade projetou as tendências no país para 2050, chegando à conclusão de que 70% dos holandeses não terão religião na metade do século XXI. Nos Estados Unidos, o número daqueles que se identificam como cristãos teve uma queda de 10% nos últimos 20 anos, passando de 86 para 76%.
O Sul21 procurou saber como é a comemoração da data para estas pessoas. Afinal, é praticamente impossível passar ao largo da face comercial do Natal. A engenheira Rachel Zanini afirma que, para ela, o Natal foi por muitos anos apenas “decoração e gastronomia” e que nunca contestou o significado da data por viver numa família extremamente católica. A partir do momento em que pode desenvolver uma crítica interna, começou a se incomodar com os excessos religiosos da família e com os comerciais da sociedade, além da obrigatoriedade da comemoração. “Até o salão de beleza onde fui hoje estava decorado com as cores da Coca-Cola. Serviam espumante… Tudo isso pelo nascimento de Jesus?”. Vou à festa da família, mas não compro presentes e só desejo boas festas e bom feriado aos amigos.
A dona de casa italiana Bruna Schiavone diz que, quando saiu do norte da Itália, nos anos 90, as festas eram bem diferentes. “Lá na Itália, a festividade está mais americanizada, mas no meu tempo as crianças comemoravam o Dia de Santa Lucia. Essa festa não é a mesma do Natal, nem na mesma data. As crianças recebiam doces de presente – antigamente ganhavam laranjas como desejo de saúde e necessidade de vitamina C para o inverno –, estes eram os presentes. No dia 25, havia um almoço e fim. Nada de vigília ou troca de presentes. Hoje, vejo a data como uma oportunidade de reunir a família. Não monto pinheirinhos em casa nem deixo a casa com cara de Natal”.
O mesmo faz Francisco Marshall. “No passado, como família germânica tradicional, cantávamos o “noite feliz”, comíamos peru e mais aquele monte de guloseimas. Hoje, reunimos a família e eu estou proibido de fazer piadas sobre religião por causa dos mais velhos. Porém, como ateu programático, às vezes aproveito a deixa… No ano passado, como meu aniversário fica próximo, fiz a festa em 25 de dezembro”. E os presentes? “Neste ano, só presentes dos adultos paras crianças. Não se toca no nome de Jesus Cristo, nem para o bem nem para o mal. Ou seja, é quase um ágape pagão, mas não se cogita passar em branco ou ficar em casa vendo filme. Há o peso da tradição na família”. Marshall explica que normalmente há discussões sobre ateísmo nas reuniões familiares, mas que estas cessam no final do ano. “A convivência é mais importante, mesmo que o ateísmo predomine, o que é o nosso caso”.
O presidente da ATEA (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos), Daniel Sottomaior, comemora tranquilamente e não se incomoda com a data. “A origem da festa não guarda o menor traço de cristianismo: é o Solis Invictus, o Solstício de inverno. Tenho uma filha de 7 anos que adora o 25 de dezembro. Nossa árvore é uma árvore de Newtal, referência a Isaac Newton, que nasceu nesta data e que descobriu a Lei da Gravidade. Ela tem maçãs, luzes e debaixo dela, um volume dos Principia (Princípios Matemáticos da Filosofia Natural) do autor. Os outros simbolismos – perus, renas, presentes, árvores, Roberto Carlos – , nada disso nasceu com o Natal. Estamos apenas retomando uma data pagã que foi roubada pela igreja”.
A fala de Sottomaior encontra eco nos livros de história. A história do Natal começa, na verdade, pelo menos 7 mil anos antes do nascimento de Jesus. No hemisfério norte, o solstício de inverno era comemorado por marcar a noite mais longa do ano. No dia seguinte, ela seria paulatinamente mais curta, encaminhando o final do período ruim para as lavouras. Então, no solstício de inverno era festejada a melhoria das perspectivas. Era um tempo em que o homem deixava de ser caçador errante e começava a dominar a agricultura; então a volta dos dias mais longos significava a certeza de novas colheitas no ano seguinte. Na Mesopotâmia a celebração era enorme, com mais de dez dias de festa. Já os gregos cultuavam Dionísio no solstício, o deus do vinho e do prazer. Na China, as homenagens representavam a harmonia da natureza. Os povos antigos que habitavam a atual Grã-Bretanha criaram Stonehenge, monumento que começou a ser erguido em 3100 a.C. para marcar a trajetória do Sol ao longo do ano. Então, em 221 d.C., o historiador cristão Sextus Julius Africanus propôs à Igreja a fixação do nascimento de Jesus no dia 25 de dezembro. Aceita a proposta, a partir do século IV o Solis Invictus começou sua mutação. Ficou convencionado que Jesus nascera em 25 de dezembro e que as celebrações eram em sua honra.
Mas voltemos a nossos personagens. Ralf Rickli, pedagogo e escritor, trabalhou por anos em comunidades carentes em São Paulo. “Nunca fiz proselitismo ateísta, mas explicava a meus alunos sobre a subjugação da cultura local em relação à do norte. Então, rejeitava os símbolos europeus, temperados, em favor de uma simbologia tropical. Em alguns anos, em vez de usar pinheiros, enfeitávamos bananeiras de Natal. Nossa celebração subversiva sempre foi um sucesso absoluto!. No passado, todos os anos eu pagava pontualmente o imposto familiar, que é o de ir à festa sem nenhuma vontade. Ficava quietinho. Minha mãe foi professora de escola dominical presbiteriana, sabe como é”. Hoje trabalhando em Vitória (ES), Ralf costuma passar o Natal sozinho. Diz que não se deprime, mas que se fosse convidado por alguém legal, iria se divertir com os amigos.
Por falar em depressão, Claudio Costa, psiquiatra e psicanalista mineiro, afirma que há efetivamente pessoas que se sentem excluídas de um fenômeno do qual gostariam de participar com alegria. “Isso ocorre independente de convicções religiosas. Em situações de festa, de alegria obrigatória e com hora marcada, muitos sentem desconforto por não se identificarem com a alegria. Sentem a situação com um beco sem saída. Quem não consegue ter uma crítica lúcida sobre a festa e liberar a sociedade das culpas, sente-se atingido. Muitas vezes a irritação vem da necessidade do cumprimento de um ritual ou até da necessidade de abraçar um familiar que lhe é desafeto. Porém, ao mesmo tempo que se irritam, essas pessoas “não conseguem não ir” e a consciência de que está cumprindo uma obrigação desagradável é causa de aborrecimento.
Estes são apenas alguns depoimentos que colhemos. A impressão geral que ficamos é de que os entrevistados – todos ateus declarados – veem a festa como uma ocasião para reunir a família, dar presentes para as crianças e refletir um pouco, o que está longe de ser negativo. Uma entrevistada que não deseja se identificar faz questão de expor uma restrição: “Olha, tudo bem, mas acho que perdemos alguma qualidade e liberdade que as celebrações pagãs deviam ter, sei lá”.
Wolfgang Amadeus Mozart nasceu em 27 de janeiro de 1756 em Salzburgo que, na época, tinha por volta de 10.000 habitantes. Salzburgo localiza-se numa das rotas em que se entrecruzavam os trajetos germânicos e italianos. Por isso, recebia influências dos dois lados e isto significa muito em termos de Mozart, um compositor que se estabeleceu e uniu as duas maiores tradições musicais europeias. O menino Wolfgang nasceu em uma família unida e amorosa. Seu pai, Leopold, era compositor. Tratava-se de uma criança emotiva e terna; queria aprender tudo, mostrando predileção pela matemática e pela música. Seu maior passatempo era o de inventar e contar histórias para si mesmo. Ao seis anos, ao começar sua educação musical em família, logo demonstrou que podia executar e compor pequenas peças ao cravo da mesma forma com que inventava histórias. O mundo perdeu um contador de histórias e ganhou um músico imenso a também nos contar histórias. A família não deu muita atenção ao compositor, mas resolveu que o pequeno virtuose poderia gerar dinheiro, tornando-se uma glória tanto familiar quanto para a corte do príncipe-arcebispo de Salzburgo. Sempre vigiado pelo pai e tendo um porto seguro em sua cidade natal, o menino-prodígio viajará loucamente (ver as viagens que fez aos 10 anos, em 1766, por exemplo) dando concertos por toda a Europa.
Para que os menos musicais pudessem reconhecer o virtuosismo do garoto, faziam-no realizar bobagens de cão amestrado, tal como tocar por cima de um pano que cobria o teclado ou com os olhos vendados. Era afagado, bem pago e sentava-se no colo de príncipes e arquiduquesas. Porém, isto foi antes dos dois grandes encontros. O primeiro encontro que mudaria Mozart foi com Johann Christian Bach, filho de Johann Sebastian e criador do estilo que foi inteiramente adotado e hiperdesenvolvido por Mozart. Mozart ouviu-o tocar em Londres e a impressão ficou-lhe para sempre. Mesmo. Se algum desavisado ouve casualmente alguma obra de Johann Christian, diz na hora: “É Mozart”. Ouvindo com mais atenção, sentirá tratar-se de um Mozart fraquinho, sem aquela imaginação pululante. Como Johann Christian fora o “Bach de Milão” antes de ser “o de Londres”, trouxe modelos italianos ao compositor. A face germânica de Mozart parace ter vindo de seu amado Haydn, a quem dedicou vários quartetos de cordas e a quem admirava desmedidamente. Tal admiração era recíproca e tão famosa e bem humorada que há bom anedotário a respeito.
O que as pessoas normalmente não sabem é que Mozart não foi um compositor tão precoce. Foi um virtuose precoce, mas perderia, em termos de precocidade para, por exemplo, Mendelssohn. Não há, na obra de Mozart pré-1781, algo como o bom Concerto para Violino em ré menor de Mendelssohn, composto aos 14 anos de idade. Poucas obras-primas mozartianas foram compostas antes disso. Suas primeiras obras de mestre foram o Divertimento K. 287, o Concerto para Flauta e Harpa K. 299, a Sinfonia Concertante para Violino e Viola K. 364, a Gran Partita, para conjunto de sopros K. 361, a Missa da Coroação K. 317 e a estranhíssima e espetacular Posthorn-Serenade, K. 320; e estas foram todas compostas todas depois de Mozart completar 20 anos. Vejam como a precocidade tem pouco a ver com as alturas que podem ser alcançadas na maturidade: afinal, poucos ousariam ir além nesta comparação entre as obras completas do genial Mozart e do muito competente Mendelssohn…
Em 1781, aos 25 anos, Mozart explodiu. Nestes 10 anos e meio – Wolfgang morreu aos 35 anos – escreveu quase tudo o que ouvimos hoje e, puxa vida, não é pouca coisa. São dezenas de óperas, concertos, sinfonias e música de câmara de melhor qualidade. É algo inacreditável e é realmente complicado apontar uma ou outra deixando tantas obras de lado.
Há um fato que me deixa contrariado na abordagem que as pessoas fazem a ele: muitos falam de Mozart como de um compositor sempre gentil e delicado, representando-o como um lago tranquilo e eternamente ensolarado onde os patinhos nadam alegres, sem sequer desejar bicar e comer os peixes que passam despreocupados por baixo de suas barrigas sempre cheias e felizes. Também estes peixes não desejam nada, apenas aspiram a uma vida feliz entre seus amigos patinhos e os peixes menores, tão lindinhos, que estão ali para o deleite de todos e assim por diante… O mesmo valeria para sua carreira, onde ele seria uma eterna criança, sempre ingênua e injustiçada, sofrendo nas mãos de poderosos e de colegas invejosos. Não é nada disso. Talvez seja necessária alguma vivência para identificar, mas há em Mozart todo um mundo de expressões sem as quais seria impossível a sua música adequar-se tão bem aos sentimentos pungentes exigidos por um Don Giovanni ou por La Clemenza di Tito e à comicidade das óperas bufas O Rapto do Serralho, As Bodas de Fígaro, A Flauta Mágica e Così fan tutte. E há toda uma música de concerto e obras de câmara autenticamente agressivas e desesperadas. É ocioso pensar que quem alcança expressar todos os matizes dos sentimentos humanos seja um palhaço bobinho e talentoso. Mozart tinha experiência de tudo o que produzia. Não era infantil, não era uma porcelana ou um santo intocável, era alguém deste mundo.
Mas por que Mozart morreu na miséria? Ora, porque tornou-se um artista absolutamente fiel a si mesmo, dando as costas ao gosto vigente na Viena de seu tempo. A partir de 1784, vieram uma sucessão de obras-primas que fez o conservador público vienense torcer seus nobres narizes. Os Concertos para piano em fá, em ré menor K. 466 e em dó maior K. 467, o em mi bemol K. 482, em lá maior K. 488, e em dó menor K. 491, o em dó maior K. 503, a Sinfonia Praga K. 543, os dois Quartetos com piano K. 478 e 493, os dois Quintetos para Cordas K. 515 e 516, o trio Kegelstatt K. 498 e a Missa em dó menor K. 427, assinalaram em dois anos a plena maturidade do Mozart-compositor que teve como resposta a hostilidade de seu público. José II, por ocasião da representação de O Rapto do Serralho (Die Entführung aus dem Serail) observou: “Notas demais, meu caro Mozart”; e obteve a resposta que nunca sairia da boca de um cortesão, mas sim de um artista absolutamente seguro de sua obra: “Nenhuma só a mais, Majestade”.
O público passou a ignorá-lo e apenas retornou ao final de 1791, dois meses antes de sua morte, quando da estréia do espetacular sucesso de A Fláuta Mágica (Die Zauberflöte). Notem que esta ópera estreou em um pequeno teatro de bairro popular em Viena com o nome de Mozart bem pequeno, para não chamar a atenção – aquele mesmo Mozart que já fora o homem mais famoso de Viena teve seu nome mostrado em letras pequenas, sob o nome garrafal do libretista Schikaneder. O sucesso foi avassalador, mas tardio. Restou-lhe tempo apenas para terminar o belíssimo Concerto para Clarinete, K. 622 e de, ironicamente, tentar terminar um Réquiem K. 626, que não escrevia para si mesmo — conforme as lendas românticas gostam de mentir –, mas por encomenda um certo Conde Franz von Walsegg, cujo contrato nada tem de misterioso e que pode ser examinado em Salzburgo. Porém, sabemos que o destino infeliz deste gênio é um convite aos que gostam de romancear tudo. Eu também gosto, mas só quando o assunto é ficção…
Espero com este post ter feito uma pequena incursão amorosa e boêmia na vida e obra de Mozart. Além da memória, utilizei-me de alguns livros e CDs, principalmente da fenomenal História da Música Ocidental de Jean & Brigitte Massin.
Observação final: Este modesto post é dedicado ao maior mozartiano que conheci. É dedicado a meu pai, morto em 1993. Ele fez com que a trilha sonora de minha infância fossem os concertos para piano de Mozart, suas serenatas para sopros e a Posthorn. Conheço tudinho, nota por nota. Ele nunca parava de falar em Mozart, Beethoven e Chopin — Mozart em primeiríssimo lugar, sempre –, assim como hoje posso passar horas falando Bach, Bartók, Beethoven e Brahms. (Não me provoquem!).
(Quando mostraram o Quarteto das Dissonâncias para Haydn, ele disse que era um equívoco, que aquilo não podia ser. Então, lhe disseram: “Mas é de Mozart”. E o velho respondeu: “Bem, neste caso, trata-se de um erro de minha parte. Eu é que não entendi.”).
1. Nós não sabemos exatamente o dia em que ele nasceu
Não existe um registro confiável da data de nascimento de Beethoven. Seu aniversário geralmente é celebrado em 17 de dezembro, data do seu batismo católico (que sobrevive nos registros paroquiais). A maioria dos estudiosos acredita que o compositor nasceu ou 15 de dezembro ou, mais provavelmente, em 16 de dezembro de 1770. Porém, sabemos que para a História vale o que está escrito, ou seja, 17 de dezembro.
2. Seu primeiro Concerto para Piano não foi o primeiro
Embora tenha sido o primeiro Concerto que publicou, o Concerto para Piano Nº 1 de Beethoven foi, de fato, o 3º. Seu 2º fora escrito uma década antes, entre 1787 e 1789. O compositor rejeitou a peça. Ele também completou um concerto de piano, o 1º., em 1784, aos 14 anos, mas apenas parte do manuscrito para esta peça sobrevive.
3. Ele era um horror em matemática
Apesar da complexidade matemática de suas composições, Beethoven sempre lutou com os números. Ele deixou a escola aos 11 anos, depois de aprender soma e subtração, mas antes de aprender a multiplicar e dividir. Como resultado, ele tinha dificuldade de acompanhar as próprias finanças. Em uma carta de 1801, ele se descreveu como “um homem de negócios incompetente, que não sabe fazer contas”.
4. As pessoas odiaram os maravilhosos Últimos Quartetos
As obras-primas experimentais tardias de Beethoven chocaram e confundiram seus contemporâneos. O compositor Louis Spohr descreveu os quartetos de cordas como “horrores indecifráveis e não corrigidos”. No entanto, para Beethoven, foram tentativas de se conectar com o divino. No topo do manuscrito para o Op.132, ele descreveu a peça como uma “Sagrada canção de ação de graças de um convalescente para a divindade”.
5. Ele pode ter tocado uma vez para Mozart
Em 1787, Beethoven fez sua primeira visita a Viena, onde Mozart estava morando. De acordo com o biógrafo do século XIX, Otto Jahn, o nervoso jovem de 17 anos foi apresentado a Mozart e tocou para ele a seu pedido. Mozart tinha 21 anos e já era muito famoso. “Mozart, considerando a peça que ele interpretou uma obra de exibição estudada, foi frio em suas expressões de admiração”, escreve Jahn. “Beethoven, notando isso, implorou um tema para improvisação e, inspirado pela presença do mestre que ele tanto reverenciava, tocou para desta vez chamar a atenção de Mozart, que disse: “Anotem o nome dele”.
6. A surdez não foi o pior dos seus problemas
Ao longo de sua vida, Beethoven teve hepatite, icterícia, colite, várias doenças de pele, febre reumática e cirrose. Antes de morrer, em 1827, aos 56 anos, 25 quilos de água foram retirados de seu abdômen. Apesar da dor da operação sem anestesia, Beethoven manteve o senso de humor, dizem.
7. Suas últimas palavras provavelmente não foram as que a lenda conta
Muitas pessoas acreditam que as últimas palavras de Beethoven foram “Vou ouvir música no céu”, mas há poucas evidências históricas disso. Pouco depois de sua morte, a crença popular dizia que suas últimas palavras tinham sido plaudite, amici, commedia finita est (“Aplaudam, meus amigos, a comédia acabou”), frase tradicional final da commedia dell arte italiana. Mas seu amigo íntimo, Anselm Hüttenbrenner, que esteve presente na sua morte, refutou o boato. Mas o relato mais confiável diz algo também extraordinário. Ao saber que seu editor lhe enviara uma caixa de vinho tinto, ele teria dito: “Uma pena, uma pena mesmo, muito tarde”.
Lucky é o primeiro filme protagonizado pelo notável Harry Dean Stanton. Sim, ele teve que chegar aos 91 anos para consegui-lo. É um filme extraordinário realizado em torno da figura da lendário figura do ator, mas cujo tema é o fim, a morte e o medo de um velho ateu sozinho, mas não solitário. Veterano de mais de 60 anos de filmes memoráveis — o filme onde ele chegou mais próximo de ser protagonista talvez tenha sido Paris, Texas, de Wim Wenders –, Stanton finalmente ganha um papel digno de suas qualidades.
Lucky vive numa casa afastada em uma cidade do Arizona. Toda gente o conhece. Ele segue uma rigorosa rotina diária: faz exercícios ao acordar, bebe um copo de leite gelado, vai à cidade, faz palavras cruzadas numa lanchonete, toma seu álcool e vai jogar conversa fora num bar à noite com amigos. Uma manhã, depois do seu amigo Howard (o cineasta David Lynch, aqui como ator) ter comunicado a fuga de seu cágado de estimação, Lucky cai sozinho em casa. Vai ao médico e este lhe diz que ele não tem doença nenhuma e que não vale a pena nem parar de fumar. Está velho e, aos 91 anos, tanto faz. Lucky entende tudo: está velho e a queda é o primeiro aviso de que irá morrer logo.
Muito inteligente a forma com que o cineasta John Carroll Lynch demonstra como tudo o que Lucky ouve a respeito da vida repercute em suas ações. Ele está ainda aprendendo. Mas como ele encara a perspectiva da morte? Rói as unhas de tanta angústia? Chora? Coloca protetores por toda a casa para não cair? Adere a uma religião? Não, ele passa reto por isso tudo. Mas, compra uma caixa de grilos e a coloca perto da da janela. Quer ouvi-los antes de dormir.
E apenas segue sua vida de ateu em paz consigo mesmo e com o mundo. Com um humor cáustico e seco — típico de Jim Jarmusch –, Carrol Lynch constrói uma história da melhor poesia, a maior homenagem que poderia receber Stanton que faleceu em setembro passado, aos 91 anos, dias antes da estreia do filme.
Um filme a ser visto, Lucky é todo feito de mosaicos preciosos.
1971. No início de Mulheres Divinas, uma série de cenas mostram a efervescência daquela época. Correrias, ruas conflagradas, bombas, manifestações, gritos, cabelos longos, Woodstock, surgimento dos Panteras Negras, protestos estudantis, revolução sexual, feminismo. Corta. Então somos levados a uma aldeia no interior da Suíça. É o mesmo ano, mas ali parece que ninguém sabe de nada. Tudo está silencioso. Uma dona de casa aspira tranquilamente o tapete da sala de sua residência. Dois pés masculinos se erguem automaticamente para que o aspirador passe. O homem lê seu jornal.
Ali vive Nora — seu nome não deve ser uma casualidade, lembrem-se de Casa de Bonecas, de Ibsen — com seu marido, dois filhos e o sogro. Ela pensa em trabalhar fora, mas o marido proíbe. Ele pode proibi-la, a lei permite. Ao mesmo tempo, aproxima-se a data de um referendo onde será decidido se as mulheres devem ou não ter direito ao voto. Só os homens votam, claro. E Nora, de forma inusitada, torna-se a líder feminista do local. Uma líder insegura e sem jeito para a coisa.
Mulheres Divinas não é lá muito profundo e muitos personagens parecem ter saído de um manual, mas o filme de Petra Biondina Volpe tira sua força do grupo de atrizes, da fluidez narrativa e do fato de partir de histórias pessoais bem comuns e, infelizmente, ainda existentes. A viagem das militantes a Zurique, onde participam de manifestações e de um curso para descobrir o próprio corpo são excelentes e repercutem no restante do filme. A parte final é previsível, mas a gente torce para que aquilo mesmo ocorra.
A tradução do título no Brasil não poderia ser mais estúpida. De A Ordem Divina tornou-se Mulheres Divinas. É que muitos homens invocam deus para que tudo permaneça como está. OK.
Este é um documentário fundamental para qualquer cinéfilo. Lumière! A aventura começatraz uma montagem comentada de 108 dos 1422 filmes que constituem o legado de Louis e Auguste Lumière. Alguns são realmente deslumbrantes, agora restaurados em 4k.
O primeiro filme dos Irmãos Lumière mostra a multidão de operários saindo da fábrica da família em 1895. Todos fingem — ou tentam fingir — que não veem a câmera. Este primeiro filme chegou dizendo de cara que o cinema servia para mostrar quem somos. E desde então os filmes vêm conversando com a gente. Eles falam conosco em salas escuras e contam nossa história.
É curioso que os Lumière tenham inventado tudo: a técnica de como registrar movimentos em filme, a arte cinematográfica e a sala de cinema. Foram os inventores do cinema e os primeiros cineastas. E dos bons. Foram também os primeiros a apresentarem um filme numa sala escura e os primeiros a cobrarem ingresso (1 franco).
Com tom professoral, o documentário de Frémaux esmiúça tudo sem se tornar chato, pelo contrário. As composições das cenas, os travellings, o cinema de ficção, o documentário, a comédia, o remake. Muita coisa já está ali. Cada filme tem 50 segundos — era o que cabia nas películas da época — e a câmera ficava parada no chão ou dentro de um carro ou trem em movimento.
E eles fizeram experiências, experiências, experiências e descobertas. Eram técnicos e artistas. Há filmes realmente lindos, outros são antecipatórios. Os irmãos Lumière e sua equipe vão concebendo e entendendo algumas funções narrativas presentes até hoje.
Pois é, Renato! Não deu! A gente sabia que era extremamente difícil. E entramos em campo pensando isso mesmo, sabendo que o impossível precisava acontecer para sermos campeões mundiais pela segunda vez. Sou um gremista apaixonado, mas sou bastante realista.
Ontem lembrei no meu Facebook que, nas oito primeiras participações no Mundial de Clubes, apenas duas equipes bateram o Real Madrid: o lendário Peñarol de 1966 e o fantástico Boca Juniors de 2000. É a filosofia do clube Merengue: vencer sempre, ganhar tudo que for possível. Era um pentacampeão mundial que enfrentávamos.
De fato, Renato, muitos têm dito que o Grêmio poderia ter ousado mais, arriscado mais. Talvez nessa postura estivesse a nossa chance, mas acredito que nela teria espaço para a goleada que não levamos. A nossa estratégia foi pensada para fazer o que todo clube sul-americano tem feito para tentar ganhar de um europeu: jogar por uma bola.
Desde a década de 90, começou-se a perceber a dificuldade que a diferença de orçamento impunha em campo (quando você Gareth Bale saindo do banco, fica evidente como o mundo é desigual). Isso tudo se acentuou ao longo dos anos seguintes, claro. Mas tem algo que piorou bastante na era pós-Guardiola.
Não só porque o técnico catalão revolucionou o mundo da bola, a ponto de todos correrem atrás dos europeus mais uma vez. É que os anos 2010 têm sido o retrato dessa desigualdade, como se vê a cada edição do Mundial de Clubes, demandando cada vez mais recursos para começar a pensar em montar um time vencedor.
O Corinthians campeão de 2012 foi a grande exceção. Venceu um Chelsea que ganhou a Liga dos Campeões na base de uma versão inglesa do CATENACCIO (o que não tira os méritos dos paulistas, obviamente). Mas a regra foi os sul-americanos levando uma SURRA desde o início da década. O melhor desempenho SUDACA de um não campeão nessa década foi o nosso ontem.
Evidentemente, Renato, que, como gremista, vão dizer que minha análise é enviesada. Mas o amor pelo Tricolor é parte da paixão pelo futebol que eu acompanho com afinco desde que me conheço por gente. Faz anos que venho dizendo isso tudo. Por isso não me abati com o resultado de ontem.
Claro, falemos do Grêmio. Geromel e Kannemann foram gigantescos. Que absurdo o que esses dois jogaram. Marcelo Grohe também foi muito bem. É outro que merece todas as honras. Luan, nossa referência técnica, deixou a desejar. Mesmo sendo difícil tentar articular jogadas contra um time que parece ter 18 em campo. Barrios foi decepcionante. Acho que sua carreira chegou ao fim mesmo.
Tivemos apenas uma finalização no jogo, de bola parada. Ironicamente, porque foi também numa falta que saiu o gol que nos tirou a chance do título (barreira não pode abrir, Luan e Barrios!). Mesmo sendo parado pela nossa zaga, Cristiano Ronaldo sempre aparece para mostrar porque foi o a melhor do mundo pela quinta vez neste 2017. No fim do jogo, senti falta do bom e velho CHUVEIRINHO na área, mas a verdade, Renato, é que parece que o Grêmio não tinha espaço nem para isso.
No final, fica de positivo a boa postura defensiva do time, especialmente no primeiro tempo. Para o futuro, fica a esperança de logo voltarmos ao Mundial de Clubes, em busca do Bicampeonato, mas numa realidade que nos permita olhar e ver que é possível (mesmo que com uma seleção internacional do outro lado).
De toda forma, Renato, a recente conquista do Tricampeonato da Libertadores nos deixou de sangue doce para o confronto de ontem. Por óbvio, hoje é dia de aguentar um pouco de corneta dos amigos – só observando a regra de não discutir futebol com quem equipara Kroos a Deco ou Modric a Giuly, claro (aqueles, quando muito, poderiam ser comparados a Magath ou Wuttke). Questão de bom senso intelectual.
O que importa, Renato, é que foram dois anos fantásticos, que a imensa e ensandecida Nação Tricolor só tem a te agradecer. Por favor, renova mais uns anos com a gente, que 2018 já está aí. Vem a Recopa. Tem a busca pelo hexa da Copa do Brasil. Tem o Brasileirão, que podemos levar a sério desta vez. E tem a busca pelo Tetra da América, obviamente.
Que venha o próximo ano! Que venham as próximas alegrias!
Saudações Tricolores!
E segue o baile…
https://youtu.be/hVwHEsxoJU4
(*) Advogado, palpiteiro, caxiense radicado na capital e GREMISTA de quatro costados.
Sempre fui fã de jogadores elegantes, daqueles que pareciam dominar uma bola sem esforço e seguiam a jogada com olhos abertos e cabeça erguida. Caras como Dennis Bergkamp e Juan Román Riquelme, por exemplo, sempre me encantaram, pelo ar de simplicidade que davam a uma jogada que eu jamais conseguiria realizar ao vivo (talvez nem no videogame). Em suma, sempre admirei os jogadores elegantes por ser eu próprio uma mistura de um troll e de um visigodo com a bola nos pés, dono de um jogo tão elegante quanto uma briga de rua entre bêbados.
Mas, de todos os jogadores considerados elegantes no futebol (e são muitos), nenhum me encantou tanto quanto Zinedine Yazid Zidane, a quem um dia nunca chamarei pessoalmente de Zizou, embora quisesse. Depois de vê-lo destroçar a Seleção Brasileira na final da Copa de 1998 juntamente com seus companheiros franceses, passei a acompanhar mais de perto a carreira dele, sobretudo a partir da sua ida para o Real Madrid. Embora nutrisse uma paixão já um tanto antiga pelo FC Barcelona (desde meados dos anos 1990, graças a Romário e Ronaldo, entre outros, e a minha mãe, que frequentemente viajava para um congresso internacional de hepatologia em Barcelona e me trazia lembranças blaugranas), passei a torcer pelo time merengue, mas apenas e tão-somente quando Zizou estivesse em campo.
Com o tempo, obter uma camisa do craque francês tornou-se um desejo, quase uma obsessão. Percebendo isso, minha (então) namorada (e hoje esposa), viu que eu havia me encantado com uma camisa branca do Real Madrid que havia encontrado em uma loja de material esportivo de Porto Alegre, pois ela estava estampada com o nome “Zidane” sobre o número 5 às suas costas. Era a camisa da temporada 2005-2006, que seria a última dele como jogador profissional. Ou seja, uma camisa já histórica.
Pois bem, no meu aniversário de 25 anos, fiquei feliz ao ver que o pacote era da loja em questão e que seu conteúdo era uma camisa. Ao abrir o pacote, esbocei um enorme sorriso, que ficou só no esboço quando vi que no verso da camisa não constava qualquer estampa. Ante a chocante descoberta, minha companheira disse que havia algo errado, pois ela mesma tinha pego a camisa do varal e levado para o caixa. Quando fomos à loja para trocar o item, descobrimos que o vendedor havia passado a camisa errada a ela, inclusive mais barata que a originalmente escolhida (na hora a atendente do caixa deve ter dado a entender a minha amada que o preço menor que o original seria devido a um desconto pelo pagamento à vista), e que a minha tão sonhada camiseta do Zidane já sido vendida.
Vendo minha tristeza quase infantil, com beiço e tudo, minha querida companheira perguntou se não havia outra camisa com nome e número de jogador dos Merengues para me dar. Não tinha a 7, do Raúl, capitão e ídolo maior daquela geração dos Galácticos? Talvez a 10, que já fora do Figo mas que àquela altura devia ser do Robinho? Quem sabe a 9, do Ronaldo, que também jogaria sua última temporada em Madri? Nenhuma dessas: a única que a loja tinha disponível era a de David Beckham, com o anódino número 23 às costas. Pensei que podia ser pior, podia ser a do Helguera ou, ainda mais triste, a do Gravesen.
Enfim, admirado que estava com o esforço da minha digníssima, aceitei a camisa do craque (?) inglês, que tenho até hoje, embora o branco original do seu tecido esteja hoje mais perto de um cinza, em parte devido à inadvertida e frequente decisão de lavar roupas brancas e pretas ao mesmo tempo na máquina. Sim, sou um péssimo dono de casa, quase tão ruim quanto sou jogador de futebol. Talvez até pior, devo ser algo como um Gravesen do lar.
Assim, obtive minha camisa que era para ser do Zidane mas acabou sendo do Beckham. E será com essa camisa que torcerei para o time hoje treinado por um dos meus maiores ídolos esportivos na final do Mundial de Clubes da FIFA contra o time que mais detesto na face da Terra, treinado por alguém que suporto menos ainda. Sou colorado e secador, sem vergonha nem pudor.
As estatísticas esportivas e demais dados jornalísticos frios podem desmentir o que vou escrever, mas é possível que Zizou seja o primeiro homem na história do futebol a conquistar títulos nacionais, continentais e mundiais como jogador e técnico pela mesma equipe. Só espero que ele não permita que o Renato seja o próximo dessa lista. Que ela seja, portanto, apenas o vice.
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(*) Thomaz Santos é bacharel em Direito (UFRGS), mestre em Relações Internacionais (UnB), doutor em Direito (UFSM) e professor adjunto do curso de Relações Internacionais da UFSM.
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas –
Essas e o que faz falta nelas eternamente;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço…
Pois é. Tantas vezes já pensei em parar, mas sempre aparece mais um assuntinho e vou ficando. Uma vez até fiz um post anunciando o fim do blog, mas apareceu um cara comemorando… E ele me detestava tanto que resolvi responder. Então, retirei o post de despedida e estou aqui até hoje. Os blogs estão fora de moda, acho que a sobrevivência do meu deve-se ao fato de ele aceitar tudo ou, melhor dizendo, de seu dono meter a colher em tudo. Publico sobre livros, música, futebol e sempre me pedem mais cinema, coisa que eu insisto em esquecer. Ou talvez os blogs não estejam acabando, mas apenas descobrindo seu real espaço de pequena influência. Aliás, noto que a maioria dos sites — mesmo os de grandes corporações — também não apitam muito.
Tenho 765 posts sobre literatura, 628 sobre futebol, 604 sobre música, 451 sobre política, 347 Porque hoje é sábado — categoria extinta em razão das pessoas terem desaprendido, entre tantas outras coisas, a diferença entre erotismo e pornografia –, 266 besteróis, 251 resenhas de livros, 231 sobre cinema, 171 em torno do meu umbigo, 166 crônicas, 166 crônicas familiares, 134 sobre viagens, 48 contos, etc.
O Google sempre me encontra, pois quase todos os textos são originais, ainda que sejam infelizmente meus. Só agora convidei o Samuel Sganzerla para escrever sobre o Grêmio, outro pedido de meus sete leitores. O incrível é que não o conheço pessoalmente.
O blog também me gerou dois processos. O primeiro foi movido por Letícia Wierzchowski contra uma crítica minha. Ela tinha razão, eu cometera uma cavalice. Pedi desculpas, retirei a coisa, ela retirou o processo e tudo acabou em civilidade. Não me orgulho do episódio. Mas me orgulho do processo de Mônica Leal contra mim. É uma medalha, uma demarcação de oposição. E mais não digo para ela não repetir a dose.
Só que o blog me proporcionou conhecer muita gente boa e legal. Todos os sete são.
Como estamos todos aí nos Emirados? Aqui em Porto Alegre (e em toda América do Sul), ontem estivemos todos em transe, aguardando o momento derradeiro que nos permitiu sorrir e achar que, sim, ainda vamos acabar com o Planeta! O Coração Tricolor é muito forte, Renato! Teste após teste, ele resiste firmemente, quando muito se socorrendo do desfibrilador da LOUCURA LUDOPÉDICA. Não foi diferente ontem!
O jogo ontem, contra o Pachuca, foi de grande tensão. Pairava no ar aquele clima de OBRIGAÇÃO que se criou sobre os clubes sudacas, especialmente os brasileiros, desde que o coirmão e o Galo sucumbiram na semifinal do atual formato do Mundial de Clubes. Em verdade, é a dignidade do futebol sul-americano que entra em jogo: quem ainda tem a pretensão de fazer frente ao multimilionário e poderoso futebol europeu necessita prevalecer sobre os demais.
O problema, Renato, é deixar a pretensão se confundir com a arrogância. Porque, como eu disse no outro dia, histórico não entra em campo. Felizmente, não foi o nosso caso ontem. Mesmo diante de tantas dificuldades contra um adversário que, no último sábado, aparentou (enganosamente) ser mais fraco do que se apresentou ontem, a ansiedade não virou desespero e a aflição não se abateu a ponto de virar tragédia.
Tivemos problemas no meio campo, nitidamente sentidos na ausência do Rei Arthur. Os mexicanos detiveram maior posse de bola, que, diante de uma boa postura de nosso sistema defensivo, não se converteu em volume de jogo. Cabe destacar a boa atuação da nossa sempre valorosa dupla de zaga. Mas o elogio especial vai mesmo para Bruno Cortez, salvando o time em duas ocasiões, com botes precisos como um CÃO DE GUARDA abocanhando um naco de vazio mal passado.
Luan, mesmo muito marcado e com o homem do apito deixando Hernandez lhe surrar à vontade, aparecia bem na articulação. Foi dele o chute que quase abriu o placar, não fosse a defesa de Perez (o arqueiro com porte de jogador de fim de semana e vasta experiência), que ainda permitiu a bola triscasse a trave. Barrios apagado deu lugar a Jael, o centroavante que revoluciona o jogo mesmo sem fazer gol (foi um elogio, OK!?). Mesmo com a melhora e com o domínio da partida, persistiu a igualdade e fomos para a prorrogação.
Eis que Everton Cebolinha, o TALISMÃ TRICOLOR, encarnou o seu melhor espírito para infernizar a defesa mexicana e soltar um petardo no canto oposto da meta mexicana. Claro, um tento logo no início da prorrogação era apenas a confirmação do bom presságio que se desenhará sempre que, numa partida do Mundial, o nosso camisa 7 sentir cãimbra nas pernas aos 45 do segundo tempo. Sabes de quem falo, né, Renato?!
Enfim, foi o grito de gol desengasgado, a alegria de uma tarde de terça-feira fugaz, que seria só mais um dia banal se não fosse o Grêmio. Desenhou-se ali a nossa vitória, e depois tudo foi alívio e festa. Estamos na final, mantendo vivo o sonho de atingir o topo do mundo novamente. Acompanharemos hoje a definição do nosso adversário, na partida em que o time do país-sede recebe o famigerado campeão europeu.
Evidentemente, a lógica nos obriga a afirmar que o Real Madrid já é nosso adversário (mesmo que, no futebol, a lógica às vezes passe fome). E, contra os Merengues, não temos nada a perder. Agora, o favoritismo, convenhamos, é todo deles. Até os quero-queros que voam sobre o crescido gramado do saudoso estádio Olímpico sabem disso. O que vier para nós será lucro. Lembremos que, daquele lado, está o maior clube da história do futebol (por méritos ou por razões escusas, como tanto acusam).
O Real É o maior vencedor do Mundial de Clubes, com cinco títulos. O maior campeão da Liga dos Campeões da UEFA, sendo também o único clube a ter vencido duas edições seguidas nas últimas três décadas. Chega com o time completo, recheado de jogadores que são titulares absolutos em suas seleções. A estrela do time já escreveu seu nome no rol dos grandes jogadores da história – e não apenas acaba de vencer sua quinta Bola de Ouro, como é um atleta ambicioso, sempre obcecado com a vitória, com quebrar recordes e marcas pessoais.
Com certeza, não é nada fácil. Como nunca foi para nós! Este será o maior desafio da gloriosa história de 114 anos do Imortal. Mas eu repito: não temos nada a perder. Se a realidade é dura, que nos alimentemos de sonhos e de loucura. É assim que vivemos desde sempre, foi graças a esse delírio apaixonado pelas três cores que chegamos tão longe. E a inspiração, Renato, pode ser numa tarde em Tóquio da qual tu lembras muito bem,
Como tu sabes, Renato, eu sou gremista desde a tenra infância. Desde que me conheço por gente, já ouvia dizer: “o Grêmio é Campeão do Mundo”. A vitória sobre o Hamburgo ocorrera em 11 de dezembro de 1983, quase quatro anos antes de eu nascer, é verdade. Devido aos canais de televisão a cabo, lembro quando vi pela primeira vez um compacto com imagens raras do jogo. Depois veio a era da internet, de modo que a tecnologia me permite rever a partida completa do meu celular agora, se eu quiser.
Graças a isso, acho que já assisti ao jogo inteiro do Mundial de 83 umas seis ou sete vezes. E sabe o que é sentimento de torcedor gremista mesmo, Renato? É que eu sei desde desde sempre qual o placar final daquela partida… Mas toda vez que o Magath levanta a bola na área, e o Jakobs a escora para o Schröder empatar, aos 40 do segundo tempo, eu fico nervoso. E sempre que tu fazes aquele golaço na prorrogação, deixando o mesmo Jakobs na saudade e batendo no contrapé do Stein, uma lágrima escorre.
Esse sentimento é o que define o Grêmio: ele é intenso, vibrante, eterna e constantemente apaixonante. Ele é Imortal!
Vai lá, Homem-Gol! Digo e repito: nada temos a perder contra o Real Madrid! Quando os fatos são improváveis, lembremos que nós somos feitos de batalhas heroicas e feitos inacreditáveis! Se a vida é dura, sonhar não custa nada!
É inacreditável que meu pai tenha morrido já há 24 anos. Tanta coisa aconteceu desde 11 de dezembro de 1993 que é quase um abuso de fantasia querer contar-lhe tudo o que houve. Sua mulher, minha mãe, foi embora em 2012. Ele teve uma primeira e última neta em 1994 — e ela foi “decidida” em razão de sua morte. Ele queria uma neta, me disse uma vez, depois de já ter dois meninos. Meu filho — o outro neto é filho de minha irmã — é fotógrafo e meu pai gostava tanto de tirar fotos que enchia todo mundo com isso. Temos fotos muito legais da família, mas ele aparece em poucas; afinal, ele era o fotógrafo. Seu Inter não ganhou nada em âmbito nacional, mas ganhou duas Libertadores e um Mundial. O Hipódromo do Cristal, local muito frequentado por ele, é hoje um lugar melancólico, quase fechado e falido, creio. Meu pai gostava muito de novidades tecnológicas, mas por alguma razão não o imagino com um perfil no Facebook. Talvez no Twitter. Mas certamente usaria o WhatsApp para economizar. E ele não amaria apenas seus netos — talvez convencesse a Bárbara a seguir na equitação, pois seu amor aos cavalos era algo muito grande, quase ruinoso –, mas também a Elena, porque era um dentista que sonhava ter sido médico ou músico. Imagino facilmente meu pai feliz com o TCC da neta e com o curso do neto na Alemanha. E me divirto criando diálogos dele com a Elena, discutindo violinistas. Aposto que ele ficaria sempre defendendo seus Accardo, Menuhin e Ferras. E ficariam trocando elogios para Grumiaux e Heifetz. Eu? Eu fico em alerta porque daqui seis anos terei 66, a idade em que ele morreu.
Vou salvar aqui algumas postagens que fiz no Facebook e que lá se perdem. Não pelo brilhantismo de minha abordagem, mas pelo comentários dos amigos. Vou começar por esta. Eu escrevi:
Elena indignada porque Paul McCartney repete 17 vezes a mesma nota no início de Another Day e a canção… É irresistível.
Paulo Moreira Não explicaste pra ela que a música pop do ocidente é assim?? E que fomos criados ouvindo estas canções horríveis, limitadas e irresistivelmente grudantes? E que por isso é música pop?
Zeca AzevedoMúsica popular é assim mesmo.
Marko A Costa Caboclo Miles Davis manda relembrar q menos é mais.
Caetano W. Galindo Pera lá…. Neguinho tá vendo “simplicidade” nisso? Bom, primeiro que essa moda de repetir uma nota só na melodia de uma canção quem começou foi dom Beethoven… Segundo que, olha a letra: a repetição vem bem na parte que fala de MONOTONIA! O cabra sabe o que tá fazendo… É que nem “My Love”, que começa com “AND when I go away”…. no meio de uma frase, e faz a harmonia começar toda no meio do caminho, num Bb que “resolve” num Am, mas que no fundo só vai fechar em F lá no refrão…. O cara sabe MUITO.
Milton RibeiroElena completa: “Nada simples. São 17 notas iguais dentro de algumas harmonias diferentes, alta competência”. Eu, Milton, tb acho. Se fosse simples, eu inventaria canções facilmente.
Marko A Costa E não confundam simples com fácil ou mesmo com simplório. Pra se atingir o simples, não raro é necessário, experiência à parte, um trabalho do cão, qdo se consegue…
Caetano W. Galindo Milton Ribeiro e, só de bônus (hoje fui reouvir a música no passeio do cachorro) e no fim, quando a coisa da rotina está superada pelo desenvolvimento todo, ele harmoniza o vocal com outra linha melódica em cima das notas repetidas… enfim… pérolas.
Caetano W. Galindo E, bem claro, não imaginei que a própria Elena estivesse vendo simplicidade, ok? É que vi uns comentários meio estranhos no post. A primeira-dama é profissional! e não há como se enganar num caso desses!
Marko A Costa Não é o caso da Elena, evidentemente que além de tudo (e bota Tudo nisso ?), tem bom humor; mas Galindo, sem nem entrar em discussão artística, o que tem de profissional no meio musical que ouve mas não escuta, é de pasmar ?
Foi um choque iniciar e leitura de A noite da espera logo após ler Oblómov. Foi como cair num pântano após quilômetros de caminhada tranquila. O livro simplesmente não me envolveu e eu esperava muito dele. Imaginem que cheguei a dá-lo de presente a um amigo, na certeza de que era um excelente romance. Não é. E tinha tudo para eu gostar: era um romance escrito por um grande autor sobre a geração que esteve na universidade durante a ditadura militar nos anos 70, a minha geração. Tive vontade de abandoná-lo, mas fui até o fim. Logo de cara vê-se uma estrutura frouxa, como um tênis desamarrado. Fiquei esperando por alguma virada, mas nada aconteceu. Não tem boa trama, o conflito é contra algo que não se vê e que não parece perigoso ou incompreensível, o cenário é pintado com superficialidade, enfim, dá vontade de largar. O protagonista e narrador da história é desinteressante. Burro, até diria. Perdido na cidade, mudando de moradia a toda hora e, incrivelmente, refletindo pouco sobre os fatos de sua vida — a separação dos pais, o sumiço da mãe, o pai entusiasmado com a “revolução” dos milicos, os amores — Martim vê tudo passar sem intervir e, pior, sem refletir muito. O livro vai ficando cada vez mais difícil de entender em razão de sua superficialidade e péssima construção. Eu, como leitor, tive que anotar o nome dos personagens e como eles se relacionam, pois todos falam e agem igualmente, sem a menor distinção. São chatos nos dois sentidos. Todos dizem insignificâncias. A política também não é muito tocada. Só se sabe que há censura, perigo e corrupção. Bem, não é uma novidade. E onde ficou a trama, o romance, a tensão, a reflexão, a humanidade? Oblómov tinha setecentas páginas e este romance tem duzentas e poucas, só que muito mais longas. Um saco.
Não recomendo. E, digo-lhes, meus sete leitores, este é o primeiro volume de uma trilogia… Tô fora.