Meus dez livros preferidos

Novamente me pedem para fazer uma lista de meus dez melhores livros. Já fiz várias dessas e acho até que outra(s) por aí no blog. Mas vamos lá, vou escrever a listinha de um jato, em um minuto, e vocês prometem não lê-la, certo?

  • Dom Quixote, Cervantes.
  • Moby Dick, Melville.
  • Doutor Fausto, Thomas Mann.
  • Uma Confraria de Tolos, John Kennedy Toole.
  • Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa.
  • Entre Heróis e Tumbas, Ernesto Sabato.
  • Berlim Alexanderplatz, Alfred Döblin.
  • Ulysses, James Joyce.
  • Middlemarch, George Eliot.
  • Os Irmãos Karamázov, Dostoiévski.
  • Ana Karênina, Tolstói.
  • A Vida e as Opiniões de Tristram Shandy, Laurence Sterne.
  • A História Maravilhosa de Peter Schlemihl, Adelbert Von Chamisso.

Cheguei aos 10? Tem 13? Kafka e Machado de Assis fora? E Virginia Woolf? E meu amado Jonathan Swift? Putz. Não, é sem revisão. Deixa assim. Quem quiser que retire três deles.

Dostoiévski ou Tolstói?

Ontem, um comentarista, que se identificou apenas como Pedro, me provocou com esta pergunta clássica. Começo respondendo que não acho lógica uma comparação entre seres humanos e romancistas tão diferentes entre si — seja nas posturas, seja nas vivências de cada um — , ao mesmo tempo que sei que nada é mais lógico do que comparar dois contemporâneos importantíssimos, como hoje fazemos com Saramago e Lobo Antunes, por exemplo. Outra mania que desejo evitar é o elogio de um para desvalorizar o outro. Este gênero de mau elogio fica melhor em jornais de província. Eu posso gostar de Drummond e João Cabral e, se elogiar este, não estarei menoscabando aquele. Talvez as pessoas gostem de comparar os dois russos pelo amor de ambos aos grandes painéis. Seus romances eram tudo: psicológicos, sociais, filosóficos, picarescos, metafísicos (no caso de Dostô) e tão grandes que empurraram as fronteiras dos gêneros para poderem se acomodar dentro delas.

Gosto de ambos por motivos muito diferentes. Tolstói talvez seja o maior de todos os narradores clássicos — por que não recebeu o Nobel se faleceu em 1910, hein? Seus romances são perfeitos, têm ritmo, excelente prosa, envolvem. Se o tivesse de comparar com alguém, seria com Turguênev ou com certa parte da obra de Tchékhov. A Morte de Ivan Illich não seria uma antecipação de Thomas Mann? Em minha opinião, sua grande obra é Anna Kariênina, além dos contos e novelas. Guerra e Paz é uma obra-prima, mas aquele epílogo semi-ensaístico é um saco, atrapalha todo o livro. Porém, enquanto Tolstói chegava ao ápice da forma clássica, Dostoiévki já sinalizava que aquilo estava ultrapassado.

Sim, notem a diferença fundamental de foco narrativo utilizado pelo dois canônicos russos. Tolstói era o típico narrador onisciente que, apesar de detalhista, não era capaz de abandonar sua posição aristocrática, o senso comum de sua época e o certo e errado da concepção cristã do mundo. Já Dostô, quando comparado a Tolstói, parece um alucinado. O narrador de Dostoiévski localizava-se sob a pele dos personagens, saltando de um para outro, deixando-se reger de tal forma por suas lógicas (ou loucuras) que fazia sumir o narrador-julgador. Não se sabe muito bem quem representa Dostoiévski em seus livros. Ele é cada personagem e o livro parece andar por si.

Tolstói tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados. O acabamento era fundamental para clássicos como ele e Mann. E Tolstói não tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados, pois livros como Crime e Castigo e O Idiota são sôfregos, nervosos e tão viscerais que, sob o filtro de Tolstói, se transformariam em outra coisa. Quem pensa em acabamento quando quer descobrir quem matou o velho Fiódor? E quem criticaria o acabamento absolutamente impecável da Parábola do Grande Inquisidor — apenas para me referir a dois temas de Os Irmãos Karamázov? Ora, Dostoiévski não estava preocupado com o acabamento porque as regras vigentes da beleza literária o atrapalhavam; porém, quando precisou, fez uso delas brilhantemente. Na verdade, uma das últimas preocupações que temos ao ler Dostoiévski é com o acabamento. Os personagens de Tolstói sofrem com dignidade, os de Dostô berram e se escabelam. Não obstante, o horror metafísico que cresce de O Idiota não fica nada a dever ao de Ivan Illich, até pelo contrário.

Enquanto Guerra e Paz é um panorama, Os Irmãos Karamázov aponta para o fim de uma era, como Dostô já fizera em Os Demônios. Tolstói é um burguês, Dostô pensa num apocalipse. Céus, são muito diferentes. E muito bons.