Dia Internacional da Mulher: "Máquina de lavar fez mais pela mulher do que a pílula", diz Vaticano

No ano passado, em pleno Dia Internacional da Mulher, o Vaticano fez publicar em seu jornal um artigo de extrema sensibilidade, pois parte da indiscutível posição de que a mulher é quem deve lavar a roupa… Como achei o artigo cômico em seu preconceito, guardei-o por um ano entre meus “Favoritos”. Ele está copiado abaixo.

Por outro lado, a data de hoje serve para celebrar os avanços sociais, econômicos e políticos alcançados pelas mulheres. Escrevo isso e penso na empregada aqui de casa: casou-se aos 12 anos com um homem de 27, teve uma filha aos 14. Dias atrás, aos 23, tentava se separar mas era ameaçada, física e materialmente, pelo marido. Tratamos de aconselhá-la — advogados, delegacia da mulher, justiça gratuita, tudo — , enquanto ela seguia sendo perseguida pelo sujeito, e contava horrores. O advogado da Defensoria Pública disse que chamaria não apenas o cônjuge como seus pais e o mundo, pois como é que fora autorizado um casamento aos 12 anos? Resultado: ficou assustada, demitiu-se aqui de casa e voltou para o marido. Sim, ainda há um longo caminho a ser percorrido.

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O jornal do Vaticano, “L’Osservatore Romano”, publicou artigo neste fim de semana no qual afirma que a máquina de lavar talvez tenha feito mais pela liberação da mulher no século 20 do que a pílula anticoncepcional ou o acesso ao mercado de trabalho. A declaração faz parte de um artigo em homenagem ao Dia Internacional da Mulher.

O artigo é intitulado “A Máquina de lavar e a liberação das mulheres –ponha detergente, feche a tampa e relaxe”.

“O que no século 20 fez mais para liberar as mulheres ocidentais?”, questiona o artigo, escrito por uma mulher. “O debate é acalorado. Alguns dizem que a pílula, alguns dizem que o direito ao aborto, e alguns [dizem que] o direito a trabalhar fora de casa. Alguns, porém, ousam ir além: a máquina de lavar.”

O texto então conta a história da máquina de lavar, desde um modelo rudimentar de 1767 na Alemanha, até os modernos equipamentos com os quais a mulher pode tomar um capuccino com as amigas enquanto a roupa é lavada.

O artigo cita as palavras da feminista americana Betty Friedan, que, em 1963, descreveu “o momento sublime de poder trocar a roupa de cama duas vezes por semana em vez de uma só”.

Segundo o texto, embora os primeiros modelos fossem caros e pouco confiáveis, a tecnologia evoluiu a tal ponto que há agora “a imagem da super mulher, sorrindo, maquiada e radiante entre os equipamentos de sua casa”.

Da Reuters, Cidade do Vaticano.

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Inter sem criatividade, Porto demite-se do penta

O Inter apresenta um grave problema. Não temos o segundo atacante, aquele que acompanha o centroavante (ops!, rimou). Taison e Edu estão muito deficientes, toda bola que vai em suas direções logo passam ao adversário. Perdem todas e não devem ser recuperados dentro de campo, prejudicando o time. Walter parece ter, no mínimo, deficiências emocionais e merecerá a punição que receber por sua fuga. Talvez a solução seja adiantar Andrezinho ou usar Leandro Damião ao lado de Alecsandro, o único avante eficiente que temos, apesar da insistência da parte burra da torcida em vaiá-lo. É complicadíssimo enfiar na cabeça dos torcedores que o jogador que faz gols é fundamental.

Pato Abbondanzieri começou a jogar. Um cara nascido em 19 de agosto não pode dar errado. Simples assim.

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Alguns adeptos do FC Porto vieram a este blog discordar cortesmente de minha opinião sobre a impossibilidade do penta. Pois piorou. Se a matemática já indicava dificuldades na semana passada, o empate com o terrível Olhanense (sim, da conhecidíssima cidade de Olhão), combinado com a vitória do Benfica só fez piorar as coisas. Agora são 11 pontos de diferença para serem tirados em oito rodadas. Impossível. Só o Braga, que está a três pontos, pode tirar o título do Benfica, meu time.

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Este blog previu…

o óbvio. Serra, por absoluta carência de condições e carisma, não teria a menor chance. Vai fazer forfait. Nada mal para este viajante que mal se informa sobre política. Só falta acertarmos! Se bem que o problema talvez sejam os apoiadores: Veja, Folha, Estadão, ZH, etc.

Pior para Dilma. Vai enfrentar a “cara nova”, ao menos em âmbito nacional, de Aécio.

E o Cloaca joga mais terra em cima:

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Dostoiévski ou Tolstói?

Ontem, um comentarista, que se identificou apenas como Pedro, me provocou com esta pergunta clássica. Começo respondendo que não acho lógica uma comparação entre seres humanos e romancistas tão diferentes entre si — seja nas posturas, seja nas vivências de cada um — , ao mesmo tempo que sei que nada é mais lógico do que comparar dois contemporâneos importantíssimos, como hoje fazemos com Saramago e Lobo Antunes, por exemplo. Outra mania que desejo evitar é o elogio de um para desvalorizar o outro. Este gênero de mau elogio fica melhor em jornais de província. Eu posso gostar de Drummond e João Cabral e, se elogiar este, não estarei menoscabando aquele. Talvez as pessoas gostem de comparar os dois russos pelo amor de ambos aos grandes painéis. Seus romances eram tudo: psicológicos, sociais, filosóficos, picarescos, metafísicos (no caso de Dostô) e tão grandes que empurraram as fronteiras dos gêneros para poderem se acomodar dentro delas.

Gosto de ambos por motivos muito diferentes. Tolstói talvez seja o maior de todos os narradores clássicos — por que não recebeu o Nobel se faleceu em 1910, hein? Seus romances são perfeitos, têm ritmo, excelente prosa, envolvem. Se o tivesse de comparar com alguém, seria com Turguênev ou com certa parte da obra de Tchékhov. A Morte de Ivan Illich não seria uma antecipação de Thomas Mann? Em minha opinião, sua grande obra é Anna Kariênina, além dos contos e novelas. Guerra e Paz é uma obra-prima, mas aquele epílogo semi-ensaístico é um saco, atrapalha todo o livro. Porém, enquanto Tolstói chegava ao ápice da forma clássica, Dostoiévki já sinalizava que aquilo estava ultrapassado.

Sim, notem a diferença fundamental de foco narrativo utilizado pelo dois canônicos russos. Tolstói era o típico narrador onisciente que, apesar de detalhista, não era capaz de abandonar sua posição aristocrática, o senso comum de sua época e o certo e errado da concepção cristã do mundo. Já Dostô, quando comparado a Tolstói, parece um alucinado. O narrador de Dostoiévski localizava-se sob a pele dos personagens, saltando de um para outro, deixando-se reger de tal forma por suas lógicas (ou loucuras) que fazia sumir o narrador-julgador. Não se sabe muito bem quem representa Dostoiévski em seus livros. Ele é cada personagem e o livro parece andar por si.

Tolstói tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados. O acabamento era fundamental para clássicos como ele e Mann. E Tolstói não tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados, pois livros como Crime e Castigo e O Idiota são sôfregos, nervosos e tão viscerais que, sob o filtro de Tolstói, se transformariam em outra coisa. Quem pensa em acabamento quando quer descobrir quem matou o velho Fiódor? E quem criticaria o acabamento absolutamente impecável da Parábola do Grande Inquisidor — apenas para me referir a dois temas de Os Irmãos Karamázov? Ora, Dostoiévski não estava preocupado com o acabamento porque as regras vigentes da beleza literária o atrapalhavam; porém, quando precisou, fez uso delas brilhantemente. Na verdade, uma das últimas preocupações que temos ao ler Dostoiévski é com o acabamento. Os personagens de Tolstói sofrem com dignidade, os de Dostô berram e se escabelam. Não obstante, o horror metafísico que cresce de O Idiota não fica nada a dever ao de Ivan Illich, até pelo contrário.

Enquanto Guerra e Paz é um panorama, Os Irmãos Karamázov aponta para o fim de uma era, como Dostô já fizera em Os Demônios. Tolstói é um burguês, Dostô pensa num apocalipse. Céus, são muito diferentes. E muito bons.

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Serra desce ladeira abaixo, Eliseus sobem aos ceús, Walter fica em casa

Ontem, Marcelo Coelho deu palavras a algo que eu já tinha intuído de forma confusa. A candidatura de Serra está morrendo e não há nenhuma reação do PSDB ou da atrapalhada tartaruguinha. Como Serra ainda não é candidato oficial, fico preocupado. Queria que ele perdesse na eleição, não previamente. Será que ainda teremos Aécio?

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É surpreendente e anormal a divulgação de um certo Eliseu Pompeu Gomes como o assassino de Eliseu Santos, pois a polícia não costuma sair divulgando nomes quando nem efetuou a prisão. Hoje, ZH diz que “parece coisa de literatura” — para mim, é — um Eliseu matar outro e mostra fotos do suposto assassino. Pelo visto já decidiram pelo crime comum. Posso não ter razão, claro, mas não acredito na coincidência e queria saber notícias da tal Operação Pathos.

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Assim, como Eliseu Gomes permanece foragido, o jogador Walter segue em casa. Nega-se a treinar porque não gosta do treinador Jorge Fossati. Imagino o desespero de seus empresários. Walter, um bom jogador, tem mente infantil, perturbada e, hoje, nenhum valor de mercado… Quem investiu no moço devia ter pensado melhor quando o jogador jactava-se de só se alimentar de cheeseburger. Agora quer voltar para Recife, mas não tem dinheiro para a passagem…

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Enfim, Joel Santana descobriu o que tanto procurava

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Os ípsilons de Bolaño

Anteontem, estava lendo 2666 (terceira parte: La parte de Fate), de Roberto Bolaño. Na página 332 o personagem Fate chega a seu quarto de hotel para dormir. Liga a TV. A princípio, Fate fica deitado e vê um desses programas de humilhação de gente gorda, tão comuns na TV inglesa. Marido e mulher batem boca, um deles arranjou uma amante. A(o) amante intervém. Fate dorme.

O notável é que Bolaño segue impavidamente descrevendo o que passa na TV. É inusitado e é maravilhoso para a narrativa. Não tenho grandes pretensões de entender o que Bolaño quis exatamente exprimir, se é que quis. Fico com a opinião de Isak Dinensen (Karen Blixen), que defendia não ser fundamental entender tudo aquilo que os escritos poéticos — pois é poesia o que faz Bolaño com sua TV — podem ou devem significar. Depois, cansado da TV, Bolaño passa a acompanhar um sonho de Fate que, de forma enviesada, tem a ver com a narrativa. É como se a narrativa estivesse subindo, evoluindo, e repentinamente se abrisse num Y. E o Y logo é abandonado, pois Bolãno já está envolvido com outra história. Nós também.

Este insistente uso da fratura, a capacidade que Bolaño tem de sempre nos interessar por outra e mais outra narrativa é a maior característica de 2666 e Os Detetives Selvagens. É uma voz que parece saída de um sonho, sedutora e ao mesmo tempo desinteressada.

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José Mindlin para as novas gerações iletradas

Por Fernando Monteiro – Enviado a mim pelo autor através de e-mail
Publicado no hoje no Substantivo Plural

No momento em que tantos estão a escrever (?) tantas “generalidades” sobre o realmente admirável José Mindlin, eu gostaria de relatar uma historinha (real) a respeito de um livro.

Um dos mais raros livros que já passaram pela mesa do meu amigo Stefan Geyerhahn, sebista que… Não, esse nome precisa, antes de mais nada, ser trocado pelo de “antiquário de livros”, que melhor se adapta ao perfil de grande livreiro especialista em obras raras e antigas (título dignamente conquistado por Geyerhahn, um dos donos da Livraria Kosmos — “sebo” que ajudou a civilizar o Brasil).

Muito bem. Vamos à historinha: estava eu, numa tarde paulista, em conversa com o Stefan na sua sala da Avenida São Luís, quando lhe anunciam que um estrangeiro, um europeu, de posse de uma obra que parece realmente rara (na avaliação inicial que era feita lá no salão da livraria, antes de alguma oferta vir para o exame especializado de Geyerhahn), tinha vindo oferecer uma obra que parecia “interessante”…

Diante do caso, eu me propus a sair, porém Stefan pediu que eu ficasse, com a generosa alegação de que, quem sabe, pudesse eu ajudá-lo a analisar a obra (pobre de mim!, um simples colecionador de pequenas raridades)…

O homem entra. É taciturno e de poucas palavras — num inglês precário. Stefan domina várias línguas, e logo estão se entendendo no francês que, um dia, já foi a língua culta do mundo.

A certa altura, o meu amigo sócio da Kosmos pede permissão ao estranho, e me passa o livro — um pequeno opúsculo do século XVII — que eu pego com infinitos cuidados, apesar de estar razoavelmente bem conservado. Sinceramente, não me lembro mais do título rebuscado (à maneira seiscentista) da raridade bibliográfica, mas conservo a lembrança da explicação do livreiro, que me esclareceu:

— “É a obra de um viajante no Brasil de meados dos 1600. Uma edição sueca, da qual eu só tinha visto, até agora, o exemplar que se encontra na Biblioteca Nacional de Estocolmo. É rara, raríssima, e esse senhor está pedindo um preço até bem razoável ( apesar de, para mim, ser um valor estratosférico, pelo que eu havia entendido da conversa deles em francês). Bem, é um livro que tem exatamente o perfil dos que interessam ao José Mindlin. Vou telefonar para ele.”

Stefan vai, e liga para o bibliófilo. É imediatamente atendido. E explica do que se trata.

Ouvindo o telefonema, percebo que Mindlin se surpreendeu, do outro lado do fio, com a aparição de tal obra em oferta no mercado, e, mais ainda, com o preço que (segundo, mais tarde, me explicou o Stefan), ele, Mindlin, considerou “muito barato”…

E aí? Você pára a leitura deste “post”, neste momento, e aposta: o que aconteceu? O livro era da área de absoluto interesse do velho Mindlin. Dizia respeito ao Brasil dos 1600, estava bem conservado e era “raro, raríssimo” – além de “muito barato”.

Ou, conforme Stefan Geyerhahn colocou, ao telefone com Mindlin:

“Dr. Mindlin, o senhor está sendo a primeira pessoa para a qual estou ligando, porque acho dificílimo que apareça outro exemplar desta obra sueca…”

Bem, o bibliófilo José Mindlin NÃO adquiriu o livro.

Não porque o livro não o interessasse, pelo contrário.

Nem porque não tivesse o dinheiro (piada!). Ou porque o livro estivesse em péssimas condições, etc. (porque Mindlin mandaria restaurá-lo de imediato, sem medir despesas) etc.

???

Resposta do enigma:

José Mindlin não comprou a raríssima obra — segundo explicou a um surpreso Stefan Geyerhahn — porque ele “jamais adquiria um livro que não pudesse ler”… E ele “não lia em sueco — infelizmente”. De onde se conclui que todos, literalmente TODOS os livros da vastíssima biblioteca do bibliófilo — por ele doada à USP — haviam sido LIDOS por Mindlin, um a um, nas muitas línguas que ele conhecia. E o sueco não estava entre elas (“infelizmente” etc etc)!

Esse foi José Mindlin — ó geração de iletrados que estão por aí. Fica o exemplo para “vosmecês”, big brothers do Oiapoque ao Chuí…

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A ZH de amanhã e a morte de Eliseu Santos

A Zero Hora de amanhã mancheteará que uma gaúcha pode ganhar o Oscar, publicará a lista de 2010 dos candidatos a Gaúchos Honorários e garantirá que é muito gostoso ser gaúcho. Já o caderno de Grandes Capangas Gaúchos, trará as principais hipóteses para o assassinado de Eliseu “O seu médico (but not mine)” Santos:

Por Luís Augusto Farinatti

São aventadas novas teses no caso da morte de Santos:

1- Crime Conjugal: não pode ser descartada a hipótese de que a mulher do secretário tenha contratado pistoleiros, pois seria uma eleitora do PT, inflitrada pelo Komintern (que apenas se finge de morto, mas está aí, firme, insinuando-se entre as pessoas de bem). Dizem que, enquanto o marido era alvejado por atiradores das FARC, treinados pelo MST, essa nova Dalila, dentro do carro, passava calmamente nos lábios um batom de um vermelho ofuscante.

2- Acidente: os ferimentos causados no secretário se deram em virtude do estouro do escapamento do carro, enquanto ele dava a volta no automóvel depois de fehcar a porta do carona onde havia entrado sua esposa.

3- Suicídio: na verdade, o secretário andava sofrendo de uma forte crise de depressão, tendo em vista as injustas denúcias das quais vinha sendo vítima. Assim, disparou três tiros contra si mesmo e ainda usou o último fôlego para imitar vozes de assaltantes, com o fim de enganar Deus e poder entrar no Reino dos Céus.

Da Redação

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Papéis Reencontrados

O dia 24 era um domingo e, no dia seguinte, 25 de setembro de 2006, minha filha completaria doze anos. No mesmo dia 25, o mundo musical comemoraria os cem anos de nascimento de Dmitri Shostakovich. Lá pelas tantas, naquele domingo em acontecimentos, resolvi olhar os e-mails. Havia um do escritor Fernando Monteiro.

Era um poema, uma litania que Fernando escrevera e dedicara a mim — seu geograficamente longínquo amigo — e a Bárbara. Fiquei honradíssimo com a dedicatória, li o poema para minha companheira de dedicatória e aquela Litania nos cem anos de Shostakovich acabou publicada em alguns jornais. Lembro que planejei fazer referências a estas publicações, mas nunca as fiz.

Hoje, ao procurar uns papéis, encontrei a Litania grampeada a outros dois papéis: um da imagem de uma página de 23 de fevereiro de 2007 do caderno “Anexo – Idéias” do jornal A Notícia de Joinville, onde a Litania tinha sido publicada, e outro, um e-mail de Fernando, explicando-me que as alusões “venezianas” do poema — detritos, crianças, gradis, febre, scirocco –, eram uma homenagem a Mahler que, para ele, é o que Shostakovich é para mim.

Fernando, digo-te que meu coração musicalmente promíscuo também coloca Mahler antes do amado Shostakovich…

No final, antes de escrever este post, examinei demorada e amorosamente a primeira folha, a da litania sozinha, onde há a linda e enorme letra infantil de minha filha. Bem sobre o B.R., ela escreveu Bárbara Ribeiro.

Litania nos cem anos de Shostakovich

Fernando Monteiro

Para M.R. e B.R.

O torso de beleza afastando-se
Como se afasta um afogado
Das margens da praia
Também recuada para trás
De onde o Mediterrâneo
Vinha beijar os pés das sílfides,
Debaixo do sol silencioso.

Abandonados pelas crianças,
Os brinquedos da marina
Zunem de calor no metal
Aquecido como as águas.

O planeta está mais quente
E mais enlouquecido
Entre os pios nublados
Do pássaro escondido
Em árvores molhadas
Da chuva ácida que se filtra
De um céu de tempestade.

Aviões caíram nesta manhã,
Levando passageiros
Para o fundo de uma laguna
E o nenhum lugar da selva
Remota que irá retomar
Seu espaço sobre azulejos
Encardidos e embalagens
Não-degradáveis
Num mundo que prefere o desastre.

Tudo o prenuncia, de certa forma,
E nada está perdoado
Nem foi esquecido
Com todas as coisas que já foram
E com aquelas que ainda serão
Ou que apenas dormem na tarde
À espera dos anos sem emoção.

Os humanos repousam
No sono da sombra de toldos
Estalando na Veneza insalubre
Deste lado do Atlântico
De exímios nadadores
que não viram as crianças
Se afogando.

Sim, eu prefiro estar
Por apanhar um resfriado
Antes da peste
No limite da cerca-viva
De mato e detritos do lixo
Avançando até o antigo gradil
De gladíolos brancos.

É minha a opção de não manter
A saúde, fumar e perder esperança
Na vigilância sem objeto,
Exposto ao vento da tarde,
Ao siroco da mente
Igualmente desistindo
Das perguntas a ninguém
Muito depois de Pã
Anunciado como morto
Antes da morte dos mares.

Então, não importa molhar
Os sapatos da espuma de solfejos
Rumorejando as queixas do Adriático
Como outrora o mar dos gregos
Deixava leve gosto de salgado
Entre os artelhos limpos
De náiades banhando-se
Nos oceanos mitológicos
Que hoje são de plástico
Cor de chumbo.

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Eliseu Santos ou A metamorfose de um morto

Li a Zero Hora de sábado. A notícia principal do jornal era o assassinato do Secretário da Saúde Eliseu Santos à saída de um culto evangélico. Sim, sei que é preconceito, mas tenho para mim que homens ricos que frequentam cultos evangélicos — e Eliseu era contumaz em sua “fé” na Assembleia de Deus — são, na maioria dos casos, perfeitos idiotas ou políticos em busca de votos. Dizem que Eliseu sempre ia a estes lugares… Talvez satisfizesse minhas duas condições, o que sei eu? O fato é que já ouvira e lera a respeito de uma lista de preços de propinas do Santo Homem, algo entre 10 e 30 mil de entrada, acompanhada de mensalidades. Há até um vídeo no YouTube que o acusa.

O fato é que, no dia anterior, Eliseu, o puro, tinha sido chamado pela Polícia Federal (Operação Pathos) a fim de prestar esclarecimentos sobre o desvio de R$ 9 milhões em sua secretaria. E no dia seguinte apareceu com três tiros, tendo alvejado seu assassino com outros dois, porque santo que se preza anda armado e Eliseu, ao sair do culto, já estava imbuído de Cristo e pronto para sacar. O que surpreende a todos é a transformação de homem e político agitado e até truculento (ZH de sábado) em São Francisco de Assis (ZH de hoje). Como se não bastasse, o crime também mudou, passou de político a comum… Vejamos, um homem sai de um culto imbecil com sua mulher e filha. As duas entram no carro, o homem se atrasa. Repentinamente, sem dizer nada — a mulher e a filha disseram que não ouviram nada — o homem chega à porta de seu carro e é atingido por um criminoso que está a alguns metros. Assalto? Estranho, mas é o que está sendo comentado. Eliseu Santos estava muito tenso nos últimos dias, relataram amigos e companheiros de partido. Tudo porque previa um assalto, sem dúvida! Deus talvez o tivesse avisado.

Flagrante de Deus avisando Eliseu: “Você será assaltaaado, pegue sua aaarma”.

Quem fez esta interpretação das atitudes de ZH é o Diário Gauche. Aqui e aqui. Será que a “limpeza” do nome político do prefeito Fogaça — único nome viável para enfrentar Tarso Genro nas eleições para Governador — vale tanto assim? Céus, vão matar meio Rio Grande!

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Haydn para blefadores

A série de livros de “Manual do Blefador” (Ediouro) dá dicas a pessoas que não querem passar vergonha entre entendidos. Há vários desses livrinhos: sobre música, vinhos, literatura, arte moderna, filosofia, teatro, etc. Eles são ótimos, engraçadíssimos, como demonstra este verbete sobre Haydn:

Haydn.

O pai da sinfonia. Ao contrário do normal, ninguém soube quem foi sua mãe. Haydn decidiu que as sinfonias deviam ter princípio, meio e fim, primeiros movimentos nas sonatas, nas missas e nos trios. Beethoven, em seu estilo grosseiro, desconsiderou e estragou esse belo modelo convencional.

O sentimento geral é de que Haydn podia ser tão bom quanto Mozart se não tivesse sido tão incuravelmente feliz durante a vida. Esse espírito de contentamento insinuou-se por toda sua música e diluiu-se. As últimas sinfonias foram compostas em Londres para ganhar dinheiro vivo, e a sombra do contrato que pairava sobre ele acrescentou-lhe aquela pitadinha de desgraça que tanto lhe faltara antes. Talvez somente um homem verdadeiramente sem coração poderia ter composto algo tão assombrosamente feliz quanto o final da Sinfonia Nº 88.

Existem muitas e muitas sinfonias que praticamente não são tocadas e que você pode considerar suas favoritas, mas o excelente comentário sobre Haydn é afirmar que o melhor de suas músicas foram as missas — e não haverá necessidade de falar sobre isso.

Peter Gammond — Manual do Blefador: Música

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