Lamento muito não ter podido escrever anteontem à noite, ainda sob o calor (sim, calor) do concerto, mas faço-o agora. Terça-feira, a OSPA apresentou a primeira sinfonia de Mahler sob a regência de Ira Levin no Salão de Atos da UFRGS. Olha, a tese de que é melhor para a orquestra não ter um regente titular torna-se cada vez mais vencedora. O concerto foi esplêndido e tudo o que aconteceu estava refletido nas caras de felicidade dos músicos logo após o titânico desempenho. A única coisa a lamentar foi o pequeno público. O gaúcho — e a tendência parece acentuar-se nas novas gerações — se borra ao menor friozinho, desistindo das poucas boas oportunidades culturais que a cidade oferece. Será que trocam Mahler pela TV? Céus…
Falar sobre Mahler falo outra hora. O momento é de saudar a orquestra que, animada, levou a sinfonia forma muito satisfatória e entusiasmada. Mahler é um problema: ele propõe grandes e súbitas alterações de humor. Passa do sublime à bandinha, da expansão ao intimismo, do desespero e da tragédia à mais pura alegria. Tudo em segundos. Não sei como Alma aguentava… Como se não bastasse, aprecia orquestrações rarefeitas, premiando muitos instrumentistas com solos que se alternam em ritmo que, se para nossos olhos já parece variado e rápido, imagina para quem tem de interpretar. Por mais paradoxal que pareça, ele dá um tratamento camarístico a suas enormes orquestras, fazendo-as tocar em pequenos grupos. Ou seja, nunca uma sinfonia sua é de execução trivial.
Por mais estranho que pareça, a puramente instrumental Sinfonia Nº 1 de Mahler é programática. Sim, o nada modesto compositor baseou seu programa no romance Titã, de Jean Paul. A história é a da tomada de consciência, por parte de uma criança, da fragilidade da condição humana e de sua morbidez atávica. Não é nada casual que o terceiro movimento — interpretado magnificamente pelo primeiro contrabaixista da orquestra (Walter Schinke?) — seja composto sobre a canção infantil francesa Frère Jacques.
Então, quando a OSPA tira tudo isso de letra, apenas reafirma o que sabemos: a orquestra tem um bom grupo de músicos merecedores de uma sede, de novos concursos, de nosso respeito, gratidão e o resto da ladainha espero que meus sete leitores já tenham decorado.
P.S. — Ah, o regente Ira Levin? Podia vir mais vezes, não? Além de ser muito competente e de ter demonstrado domínio do repertório, é uma pessoa respeitosa e solidária. Como sei? Vou contar um segredo de concertos para vocês. Notem o momento dos aplausos. Se o cara primeiro destaca os músicos e, na hora de ser saudado pelo público, desce de sua bancadinha para receber o aplauso no mesmo nível do restante da orquestra, demonstra (1) não ter complexo de deus e (2) considerar que é um do time. Ira Levin, mesmo sendo um nanico, recebeu a saudação entusiasmada dos poucos e bons que lá estiveram bem ao lado do spalla.
P.P.S. – Peço-lhes desculpas pela nota rápida escrita sobre a perna. Deve conter erros. Corrijam!
Obs.: Essa entrevista foi feita por mim para o Sul21, mas como o assunto é cultura — um dos assuntos mais frequentes neste eclético blog — , deixo-a também aqui para meu 7 fiéis leitores.
Denise Viana Pereira é a Diretora de Economia da Cultura da Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul. Trabalha, pois, com o Secretário Luiz Antônio de Assis Brasil numa das secretarias mais pobres e de maior visibilidade do governo, vendo apenas 0,07% do orçamento estadual e sendo visitada por boa parte dos artistas e produtores do Rio Grande do Sul. Denise é formada em Comunicação Social pela Ufrgs, é especialista em Teoria de Jornalismo e em Economia da Cultura. De 1999 a 2001, integrou a equipe do Instituto Estadual de Música da Secretaria de Estado da Cultura do RS. Nos anos de 2003 e 2004, foi Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre e integrou a Representação Regional Sul do Ministério da Cultura entre 2006 e dezembro de 2010.
Em sua entrevista ao Sul21, Denise Viana Pereira fala sobre a nova lei que substitui a antiga LIC e sobre os planos nada modestos da Cultura do estado.
Sul21: Nos últimos dias, foram aprovados R$ 3,6 milhões em autorizações para captação de patrocínios via LIC. Associada a esta notícia, há a nova legislação de apoio e fomento à cultura, aprovada em dezembro de 2011.
Denise Viana Pereira: Sim, a LIC – Lei de Incentivo à Cultura – foi sancionada em 1996 e começou a funcionar em 1997, indo até agosto de 2010. Após esta data, ela foi suspensa até 7 de dezembro quando foi regulamentada a nova lei de fomento e apoio à Cultura, que se chama Pró-Cultura.
Sul21: A LIC não existe mais?
DVP: Não existe mais. Ela só permanece para os projetos que ainda estão em tramitação. Os novos processos não ingressam mais via LIC, mas sob o Pró-Cultura. O Pró-Cultura tem no seu bojo dois mecanismos: um mecanismo é o Fundo de Apoio à Cultura, grande conquista que nós aprovamos em 2001 na Assembleia Legislativa e que nunca tinha sido regulamentada, e um mecanismo de compensação fiscal semelhante à antiga LIC. O Pró-Cultura, então, engloba o fomento direto – pelo Fundo – e a compensação fiscal.
Sul21: Como funciona?
DVP: Na lei antiga, a empresa poderia se compensar de 75% do total do projeto descontando o valor de seu ICMS. Na nova lei, o desconto é de 100%. Porém, regra geral, para todo o projeto, o patrocinador fica obrigado a um depósito de 10% no Fundo de Apoio à Cultura, à exceção de projetos para Patrimônio Cultural e Construção de equipamentos culturais, para os quais o depósito é de 5%. Então, há a compensação, a isenção, mas há o incentivo propriamente dito, o qual é depositado no Fundo.
Sul21: Há um teto de isenção fiscal determinado pelo estado?
DVP: Sim, e este é muito baixo. O teto de isenção fiscal é de 28 milhões. Então, 10% são 2,8 milhões. É pouco para o Fundo. No ano passado, foi enviado um projeto de lei que prevê um aumento deste valor para R$ 35 milhões. A lei permite que este teto possa chegar ao máximo de 0,5% da receita líquida do estado. Trata-se de um valor variável, que hoje deve bater nos R$ 70 milhões.
Sul21: Resumidamente, poderia descrever o processo de aprovação do Pró-Cultura com a compensação fiscal?
DVP: O processo é (1) o proponente cadastra-se no site, (2) validação por parte da SEDAC, o que hoje demora 7 dias; (3) então, o proponente tem 15 dias para trazer documentos; (4) de posse dos documentos, fazemos a análise técnica detalhada onde normalmente questionamos coisas que não ficaram claras e então (5) o projeto é enviado para o Conselho Estadual de Cultura, que tem 60 dias para analisar. Após a aprovação, esta é publicada no Diário Oficial do Estado e o autor do projeto recebe uma carta que autoriza a captação, ou seja, o patrocínio por parte das empresas. O prazo mínimo total para a aprovação de um projeto é de 90 dias, por lei. Na prática, sabemos que este tempo não ocorre antes de 4 meses. O que desejamos é chegar cada vez mais próximos dos 90 dias. Estamos em contato com o Conselho para que eles analisem a possibilidade de diminuição de seus prazos. Tudo é muito moroso e há uma comparação inevitável: a Lei Federal é muito mais ágil. Não faz sentido. Temos que nos apropriar do sistema federal.
Sul21: Como é que o novo governo encontrou a SEDAC?
DVP: O secretário Assis Brasil sempre diz que não adianta a gente ficar olhando para o passado. O que a gente quer é que nossa marca seja o diálogo. Queremos manter as portas abertas e até retiramos algumas divisórias que haviam em nossa estrutura física… Queremos receber todos, ouvir todos os que nos procuram. Todos são atendidos. Acabamos inteiramente com certo tom policialesco da SEDAC. Nós éramos vistos pelos produtores culturais, de antemão, como oponentes, quando na verdade ambos são proponentes. Claramente, havia grande distância entre os produtores e o sistema de fomento e financiamento da cultura no estado. Nós queremos o oposto.
Sul21: Quais são objetivos factíveis dos quatro anos da gestão?
DVP: O primeiro objetivo é o de fazer a Casa de Cultura Mario Quintana funcionar a pleno. Resolvendo desde a obra de fixação da fachada até recheá-la de programação. O segundo é o de construir o Teatro da OSPA. Os outros estão associados ao plano de recuperação do orçamento da cultura do estado, que nos tirará deste “quase nada” de recursos que temos hoje. Hoje, temos 0,07% do orçamento do estado. Nossa intenção é a de chegar, ao final dos quatro anos do governo Tarso, a 1,5%. Queremos 0,5% no segundo ano de gestão, 0,75% no terceiro, 1% no quarto e 1,5% para a próxima gestão.
Sul21: Há outros?
DVP: Temos também projetos ligados à utilização do Fundo de Apoio à Cultura. Pretendemos criar editais a fim de selecionar projetos de Casas de Cultura, teatros, cinemas ou bibliotecas para o interior do estado. Queremos equipamentos culturais para o interior. Nós selecionaremos os projetos; desta forma, não seriam equipamentos de propriedade do estado. Nós apoiaremos projetos que permitam aos municípios se equiparem. Imaginamos valores de até R$ 500 mil. Muitas vezes há prédios que poderiam se transformar num teatro ou numa biblioteca. Nossa intenção é participar da reutilização destes espaços para fins culturais.
Sul21: Não há quase mais cinemas no interior.
DVP: Bem, neste sentido nós trabalhamos com a ideia dos cineclubes. Nosso plano de governo inclui a criação de 100 Cines mais Cultura ao longo dos quatro anos de gestão e envolve a criação de 500 Pontos de Cultura lato sensu. Nos Pontos de Cultura, o governo aporta recursos para iniciativas que já existem, dando apoio aos chamados Pontos de Cinema (cineclubes), aos Pontos de Brincar (brinquedotecas), aos Pontos de Leitura (pequenas bibliotecas) e aos Pontos de Memória (museus comunitários ou ações de memória). Estas são ações que o MinC desenvolve. Este ano, deveremos receber R$ 10 milhões para começarmos.
Sul21: E a OSPA? Sem sede, ensaiando no cais do porto, convivendo com falta de músicos, concursos… E o novo Teatro que não sai do papel?
DVP: Hoje temos boas perspectivas. O secretário Assis Brasil é um ex-membro da orquestra e está bastante compromissado com a OSPA. Foi elaborada uma emenda parlamentar de R$ 20 milhões para a construção – o custo do teatro é de R$ 32 milhões. Em um de seus primeiros pronunciamentos, a presidente Dilma Rousseff falou em necessidades de contenção e suspendeu todas as emendas. Algumas destas foram extintas, mas a da OSPA não. O governador Tarso já enviou correspondência para a Ministra da Cultura e para a Comissão de Educação e Cultura do Congresso. Há toda uma mobilização estadual pela manutenção da emenda parlamentar de R$ 20 milhões. Isto garantiria 2/3 da obra. De outra parte, o MinC, em reunião aqui conosco, com a presença do secretário Assis Brasil, comprometeu-se em colocar mais R$ 7,5 milhões ou R$ 10 milhões – dependendo da emenda deste ano – , à razão de 2,5 milhões por ano. Se a emenda de R$ 20 milhões entrar este ano, eles não repassariam a primeira parcela de R$ 2,5 milhões, ficando o primeiro pagamento para 2012. Em resumo, repito, temos boas perspectivas.
Sul21: Houve uma discussão sobre possíveis mudanças no projeto do Teatro a fim de que ele pudesse receber óperas. Propôs-se a criação de um fosso para a orquestra…
DVP: Falando de uma forma rasa, o secretário compreende as críticas – o IAB igualmente não está de acordo com a parte externa do projeto e há esta discussão sobre óperas – , mas sua ideia é a de que o Teatro da OSPA é uma sala sinfônica e não outra coisa. E mesmo que haja discussões — penso que sempre haverá — não podemos atrasar mais 20 anos uma construção que nos faz falta há décadas. Então, temos um projeto pronto, pago, e achamos que ele não deve mais ser alterado. Estamos em outra fase e, se retrocedermos a uma anterior, quando teremos o Teatro?
Sul21: Fomento é política cultural? E a distribuição, divulgação e venda?
DVP: De modo algum fomento é política cultural. O mecanismo de financiamento e fomento não pode ser nossa única atividade; isto é apenas um instrumento. É muito insuficiente e concentra a pouca verba disponível nas capitais e nos artistas conhecidos. Para isso é que agora temos o Fundo de Apoio à Cultura, temos que fortalecê-lo para poder diversificar o tipo de projeto a ser apoiado. Por outro lado, temos que nos preocupar não apenas com os projetos, mas com a criação de hábitos de consumo de toda produção cultural. Temos que apoiar a distribuição, o consumo e a formação de plateias. É um problema igual ou maior do que o de produção, que é o que a LIC fazia exclusivamente. As leis de incentivo fomentam a produção, mas não fomentam a distribuição, elas concorrem muito pouco para a absorção daquilo que criam. Veja o caso do blog da Maria Bethânia: Jorge Furtado foi brilhante ao dizer que se tivessem pedido três vezes o mesmo valor para um filme que ninguém fosse assistir, não iam reclamar de nada, mas como é um blog e há um preconceito com o meio virtual – criado pela grande mídia – ninguém diz que Bethânia estará divulgando uma porção de poetas que ficariam de outro modo inacessíveis. Sou totalmente favorável ao blog dela. Grande parte desta discussão é sufocada pelo desconhecimento que as pessoas têm do contexto da produção e das necessidades culturais.
Sul21: Teu cargo é o de Diretora de Economia da Cultura. O que significa exatamente?
DVP: Como tu disseste, não adianta a gente apenas fomentar a produção. O olhar da economia sobre a cultura nos dá uma noção de que existe uma cadeia produtiva inteira, que vai até o público.
Sul21: Normalmente os artistas não pensam na parte comercial…
DVP: Sim, há que pensar na divulgação, nas vendas, na infraestrutura. Mas o pensamento não pode também ser apenas mercantilista, pois há dois valores envolvidos: o valor econômico do produto cultural e o valor simbólico, que vai transformar a pessoa que assistirá uma orquestra pela primeira vez, que vai fazê-la pensar em coisas sobre as quais jamais tinha antes refletido. É preciso pensar na sustentabilidade da produção.
Sul21: Sim, o espectador sai melhor, mais rico de um filme, peça ou espetáculo, mas como medir a importância desta experiência, deste conhecimento?
DVP: Nós estamos num momento maravilhoso, porque o governador é sensível à cultura. Ele é completamente consciente deste valor simbólico e da importância de termos cidadãos capazes de serem reflexivos e críticos, em contraposição a cidadãos que vêm da classe D para a C apenas para comprar uma geladeira ou uma batedeira e continuar se matando na esquina ou atropelando ciclistas. Se a gente quer mexer na sociedade, temos que necessariamente passar por sua culturalização. E temos a nossa favor a tecnologia, que dá acesso a bens culturais com maior facilidade do que no passado. Antigamente, a montagem de um cineclube era coisa para heróis, hoje tu colocas um DVD debaixo do braço e sai mostrando os filmes. Hoje já temos óperas sendo apresentadas ao vivo em cinemas. O mundo é outro, temos que utilizá-lo.
Sul21: É difícil convencer alguém disso ou a arte ainda funciona do modo como Louis Armstrong definia o jazz: “If you gotta ask, you`ll never know”?
DVP: Sim, é difícil. Mas nós não devemos nos conformar com este corolário do “eu sei a importância que tem e se tu não sabes, nunca vais saber”. Desta forma, tu não convences o outro, tu não dás acesso à cultura. Imagina um professor dizendo ao aluno: “Tu nunca vais entender, meu filho!”. O ser humano muda, avança. Essa é a nossa missão fundamental.
Sul21: Pois é, estamos chegando à educação, não?
DVP: E chegamos… Por exemplo, o trabalhador da área da cultura ganha três vezes mais do que a média da indústria. Há um dado estarrecedor: na Bahia, 54% dos empregados ou são analfabetos ou tem primeiro grau incompleto. No setor cultural, este índice de analfabetismo cai para 34%. Não há estatística análoga para o RS, mas tenho certeza de que no RS o índice de 34% deve ser de gente que tem o terceiro grau incompleto e no entanto… O Acre, a Bahia e Pernambuco estão muito à frente do RS na área cultural. Há muito tempo eles trabalham com conceitos modernos e estão inseridos naquilo que o MinC criou em 2007: o Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura, que trabalha com todos esses conceitos de cadeia produtiva que expus.
Sul21:Para terminar, para que serve a SEDAC e a que veio?
DVP: A pergunta deve ser respondida fugindo das respostas que passam perto de expressões como “alimento da alma”, etc. A cultura deve ter as três dimensões que o MinC defende: o valor simbólico, o valor econômico e o valor de cidadania, de promotor de direitos. Esse é o nosso norte.
Após anos de bebedeiras e overdoses que quase o levaram à morte, o cantor Ozzy Osbourne experimentou uma perigosa recaída em sua passagem por Porto Alegre. Desta vez, nada de cabeças de morcego ou pombas, nada de encontros com Ivan Lins. Desta vez o caso foi grave.
A audiência da ação que Mônica Leal move contra este blogueiro foi rotineira, penso. Houve um pouco de emoção antes do início, quando descobrimos que minha filha não trouxera sua identidade, o que não permitiria que ela depusesse. Ela saiu correndo para buscá-la — moramos próximo ao Fórum — e, quando entrou no elevador, deu de cara com Mônica. Outro elevador, a mesma Mônica. Cenas análogas, para quem lembra do post.
Sem reconhecê-la, a autora da ação perguntou a ela se ali era o segundo andar. Depois a Bárbara me contou que lhe respondeu da forma mais detestável com seu Esgar Nº 1, um no qual uma careta indescritível é acompanhada de um som semelhante àquele que os Estegossauros costumam emitir quando de seu segundo AVC. Parece que a atuação foi acompanhada de um braço que apontava para o enorme número 2 que estava pintado na parede. O Esgar Nº 1 é uma das coisas que mais me irritam na vida, pois, além do som, a Bárbara consegue estampar em sua cara o quanto somos idiotas, em sua opinião. (Uma adolescente. <— Esta expressão a irrita profundamente. É meu contra-ataque. Fecha parênteses).
Ela voltou a tempo, claro. Ela queria falar. A coisa começou com a identificação dos contendores e a entrevista de Mônica Leal. Fiquei fora da sala, caminhando de um lado para outro com minha filha, que fazia planos do que iria dizer enquanto eu me preocupava com o longuíssimo, épico, alentado e volumoso depoimento da nossa ex-Secretária de Cultura. Quando, após décadas, fui convidado retornar à sala, não fui ouvido — não imaginava que não seria necessário ouvir minha voz ainda hoje gripada. Foi então chamada uma das pessoas que estavam no elevador, a Dra. Rosanna Nejedlo, que foi perfeitamente veraz e depois minha mulher, que foi idem até demais.
Então a juíza fez uma cara de torturada para meu advogado e perguntou se ele achava necessário a oitiva de minha filha de 16 anos. Ele me passou a pergunta e eu, interpretando o rosto da juíza como um “não é necessário, já entendi tudo”, respondi que não achava necessário. É claro que, na saída, quase apanhei da Bárbara, principalmente depois de confessar que o culpado por sua dispensa era euzinho.
— Pô, eu vim, busquei correndo a carteira e nem pude dizer as coisas que queria dizer? Eu ia te ajudar.
— Babi, tive a impressão de que a juíza não estava muito a fim.
— MAS EU ESTAVA!
OK, OK, tranquilo… Meu excelente advogado, o Dr. Marcelo Bidone, despediu-se de nós e ainda me ligou no outro dia para fazer alguns comentários sobre as possibilidades. Estou revendo minhas opiniões a respeito destes profissionais.
O gozado é que meu estômago, sempre tão impecável e pronto para qualquer mesa e copo, estragou de vez. Mas talvez seja essa maldita gripe. Agradeço a todas as mensagens de apoio aqui e no twitter. Aqui a coisa foi mais séria; em 140 caracteres, recebi as mais engraçadas mensagens. Houve uma que me fez cair os “butiá do bolso”, né?
~o~
Também pelo twitter, a Elenara (@ElenaraLelex) distribuiu uma foto absolutamente revoltante. Um absurdo flagrante da polícia carioca. O que é o jato?
Hoje, no Fórum da Tristeza, haverá a audiência de instrução do processo que me move a ex-Secretária da Cultura do RS Mônica Leal. Não houve acordo na audiência de conciliação em razão de que, além da retirada do post, ela deseja uma indenização. Pensei em digitar a inicial aqui, porém desisti – era óbvio que seu potencial cômico atrairia todo o tipo de chacotas. Afinal, ela está me processando porque escrevi uma colorida narrativa de um episódio real: o atropelamento do pé de minha filha por um carrinho de bebê dirigido pela ex-secretária num elevador. Mais: nem vi a coisa ocorrer, apenas vi minha filha saltar para trás com cara de indignada. Soube do pé logo que saímos do elevador. Fiquei puto e por isso escrevi a respeito. Quem acompanha o blog deve lembrar de como Mônica entrou no recinto…
Todos me cumprimentam por ter conseguido irritar Mônica Leal, mas não pensam na incomodação. Vou ter que sair de casa no dia de visita de meu filho, tive que constituir advogado, enchi o saco de amigos, perdi tempo explicando coisas fúteis, me preocupo com o que pensará o juiz disso tudo e sei que estou numa posição falsa.
Pois o verdadeiro motivo da ação não é o carrinho de bebê e sim são os diversos posts em que combati a gestão da secretária. O verdadeiro motivo da ação é o de eu ter dado espaço em meu blog para sua – penso – maior inimiga: a ex-presidente do Conselho Estadual de Cultura Mariângela Grando, a qual também foi processada por Mônica (fui informado pela Mariângela no Facebook que Mônica Leal viu frustradas suas intenções de vingança em primeira instância). Deste modo, a ação é intimidatória e alcança seus objetivos. Estou louco para não ir ao Fórum, para esquecer da ex-secretária e até, fato ridículo, pedi para que meu amigo Alex Haubrich não escrevesse sobre o assunto, ele que apenas queria prestar solidariedade. (Alex, pode escrever o que quiser, bobagem minha).
Então, hoje, às 19h, falaremos de elevadores e bebês, mas o real motivo não será objeto da ação. Por isso, sou dos poucos que veem toda a comicidade latente dos fatos. E tenho-os evitado por medo. Por medo do juiz, claro. Mas, se vier a perder a ação e tiver que pagar a indenização, já convoco meus amigos para o Bailão da Mônica, com a finalidade de arrecadar fundos.
Ontem, uma amiga publicou um pequeno vídeo em seu Facebook. Sua intenção era outra, ela nem sabe deste caso. Mas vejam se não é pertinente. O medo do estado todo poderoso (dos juízes que mal leem ou ouvem nossos argumentos) não nos torna estéreis? A voz é do grande filósofo e sociólogo esloveno Slavoj Zizek:
Taí o seu presente, Milton. Espero que você goste. Um abração!
Quando recebi esta mensagem pelo Facebook, pensei que fosse mais uma composição que o Gilberto Agostinho desejava me mostrar. Gosto muito de ouvi-las e, bem, de dar meus pitacos. O Gilberto é um compositor brasileiro que estuda em Praga e suas obras são efetivamente muito boas, tanto que ele acaba de classifcar-se em primeiro lugar na principal Academia de Música de Praga. Ouvi a tal música e gostei muito. (Vocês podem baixá-la aqui, vale a pena). Chamava-se Suite for Cello and Harpsichord, in Old Style. E escrevi-lhe de volta:
Rapaz, consegui ouvir apenas ontem. Gostei muito. Achei ADMIRÁVEL e deixo a palavra em caixa alta para demonstrar que este é um elogio repleto, onde a palavra deve receber significado pleno. É claro que notei a Courant e sua citação. Me diverti com o final perfeitamente bachiano da abertura, e — mesmo com a séria sarabanda — o efeito geral sobre mim foi de felicidade. Ouvi tudo com um sorriso. Achei o final da Giga um tanto inesperado, talvez brusco, mas eu jamais o alteraria, pois aquilo parece uma frase tua dizendo “gente, é bem feito, bem escrito, mas é uma paródia, claro”.
Cara, nós já temos material para outra postagem naquele blog, não? Esse teu sw de agora é melhor do que aquele outro. Até o pizzicato funciona bem. O cravo tem som de cravo, etc. Poderíamos montar uma postagem assim que eu voltar de uma viagem que farei de quinta a terça? Volto em 22/02. Tu poderias ir escrevendo os textos de apresentação, certo?
Inclua o que quiser, mas não retire essa Suíte, pelamor.
Grande abraço!
P.S.– Acredito que estejas passando por um período feliz em Praga. A Suíte, além de excelente, é feliz.
Tudo normal até aqui. Mas então ele escreveu de volta:
Oi Milton,
Muitíssimo obrigado pelos elogios! Já fazia tempo que eu estava querendo dedicar uma obra minha pra você, e eu achei que esta cairia muito bem, já que você é outro fanático pelo período barroco. Você pegou bem o espírito desta peça, e eu fico feliz que o final tenha sido bem entendido. Eu me considero um contrapontista acima de tudo, então eu escrevi esta obra como uma espécie de desafio para mim mesmo. Será que eu ainda conseguiria escrever algo tonal, respeitando todas as regras do período barroco? Pois bem, eis o resultado.
Umas das questões que me ocorreram enquanto eu escrevia esta obra foi sobre liberdade de escrita. Eu tentei escrever algo que fosse “histórico”, mas ao mesmo tempo eu tentei ao máximo me expressar neste idioma. Só que acontece que nós já não temos o direito de “quebrar regras”, como Bach fazia. Quando você ouve uma obra como a minha fuga favorita, aquela em si menor do primeiro livro do cravo, você tem um tema quase dodecafônico, e isto deve ter sido um choque na sua época (ainda hoje muita gente não gosta desta fuga, fazer o quê?). Só que seria incoerente se eu me propusesse escrever algo barroco, e então saísse quebrando as regras. Quebrando para aonde? Para atonalidade? Felizmente perdemos este direito, pois com isto ganhamos outros, mas é uma questão interessante que me apareceu. Então eu ousei mais na forma das composições, não no conteúdo tonal.
E sim, eu tenho muitas composições para postar no blog sim! Eu vou separar algumas delas, e vou escrever o texto e depois te mando. Quando você voltar de viagem, você me diz o que achou. E a maioria das composições que eu gostaria de incluir serão aquelas outras que eu te mandei, mas não sei se você já teve tempo para dar uma ouvida. Depois me diga o que você achou, eu estou bem curioso com suas opiniões (mas sem pressão para ouvir logo). E esta suite será inclusa sim, pódexá!
Sobre Praga, eu estou muitíssimo feliz com a minha vida musical. Eu estou me sentindo bem seguro e produzindo muito, o que é ótimo.
(…)
Um grande abraço, meu caro!
Gilberto Agostinho
Ou seja… Ou seja.. A obra é dedicada a mim, como aliás estava escrito na partitura e eu, boca-aberta, não tinha visto.
Eu realmente não sei como agradecer. Estou explodindo de tão orgulhoso e feliz. Muito obrigado, Gilberto.
~o~
Hoje viajamos em visita ao Dr. Cláudio Costa! Passaremos 4 dias em sua companhia e de sua mulher Amélia. Já estiveram aqui em casa e foi indiscutivelmente maravilhoso, ao menos para nós. Ele ligou várias vezes convidando e já viram, vou ter que fazer meu tratamento psiquiátrico nas cidades históricas de Minas em meio àquela baita gastronomia. (suspiro) Volto terça-feira durante o dia. Mais um motivo para comemorar. Mas nem tudo pode ser perfeito, senão não seria a vida.
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Mônica Leal me processou. Já retirei o post causador da pendenga, se o deixasse teria de pagar um salário mínimo por dia… Não entendo, mas, enfim, é a nossa justiça. Ela insiste numa indenização. Se soubesse de minhas posses e de minha conta bancária, não perderia tempo. Acho que se esqueceu de averiguar. Ela deveria ser incentivada a fazer uma devassa em minha vida. E a vida segue.
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E segue com Celso Roth, que recebeu um timaço e insiste em jogar retrancado dentro de seu esquema chama-derrota. O Mazembe não serviu de lição; acho que a diretoria espera algo mais grave como um enorme fiasco da Libertadores 2011 e um grupo de jogadores descontentes. Deram um carro de Fórmula 1 para um motorista de taxi.
Carol Bensimon e seu Pó de Parede venceram a 1ª edição do Campeonato Gaúcho de Literatura na final contra Veja se você responde essa pergunta, de Alexandre Rodrigues. Li ambos os livros, assim como alguns outros que foram eliminados pelo caminho. A presença dos dois na partida decisiva e a vitória de Carol foram merecidas. Apenas livros de contos participaram nesta edição. A próxima edição focará romances.
Foi uma boa decisão a de ter ido ao StudioClio anteontem (28/12) às 18h a fim de assistir o jogo final através da palavra ao vivo e a cores dos três árbitros. O juiz e seus bandeirinhas — não pensem que vou distribuir os cargos entre eles — fizeram um excelente trabalho. Carlos André Moreira, Luiz Gonzaga Lopes e Marcelo Frizon foram bastante competentes nas fundamentações de seus julgamentos, assim como o foram o quarto e quinto árbitros — Lu Thomé e Rodrigo Rosp (o qual parece não ter um link para chamar de seu) — na organização do imenso torneio de seis meses e 51 jogos.
No âmbito de Porto Alegre, o StudioClio firma-se como o local perfeito para o indispensável diálogo culto e a presença da cerveja Coruja serve para como oportuno e delicioso catalisador de debates. Só não entendi o motivo que levava o curador do local, Chico Marshall (acima), a desejar que eu me embriagasse, servindo-me irrecusáveis Corujas uma atrás da outra, como punhaladas de louco.
Mas tergiverso. Se a proposta do projeto era a de provocar o debate sobre a produção local, esta foi alcançada com sobras e só a tímida divulgação impediu um sucesso maior do Campeonato. Digo isto porque acabo de escrever no Google “Campeonato Gaúcho de Literatura” e a primeira referência encontrada é a deste prestigioso blog de sete leitores, sendo que a segunda é a do árbitro Carlos André Moreira. Se escrever “Gauchão de Literatura”, o primeiro a ser encontrado é o blog de Antônio Xerxenesky e o segundo é novamente a do blog bi-vice de Carlos André. Estranho.
Não discordei do julgamento, mas estava com muita vontade de levantar o braço e interromper os votos para fazer perguntas e encher o saco. Sim, pois eles disseram que o livro de Alexandre Rodrigues seria mais experimental e o de Carol mais, assim, convencional, com construção rigorosa de personagens e outros que tais que caracterizariam uma literatura mais “enquadrada”. Se não disseram isto com todas as letras, deram a impressão de terem dito, o que não é a mesma coisa, mas provoca o mesmo efeito. Ora, ora, acho que o livro do Alexandre é mais ousado na formatação dos 14 contos, alguns curtíssimos, outros verdadeiros enigmas, outros efetivamente belos; porém Carol é absolutamente original e desenquandrada na realização de um original e poético trabalho de linguagem que nunca poderá ser chamado de clássico.
Mesmo a construção dos personagens no(s) livro(s) de Carol são feitos na forma mais de mosaicos faulknerianos do que na de um tijolo balzaquiano. O problema é que a Carol é densa e o Alexandre é rarefeito. Quem gosta mais de densidade, de um trabalho voltado para contar a história de forma mais e mais completa, vai com Carol; quem se seduz com formas originais, com histórias cheias de detalhes literários surpreendentes, vai com Alexandre. Ou será que é antiquado ser denso? Nada disso significa que um seja muito melhor do que o outro, significa apenas que, se estamos comparando um com o outro, devemos dar-lhes as devidas qualidades.
Eu evitei escrever sobre o livro do Alexandre porque ainda tenho aquele pingo de bom senso que me dizia estar acima ou abaixo do que eu tinha lido, nunca em sintonia. Ou seja, estava mais ou menos como o juiz Luiz Gonzaga Lopes, que disse num momento que não gostava dos contos de uma página — e os há no livro do Alexandre. São minoria, mas há. Um conto de uma página que não é uma piada ou altamente poético me deixa brocha por dez páginas. Não sei é também o caso do Gonzaga, falo por mim. Fato análogo ocorreu quando li V.S. Naipaul. Eu sabia que era bom, mas que eu não era o leitor ideal. Se me colocarem na parede, direi que que não gosto do trinitário tão mais inteligente e capaz do que eu, mas como aqui posso abrir mão de fazer críticas àquilo que está afastado de meu gosto pessoal ou que não compreendo, abro, ora.
Porém, o principal a ser destacado é que esta é uma geração que, apesar de demonstrar tremenda educação e imensos cuidados para não ferir suscetibilidades, começa lentamente a desprezar o compadrio e os elogios vazios para substituí-los por algum debate. As sete pessoas que leem meu blog sabem o quanto sou bakhtiniano e amigo de Platão: a natureza e o habitat das ideias, onde elas vivem e se transformam é durante o diálogo, e elas ficam ainda mais vivas e melhores ainda com Corujas e um curador louco para nos embebedar.
Pois a gente só sabe agora o quanto nos fazia falta um StudioClio.
Meu último post teve repercussão inteiramente diversa dos anteriores. A repercussão positiva veio na forma de entusiasmados e-mails e telefonemas de apoio. Estes, na maioria de pessoas pertencentes ao Departamento de Música da UFRGS e à propria Rádio, não queriam ser identificados. Uma pena. A repercussão negativa veio dentro dos comentários do blogue, misturada a outros apoios. Fiquei discutindo com um grupo de alunos inteligentes e articulados – mas dos quais discordo! -, que desejavam, além de defender a profe (ou sora, segundo meus filhos), manter o que pensam ser um laboratório. Um laboratório público, bem entendido.
Estes talvez não precisem se preocupar, pois representam hoje o poder; mas suas idéias me deixaram pasmo. Algumas delas: a RU foi um equívoco por 45 anos e agora seus rumos estão sendo finalmente corrigidos… A gloriosa RU tem de ser dos alunos… Os ouvintes de música erudita melhor fariam se fossem para a Internet a fim de montar suas próprias rádios… Puxa, o correto não seria o inverso? Se a PUC tem uma rádio-laboratório, por que a UFRGS não pode manter uma? Com a Internet, isto é fácil de viabilizar. Há também, na idéia dos alunos, a crença de que somos elitistas, ricos, etc. Realmente, não nos conhecem. Somos pessoas de todas as classes sociais e muitos tornaram-se músicos ou apaixonados ouvintes por vivenciarem a antiga RU. Assim como não me conhecem as pessoas que querem que eu brigue sozinho pelo retorno da RU às origens, pois não podem aparecer, têm medo de retalhações, etc. Democrático, não? A continuidade lógica destas idéias obtusas leva-me a pensar também na extinção da OSPA (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre). Por que não? Afinal, o que o Estado tem a ver com a arte?
Sugiro que o missão-devaneio que há no site da rádio mude imediatamente, seguindo a sugestão de uma amiga. De “Especializada em Música Erudita” para “Especializada na formação de novos comunicadores”. Maus comunicadores, pois serão especialistas em criar o que melhor lhe aprouverem , não a se adaptar a um meio de comunicação pronto, que é o que encontrarão na vida real. Vida real… Acho melhor voltar logo à literatura, à música e a meus comentários sobre qualquer assunto. Toda a vez que falamos na UFRGS vem junto uma política muito chata e complicada… Para terminar: se a Prof. Sandra de Deus quiser falar comigo, não há problema, basta vir a meu blogue e escrever qualquer coisa. Logo após, entrarei em contato. Se ela quiser, até peço desculpas pelas brincadeiras com seu nome.
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Eu inventei os blogues. Um dia visitei o site de Sergio Faraco e pensei em como seria interessante àqueles que o lessem se ali houvesse uma espécie de diário do escritor. Trata-se do maior contista brasileiro. Imaginei como seria bom se tivéssemos notícias sobre novas obras, sobre o último jogo de sinuca, sobre mecânica de automóveis e sobre tudo o que lhe passasse pela cabeça, desde considerações eruditas até abobrinhas. Fiquei pensando numa entrevista que ele concedera. Gosto de carros, de todos os esportes e de muitas outras coisas que nada têm a ver com prática literária. O prazer não me dá remorso. Onde não há prazer não há proveito, escreveu Shakespeare. Não sou como esses escritores que só sabem falar de literatura e cujas obras nunca se equivalem ao que sabem ou pensam saber. Falo de qualquer coisa, estou atento ao acontece ao meu redor. Não vivo num buraco, alimentando-me de sopa de letrinhas.
Nesta vontade de saber mais sobre Faraco, pensei que deveria existir alguma coisa pronta na Internet, um software que funcionasse como um diário, só que utilizada por gente interessante. Isto é, inventei internamente a idéia de blogue – nada brilhante para quem está sempre divagando -, depois fui para o Google e o descobri em 5 minutos. Entrei em alguns e fiquei decepcionado, era tudo muito fútil. Então, fiz a seguinte pesquisa: “Blog+Beethoven+111+Mann”. Imaginei que esta curiosa quase-livre-associação deveria fazer com que eu encontrasse um blogue de alto nível que estivesse a comentar o famoso oitavo capítulo de Doutor Fausto de Thomas Mann. E encontrei. Era o blogue do Zadig. E era brilhante. Tudo aconteceu em menos de 1 hora. Hoje, tenho outros amigos e amigas de mesmo tamanho na bloguesfera, mas Zadig foi o primeiro e o primeiro… (completem vocês)
Fiz-lhe um enorme comentário e recebi de volta um e-mail ainda maior me explicando detalhadamente o que era um blog. Ontem, recebi um belo e-mail do Zadig (que também atende por Adalberto Queiróz ou BetoQ) me propondo um texto a quatro mãos. Milton, numa dessas últimas Bravo! tem um artigo sobre o qual desejaria trabalhar a quatro mãos (se pensamos em escrever pelo teclado) ou a duas (se pensarmos na velha e boa lapiseira): seria como voltarmos ao problema bem situado por você quando falou sobre a…
Como dizer não? Gostei muito da proposta e do assunto, que vou deixar em segredo. No e-mail, havia também notícias de uma cirurgia de apêndice da Sherazade. O Zadig (com quem divido teto, prazeres, sonhos e dívidas, nessa ordem exata) me mostrou um texto do seu blog… Ela está em fase recuperação de uma apendicite e logo vai viajar para o casamento da filha Maíra, que mora fora do Brasil. Somaram-se duas ansiedades: uma boa – Maíra vai casar e está muito feliz; outra preocupante – Helenir adoeceu. Graças a Deus, tudo vai bem na sua recuperação, mas o susto ficou.
Eles são goianos e moram em Goiânia, mas estudaram na UFRGS (olha ela aí de novo, gente!). Maíra nasceu aqui em Porto Alegre e o casal tem outra filha, presumivelmente goiana. Temos muita coisa em comum. Muito legal conhecer você: minha mulher Helenir (que também é doida por Balzac) comentou quando viu partes do seu blog (ela não tem muita paciência com a web): “Mas este cara é seu irmão – leu tudo que você lê, gosta de muita coisa que você gosta. Infelizmente, não do Grêmio.”
É verdade. Sou colorado. Muito. E ele fuma charutos, enquanto eu detesto qualquer fumo; e ele é neo-católico, eu sou indiferente; e ele fala e escreve em francês, eu só fiquei francófilo antes da guerra e volto a ficar sempre que vejo a Juliette Binoche sorrir; e ele não gosta de cinema, eu o amo; e ele às vezes bebe além da conta, eu, só um cálice. Mas somos parecidos e amigos.
Conversamos várias vezes por semana. Já trocamos mimos pelo correio. Eles também o fizeram com o Guiu Lamenha, mas não sou ciumento, gosto de apresentar meus amigos uns aos outros. …não paro de ouvir a Missa de Bach que você me enviou. Como é possível não deixar o pensamento voltar-se a Deus ouvindo aquilo, Milton? É, Zadig, será duro me convencer, mas acho que se houver uma justiça divina melhor que a brasileira, estou salvo. Nos encontraremos no julgamento e vamos ser absolvidos, não se preocupe! Afinal, só faço mal à Sandra de Deus… Porém, como garantia, espero conhecer o cerrado e vocês pessoalmente antes.
Quando publiquei este post pela primeira vez, em 2 de dezembro de 2003, em outro blog que eu possuía, houve uma confusão inédita. Alguém o repassou para os e-mails internos da UFRGS e o que se viu foi uma enorme briga. Infelizmente, perdi os comentários. A Rádio mudou muito desde então. Para melhor. Imodestamente, digo que mudou exatamente na direção apontada por mim. Devo ter influenciado um pouquinho. Deste modo, não houve a “Morte”.
A Rádio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul existe há 46 anos. Ouço esta rádio diariamente há mais de trinta, sou íntimo. Se não costumamos expor os podres das pessoas que nos são íntimas, isto não é válido para uma estação de rádio, ainda mais quando ela nos trai. Sinto-me à vontade para falar bem ou mal dela. Não fui ouvinte por ódio e sim por admiração acompanhada de amor à música. São de meu conhecimento as dificuldades pelas quais a rádio passou e o heroísmo de seus antigos funcionários para mantê-la viva dentro do estilo a que se propunha. Ambos, eu e ela, nascemos em 1957 e sempre fantasiei que alguma coisa ligava minha vida ao esforço de sobrevivência da RU. Em seu site, ela se auto-define da seguinte forma: Somos uma emissora especializada em música erudita, oferecendo “aos” nossos ouvintes, cultura e entretenimento. Isto já foi verdade, porém desde que a jornalista e professora Sandra de Deus – que não conheço – assumiu o comando da emissora, ela virou coisa do diabo.
Meus 7 leitores podem não acreditar, mas sofro com a agonia dos propósitos definidos na missão-devaneio transcrita acima.
Meus amigos, minha querida rádio, que já foi escolhida a melhor do Rio Grande do Sul por nossos escritores e artistas, que foi tão citada nas obras de Erico, Dyonélio e outros, que era ouvida por Vasco e Iberê enquanto criavam, esta rádio está hoje invadida pelo pior jornalismo. Quando ela faz programas sobre negócios, sentimos saudades do superficialismo mais consistente da Globo; quando ela toca música brasileira, sentimos vontade de ouvir a FM Cultura, que faz isto com muito mais talento e repertório; quando ela apresenta programas étnicos, ficamos nos perguntando se há algum profissional por perto para ajudar o pobre amador responsável pelo espaço; e quando as matérias são produzidas pelos alunos, temos de aceitar, afinal a Rádio pertence a uma Universidade, o que fazer?
Esta grande emissora possui uma das maiores discotecas e cedetecas do país. Durante alguns períodos difíceis a rádio solicitava doações de obras em CDs. Vários conhecidos, including me, fizeram doações de discos, famílias deram e dão para a rádio o acervo de seus melômanos mortos e o diabo trai a todos, certamente irritado pelo fato dos mesmos estarem no céu, gozando das duvidosas delícias castas oferecidas nestes casos. E a Magnífica Reitora Wrana Panizzi, que certamente não se interessa um nadinha por música, fica cantando “tô nem aí”, enquanto penso sobre onde estão Flávio Oliveira, Rubem Prates e outros conhecedores de música neste momento. Alguém deveria dizer à diabólica Sandra que, se há um noticiário de uma em uma hora, só é possível executar as sinfonias Nº 1 e 4 de Mahler ou as Nº 4, 7 e 9 de Bruckner e nunca as outras obras destes autores, pois somente as citadas têm menos de uma hora de duração… Mas tentarei refrear a indignação e ir por partes:
1. Os horários:
Repetindo, como tocar uma sinfonia de Bruckner, Mahler, a West Side Story inteira ou uma ópera se de hora em hora há um programa de notícias? A programação da RU fica limitada e empobrecida devido a estas interrupções.
2. Quanto à qualidade das gravações:
As pessoas de mais de 35 anos que têm discotecas há decênios se deparam com um problema: a gravação em vinil ou a gravação em CD? Eu, que possuo mais de 1200 discos em vinil e uns 800 CDs, sei bem o que é isto. Às vezes, a qualidade musical de um CD é inferior ao de uma gravação em vinil. Então, se a RU ainda tem agulhas novas nada, mas nada mesmo, justifica a transmissão das Variações Goldberg de J. S. Bach por Christiane Jaccottet (ainda mais em um sábado de manhã!). Ela é simplesmente medonha. O fato de estarem presentes no acervo da rádio CDs da antiga Movieplay não obriga a emissão de todos eles. Ora, quem possui as Goldberg em gravações de Landowska, Leonhardt, Gould, Richter, Staier e Hantaï estará totalmente certo se esquecer os 12 volumes das obras para teclado de Bach pela Jaccottet. A boa qualidade do som do CD apenas deixa mais expostos os erros dela. Eu mesmo tenho estes CDs e já os esqueci. (Alguém aí na bloguesfera os quer?) Claro que isto não vale para todos os Movieplay, só para alguns.
3. O repertório:
Parece que a rádio está mais e mais acadêmica em seu repertório. Há uma variação muito pequena de autores/estilos/escolas. Ficamos todos os dias repassando os mesmos nomes. Um dia, por exemplo, foram colocadas consecutivamente três gravações da Sinfônica de Washington sob a regência de Rostropovitch. Eram autores diferentes e as gravações são boas, mas para que isto? Ninguém estava comemorando a détente, nem o aniversário de Shostakovitch ou alguma data russa ou soviética, estava? Outro fato que me intriga é que os autores – exceto Gorecki – que estão crescendo na consideração de qualquer publicação de música erudita não são mais repercutidos na RU. Cito os nomes de Spohr, Heinichen, Berwald, Ockeghem, Schnittke e em outros tantos que principalmente a Naxos está trazendo à tona. A atual RU parece ser programada por curiosos.
4. Os programas:
Há um programa sobre cinema que é um toca-cedês de trilhas de filmes. Há um que até não é péssimo mas é um mistério. Ele tem o horário nobre das oito da noite e se extendia primeiramente por meia hora. Hoje tem, no mínimo, uma hora e, às vezes, o apresentador de mente caquética se entusiasma e vai adiante. Nunca sabemos quando estaremos livres dele. O programa é dedicado aos tangos. Parece que a Buenos Aires dos anos 40 ou 50 baixa em Porto Alegre; porém, infelizmente, Borges fica em sua biblioteca enquanto Cortázar viaja e Sábato fica ouvindo seu amado Heifetz em casa. Tudo o que Roque Araújo Vianna apresenta é “maravilhoso” e “genial”, o programa já fez cinco anos e ele nunca encontrou nada “mais ou menos” em sua alentada discoteca. O nome da coisa é “Tangos en la Noche”, mas deveria ser “Tangos Todas las Noches”. Um saco! E há um programa feito por ecologistas que diz 3 frases e passa para alguma música bem alegre e acústica. Somos, pois, informados subliminarmente que aquilo seria música ecológica.
5. Intercâmbio com outras rádios e programas sobre música:
Desapareceram os programas da Deutsche Welle, BBC, etc. Estive em São Paulo e ouvi programas muito interessantes na Cultura. Vinham do Canadá, Suécia, Espanha, Suíça, DW e BBC. Eram todos em português. Desconheço a opinião da RU sobre eles, mas eu os achei ótimos. Serão eles caros? Eu, na minha ignorância, sempre pensei que viessem de graça, através de um serviço de intercâmbio cultural, sei lá. E por que não são criados programas dedicados a um ciclo de composições e a seus principais intérpretes. Exemplos: Sinfonias e Quartetos de Beethoven, Cantatas de Bach, Concertos para piano de Mozart, etc. Discoteca para isto a RU tem de sobra. E bastaria chamar um especialista do Departamento de Música para resolver o problema.
7. As vinhetas e chamadas:
Provando a estranheza da atual equipe com a música erudita, só se ouvem vinhetas e propagandas de programas com músicas populares, normalmente as eletrônicas dos anos 70 e 80.
8. Apenas um elogio:
O programa “A Hora do Jazz” é perfeito. Quem o apresenta sabe do que está falando. Não sei seu nome completo, é Günther mais um sobrenome alemão, é claro. Tal apresentador recebe uma hora semanal da divina Sandra. Por que não reduzir os tangos a este tempo?
No melhor estilo Thelma e Louise, a desgovernadora Yeda Crusius inovou na inauguração da RST-471. Pegou um Mercedes-Benz conversível e fez-se filmada em ação, como se fosse uma estrela cinematográfica. Eric Clapton e B. B. King são os inocentes responsáveis pela trilha. Será que os donos dos direitos sobre as músicas foram consultados? Duvido muito. Infelizmente, o carro era bom e fez todas as curvas normalmente, contornando cada precipício. Yeda Crusius está viva e depois do passeio tuitou alegremente para o Rio Grande:
Há muito eu pedia para substituir as cerimônias formais de inauguração por uma celebração. Merecemos. Que estrada, que dia!
A estrada é importante, claro. Mas… A desgovernadora, que responde processo movido pelo Ministério Público Federal por formação de quadrilha, celebrou bem celebrado. E, no filme abaixo, aparece como uma celerada fugitiva, alegre e aventureira.
Este post é dedicado a cada um dos gaúchos que tomaram a tresloucada atitude de votar em Yeda no ano de 2006. Parabéns! Agora vejam abaixo o retrato da austeridade que, dizem, foi a tônica dos últimos 4 anos. Som na caixa! Ah, o vídeo foi capturado no site do Governo do Estado.
O alegre senhor de longas melenas brancas é o marido da escritora de autoajuda Lya Luft, não? O título da canção é Riding with the (crazy) King (Queen), informa @icarohistoria.
A partir deste domingo (13), ônibus com mensagens ateias circularão em Porto Alegre e Salvador. A iniciativa é da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (ATEA) e apresenta quatro mensagens que expõem um pouco o que pensam os ateus. Segundo a entidade, este é mais um passo dado na direção do reconhecimento dos não crentes como cidadãos plenos e dignos. Serão 10 ônibus em Porto Alegre, financiados por um único doador paulista que prefere permanecer anônimo, e 5 ônibus em Salvador, financiados com recursos da entidade e outros doadores.
O mote da campanha é “Diga não ao preconceito contra ateus”, que aparece em quatro formatos diferentes. Um deles afirma “A fé não dá respostas. Ela só impede perguntas” e outra diz “Religião não define caráter” mostrando uma foto de Hitler, citado como crente, e Charles Chaplin, um ateu. As propagandas permanecerão nos ônibus por um mês. Porém Daniel Sottomaior, presidente da ATEA, revela que “O prazo pode se estender, se tivermos doações. Somos cerca de 2% dos brasileiros ou 4 milhões de ateus. Muitos têm medo de se expor devido ao preconceito de amigos, chefes e familiares. Isso tem que acabar”.
A campanha traz ainda a foto de um avião atingindo o World Trade Center com os dizeres “Se Deus existe, tudo é permitido”, uma citação alterada da famosa frase de Dostoiévski em Os Irmãos Karamázovi, “Se Deus não existe e a alma é mortal, tudo é permitido”, dita paradoxalmente pelo ateu Ivan Karamázov no romance. Outra peça afirma “Somos todos ateus com os deuses dos outros”, mostrando imagens de um deusa hindu, um deus egípcio e um deus palestino — Jesus.
Segundo a entidade, o objetivo da campanha não é fazer desconversões em massa, mas conseguir um espaço na sociedade e diminuir o preconceito que existe contra ateus.
Gostava mais quando as discussões eram aqui, mas o Facebook não quer saber e leva as coisas para lá mesmo. Sobre o post abaixo:
Francisco Marshall, historiador, coordenador do Studio Clio: A OSPA vive uma enorme crise. A comunidade, distanciada da orquestra, espera que sobreviva, pois tem 60 anos, o Érico disse aquilo, é um órgão público, etc, etc. A verdade, porém, é que está no fundo do poço, sem regente titular, desmotivad…a, com salários baixos, sem casa, com um projeto de teatro novo que poucos conhecem e quem conhece não gosta (cafona, horrível), sem associação de amigos, sem escola… que que falta? Tocar pagode? Daqui a pouco diremos no além-Mampituba: “Eu venho de uma cidade que teve uma orquestra sinfônica, e fechou.”
Elena Romanov, violinista da OSPA: Discordo completamente. A Nona de ontem foi emocionante!
Fiquei muito orgulhosa de fazer parte desta Nona… espero que a maioria dos colegas sente o mesmo orgulho. E Karabtchevsky continua sendo Karabtchevsky, mesmo gripado e criticado.
Francisco Marshall: Bueno, eu não ouvi, e vou por ti, Elena, quanto à música. Parabéns!
O que falo diz respeito à situação política, social e administrativa da OSPA, muito preocupante.
Elena Romanov: à situação política, social e administrativa da OSPA, muito preocupante…
Com isso não posso não concordar… infelizmente.
Milton Ribeiro: Elena, é estranho. Ouço a Nona há anos (claro!) e tomo por base o que tenho ouvido. Concedo que a má interpretação do Scherzo pode ser impressão, apesar de que não estava nada divertido, porém o Adágio estava muuuuito rápido. Não estava nad…a delicado, tenho convicção de que estava ruim e conheço n gravações onde ele aparece muito mais interessante e… lento. A concepção me pareceu antiquada.
Mas estou longe de me considerar o dono da verdade e posso estar erradíssimo, apesar do que dizem meus ouvidos. Minha opinião so tem validade absoluta dentro do perímetro do meu cérebro, dali pra fora…
Abraço.
Elena Romanov: Pois é, Milton. Todos nós gostamos algo mais e algo menos… isso é normal e humano. Mas a OSPA deu seu melhor ontem. Ao vivo. Numa acústica terrível. E estava de aniversário.
Merecemos um Parabéns sem as criticas 🙂
Milton Ribeiro: Elena, eu acho que OSPA merece todos os parabéns e mais 60 anos de vida. O que fiz foi uma crítica a uma interpretação. Nunca seria estúpido (pois é esta a palavra) de desconsiderar a instituição. Ao contrário, sinto enormes saudades dos te…mpos de Komlós, David Machado e Eleazar. Sinto saudades, sobretudo, de REPERTÓRIOS MAIS AMPLOS, da música moderna, dos compositores brasileiros, da fuga da atual zona de conforto e estou disposto a lutar pela melhoria da situação. Sinto saudades dos tempos em que a orquestra me parecia mais disposta a desafios e que era a melhor do país. Sobre o esforço de vcs: minha nossa, sei que deve ser imenso. Vcs são músicos que ensaiam e tocam em locais de acústica lastimável. Mas sou público ouvinte e essas pessoas têm a mania de cobrar qualidade mesmo que as circunstâncias sejam precárias.
Sim, temos discordâncias sobre a Nona. Sou um ouvinte de longa vivência (deves conhecer aquele blog de múisca erudita que mantenho, não?) e tu és uma musicista. É claro que tua opinião é mais abalizada do que a minha e que tu estás sendo bondosa ao me poupar de explicações técnicas. O que desejo deixar claro é frequento a OSPA desde criança, adoro a orquestra e tanto sinto-a como minha que fico envergonhado pela “situação política, social e administrativa” dela.
Agora há colegas teus que têm reações as mais estranhas: enquanto um diz que o Scherzo da Nona é sério — o que é uma piada involuntária, me faz imaginar Beethoven escrevendo uma peça bem humorada que fosse inteiramente despretensiosa (fato impossível) e me faz pensar em Scherzi bem mais sérios como os de Bruckner –, houve outro que me fez um sinal de que gostaria de vomitar e isto em pleno concerto! (não diria seu nome nem sob tortura, OK?). Ou seja, há opiniões e opiniões, mesmo dentro da orquestra.
Abraço.
Claudia de Ávila Antonini: Acho vocês músicos uns heróis.
Não sei onde encontram motivação tendo que ouvir antes do concerto notícias sobre pagamentos atrasados e estando sem casa própria, sem local adequado para ensaios e sem verba para a manutenção dos instrumentos… e trajes. Haja magia…
E que vergonha isso para nós portoalegrenses!
Sobre o ex-titular, desculpe mas me é antipático, não consigo não vê-lo como um turista pretensioso que queria ser o Neschling do Sul mas só se não desse muito trabalho…
Espero que os novos ares mudem estes rumos em breve e que sejam vocês músicos a cortar a fita de inauguração do novo teatro.
Durante o concerto comemorativo aos 60 anos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA), nesta terça-feira, ouviu-se não apenas a 9ª Sinfonia de Beethoven, mas vários discursos.
Quando o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, declarou a OSPA como “Bem Cultural de Natureza Imaterial” da cidade, houve certa reação de uma plateia que conhece a história recente da Orquestra. Ouviram-se murmúrios, para dizer o mínimo. A Ospa está há anos sem sede. Após ter sido rejeitado por algumas associações de moradores — houve o célebre caso dos Histéricos da Gonçalo de Carvalho que desejam proteger o ecossistema da rua… — , o projeto da sede, hoje, só se materializa no papel e em tapumes no Parque Maurício Sirotsky. Como se não bastasse, a verba indenizatória para manutenção de instrumentos e indumentária dos músicos está defasada, o regente titular está demissionário, o local de ensaios é totalmente inadequado – um armazém no cais do porto – e o Conservatório Pablo Komlós está desativado. Sob esta perspectiva, o ato de registrar a OSPA como Bem Imaterial foi ouvido como uma fina ironia involutária, porque “bens materiais” é tudo que lhe falta.
Porém, a reação maior veio quando o Secretário de Cultura do Estado, César Prestes, discursou, representando o Governo do Estado. Ao referir-se a uma suposta boa convivência da Secretaria com a Orquestra, Prestes ouviu algumas risadas em tom de escárnio. Apesar do secretário ignorá-las, o constrangimento foi geral. Depois, foram chamados para discursar o deputado estadual Adão Villaverde (PT). Ele tentou tranquilizar a plateia, garantindo que os recursos para a construção do novo teatro estão na previsão do futuro governador Tarso Genro e da bancada federal gaúcha para o próximo ano. Porém, o presidente da Fundação Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, Ivo Nesralla, após citar a presença do futuro Secretário da Cultura, Luiz Antônio de Assis Brasil, do ex-governador Olivio Dutra, do deputado Raul Pont (PT), do secretário municipal da Cultura, Sergius Gonzaga, e de outras autoridades, fez retornar o clima pesado ao dar a boa notícia de que finalmente as verbas para manutenção dos instrumentos e da indumentária seria reajustada e paga. Só que o bom anúncio foi feito com tal falta de entusiasmo que os murmúrios voltaram à plateia. Só foram interrompidos por Beethoven, regido por Isaac Karabtchevsky em seu último concerto e que recebeu uma interpretação apenas correta, bem abaixo da capacidade dos músicos.
Se no primeiro movimento a orquestra somente tratou de bater o ponto, um Molto Vivace (Scherzo) duro e estranhamente militar deu o pontapé inicial para a tragédia. Há que ter humor para tocá-lo e parecia que não havia muito disponível em estoque. Obs.: Scherzo significa “brincadeira”. O Adagio molto e cantabile veio em inusitada velocidade, como se Karabtchevsky quisesse jantar logo. Desde que Karl Böhm passou a tocar este movimento em 18 minutos lá pelos anos 70 — contra os 14 de Karajan, por exemplo — que a concepção mais rápida do Adágio da Nona ficou abalada. Hoje, poucos o interpretam da forma escandalosamente açodada que ouvimos ontem e conheço muitas gravações dele, pois é meu movimento preferido da Nona. O Coral final esteve realmente perfeito, mas foi só. Falando com franqueza, acho que o internacional Karabtchevsky não tem mais ambiente e já vai tarde.
Por falar em tarde, hoje à tarde, a Assembleia Legislativa do Estado homenageou a OSPA por seus 60 anos. No Plenário da Assembleia Legislativa, ouviram-se novas promessas de apoio à instituição. Fala-se em recursos federais de R$ 30 milhões para o início das obras, mas não há confirmação de valores.
Na última sexta-feira, entre 18 e 20 horas, enquanto fazia a performance “Não alimente o escritor“, presa a uma casinha de cachorro, a escritora e performer Telma Scherer foi enxotada da Feira com alguma truculência. Com problemas financeiros reais, muito triste — como afirma com escarrada clareza no vídeo abaixo — e não sendo absolutamente doida varrida, Telma acabou vítima da Brigada Militar. Foi levada num camburão para um posto da instituição, sob a vaga acusação de perturbar a ordem e desobedecer a ordem pública, legal, etc.
Eu já sabia do fato, mas só dei-lhe a devida importância quando, segunda-feira, vi um ciclista ser expulso da Feira do Livro com agressividade bem maior do que a utilizada contra Telma Scherer. O menino estava atrapalhando mesmo, caminhando entre as barracas empurrando sua bicicleta e até justificava algumas reclamações de quem se chocava contra a bicicleta. Merecia, no máximo, uma advertência da autoridade, pois, imaginemos, ele estava com aquele capacete meio ridículo dos ciclistas e óculos escuros, talvez viesse de longe e com pouco dinheiro para comprar alguns pockets. Era caso para um tratamento indulgente e educado. Porém o que ocorreu é que ele foi literalmente abalroado por um brigadiano que veio de longe aos gritos de “Para o lado, para o lado”. Como o menino não reagiu imediatamente — custou a ser dar conta que a gritaria era com ele — , o homem seguiu gritando e empurrou o ciclista, que antes apenas olhava com interesse os livros com sua bicicleta. Foi uma cena feia.
Ora, nós estamos numa Feira do Livro. Há estátua de Drummond e Quintana, havia escritores dando palestras sobre ficção russa e um americano falava sobre Clarice Lispector. É um espaço cultural e, goste-se ou não, aprove-se ou não, o anônimo ciclista e a escritora deprimida (com razão, com razão) que resolveu expressar-se em praça pública, devem ser tratados com a gentileza e civilidade que o evento pressupõe. É incrível que após 56 anos anos de Feira não haja um protocolo entre a Câmara Riograndense do Livro e a Brigada Militar para que seus soldados não tratem o povo da Feira como se fossem gente armada vendendo drogas, apesar de alguns títulos que vi. É incrível que após 56 anos ainda não foi criado um espaço de arte e diálogo a poucos metros de distância da programação oficial. É uma total falta de sensilidade.
Eu tenho críticas à Feira do livro — a oferta de livros muito rotineiros a tornam uma enorme, comum e nauseante livraria média; há nela cada vez mais um perfume de quermesse; há alunos de escolas fazendo passeios bobos sem aproveitar o MARGS, o Memorial, o Erico Verissimo, a Casa de Cultura e o Santander Cultural que estão ao lado — , mas sou grande apreciador das muitas palestras e dos balaios. Como experiente frequentador de um evento que este ano teve 1,7 milhão de pessoas e recorde de vendas (411 mil exemplares vendidos numa capital média como a nossa), afirmo com segurança que tanto Telma quando meu ciclista não atrapalham em absoluto e sim dão um colorido peculiar de protesto e casualidade que deveria ser uma das qualidades da Feira do Livro.
Acho que a Brigada Militar está mais acostumada ao MST que, sem cobertura maior da imprensa, deve receber ordens e detenções sem a menor explicação… Também sou de opinião que a Câmara faz um belo trabalho que deve ser melhorado e que não tem relação com os abusos da polícia da desgovernadora. E, bem, acho que nem preciso declarar minha solidariedade à bonita Telma nem ao anônimo ciclista, né? Só não sei se eles voltarão à Feira, se acham mesmo que ela serve para a promoção da leitura e que é um “espaço cultural”.
Ser patrono da Feira do Livro pode ser humilhante. Lembro da cara constrangida de Charles Kiefer, em 2008, de braços dados com Yeda Crusius e Mônica Leal. Aquele foi o alto preço cobrado pela vaidade. Lembro da cara “tô nem aí” de meu colega de daltonismo Carlos Urbim no ano passado. Já o folclorista Paixão Côrtes sempre militou na grande imprensa e receberá quaisquer companhias com naturalidade. Estive na cerimônia de escolha do novo patrono. Paixão fez um belo discurso desculpando-se pela idade (83 anos) e pelo marca-passo que o tornará um patrono comedido. Paixão é um Ariano Suassuna low profile. É menos talentoso e bem menos caudilho que seu colega nordestino, pois há um lado positivo em quem não consegue pontificar de forma tão completa.
Hoje li críticas à Feira de Porto Alegre. Seria apenas uma grande livraria comercial. E há alguma que não seja comercial, mesmo dentre as simpáticas pequenas livrarias? Mas concordo com uma das críticas: há um fato que torna a de Porto Alegre e todas as Feiras — incluindo a Bienal de São Paulo e a Feira bonairense — iguais: são imensas e enjoativas livrarias com mais ou menos os mesmos livros. Mas há que saber usar o evento. Há uma interessante programação paralela que é gratuita e que apenas quem não se interessa por cultura pode ignorar. Em razão disso, ainda dou vivas à Feira de Porto Alegre.
Tenho um amigo que pensa que o preconceito de classe é tão grave ou mais do que o racial, até por sempre ficar impune. Fico na dúvida quando ele fala isso, mas logo penso naquela assessora do Serra que garantiu que o candidato era apoiado por uma “massa cheirosa” e no resultado desta e de outras ações de “classe superior” do grupo: hoje estão sendo punidos por um desempenho pífio de sua tartaruguinha. Também acabo de pensar nos empresários que foram beneficiados pelo governo Lula mas que não podem de modo algum aprovar o governo de um torneiro mecânico sem formação universitária, mesmo que ele tenha garantido estabilidade e maior consumo. Trata-se de puro preconceito de classe.
Célia Ribeiro, em sua coluna dominical no caderno Donna de Zero Hora, publicou, em 22/08, um texto que passa ao largo de suas habituais considerações inofensivas sobre elegância e etiqueta, invadindo com duas patas o terreno mal-cheiroso do preconceito de classe. Destaco um trecho da coluna:
Dia desses, entrei no banheiro de um shopping, por volta das três horas da tarde. Todas as pias da bancada de mármore estavam ocupadas por funcionárias das lojas que escovavam os dentes com o maior esmero, diante do espelho, formando espuma da pasta dental na boca. Havia mais duas senhoras à espera para lavar as mãos, mas nada levou aquelas vendedoras a acelerar sua higiene bucal (bom senso seria os shoppings oferecerem aos seus funcionários banheiros privativos para deixá-los mais à vontade).
Se isso não ocorre, que elas escovem os dentes no banheiro comum, rápida e discretamente, sem ruído, deixando os detalhes para aprimorar na pia de casa, no final do dia. E, cá para nós, não é nada favorecedora a imagem de um rosto no espelho, com as bochechas infladas pelo vaivém da escova.
Achei que Célia foi pra lá de infeliz. Ela deveria, no máximo, dirigir sua crítica exclusivamente à administração dos shoppings e não qualificar as mulheres escovadoras de “funcionárias” e as mulheres esperadoras de “senhoras”. Todas são mulheres, provavelmente trabalhadoras. Simples assim, minha cara colunista. O tom da crítica, com descrições de bochechas infladas e baba saindo pela é muito preconceituoso. Queria ler Célia dizendo o mesmo de uma senhora…
Estranho, lembro agora de que uma ou duas vezes fui atingido por suspiros impacientes por ter resolvido lavar o rosto num shopping. Tenho a pele oleosa e penso que às vezes sou um sebo ambulante. O pessoal não gosta e nesse caso nãop se trata de preconceito de classe.
Portanto, fica aqui uma pergunta para Célia Ribeiro: devo lavar o rosto num banheiro de shopping ou apenas fazer os números 1 e 2 e lavar as mãos, hein?
Desde a semana passada, várias pessoas me perguntam sobre o Sul 21, então vamos lá.
Não sei exatamente bem onde nasceu, sei que fui convidado para uma reunião na Palavraria da qual participaria um grupo de blogueiros mais Alberto Kopittke, que logo depois fundou o Leitura Global. Pensando naquele dia, acho que a ideia inicial não mudou muito. Queríamos um portal com um assunto diário principal e vários blogs agregados. A inspiração óbvia era o Huffington Post e nosso principal problema era o de sempre: dinheiro. Afinal, a gente sempre pensa que não custa nada, mas vá somar tudo — provedor, espaço físico, jornalistas, fotógrafos, equipamentos, segurança contra hackers, etc. Dá bem mais que uma Kombi.
Ontem, durante a festa de lançamento, talvez influenciado pelo toró que caia lá fora e que não atrapalhou, tinha a ribeiriana sensação que costuma nublar meus momentos de alegria. Até quando, até onde vamos? O cenário indica que temos tudo para sobreviver: queda na venda e influência dos jornais, imprensa de qualidade rasante e claramente desonesta e crescimento dos meios alternativos de comunicação. O processo histórico indica que a internet poderá provocar alterações de hábitos muito maiores do que provocaram o rádio em relação aos jornais (anos 30) e a TV em relação a ambos (segunda metade do século XX). Pergunto a quem pensa que os jornais e a TV estão na mesma posição de antes: o que explica que a Folha vendesse um milhão de exemplares e hoje apenas 300 mil? E cadê a penetração que o Jornal Nacional tinha nos anos 90?
Bem, mas tergiverso citando fatos conhecidos. Um veículo como o Sul 21 precisa de acessos, muitos, que justifiquem a venda de espaços. Não sou um dos financiadores do projeto, o dinheiro não é meu, mas estou preocupado. Minha posição pessoal — a qual, como indica a palavra, vale apenas para mim — é simples: qualquer coisa que não influencie a arejada linha editorial é válida.