Memória

Memória

villa-lobos com violao

Acabo de escrever 10 mil caracteres sobre Heitor Villa-Lobos. Por minha biblioteca estar longe, praticamente só utilizei a memória, além da ajuda no site do Museu Villa-Lobos. Sob a pressão de ter de entregar a matéria, acabei lembrando de coisas que nem sabia mais… Tive que conferir tudo e acho que não menti muito. A coisa deve ser publicada amanhã no Sul21.

Mas não estou aqui para me gabar. Todos têm memória. Só que é tanta coisa armazenada que a gente mal consegue fazer aflorar e deixar disponível. Eu, por exemplo, sou lentíssimo. Precisei de uma noite de sono e de preocupação. Porém, hoje pela manhã, cheguei a recordar a voz de Villa-Lobos, presente em um de meus CDs. Ainda estou surpreso e lembro agora de uma cena aterradora.

Em 1993, no velório de meu pai, fiz-lhe um carinho e ele estava frio como nunca estivera. Notei que toda a memória que ele tinha de mim se esvaíra e este pensamento acabou comigo. Muito do que ele sabia de mim se fora, muito do que eu ainda podia saber se perdera. Isto me deixa triste e choramingas até hoje. Ele morreu cedo demais.

(Fazia tempo que eu não publicava nada na categoria “Em torno do meu umbigo”…)

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Da classe de uma senhora

Da classe de uma senhora

Detesto a palavra classe, até porque uma dos piores chagas de nossa sociedade é o preconceito de classe, mas vá lá. Aqui cabe.

Eu e Elena fomos ao cinema no último sábado à tarde para ver o excelente Pedalando com Molière. Compramos os lugares E08 e E09. Na hora de sentar, a Elena pensou que nosso lugar estivesse ocupado. Porém, estava errada e a senhora de cabelo brancos que ocupava a cadeira, sorriu e mostrou seu ingresso, dizendo:

— O meu é o E10.

Ao ouvir aquela voz, fui remetido a não sei quantos anos atrás, talvez 40. Era a voz de Jacqueline ou Jaqueline Monteiro, uma das maiores amigas de minha mãe. Olhei para a ela, era uma senhora muito bonita, como a tia Jac sempre fora. Analisando o rosto, só podia ser ela. Sentamos ao lado e eu disse para a Elena, que me incentivou a fazer minha apresentação. Fiquei tímido e confuso por dois minutos — não queria dar para ela a notícia da morte de minha mãe no ano passado –, mas depois tomei coragem e perguntei se o nome dela não era Jacqueline. Ela me olhou com um belo sorriso de surpresa.

— Ah, sim, não tinha te visto… Não. Meu nome é Jacquely, com ípsilon no final, e tu deves ser o filho da Maria Luiza, não?

— Sim. Sou o Milton.

— E eu sou a tia Jac, que era como tu e tua irmã Iracema me chamavam.

Introduzi a Elena na conversação e o encantamento que a tia Jac ficou ao saber que ela era violinista talvez só tenha sido superado pelo meu ao ver que pusera em funcionamento duas pessoas da mais alta elegância e educação. E cultura. Não sei como, chegaram logo ao último filme do Woody Allen, sobre o qual a tia Jac parecia saber tudo (e de uma forma bastante crítica), e depois aos Quintetos de Schubert. Só me restava observar — além de dizer que o Quinteto de que elas estavam falando era aquele com dois violoncelos –, porque, se sou um silvícola perto da Elena, com aquelas duas juntas passo a visigodo. Não saberia me comportar. Senti que o momento de ela se referir a minha mãe estava chegando… Ela perguntou:

— Talvez a Maria Luiza já tenha infelizmente falecido…? — e, ao ver que eu confirmava com a cabeça, continuou.

— Vi-a há uns dez anos e ela estava confusa. Acho que não me reconheceu, que estava apenas sendo gentil. Telefonei algumas vezes e as notícias não eram boas. Deve ter sido doloroso para vocês.

Claro que ela sabia da morte. O vínculo com minha mãe estava estampado no português perfeito, com todas as conjugações certinhas, o mesmo de minha mãe. Mudou de assunto, dizendo que eu era parecido com os meus dois pais, uma mistura deles. É óbvio que me orgulhei de que a tia Jac — que demonstrara em cinco minutos elegância ímpar, vida cultural ativa e excelente memória — fora uma pessoa que convivera com minha mãe, cada vez mais irreconhecível em seus últimos anos de vida.

O filme — que se revelou extraordinário — começou. A Elena se aconchegou a mim e me disse no ouvido:

— Que senhora agradável! Ela é o máximo! Viu como eu estava certa?

Claro que estava. No final do filme, comentamos a três sobre o brilhantismo da história sobre o ator aposentado que é convidado a voltar aos palcos e entra em confronto com quem tenta contratá-lo. A tia Jac desceu as escadas segurando-se no corrimão, mas depois acelerou, caminhando na mesma velocidade que nós. Permanecemos sob o seu efeito.

(Voltamos para a casa a pé. Eu pensava na influência que as pessoas têm umas sobre as outras e no que dissera o queridíssimo Arthur, filho de dez anos do meu amigo Augusto Maurer:

— Com a classe da Elena, o Milton ficou muito mais educado).

Como não tenho fotos da Tia Jac, eu e Augusto Maurer
Como não tenho fotos da Tia Jac, eu e Arthur Bertuol Maurer | Foto: Augusto Maurer

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O 31 de outubro que não é mais de Drummond, nem de Fellini

O 31 de outubro que não é mais de Drummond, nem de Fellini
Não lembro de que ano é a foto, mas acho que eu estava na faixa dos 30 e ela na dos 60, pois tínhamos exatos 30 anos de diferença.
Não lembro de que ano é a foto, mas acho que eu estava na faixa dos 30 e ela na dos 60, pois tínhamos exatos 30 anos de diferença.

O 31 de outubro já foi, para mim, apenas a data de nascimento de Carlos Drummond de Andrade. Apenas? Depois, passou também a ser a data da morte de Federico Fellini. Pois é. Porém, no ano passado, a data ganhou novo significado; afinal, em 31 de outubro de 2012, às 6h20, faleceu minha mãe. É estranho como lembro absolutamente de todos os que lá foram, dos sentimentos externados e de algumas piadas, as quais ficaram muito mais engraçadas contra um ambiente de luto. Lembro com carinho do encontro da Inah — velha empregada de minha mãe — com minha filha Bárbara. Vi como as lágrimas brotaram imediatamente dos olhos da Bárbara, saudosa das amadas sopas que comeu por toda sua infância. Lembro de comportamentos fora do tom daqueles que não percorreram todo o período do Alzheimer de D. Maria Luiza. Nós estávamos tristes e aliviados. O sofrimento da doença fora imenso e ninguém estava muito desesperado com aquele final que livrava minha mãe de enorme desconforto, apesar de todos os cuidados. Nem sua alimentação era autônoma e as dificuldades respiratórias eram severas. Lembro do dia. Do incrível preço do caixão. Das perguntas que sobre se minha mãe realmente desejara a cremação enquanto estava lúcida. Da escolha da caixinha onde seriam colocadas suas cinzas. De ficar em casa sem ter nada o que fazer enquanto não iniciava o velório. Da música de Chopin que ela amava e que acompanhou o caixão. Da conversa com o padre, ao qual explicamos que ela apenas discretamente religiosa. Das várias histórias contadas a respeito de minha mãe. De seus clientes que diziam que ela fora a melhor dentista que tiveram. Dos que perguntavam como fora toda a evolução da doença e ouviam minha voz (ou a da minha irmã) em piloto automático. Dos constrangidos que não sabiam cumprimentar com “Meus pêsames”, nem com “Lamento muito”, e que ficavam em silêncio ou diziam “Tudo bem?” (e ficavam ainda mais atrapalhados). Daquela noite. Dos dias posteriores. De buscar a caixa com as cinzas e de notar como era pesada e não me causava emoção.

Foto: Augusto Maurer
Foto: Augusto Maurer

Porém, esquecida de tudo isso, hoje fui acordado por uma voz me dizendo: “Dois meses”. E só pude sorrir ante o novo e delicado significado da data. E o espumante já está aguardando a noite.

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Dia do Professor

teacher-on-a-white-background-vectorNão adianta, eu sempre odiei meus professores. Admiro o sujeito que abraça esta profissão tão difícil e mal paga, mas… Hoje, muita gente lembrou saudosamente de seus melhores mestres. Alguns citaram seis, sete, dez, vinte nomes. Eu não tenho quase nenhum para lembrar, detestei a maioria deles, sempre me pareceram um bando neurótico de pequenas autoridades. Gostava mais daqueles que exerciam a profissão como cômicos, mas eles sempre foram muito impessoais para serem amados.

Tenho apenas duas admirações, uma incondicional, outra com muitas e justificadas restrições. A admiração vai para a Sarinha, minha professora de português no primeiro ano do segundo grau no Colégio Júlio de Castilhos. Ela me inoculou a literatura. Eu não lia durante a infância, só jogava bola. A Sarinha fez tudo com grande economia de meios, chegou ao ponto muito rapidamente. Ela viu como eu — péssimo aluno de boas notas — detestava sentir o poder que ela tinha sobre mim e me disse: “Leia dois livros por mês, de minha escolha”. A cada quinze dias, eu vou te fazer um questionário verbal e tu não precisas assistir as aulas. Te dou a nota pelas respostas que tu me deres”. E indicou o primeiro livro, O Continente, de Erico Verissimo. Eu enlouqueci e li o que ela pedira e mais a continuação, O Retrato. Ela me perguntou tudo sobre O Continente e saí com nota dez. Pedi para que o próximo questionário fosse sobre O Arquipélago, continuação de O Retrato. Nova nota dez. Assistir aulas sempre foi um tormento para mim e a Sarinha me abriu as portas do paraíso.

E assim eu passei o ano inteiro lendo livros para a esperta Sarinha, uma professora de olhos azuis e 1,50m de altura. Passei a idolatrá-la. Ela tinha uma irmã que era professora de inglês de nossa turma, uma jararaca. Voltando à Sarinha, o terceiro livro foi Laranja Mecânica, depois veio Manuel Bandeira, Dostoiévski e Guimarães Rosa, meu maior espanto. Era 1974, um ano feliz. Foi o ano em que conheci a Maria Cristina, a menina com quem depois dividi minha primeira experiência sexual. Dizíamos rindo um para o outro: “Vamos praticar bastante e aprender juntos”.

De meu outro mestre-exemplo não declino o nome. Estava na universidade e o cara apoiava o Golpe de 64. Era muito inteligente, muito capaz, tinha farta biografia de realizações, mas era minuciosamente maquiavélico. Por isso era todo aquele sucesso acadêmico. Construíra prédios na UFRGS, fundara departamentos. Devia ter esmagado dezenas de inimigos políticos. Prometia coisas e descumpria: “O que não foi escrito não foi dito”, respondia para nós, os idiotas. Aprendi com ele que se deve esperar pelo pior das pessoas para não haver decepções. Foi algo muito instrutivo. Mesmo assim, sou bondoso e otimista com as pessoas como um cãozinho labrador. Apenas não me surpreendo quando vejo certas mudanças de comportamento. Este professor foi fundamental no meu conhecimento da natureza humana. Seus ensinamentos foram preciosos e não me abandonaram até hoje, 37 anos depois.

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Maria Luiza & Milton (meu pai)

Maria Luiza & Milton (meu pai)

Abaixo, minha mãe, Maria Luiza, aos 21 anos. A foto é de 7 de março de 1949.

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No verso da foto, meu pai escreveu de forma bem portuguesa, cheia de diminutivos carinhosos: “Está ou não está um verdadeiro amorzinho a minha Luizinha neste fotografia?”.

Milton - 2

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Amor por duas mulheres

Amor por duas mulheres

Tenho / tinha em minhas mãos todos os ingredientes para estar vivendo uma das quadras mais podres de minha vida, mas, se fosse reclamar, seriam lágrimas de crocodilo, pois sou beneficiário do amor de duas mulheres. Só posso pensar que, se for mesmo uma pessoa boa e grata, quando olhar para trás, pensando nesta época de separação, vou me lembrar mais delas, de minhas duas mulheres, do que de qualquer outro.

Prova de que o recente calor provocou brotações em Porto Alegre, ambas mudaram recentemente seu status no Facebook para “Em um relacionamento sério com…”. Uma é minha filha; a outra não sei bem o que será, mas bem a quero e bem sei o que desejo que seja. Uma é mais pequena; a outra não chega a ser grande. Uma me dá conselhos com certa rispidez; a outra é cheia de modos. Uma me provoca a tapas; a outra o faz mudando subitamente de assunto, deixando pelo caminho vagas frases com mil reticências. Estou acostumado com o espanto de ver a primeira delas repentinamente a meu lado desde há duas décadas; a outra vai e volta e, por mais que me esforce, sou obrigado a pensar que chegou pelo ar. Uma me defende de forma indignada; a outra pede que eu cultive a tranquilidade. Uma corrige meus escritos; a outra diz ouvi-los. Uma tem um piano cheio de cupins; a outra morre de saudades do seu. Uma gosta dos filmes pesados; a outra, dos leves. Uma costuma me soquear de brincadeira; a outra … Bem, uma diz palavrões — Por que seremos mais castos / Que o nosso avô português?, perguntava Drummond — ; o que escandalizaria a outra — se esta os ouvisse. Uma é brasileira de Porto Alegre; a outra, bielorrussa de Mogilev. Porém, nas poucas vezes em que se encontraram, uma elogiou a outra; no que foi retribuída (e sou a solitária testemunha disso).

E eu nisso tudo? Olha, eu trato de, cuidadosamente, receber um pouco da vida de cada uma delas e devolver tudo na forma de boas memórias. Acho que é isso que devo fazer..

A quase um mês da primavera, flores já colorem Porto Alegre
A quase um mês da primavera, flores já colorem Porto Alegre

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Três fotos

Três fotos

Esta é minha foto preferida de infância. Meu pai escreveu atrás dela: 31 de julho de 1965. Então, era aniversário de 13 anos de minha irmã Iracema Gonçalves e eu tinha sete, quase oito anos. O filhote era o Rex, que viveu 18 anos, me suportando até meus 23 anos.

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Os dois apaixonados abaixo somos eu e minha mãe, a Dra. Maria Luiza. Como confio na minha memória, não lembro de que ano é a foto, mas acho que eu estou na faixa dos 30 e ela na dos 60, pois ela tinha exatamente 30 anos a mais do que eu.

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A terceira é de 2002, foi tirada por Bernardo Jardim Ribeiro, em pé, sobre uma cama da Pousada Don Giovanni, de Bento Gonçalves. Chovia muito, estava quase zero grau e a gente tinha que inventar coisas para passar o tempo. Essa pousada é o máximo. Indico a todos.

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Dra. Maria Luiza e Dr. Milton

Saí da casa de meus pais aos 26 anos. Minha mãe não queria que eu saísse, estava indignada: “Para que morar sozinho se tem tudo em casa? Toda a liberdade?”. Mal conseguíamos conversar.

Depois da mudança, estava em casa, à noite, e a campainha tocou pela primeira vez. Era meu pai. Todo constrangido, trazia um presente.

“É um ferro de passar. Tua mãe acha que tu precisa de um”.

E começamos a rir.

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Educação sentimental

Educação sentimental
Natália, Bernardo e aminha máquina fotográfica, que sempre me prega peças
Natália, Bernardo e minha máquina fotográfica, esta sempre pregando peças

Minha sexta-feira à noite foi em casa, tranquila, preguiçosa, com gente um pouco cansada, mas com muito carinho envolvido. Meu filho Bernardo fez o jantar para mim, sua namorada Natália e sua irmã Bárbara. Um bom vazio numa panela de pressão com uma garrafa e meia de cerveja preta Kalena, mais cebola e alho. 60 minutos depois, abriu-se a panela, desfiou-se a carne, que voltou para a panela e esta para o fogo, recebendo o restante da segunda garrafa de ceva, mais creme de leite, sal e nhoque. Tudo saiu no ponto, perfeitíssimo. A melhor refeição, a mais querida.

No dia seguinte, nós e os vizinhos do andar de cima seguimos comendo. Eles faziam hums e ohs a cada garfada. Não, não é exagero de pai. O afeto espraiava-se naturalmente.

Foram momentos especiais. Muito obrigado.

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Sim, orgulho: meus filhos na Marcha das Vadias

Também é uma festa, também é uma piada, mas as piadas e as brincadeiras podem envolver fatos muito sérios. Uma explicação para marcianos — pois notei, através de sites, que há muitos recém chegados daquela planeta: a Marcha das Vadias (em inglês SlutWalk) é um movimento que surgiu a partir de um protesto realizado no dia 3 de abril de 2011 em Toronto, no Canadá, quando um delegado culpou uma mulher por ter sofrido abuso… Afinal, ela estava vestida de forma provocante… Desde então esta Marcha se internacionalizou como um protesto contra a crença de que as mulheres que são vítimas de estupro porque “pedem” para ser estupradas com base em sua forma de vestir. Durante a marcha, algumas mulheres usam roupas cotidianas, mas a maioria vão seminuas com roupas transparentes, lingerie, saias, salto alto ou apenas sutiã. Em Porto Alegre, a Marcha teve também presença masculina. Em solidariedade a elas, eles vestiram saias ou outros itens do “provocante” vestuário feminino.

A Marcha das Vadias é um movimento indiscutível, cheio de razões de ser. Meus filhos Bárbara e Bernardo participaram da Marcha. Ele é fotógrafo, mas como aparece em duas, acho que a única de sua autoria é a da Bárbara, as outras devem ser da Natália Karam e da Bárbara Ribeiro, quando ausentes das fotos.

Bárbara já esta paramentada, o Bernardo ainda não tinha encontrado a Natália, da qual receberia a saia para participar.
Bárbara já esta paramentada, para o Bernardo só faltava desamarrar a saia que recebera da Natália.

Mais fotos:

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O estuprador da General Câmara

Pois meus sete leitores, sou uma pessoa discreta, mas o que posso fazer se as circunstâncias costumam me atrapalhar?

Dia desses, semanas atrás, estava saindo do Sul21 no horário do almoço, acompanhado por colegas. Caminhávamos pelo corredor de nosso prédio em direção à rua, conversando animadamente. Quando dobramos à direita para descer nossa querida Ladeira, a Carmen viu uma amiga e desgarrou do grupo. Fui olhar com quem ela falava e tum!, bati em algo que estava na minha frente. Senti a pancadinha mais ou menos na altura do púbis. Tudo se passou em menos de um segundo: bati em alguma coisa, não vi direito o que era e, no reflexo, tratei de segurá-la para não cair. Quando olhei melhor o que tinha ocorrido, eu estava com as duas mãos na cintura de um sujeito que estava agachado, amarrando o sapato. Deve ter sido uma cena idílica.

Nossa repórter Rachel Duarte, de família materna italiana, é muito pouco silenciosa e deu uma risada que foi ouvida desde a Biblioteca Pública até a Rua da Praia. A vítima ergueu-se rapidamente, não olhou para trás e desceu a rua a toda a velocidade, trotando em marcha atlética. Pude comprovar que, realmente, quem tem, tem medo. Após a surpresa, comecei a rir da reação do moço que estivera em tão comprometedora posição segundos antes.

Mas, porra, como é que o sujeito está em tão boa forma física que amarra o sapato apenas dobrando o tronco? Ah, essas academias! E quem é que mandou ele fazer aquilo no meio da calçada, mostrando-se para todos em vez de encostar-se a uma parede, até porque ficaria mais protegido, não? Na tarde daquele dia, a Rachel me mandou, pelo Facebook, dezenas de fotos de gente amarrando os sapatos, a maioria de costas para a parede.

Que é como se faz essas coisas.

Antes de ir ao tênis, fique de costas para uma parede, por favor. Afinal, EU pode estar próximo.

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Em La Paz, depois de Copacabana

Meu filho Bernardo está viajando desde o dia 20 de dezembro, mais ou menos. Volta em 1º de fevereiro. Foi de avião para Rio Branco, no Acre. Era o único trecho que faria via aérea. Depois, só ônibus e sola de sapato. Ele e seus dois amigos foram em seguida de  ônibus para o Peru, onde fizeram a trilha inca caminhando 90 Km em 5 dias. Pegaram neve no Natal, devem ter visto trenós incas dirigidos por índios com enormes sacos de coca, puxados por lhamas. E ontem ele me ligou do Titicaca.

Voz tranquila e macia, típica de quando está descansado, disse que passou três dias em Copacabana, uma praia do lago que está a quase 4000 m acima do nível do mar e onde o celular pegava mal. Neste ínterim foi para a Isla del Sol, uma ilha do Titicaca. O lado é enorme, comprido, tem 90 Km de comprimento e uns 25 de largura. Ele me diz que, no meio do lago, não se enxerga nenhuma margem. Pergunto sobre a respiração e ele disse que, mesmo na caminhada nos Andes, sentiu-se bem. Ia pegar um ônibus para La Paz, onde já deve ter chegado. Com o Facebook, fica fácil de monitorá-lo. Afinal, lá pela meia-noite, ele escreveu: “La Paz, fetos de lhama nas esquinas. Muito afudê”.

Não sei se vão ter tempo de ir ao Chile ou se descerão pela Argentina. Acho uma pena que o Bernardo não goste de escrever. Deve voltar com um monte de histórias que vai contar aos poucos. Espero que tenha tirado muitas fotos, porque isso ele faz muito bem. Ele estagia como fotógrafo no Sul21. Gostaria de ter visto a cara dele ao pedir 40 dias de férias. Ele sabe ser sedutor quando precisa, o filho da puta. Putz, espero que volte bem. Nem li os detalhes daquele brasileiro que sumiu no Peru. Não quero fantasiar coisas ruins. Prefiro pensar que ele está entre montanhas, lhamas, indiazinhas feias e coloridas e que caminha sem parar, olhando tudo.

Sim, esta é Copacabana, porta de entrada do Titicaca e centro de peregrinações desde os tempos pré-colombianos.
A Isla del Sol no Estreito de Yampupata
Índios Aymara na Isla del Sol. Todo lo que necesito / tengo a mis pulmones / respirando azul clarito / la altura que sofoca / Soy las muelas de mi boca, mascando coca.

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Desejos bem simples

Em 2013, não quero ir a nenhum velório. Desse jeito, daqui há pouco os porteiros do Crematório São José já vão me saudar com um “Como vai, seu Milton, de novo por aqui?”. Afinal, toda hora estou indo lá. Em termos de mortes, 2012 trouxe muitas más notícias.

E, para que eu não entre lá pela outra porta, acho que eu deveria fazer um check-up. O último foi feito há uns quatro anos e eu simplesmente guardei numa pasta as requisições da Unimed, preenchidas pelo Dr. Hilário Wolmeister. Não fiz nenhum exame, pois parecia-me que sempre tinha algo mais urgente a resolver. Poderia também visitar um oftalmologista. Estou enxergando muito mal de perto e tenho que tirar os óculos para trabalhar no computador. Os óculos — esses já têm quase dez anos — só servem para dirigir, ir no futebol, ao cinema, etc.

Os médicos que me aguardem.

No mais, desejaria que a Bárbara entrasse numa boa faculdade, adoraria viajar, gostaria que minha vida não mudasse muito e que o Sul21 seguisse crescendo, mas isso tudo isso depende de trabalho, né? Então, em resumo, se tivermos saúde dá-se um jeito no resto.

E para a primeira manhã de 2013 tá bom.

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Meu sonho de Natal

Quando eu era pequeno, gostava do Natal. Na verdade, adorava, claro, porque meus pais nos enchiam de presentes. A festa era diferente, era matinal. A gente ia dormir pensando naquilo que o Papai Noel nos deixaria durante a noite e, quando acordávamos, nossa, ele tinha adivinhado nossos mais profundos desejos! Lembro especialmente de quando ganhei um autorama, mas isso é outro papo.

Depois, meu esfriamento em relação à data chegou a grau zero. Ainda na pré-adolescência, sem ler nada e sem maior influência, tornei-me ateu, um ateu natural e a data, que originariamente é uma festa pagã, passou a me irritar em razão de seu substrato religioso. Acho que todos os meus sete leitores sabem que a origem da festa não guarda o menor ranço de cristianismo: é o Solis Invictus (Sol Invencível), o Solstício de inverno. Era uma enorme festança que acontecia na noite mais longa do hemisfério norte para comemorar o recomeço, pois dali por diante os dias seriam mais longos, pouco a pouco mais quentes, e haveria a possibilidade de novas e fartas colheitas. Uma belíssima data do hemisfério norte, uma data bem realista que nos foi tomada pela igreja. De certa forma, era mais ou menos (eu escrevi mais ou menos) o que é nossa virada de ano, com suas renovadas esperanças, resoluções e renovação.

Depois, quando vieram as crianças, cheguei a me vestir de Papai Noel. No segundo ano, o Bernardo ficou me olhando como quem diz “Mas esse aí é o meu pai” e, perguntado se não era no dia seguinte, neguei e desisti de novas tentativas. A Bárbara deve ter aproveitado menos dessas festinhas. Também pudera! Ela, com três anos de idade e já sob a influência do irmão três anos mais velho, costumava observar aos coleguinhas de maternal que nem Deus nem Papai Noel existiam, fato que a deixava extremamente popular entre seus amiguinhos e objeto de desconfiança dos outros pais. Quem seria aquela crespinha louca, de três anos, que fazia proselitismo ateu num maternal?

Terrível: Bárbara por volta da época em que fazia proselitismo ateu. Ainda faz, acho.

Hoje, nem dou bola para o Natal, mas acho que está na hora dos movimentos ateus serem menos mal humorados. A data é nossa. Simples assim. Por exemplo, o presidente da Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, da qual sou sócio), Daniel Sottomaior, comemora tranquilamente e não se incomoda com a data. Ele tem uma filha de 8 anos que adora o 25 de dezembro. Diz ele: “Nossa árvore é uma árvore de referência a Isaac Newton, que nasceu nesta data e que descobriu a Lei da Gravidade. Ela tem maçãs e luzes. Os outros simbolismos – perus, renas, presentes, árvores, Roberto Carlos – , nada disso nasceu com o Natal”. E completa: “Estamos apenas retomando uma data pagã que nos foi roubada pela igreja e que foi comemorada por sete mil anos antes do século III”.

Aqui em casa, durante o Natal, meu filho costumava  — esse ano ele não fez (por quê?) — escrever no quadro de avisos da cozinha em letras garrafais: Natalis Solis Invictus, isto é, Nascimento do Sol Invencível. O nascimento do Sol Invencível é o momento em que o Sol inicia a Sua ascensão triunfante, representando, neste momento, a Luz que nunca morre e vence sempre, reflexo da imortalidade. (E que acabará com a Terra, daqui a 5 bilhões de anos…). Á época, a data era uma coisa tão forte que a igreja trouxe o nascimento de Jesus justo para o 25 de dezembro… Vergonha.

Então, meu sonho de Natal é que o paganismo retome a data. E que, no hemisfério sul, a gente invente um modo bem livre e religiosamente incorreto de comemorá-lo. Eu acharia muito justo se os namorados perseguissem uns aos outros nus pelas ruas, algo assim. É sonho, e em sonhos vale tudo.

P.S. — Rodrigo Cardia que, assim como eu, odeia o verão, escreveu: O texto do Milton Ribeiro me fez lembrar do significado original da celebração: o solstício de inverno no hemisfério norte, noite mais longa do ano, depois elas começam a ficar mais curtas. E então percebo que tenho algo a celebrar: aqui no hemisfério sul as noites começam a ficar mais longas… 

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Os hóspedes se despedem (com filme)

Primeiro post. / Segundo post. / Terceiro post.

A ninhada já estava se apertando. O espaço era exíguo e,

quando um se mexia, mexiam-se todos.

Pois ontem pela manhã, 22/12, o ninho estava assim.

Porém, na grade da casa, estava o trio fazendo seus primeiros testes de voo.

Esse aí estava meio desajeitado entre as plantas. Chegamos a pensar numa asa

machucada, mas o cara estava inteiro. Todos os membros do trio,

acostumados ao pessoal da casa, não demonstrava grande receio de nós.

Um(a), mais emotivo(a), ainda voltou ao ninho para uma última despedida.

Mas a falta de jeito dava o tom. Vejam o que este aí em cima faz com os pés.

Ah, melhor agora!

Todo um mundo diferente a explorar.

E o(a) nostálgico(a) só observando do ninho.

Até que pegamos sua saída do ninho (vídeo abaixo). Não voltou mais. Ouçam como a mãe (ou o pai) chamam e ele(a) voa!

http://youtu.be/41YrILQZ0MY

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Nossos hóspedes estão monstruosamente grandes

Primeiro post. / Segundo post.

Hoje é quarta-feira. Sexta passada (14/12), eles estavam assim.

E abriam silenciosa e desesperadamente a boca em busca da mãe. Ou da comida.

Tudo por quê, como dizem os psicólogos, o cérebro da criança pensa que seu grito…

… ou, no caso, sua bocarra, transforma-se em comida.

em, não são crianças, mas talvez pensem que se abrirem desmesuradamente o bico

aparecerá uma minhoca. A foto de cima e a de baixo já são de domingo (16/12).

Abaixo, vocês já podem ver o quanto cresceram em 3 dias. A partir daqui, são fotos de …

… hoje. As crias já estão do tamanho dos pais, só que não abandonaram ainda o ninho.

Ainda ficam pedindo comida como trintões morando com a mãe.

Estão super apertados.

Temo que a qualquer movimento mais brusco possam cair do ninho.

E pedem e pedem e pedem comida.

E mamãe ou papai vêm e lhes dão.

Um deles já caminha na borda.

(Os cães estão ficando só no pátio dos fundos para evitar que, no caso de quedas durante as instruções de vôo, algum sabiá vire lanche…).

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Porque hoje é sábado, Vote Chapa 3, Convergência Colorada

Hoje tem eleição no Inter,

eleição de metade do Conselho Deliberativo.

Esse mesmo que é tão dominado pela situação do banana Giovanni Luigi,

que conseguiu reelegê-lo sem passar pelo sócio,

numa decisão que mais pareceu um GOLPE PARAGUAIO.

Logo no Inter, que sempre se ufanou de ser o mais democrático dos clubes.

Então, para que isto não se repita nunca mais.

Para evitar que um Conselho permaneça dominado por um grupo

— ainda mais por este grupo de bundinhas amantes do conchavo —

está na hora de equilibrar o jogo, trazendo novamente para o Conselho

um papel crítico, varrendo parte da claque inútil que lá se encontra.

O Conselho deve ser fiscalizador, participativo e crítico.

Deve ser formado por pessoas que conheçam mais a arquibancada e menos os

os jantares e o prestígio de apenas poder jactar-se de ser um Conselheiro

do Internacional. O Inter não merece ser gerido por quem não vai aos jogos,

nem às reuniões do Conselho. A Convergência concebeu um projeto profissional 

para o clube. Sofremos como torcedores, mas não acreditamos em soluções mágicas.

A Convergência quer seu voto hoje, pela Internet ou lá no Beira-Rio.

.oOo.

Quem são: Luize Altenhofen, Monica Bellucci, Juliette Binoche, Eva Wyrwal (Iga A), Renata Fan, Nina Mercedez, Alessandra Pinho, Alessandra Pinho, Brigitte Bardot, Juliette Binoche, Salma Hayek, Charlize Theron, Nina Mercedez, Irène Jacob, Scarlett Johansson, Mila Kunis e Luize Altenhofen.

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Notícias frescas de nossos hóspedes

Continuação deste post.

Os pequenos sabiás estão crescendo loucamente. E pedindo comida com veemência. Fotos de uma hora atrás:

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Passa bem a família que ora hospedamos

Os pássaros fizeram um ninho sobre um vaso que fica preso na parede de nosso pátio, aqui em nosso magnífico Solar da Gaurama. Afastamos as cachorras do local — a Juno pula muito e poderia encher o saco — e vejam só o resultado. Hoje, voltando da feira, quando chegamos perto da porta, havia três bocas abertas para nós e uma mãe no muro, observando tudo de perto, assim como um pai no muro do outro lado. Ou seria o contrário?

Fotografamos a ninhada com cuidado. Abaixo, o vaso invadido pelos inquilinos.

Mais perto…

Um bico se ergue ao ouvir o som feito por ela.

Minha máquina é mesmo uma bosta.

Opa, mas agora a coisa fica mais clara.

Aí está o trio. Estão bem gordinhos.

Todos uns por cima dos outros, como fazem as ninhadas de cães.

Perna de um, pescoço do outro, bicos. Impossível saber quem é o dono do quê.

Perto dali, a apenas dois ou três metros, papai e mamãe conversam.

Tudo parece MESMO uma conversa. Com diferentes tons de pios e falando sem se …

… interromperem. Acho que não são pássaros italianos.

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